Da página do Professor Bresser-Pereira, sua avaliação sobre a taxa de câmbio e a nossa economia.
A
teoria se confirma, mas sombriamente.
Um cientista se alegra quando desenvolve
uma teoria que implica uma predição e esta se confirma na prática. Em 2008 eu
propus a tendência fundamental da macroeconomia desenvolvimentista que venho
desenvolvendo desde 2001 – a tendência à sobreapreciação cíclica e crônica da
taxa de câmbio. Isto significa que a taxa de câmbio se deprecia fortemente nas
crises, mas logo volta a se apreciar, o país passa a ter deficits em
conta-corrente, e alguns anos depois, devido ao contínuo aumento das dívidas
das empresas e do país, uma nova crise financeira se desencadeia, e a taxa de
câmbio novamente se deprecia.
Em 2008 a taxa de câmbio, que se
depreciara fortemente na crise financeira de 2002, já voltara a se apreciar e
desde o ano anterior estava sobreapreciada ao mesmo tempo em que o deficit em
conta corrente do país já voltara a ser grande, dada a forte correlação entre
este e a taxa de câmbio. Nos anos seguintes a tendência se confirmou, e a taxa
real de câmbio, a preços do final de 2015, flutuou em torno de R$ 2,80, quando
a taxa de câmbio, que torna competitivas as boas empresas industriais do país,
era de R$ 3,80 por dólar. Assim, a previsão se confirmou, como também se
confirmou sua consequência: as empresas, tornadas assim sem competitividade,
deixaram de investir, houve uma nova e brutal onda de desindustrialização, as
empresas se endividaram, e, no segundo semestre de 2014, o país entrou em crise
financeira, e a taxa de câmbio voltou a se depreciar. Ela chegou a R$ 4,40, mas
logo voltou se a apreciar, e hoje, a preços de hoje, quando a taxa de câmbio
competitiva ou de equilíbrio industrial é de cerca de R$ 4,00 por dólar, ela
caiu (apreciou-se) para R$ 3,00 por dólar.
Novamente a teoria se confirmou na
prática. Mas não estou alegre. O que se confirmou foi uma previsão sombria.
Quando a taxa de câmbio não é apenas volátil, mas tende a permanecer apreciada
por vários anos – algo que apenas a macroeconômico novo-desenvolvimentista
afirma – o país fica condenado a exportar apenas commodities e permanecer
semiestagnado, como está desde 1990, crescendo em média, por pessoa, 1% ao ano.
Hoje o Valor publica ampla reportagem onde as empresas industriais afirmam que
essa taxa de câmbio inviabiliza a indústria – é mais que isto, inviabiliza o
Brasil.
Por que a taxa de câmbio tende a se
sobreapreciar nos países em desenvolvimento? No plano econômico, porque muitos
deles sofrem a doença holandesa, porque suas taxas de juros tendem a ser
elevadas, atraindo capitais, porque seus governos acreditam equivocadamente que
o pode crescer com “poupança externa”, ou seja, com deficit em conta corrente
financiado por investimentos diretos e empréstimos, e finalmente, porque usam o
câmbio como âncora para controlar a inflação; no plano cultural, porque os
brasileiros revelam uma alta preferência pelo consumo imediato, que é
incompatível com uma taxa de câmbio competitiva ou de equilíbrio industrial, e,
segundo, porque deixaram de ser nacionalistas, e passaram a acreditar nas
recomendações e pressões dos países ricos.
Keynes afirmou que a economia é uma ciência triste, sombria.
Tinha razão. Mas ele mostrou que através de uma boa política macroeconômica –
fiscal e monetária – seria possível superar suas previsões sombrias. Os
economistas novo-desenvolvimentistas concordam, mas acrescentam: é preciso
também uma política cambial – algo que o Brasil não tem desde 1990, quando se
submeteu ao capitalismo financeiro-rentista do Oeste, suas elites se tornaram
liberal-dependentes, e semiestagnação se tornou o novo normal .
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