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segunda-feira, 26 de setembro de 2011

De volta ao desenvolvimentismo.


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA, hoje na FOLHA DE S. PAULO e sua visão de um mundo diferente do atual. 

Desde 1991 a política econômica do Brasil se pautava pelo ortodoxia convencional ou o consenso de Washington. A partir, porém, de 2006, já com Guido Mantega no Ministério da Fazenda e Luciano Coutinho no BNDES, o governo Lula começou a mudar a estratégia de desenvolvimento em direção ao novo desenvolvimentismo.

Em 2009 um passo decisivo nesse sentido foi dado com o início do controle da entrada de capitais. Agora, no nono mês do governo Dilma Rousseff, a decisão do Banco Central de baixar a taxa de juros, surpreendendo o mercado financeiro, e a decisão do governo de taxar a importação de automóveis com menos de 35% de conteúdo nacional consolidam essa mudança.

O aprofundamento da crise mundial tendo a Europa como epicentro e o desaquecimento da economia brasileira confirmam a boa qualidade da decisão. O novo desenvolvimentismo não é uma panaceia, mas está ancorado teoricamente em uma macroeconomia estruturalista do desenvolvimento, tem como critério o interesse nacional, e sabe que este só pode ser atendido por governantes que em vez de aplicarem fórmulas prontas avaliam cada problema e cada política com competência. Adotado com firmeza e prudência, o Brasil crescerá a taxas mais elevadas, com maior estabilidade financeira, e com a inflação sob controle.

Enquanto o tripé ortodoxo é "taxa de juros elevada, taxa de câmbio sobreapreciada, e Estado mínimo", o tripé novo-desenvolvimentista é "taxa de juros baixa, taxa de câmbio de equilíbrio, que torna competitivas as empresas industriais que usam tecnologia moderna, e papel estratégico para o Estado". Enquanto para a ortodoxia convencional os mercados financeiros são autorregulados, para o novo desenvolvimentismo apenas mercados regulados podem garantir estabilidade e crescimento.

Novo desenvolvimentismo e ortodoxia convencional defendem a responsabilidade fiscal, mas o mesmo não pode ser dito em relação à responsabilidade cambial. Enquanto o novo desenvolvimentismo rejeita os deficits em conta corrente, a ortodoxia convencional os promove, e, assim, se comporta de maneira populista (populismo cambial).

Argumenta que a "poupança externa" aumentaria o investimento do país, mas, as entradas de capitais para financiar esses deficits aumentam mais o consumo do que o investimento, endividam o país, o tornam dependente do credores e de seus "conselhos", e resultam em crise de balanço de pagamentos.

O Brasil, ao retornar ao novo desenvolvimentismo, está voltando a se comportar como uma nação independente. Havia deixado de agir assim em 1991, porque vivia profunda crise, e porque a hegemonia neoliberal americana sobre todo o mundo era, então, quase irresistível. Mas desde meados da década passada a sociedade brasileira começou a perceber que o projeto neoliberal era um grande equívoco, e que havia uma alternativa para ele. Como a crise financeira global de 2008 demonstrou de maneira cabal, as políticas econômicas neoliberais não eram boas nem mesmo para os países ricos.

Dessa maneira, a hegemonia neoliberal entrou em colapso, e as forças desenvolvimentistas -os empresários industriais, os trabalhadores e uma parcela da classe profissional- fortaleceram-se, o que abriu espaço para que o governo Dilma aprofundasse seus compromissos para com elas. Um novo e amplo pacto político está se formando no Brasil. Vamos esperar que leve o Brasil mais depressa para o desenvolvimento.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O mal-estar dos nossos dias

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA, hoje na FOLHA DE S. PAULO, escreve sobre "O mal-estar dos nossos dias".

Vivemos um tempo de crise, um tempo de mal-estar. A selvagem revolta no Reino Unido mostrou com clareza; foi uma reedição agravada das revoltas da França de 2005.


Essas, como as manifestações mais moderadas e mais objetivas na Grécia, na Espanha, e na própria Inglaterra contra as políticas de austeridade impostas pelos credores ou então autoimpostas pelo próprio governo conservador, demonstram que não vivemos dias felizes.


A miséria material continua a identificar países pobres e explorados da periferia, mas a miséria humana, a sensação de insegurança e falta de perspectivas e a frustração generalizada estão em toda parte. Especialmente no mundo rico.


Os EUA, que no pós-guerra eram uma sociedade coesa e vigorosa, hoje são uma sociedade dividida e desorientada. Na Europa a crise provocada pelo euro sugere para todos a estagnação senão a decadência econômica.


Como explicar o que está acontecendo? É o capitalismo que fracassou, é o Estado social que foi destruído, como afirma um crítico tão radical como brilhante como é Slavoj Zizek? Não aceito esse tipo de diagnóstico.


Os 30 anos neoliberais do capitalismo foram um tempo de retrocesso social e político, de aumento brutal das desigualdades e da instabilidade financeira e de diminuição das taxas de crescimento econômico. Mas o Estado social europeu sobreviveu porque foi defendido em eleições democráticas.


Foi então porque o mundo moderno perdeu seus parâmetros morais, como pretendem os conservadores? Não vale a pena perder tempo com esse tipo de não-explicação. As revoltas nem sempre são racionais, e muitas vezes não são sequer razoáveis, mas são sempre morais.


Mostram sempre indignação moral contra a injustiça, o privilégio e a corrupção dos ricos. Os revoltosos de Londres agiram em alguns momentos como criminosos, mas não subestimemos sua indignação.


Houve, sim, decadência moral no nosso tempo. Mas a perda de parâmetros morais decorreu da aliança contraditória e malsã do conservadorismo com o neoliberalismo - com uma ideologia ferozmente individualista, que nega de forma militante solidariedade e interesse público.


Os progressistas não têm o monopólio da moral, já que os conservadores foram sempre guardiões da moralidade, embora a confundindo com a ordem estabelecida. O conservador apenas não estava disposto, como estão o progressista e o revolucionário, a arriscar a ordem em nome da justiça social.


Quando, entretanto, nos 30 anos neoliberais, o conservadorismo foi capturado pelo neoliberalismo, tornou-se uma fonte de desorganização social e de retrocesso moral.


O mal-estar do nosso tempo só será superado quando o mundo rico redescobrir o futuro. Mas essa redescoberta só pode ser feita quando fizer a crítica ao neoliberalismo.



Os anos neoliberais do capitalismo terminaram com a crise financeira de 2008, que os desmoralizou, como desmoralizou a teoria econômica neoclássica que os justificava.



Mas nem as elites conservadoras nem os intelectuais progressistas foram capazes de fazer a crítica necessária do que aconteceu. Nem de reafirmar sua confiança na ideia do progresso ou do desenvolvimento.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O colonialismo cultural de Bresser-Pereira.

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA, em artigo na FOLHA DE S. PAULO de hoje, questiona sobre “o colonialismo cultural” do economista. O assunto é provocativo, polêmico e merece ser discutido entre nós, sempre com o objetivo de melhorar a qualidade do ensino e da pesquisa econômica. Será que podemos entender como mais uma espécie de “cota” que o governo deve dispor para as nossas publicações?

De que tipo de economistas o Brasil precisa? De economistas que pensem de acordo com os problemas e interesses nacionais ou conforme a agenda e os interesses dos ricos?

Faço essa pergunta ao verificar que hoje o padrão de qualidade do ensino e da pesquisa aceito pela "comunidade acadêmica" é definido pelas revistas estrangeiras.

Ao fazermos isso, estamos formando professores e pesquisadores alienados dos interesses nacionais, estamos praticando uma violência contra a nação brasileira.

Para que uma nação seja forte, precisa dominar a ciência e a tecnologia, o que permitiu que os primeiros países que se industrializaram se tornassem ricos e poderosos. Para isso, países como o Brasil, cuja revolução capitalista foi retardatária, precisam contar com universidades capazes de absorver a ciência e a tecnologia estrangeiras.

Não é, porém, com esse tipo de argumentação que se pode explicar o fato de que no Qualis - o sistema de qualificação de periódicos da Capes que serve para avaliar a produção acadêmica - não haja sequer uma revista nacional de economia classificada como A.

Se a teoria econômica fosse uma ciência natural e exata como é a física, não haveria problema aí. Mas a economia é uma ciência social, é uma ciência que busca compreender como as sociedades modernas produzem e distribuem riqueza.

É uma ciência imprecisa porque os homens não são autômatos previsíveis e é sempre marcada pela ideologia, pois os interesses que envolve são muito grandes. Pretender transformá-la em uma ciência matemática é pura arrogância, o que leva à desregulamentação dos mercados e abre espaço para baixo crescimento e crises.

A economia é uma ciência que sempre refletiu interesses nacionais. E os países ricos sempre a usaram para "empurrar a escada" dos retardatários, ou seja, para convencê-los a adotar políticas que consultam seus interesses nacionais.

Não obstante isso, os artigos publicados por pesquisadores em revistas brasileiras obtêm uma pontuação nas avaliações da Capes muito menor do que os publicados em revistas estrangeiras.

A participação das revistas nacionais na classe A é zero. O que estamos dizendo aos jovens brasileiros com essa política?

Que pautem suas pesquisas e sua forma de pensar pelos padrões dos países ricos nossos concorrentes. "Mas é mais difícil publicar em uma revista estrangeira", dizem-nos.

Claro que é em algumas revistas, mas não é esse o critério. Ao Brasil, o que interessa são economistas que saibam analisar e propor soluções para os problemas brasileiros.

Quando revelo à Capes minha indignação com o colonialismo cultural, dizem-me que estão traduzindo a visão da comunidade acadêmica.

Mas quem "consagra" tal monstruosidade é o Estado brasileiro, que existe não para traduzir, mas para afirmar valores.

Para resolver esse problema, a Capes deveria estabelecer para as ciências humanas um porcentual mínimo de periódicos nacionais A.

Não precisa ser um percentual alto como o da história. Um número em torno de 20% como é o caso da antropologia é aceitável. Inaceitável é o que ocorre na economia.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Crise europeia sem controle?

LUIZ CARLOS BRESSER – PEREIRA, escreveu hoje na FOLHA DE S. PAULO sobre “Crise europeia sem controle?

Nesta semana o ataque especulativo contra a Itália deixa claro que o verdadeiro problema que a Europa enfrenta hoje não é mais evitar a crise - ela está aí -, mas atravessá-la sob razoável controle.

Os principais obstáculos a uma solução adequada são os burocratas internacionais do Banco Central Europeu e do FMI que rejeitam a restruturação administrada da dívida, e o Institute of International Finance que quer reduzir o custo da restruturação para os grandes bancos que representa mais do que já sendo reduzido.

A Grécia está hoje em situação de insolvência. O documento do IIF reconhece esse fato. Diante disso, a única solução razoável para o problema é o default e a reestruturação da dívida ""a redução do valor total a ser pago e o aumento do prazo de pagamento - feita de maneira negociada e ordenada.

A Alemanha propôs essa solução, que dividiria as perdas entre os Estados e os bancos.

Estes rejeitaram a propostas com o apoio do Banco Central Europeu, do FMI, e da Comissão Europeia, e, há três semanas, a proposta alemã foi descartada em troca de uma alternativa segundo a qual os grandes bancos participariam do socorro total de € 115 bilhões de dólares com a substituição de seus créditos de curto prazo no valor de € 30 bilhões por créditos de longo prazo com um desconto.

O IIF dá agora sua resposta. Quer anulação ou redução de uma parte da dívida pública grega de € 350 bilhões de euros. Concorda, portanto, com a reestruturação que haviam recusado, mas quer que o setor público pague o prejuízo que os bancos tiveram ao emprestar à Grécia.

Os adversários da reestruturação argumentavam que a reestruturação grega contagiaria os demais países. Mas isto já está acontecendo, e se reflete nos juros elevados que os outros países europeus afetados estão sendo obrigados a pagar.

Agora, com o vazamento do documento do IIF, é a Itália o novo alvo. Devido ao excesso de dívida pública, os juros de seus títulos aumentaram perigosamente. Ao que parece o IIF foi longe demais.

Neste fim de semana, diante do agravamento da crise, os ministros de finanças europeus estão reconsiderando a proposta de reestruturação, agora chamada de "default seletivo", que obrigará os bancos credores a aceitar o desconto.

E o FMI dá afinal sinais favoráveis a essa solução.

Não há garantia de que a reestruturação da dívida grega controlada pela União Europeia, o BCE e o FMI garantirá a travessia ordenada da crise, porque o risco do contágio sempre existirá, e porque a solução será parcial.

Resolve o problema da dívida pública, não da dívida privada grega. Nem o problema dos custos de produção excessivos nos demais países devedores, porque o aumento dos salários neles foi maior do que o da produtividade enquanto o inverso ocorria nos países credores europeus, resultando na sobreapreciação implícita da taxa de câmbio.

A solução apenas resolve ordenadamente uma parte do problema. Vamos esperar que a outra parte - a da desvalorização necessária - vá aos poucos sendo resolvida através da adoção de planos de austeridade pelos governos, e através do aumento da produtividade das empresas. O fundamental é manter a economia europeia sob controle.

segunda-feira, 28 de março de 2011

FALA BRESSER-PEREIRA!

Postado pelo CORECON-RJ, direto da FOLHA DE S. PAULO, Luiz Carlos Bresser-Pereira, escreve sobre “Felizes com a presidente.”

Estamos todos felizes com a nossa presidente. Ela formou um bom ministério, estabeleceu uma maioria sólida no Congresso, e está agindo com equilíbrio e firmeza diante dos problemas econômicos e de política interna e internacional.

Não devemos, entretanto, subestimar os problemas que ela enfrenta, ou que o Brasil enfrenta. Não devemos, principalmente, nos deixar enganar com os elogios dos governantes, investidores e economistas dos outros países sobre o Brasil.

O presidente Lula saiu vitorioso de seus oito anos de governo porque se revelou um governante competente, mas é preciso não esquecer que sua política de distribuição da renda e de aumento do poder de compra dos pobres foi possível sem causar inflação porque a taxa de câmbio, que estava em R$ 3,95 por dólar quando assumiu, baixou sistematicamente durante seu governo.

E esta apreciação do real não causou problemas no lado externo da economia -pelo contrário, o país zerou sua dívida externa líquida- porque os preços das commodities exportadas pelo país explodiram, permitindo que as exportações quase triplicassem sem aumento significativo de quantum exportado.

A apreciação do câmbio e o aumento dos preços das commodities abriram um grande espaço de política econômica para o governo anterior. Não há, entretanto, nenhuma indicação de que o atual governo contará com espaço semelhante.

A inflação acelerou-se em 2010, e o governo não pode mais contar com a apreciação adicional da taxa de câmbio para fazê-la baixar. Sabe que precisa depreciá-la e por isso tratou de combater o aumento da inflação com ajuste fiscal, redução do crédito e aumento dos juros.

Mas nada fez ainda em relação à sobreapreciação da taxa de câmbio, cujo nível é incompatível com o desenvolvimento econômico do país. É incompatível porque não se pode mais contar com aumento adicional dos preços das commodities.

Eles aumentaram devido à demanda adicional da China, mas não me surpreenderei se começarem a baixar devido ao aumento dos investimentos realizados para atender a demanda. É incompatível porque o dano que a atual taxa de câmbio está causando à economia brasileira é muito grande. O país está se desindustrializando e caminhando para trás no plano tecnológico.

Meu amigo e notável economista Gabriel Palma costuma dizer que, para a teoria econômica convencional, não faz diferença produzir "potato chips" ou "computer chips". Se isto fosse verdade, não haveria por que nos preocuparmos.

Mas qualquer prefeito do interior sabe que precisa atrair indústrias que elevem o valor adicionado per capita de sua cidade. E que não há nada mais importante para o desenvolvimento que o progresso técnico.

Vejam, então, o que está acontecendo. Conforme o competente pesquisador do Ipea, Marcelo Nonnemberg, verificou, enquanto o grau de intensidade tecnológica das exportações da China e demais países asiáticos dinâmicos está crescendo, o índice do Brasil está em queda.

De 2000 para 2008, enquanto o índice da China aumentou de 11,4 para 14,8, o do Brasil caiu de 9,1 para 7,1. Estamos nos transformando em produtores de "potato chips", enquanto os asiáticos desenvolvem uma indústria cada vez mais sofisticada. Algo de corajoso terá que ser feito nesta área para que continuemos felizes com nossa presidente.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

A CRISE DO EURO.

Nestes dias de trabalhos extras e com o prazo no limite, não posso deixar órfãos aos meus quase dois atentos e fiéis leitores, principalmente devido à grave situação pela qual passa o EURO. Diante disso, deixo-os na companhia do colega LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA, que na FOLHA DE S. PAULO escreve sobre “A NATUREZA DA CRISE NA EUROPA”.

O quadro financeiro europeu continua muito grave. A Alemanha, afinal, decidiu dar apoio ao pacote financeiro grego, de forma que a dívida do setor público da Grécia está equacionada. A imprensa tem dado amplo noticiário sobre o assunto, mas afinal se limita a informar sobre o deficit público e a dívida pública do Estado grego, em vez de informar sobre o problema fundamental que não é do setor público, e sim do setor privado: é o deficit em conta-corrente e a dívida externa dos países. O problema fiscal é grave porque o deficit de 2009 somou-se a elevados níveis de dívida pública, mas o desequilíbrio não está apenas nos governos; está nos países como um todo e, portanto, em seu deficit em conta-corrente e em sua dívida externa, que englobam o setor público e o setor privado.

Se o problema fosse apenas do setor público, o socorro financeiro e uma política dura de ajuste fiscal resolveriam a questão. Sendo do país, necessita da depreciação cambial que não podem realizar.

A União Europeia controla os deficit públicos, não controla os deficit em conta-corrente. Os jornais não publicam dados sobre esse deficit porque não os recebem dos economistas. Esses não os informam porque a teoria econômica ortodoxa pressupõe que o setor privado é equilibrado pelo mercado: é o chamado "princípio de Lawson", associado ao ministro das Finanças de Margaret Thatcher, Nigel Lawson.

A Crise Global de 2008 mostrou que essa tese é absurda no plano nacional. Agora o fenômeno se repete no plano internacional. Em 2009, enquanto a Alemanha, que reduziu salários nos últimos dez anos, obteve superavit em conta-corrente de 4,8% do PIB, Grécia, Portugal, Espanha e Itália realizaram deficit em conta-corrente de 10,2%, 10,5%, 5,8% e 3,9% do PIB, respectivamente. Esses deficit financiaram investimentos de médio prazo, mas as empresas e o Estado se endividaram no mercado financeiro de curto prazo.

Devedores e credores sabiam que os débitos não poderiam ser pagos de um dia para o outro - que teriam que ser rolados -, mas, dado o pressuposto dos mercados privados sempre equilibrados, foram adiante no processo. Até que, neste ano, repentinamente, os credores começaram a elevar os prêmios de risco e a suspender a rolagem da dívida.

O problema se agrava porque decidiram pelo "sudden stop" em um quadro no qual os países não têm o mecanismo de ajuste clássico para esses momentos: a desvalorização cambial, que reduziria os salários e equilibraria a conta-corrente. Os Estados de cada país podem ajustar suas finanças, mas não há solução para o desajuste privado de países que não têm moeda própria para desvalorizar.

Como na Crise Global, existe a solução financeira via Estado. O governo da União Europeia pode garantir a dívida externa daqueles quatro países por meio da criação, às pressas, de um FMI europeu, por meio do próprio FMI e via BC Europeu.

Neste momento, os ortodoxos dirão que o BCE não pode entrar no jogo porque estaria criando dinheiro ao socorrer os países, mas foi exatamente isso o que fez o Federal Reserve na Crise Global, sem causar inflação. Agora o BCE precisará criar dinheiro para salvar os países, ou melhor, novamente os bancos, porque foram eles que emprestaram.

Mas uma situação como essa não pode continuar para sempre. A política de crescimento com poupança externa já vitimou muitos países. É preciso repensar radicalmente o problema das finanças internacionais e dos deficit em conta-corrente.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

DÁ PARA REGULAR E SUPERVISIONAR AS FINANÇAS?

Há dias não posto um artigo do Professor da FGV LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA. Diretamente da Folha de S. Paulo de hoje, BRESSER-PEREIRA escreve sobre “REGULAR E SUPERVISIONAR AS FINANÇAS.” Para uma boa leitura, análise e reflexão.

Em Nova York, os dois temas que continuam a dominar a discussão de economistas e financistas são o "grande demais para quebrar" ("too big to fail") e a necessária regulação e supervisão dos bancos. Em outras palavras, pergunta-se, de um lado, como impedir que os grandes bancos comerciais façam operações arriscadas porque sabem que, na última hora, serão socorridos, e, de outro, como regulá-los e supervisioná-los melhor. Essa dupla preocupação dominou a Conferência Minsky, organizada pelo Levy Institute e patrocinada pela Fundação Ford. Participaram dela um equilibrado número de financistas, representantes do governo (inclusive três diretores do banco central americano) e professores de economia.

Na conferência, poucos se mostraram seguros quanto à solidez da recuperação econômica depois da crise.

Boa parte dos que intervieram nos debates se mostrou convencida de que a crise poderá voltar a qualquer momento, principalmente porque, apesar do empenho do presidente Barack Obama, o governo não foi ainda capaz de re-regular o sistema financeiro desregulado durante os 30 Anos Neoliberais (1979-2008). Há também uma grande insatisfação com a teoria econômica ortodoxa ou convencional, que, evidentemente, contribuiu para a crise ao pressupor um mercado financeiro eficiente, autorregulado.

Em relação ao problema do "grande demais para quebrar", a solução apresentada por Paul Volcker -ex-presidente do Fed e hoje assessor especial de Obama- de proibir os bancos de realizarem operações de tesouraria (uma espécie de volta à separação dos bancos comerciais dos bancos de investimento) dividiu as opiniões. Volcker argumentou que a medida é necessária para impedir que os bancos participem de operações financeiras arriscadas demais. Entretanto, muitos consideraram a proposta pouco realista; incompatível com a necessária rentabilidade dos bancos comerciais. Melhor será regulá-los e supervisioná-los mais cerradamente, já que são entidades quase públicas que criam crédito e, portanto, dinheiro.

Embora a principal causa da crise tenha sido a desregulação do sistema financeiro promovida no início dos 30 Anos Neoliberais, houve também grande falha de supervisão, já que muitas operações com securitização e derivativos não eram apenas excessivamente arriscadas; elas violavam a regulação ainda existente, implicando fraude. Esse fato, assinalado por diversos participantes, foi mais uma vez confirmado no dia seguinte ao término da conferência, quando os jornais publicaram que a SEC acusou de fraude e iniciou ação civil contra o banco Goldman Sachs, porque este teria participado, com o fundo hedge Paulson & Co., da securitização e empacotamento de hipotecas que sabiam ser de baixa qualidade. Eles as venderam para clientes e outros bancos mal informados para, em seguida, o próprio banco e o fundo hedge apostarem contra esses mesmos títulos e, assim, obterem enorme ganho à custa dos que compraram os títulos empacotados. Nessa fraude, o fundo ganhou US$ 1 bilhão, enquanto Goldman Sachs ganhava quase a mesma quantia.

Antes da crise, muitas operações desse tipo passaram sem supervisão, não por falta de regulação, mas porque se supunha que os mercados eficientes tudo regulavam. A crise global ainda custará muito ao mundo, mas, pelo menos, convenceu a todos quão importante é a regulação e a supervisão e quão enganadora é a teoria econômica neoclássica dos mercados autorregulados.

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...