Hoje, após ter lido na FOLHA o artigo do Bresser-Pereira em que cita um texto de Dani Rodrik publicado anteriormente no VALOR, o comentário despertou a minha curiosidade e consegui obter o artigo do Rodrik conforme abaixo. E algumas verdades econômicas, diga-se de passagem.
No início de novembro, um grupo de
estudantes abandonou um conhecido curso de Harvard de introdução à economia,
"Ciências Econômicas 10", lecionado por meu colega Greg Mankiw. A reclamação:
o curso propaga ideologia conservadora disfarçada de ciência econômica e ajuda
a perpetuar a desigualdade social.
Os estudantes fazem parte do crescente
coro de protestos contra as ciências econômicas modernas da forma como são
ensinadas nas principais instituições acadêmicas do mundo. As ciências
econômicas sempre tiveram seus críticos, é claro, mas a crise financeira e suas
sequelas lhes deram nova munição, que parece validar as antigas acusações
contra as suposições pouco realistas da profissão, assim como sua reificação
dos mercados e desprezo pelas preocupações sociais.
Mankiw, por sua vez, achou que os
estudantes que protestavam estavam "mal informados". As ciências
econômicas não têm ideologia, retorquiu. Citou John Maynard Keynes e destacou
que as ciências econômicas são um método que ajuda as pessoas a pensar mais
claramente e a alcançar respostas corretas, sem conclusões políticas
predeterminadas.
A ciência econômica que precisamos é a
do tipo da "sala de seminário" e não a do tipo "geral".
Precisamos das ciências econômicas que reconheçam suas limitações e saibam que
a mensagem apropriada depende do contexto.
De fato, embora possa entender-se o
ceticismo de quem não esteve imerso em anos de estudos avançados de economia,
os trabalhos feitos pelos alunos em um curso típico de doutorado em economia
produzem uma variedade desconcertante de receitas políticas, dependendo do
contexto específico. Algumas das estruturas que os economistas usam para
analisar o mundo favorecem o livre mercado, enquanto outras não. Na verdade,
boa parte das análises econômicas são voltadas a compreender como a intervenção
dos governos pode melhorar o desempenho econômico. E motivações não econômicas
e comportamentos socialmente cooperativos são cada vez mais parte dos assuntos
estudados por economistas.
Como o grande economista internacional
Carlos Diaz-Alejandro, já falecido, disse certa vez, "atualmente, qualquer
estudante universitário esperto, se escolher suas suposições [...]
cuidadosamente, pode produzir um modelo consistente, recomendando praticamente
quaisquer medidas políticas às quais ele fosse favorável inicialmente". E
isso foi na década de 70! Um economista aprendiz não precisa mais ser
particularmente esperto para produzir conclusões de políticas não ortodoxas.
Ainda assim, os economistas precisam
aguentar acusações de que não saem das raias ideológicas, porque eles mesmos
são seus piores inimigos no que se refere a aplicar suas teorias no mundo real.
Em vez de comunicar todo o arsenal de perspectivas que sua disciplina oferece,
eles mostram confiança excessiva em soluções em particular - frequentemente
aquelas que melhor se encaixam em suas próprias ideologias.
Vejamos a crise financeira mundial. A
macroeconomia e as finanças não carecem das ferramentas necessárias para
entender como a crise surgiu e se desenrolou. De fato, a literatura acadêmica
está repleta de modelos de bolhas financeiras, informações assimétricas,
distorções dos incentivos, crises autorrealizáveis e risco sistêmico. Nos anos
que levaram à crise, no entanto, muitos economistas menosprezaram as lições
desses modelos em favor dos que tratavam sobre a eficiência e o poder de
autocorreção dos mercados, o que, na esfera das políticas, resultou em
supervisão inadequada dos mercados financeiros pelos governos.
Em meu livro "O Paradoxo da
Globalização", imagino o seguinte experimento. Consiste em que um
jornalista ligue a um professor de economia e pergunte se um acordo de livre
comércio com o país X ou Y seria uma boa ideia. Podemos ter quase certeza de
que o economista, assim como a ampla maioria das pessoas na profissão, se
mostrará empolgado em seu apoio ao livre comércio.
Em outra situação, o repórter não se
identifica e diz ser um estudante no seminário universitário avançado do
professor sobre teoria do comércio internacional. Ele faz a mesma pergunta: O
livre comércio é bom? Duvido que a resposta será tão rápida e sucinta. Na
verdade, é provável que o professor se sinta bloqueado com a pergunta. "O
que você quer dizer com 'bom'?", ele perguntará. "E 'bom' para
quem?"
O professor, então, entrará em uma longa
e cansativa exegese, que acabará culminando em uma declaração pesadamente
evasiva: "Então, se a longa lista de condições que acabei de descrever for
cumprida e supondo que podemos tributar os beneficiários para compensar os que
saíram perdendo, um comércio mais livre tem o potencial para melhorar o
bem-estar de todos." Se estivesse em dia inspirado, o professor poderia
até acrescentar que o impacto do livre comércio no índice de crescimento da
economia não seria claro e dependeria de um conjunto inteiramente diferente de
requisitos.
A afirmação direta e incondicional sobre
os benefícios do livre comércio agora foi transformada em uma declaração
adornada com todos os tipos de "se" e "mas". Estranhamente,
o conhecimento que o professor transmite de boa vontade e com grande orgulho a
seus estudantes avançados é considerado impróprio (ou perigoso) para o público
em geral.
O ensino das ciências econômicas no
nível universitário sofre do mesmo problema. Em nosso empenho para mostrar as
joias da coroa da profissão de forma imaculada - a eficiência do mercado, a mão
invisível, a vantagem comparativa - nós pulamos as complicações e nuances do
mundo real, tão conhecidas como são na disciplina. É como se os cursos de
introdução à física presumissem um mundo sem gravidade, porque assim tudo
ficaria muito mais simples.
Aplicadas apropriadamente, com uma dose
saudável de senso comum, as ciências econômicas nos teriam preparado para a
crise financeira e nos indicado a direção certa para consertar o que a causou.
Mas a ciência econômica que precisamos é a do tipo da "sala de
seminário" e não a do tipo "geral". Precisamos das ciências
econômicas que reconheçam suas limitações e saibam que a mensagem apropriada
depende do contexto.
Negligenciar a diversidade de
orientações intelectuais dentro de sua disciplina não torna os economistas
melhores analistas do mundo real. Nem os torna mais populares.