Tem livro novo na praca. MIRIAM LEITAO escreve sobre economia, of course, notadamente a nossa sempre lembrada hiperinflacao. Abaixo resenha postada pelo colega PERSIO ARIDA. .
Em seu novo livro, Míriam Leitão recupera, com a leveza e simplicidade do excelente jornalismo que a caracteriza, a longa saga através da qual o Brasil logrou finalmente livrar-se da hiperinflação. Num país como o nosso, que não tem como um de seus pontos altos a memória e a reflexão sobre sua própria história, isso já seria em si um feito digno de nota e admiração. Mas Míriam Leitão foi além ao chamar a atenção para um ator por muitos ignorado: nosso próprio povo. Todos sabemos que inflação não é criada pelos mercados, mas sim o resultado de políticas econômicas equivocadas. O que poucos se dão conta é que, para que a estabilização econômica seja bem sucedida, tem que haver, além de um bom governo, um pacto social de apoio e adesão.
Conto aqui um episódio que ilustrará bem o que quero dizer. Em 1984, dez anos antes do Plano Real e dois anos antes do Plano Cruzado, fiz uma apresentação no MIT, do trabalho que havíamos escrito, André Lara Resende e eu, sugerindo uma reforma monetária para terminar com a inflação no Brasil. Mário Henrique Simonsen e um professor de Harvard, que, mais tarde, seria figura importante no governo americano, eram os debatedores.
Expliquei o melhor que consegui a ideia do que mais tarde foi a URV, no trabalho aparecia como ORTN pró-rata dia, uma moeda virtual de transição. Simonsen, que era um gênio da didática, me ajudou - "o Persio não explica bem suas próprias ideias", disse ele brincando. O professor de Harvard, polemista por vocação, mas excelente economista, terminou por entender, mas vaticinou: uma abordagem originalíssima, mas sem chances de funcionar. Explicou: primeiro, por que as pessoas fariam uma conversão voluntária dos contratos na nova moeda, o que elas ganhariam com isso? Segundo, se a inflação acabar de repente, numa reforma monetária, sem um enorme desemprego, todo mundo vai achar que é fácil acabar com a inflação. Como os políticos gostam de gastar, a tentação de reinflacionar a economia será irresistível.
Não foi o que aconteceu no Plano Real. A primeira tentativa, o Plano Cruzado, falhou, mas conseguiu incrustar no imaginário coletivo a ideia de que a estabilidade monetária era possível. Quando do Plano Real, a população espontaneamente tratou de converter contratos em URV. E depois de lançado o programa, reafirmou, em todas as eleições, que políticos que não levassem a estabilidade a sério não teriam seu voto. Sem o pacto social de apoio, o Plano Real não teria dado certo.
Míriam Leitão conta-nos a história da nossa moeda entremeando conversas de bastidores, depoimentos pessoais, erros e acertos de política econômica. Longe dos muitas vezes aborrecidos textos acadêmicos, o que se lê é uma história viva, fluente. Recomendo vivamente a leitura. Os que experimentaram a hiperinflação poderão saborear episódios que acompanharam de perto; os mais jovens, afortunados por terem escapado do Brasil antigo, poderão se familiarizar com uma história que, em muitos momentos, lhes parecerá surreal.
* PERSIO ARIDA é economista e ex-presidente do Banco Central e do BNDES.
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