O texto do FERNANDO RODRIGUES hoje na FOLHA DE S. PAULO demonstra a triste realidade brasileira. Excelente.
BRASÍLIA - Sou a favor da liberdade de expressão.
Considero uma regressão civilizatória a retirada de um livro do mercado só
porque um biografado se sentiu ofendido. Um cidadão incomodado deve ir à
Justiça e ser ressarcido pelo dano causado. Mas quem vive e ganha dinheiro se
expondo na mídia não tem como reclamar quando seus hábitos no café da manhã são
revelados.
Apesar
de pensar assim, acredito que Caetano Veloso, Chico Buarque e Djavan, entre
outros, prestam um serviço ao ficarem do outro lado do muro. Eles nos ajudam a
enxergar o óbvio: o Brasil é um país atrasado. Não estão disseminados por aqui
os valores republicanos clássicos. Liberdade de expressão é uma abstração que
não faz parte da vida real da imensa maioria dos brasileiros.
Caetano,
Chico e Djavan compõem essa paisagem. Chocam parte dos leitores daFolha,
mas será que a reação seria a mesma na maioria da população? Não somos o Brasil
potência dos anúncios do governo na TV, em que os pobres estão sempre sorrindo
e os direitos parecem plenos para todos.
O
Brasil real é o das ruas com calçadas esburacadas e ônibus sujos e lotados. Da
Justiça lenta e improdutiva. O Brasil é conservador. Seu conjunto de valores
está em formação. A democracia só tem 25 anos.
Talvez
o Datafolha pudesse perguntar a brasileiros que circulam no viaduto do Chá, em
São Paulo, ou na Cinelândia, no Rio: "Você é a favor ou contra retirar do
mercado um livro que exponha a vida de Roberto Carlos, incluindo a intimidade
do cantor, dramas pessoais na infância sobre os quais ele não fala em público,
casamentos malsucedidos e um lado menos conhecido da vida desse artista? Está
certo publicar um livro que seja verdadeiro, porém constrangedor para Roberto
Carlos?".
Suspeito
que muitos aprovariam a censura prévia. O Brasil profundo é assim. Continua
refém daquela velha profecia: corre o risco de ficar obsoleto antes de ficar
pronto.
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