Caio Megale, mestre em economia pela
PUC-RJ, economista do Itau-Unibanco, escreveu no VALOR de 09.08.2012 as razões
do baixo crescimento brasileiro.
O crescimento
brasileiro vem decepcionando em 2012. Há um ano, a mediana das projeções de
crescimento do PIB para este ano, coletadas pelo Banco Central em seu relatório
Focus, estava em 4,1%. Hoje, essa mesma mediana está em 1,85%. Isso depois do
crescimento de 2011 também ter decepcionado, ficando em 2,7%.
Alguns analistas sugerem ser essa uma
evidência de que a capacidade de crescimento do Brasil está comprometida.
Depois de um período particularmente favorável entre 2004 e 2010, estaríamos
voltando para nossa antiga sina de crescer
perto de 2% ao ano.
A conclusão parece precipitada. Há uma
parte cíclica pesando sobre o crescimento econômico que, há razões para
acreditar, será gradualmente superada. No entanto, também é verdade que alguns
fatores que permitiram um crescimento mais acelerado no passado recente não
estão mais presentes. Mesmo quando os obstáculos de curto prazo forem
superados, o crescimento talvez não retorne aos níveis pré-2011.
O componente cíclico
está relacionado a excessos de 2010, quando o país andou rápido demais. O
consumo das famílias cresceu muito, especialmente de bens duráveis. As empresas
aceleraram o investimento e a produção, motivadas pela crença de que a economia
brasileira manteria o crescimento forte indefinidamente.
No entanto, com a desaceleração da
demanda observada a partir de 2011, vendas ficaram abaixo do projetado,
estoques se acumularam em muitos setores. Algumas famílias se perceberam
endividadas, acentuando a redução da demanda.
A piora do cenário de
crescimento global também tem sua influência. China e Estados Unidos perderam
vigor, e o risco de uma ruptura na Europa não é desprezível. A incerteza
externa também vem pesando sobre a confiança do empresário brasileiro, ajudando
a retardar a retomada do investimento.
Diante deste cenário,
o governo passou a estimular a demanda com cortes de juros e impostos, e
aumento de gastos.
As medidas expansionistas, mantidas por tempo suficientemente prolongado, devem
fazer com que a economia supere os obstáculos de curto prazo. O país ainda
conta com um mercado consumidor amplo, com demanda reprimida em muitos
segmentos. O avanço da classe média continua, como revelaram os últimos dados
do censo do IBGE. Há gargalos de infraestrutura que geram oportunidades de
investimentos, relacionados ou não aos grandes eventos esportivos que vamos
sediar. O setor imobiliário ainda tem espaço para expansão, haja vista que o
volume de crédito residencial é baixo, mesmo com a arrancada dos últimos anos.
Ao longo dos próximos trimestres a
demanda interna seguirá melhorando e atingindo mais setores da economia. O
nível de estoques na indústria estará mais ajustado, a produção deve retomar. As projeções do Itaú apontam para uma aceleração do
PIB de 1,9% em 2012 para 4,5% em 2013, com o crescimento do quarto trimestre de
2012 já perto de 5%, em termos anualizados.
Passado o período de baixa, no entanto,
o novo ritmo de cruzeiro da economia brasileira nos próximos anos deve ser
menor do que na década passada. Entre 2004 e
2010, o Brasil cresceu 4,5% ao ano, mas durante este período ocorreram alguns
fenômenos que não devem se repetir.
Primeiro, o nível de
crédito como proporção do PIB subiu de 25% para perto de 50%. Não é um
movimento que preocupa, dado que 50% ainda é um nível confortável. Mas é
prudente que o avanço seja mais moderado daqui para frente.
Segundo, a taxa de
desemprego caiu para 5,5%, nível próximo do chamado pleno emprego. Não há mais a
ociosidade no mercado de trabalho de anos passados. Para continuar a crescer no
mesmo ritmo anterior, é preciso agora acelerar a produtividade da mão-de-obra,
que é relativamente baixa no Brasil. Investimentos em automação e em
qualificação de pessoal vêm sendo feitos, mas ainda são localizados.
Terceiro, ao longo da
década passada o mundo cresceu muito acima do normal, em parte
porque Europa e EUA viviam a bolha do endividamento, em parte porque a China
estava em processo acelerado de urbanização. Com a crise financeira e o avanço
da urbanização chinesa, o crescimento destas regiões tende a ser mais baixo,
reduzindo a demanda pelas exportações brasileiras.
Finalmente, como
resultado do mundo crescendo menos, os preços das commodities que exportamos
devem se estabilizar.
Ficará mais difícil manter o ritmo de crescimento das importações - que
dobraram em termos reais desde 2004, fruto da forte expansão da demanda interna
- sem gerar desequilíbrios externos.
Em suma, o crescimento
muito baixo do primeiro semestre no Brasil tem um componente cíclico
importante, que vai sendo superado conforme os exageros do passado recente são
digeridos. É legítimo esperar uma retomada da economia no segundo semestre, e
em 2013. Mas isso não significa que voltaremos ao crescimento acelerado da
década passada. Para isso, precisamos de reformas adicionais, que aumentem a
capacidade de investimento e gerem ganhos de produtividade ao país.
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