Até a FOLHA registra em editorial o caso Rogoff e Reinhart.
A
descoberta de erros em um estudo publicado em 2010 pelos economistas Kenneth
Rogoff e Carmen Reinhart desencadeou grande polêmica sobre um problema
macroeconômico: qual a relação entre o tamanho das dívidas e o crescimento da
economia?
Em
termos simples, a divisão teórica e política se refere a como governos já
endividados devem reagir à lerdeza econômica.
É
justificável aumentar ainda mais o endividamento, a fim de estimular a retomada
do crescimento? Ou os governos devem gastar menos, para evitar problemas
maiores, como inflação e desconfiança dos investidores (credores), entre
outros, que poderiam solapar a economia no futuro?
Rogoff
e Reinhart são professores de Harvard, autores de um respeitado estudo sobre
crises financeiras ("Desta Vez é Diferente?"). Entre outras
conclusões, no artigo afirmam que a relação entre a dívida do governo e o ritmo
da economia não é muito relevante até um limite. Quando o endividamento supera
90% do PIB, o crescimento é severamente reduzido.
Recentemente,
pesquisadores da Universidade de Massachusetts, liderados por um estudante de
pós-graduação, descobriram naquele trabalho erros no uso de um programa de
computador, omissão de dados e aplicação indevida de técnicas estatísticas. Mas
tais falhas, bastante prosaicas, apenas reavivaram controvérsia mais séria, que
vinha desde a crise de 2008.
Uma
crítica essencial a Rogoff-Reinhard trata da direção da causalidade: a dívida
causa baixo crescimento ou o contrário? Governos de países que crescem pouco
têm receitas menores. Assim, aumentam o deficit, contraindo dívidas. De resto,
o tamanho relativo do débito não diminui se uma economia não cresce.
Apesar
dessas dúvidas conhecidas, o artigo dos economistas de Harvard tornou-se
munição das escaramuças políticas. Reforçou os argumentos dos defensores da
austeridade, da redução da dívida, em especial na União Europeia.
O
episódio convida à reflexão sobre o consumo desses estudos. Cada pesquisa, por
mais séria que seja, é uma contribuição preliminar, pelo menos até ser
incorporada ao conjunto maior da teoria, e sempre passível de correção futura.
Qualquer
aplicação científica, em particular nas ciências sociais, precisa levar em
conta contextos. O sucesso de estudos e teorias muitas vezes está condicionado
ao interesse social, econômico ou político que eles podem legitimar.
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