LEANDRO TESSLER, 50, professor do Instituto de Física Gleb Wataghin da Unicamp e assessor para internacionalização da universidade, escreveu este artigo na FOLHA DE S. PAULO de hoje. Algum leitor discorda?
Nosso
ensino superior está se internacionalizando. É uma via virtuosa: as
instituições se internacionalizam porque se qualificam e se qualificam porque
se internacionalizam.
Há um pequeno fluxo de estudantes de graduação europeus que
passam alguns anos da sua formação em nossas melhores universidades em
programas de duplo diploma.
Na pós-graduação, o Brasil é um destino importante para
estudantes de países vizinhos. O Brasil é extremamente atraente para eles: tem
um sistema universitário desenvolvido; oferece formação de primeira linha; ao
contrário do que ocorre na maioria dos países, não cobra taxas ou mensalidades
de nenhum estudante, brasileiro ou estrangeiro; há abundância de bolsas e
oportunidades de financiamento. Falamos uma língua facilmente acessível para
quem fala espanhol.
Mas os resultados atuais estão muito aquém do que poderiam ser.
O Brasil ainda tem um número pequeno de universidades entre as
500 melhores do mundo. O número de alunos estrangeiros no Brasil é bastante
reduzido. Há mais estudantes norte-americanos na Argentina do que no Brasil.
Isso se deve à preferência dos estudantes por um país que fala espanhol, mas
também pela disponibilidade de programas de graduação em inglês.
As universidades brasileiras deveriam considerar a possibilidade
de oferecer cursos superiores em inglês -de preferência até completos-
juntamente com o português.
Na idade média, quando as universidades foram criadas, as
pessoas cultas se comunicavam em latim. Graças ao latim, um estudioso de Oxford
ou de Bolonha no século 12 podia trocar ideias com alguém de Salamanca ou da
Sorbonne.
Com o passar do tempo, o latim caiu em desuso e o inglês tomou
conta do universo universitário. Atualmente não existe nenhuma conferência
internacional importante que não adote o inglês como língua franca. É
fundamental para o avanço do conhecimento que pesquisadores possam se comunicar
e se fazer entender diretamente.
Nós, brasileiros, historicamente temos resistido a introduzir o
inglês como língua de instrução nas nossas universidades.
Há quem afirme que ensinar em inglês seria renunciar à soberania
nacional, como se a nossa nacionalidade estivesse estritamente associada a
falar português. Não se tem notícia de que algum país não anglófono no qual há
ensino superior em inglês (como Portugal, berço da língua portuguesa) tenha
renunciado a sua nacionalidade por isso.
Outra posição recorrente é a do esforço: alguém realmente
interessado em estudar no Brasil deveria aprender a língua.
Em tese, isso está correto. Na prática, os estudantes preferem
dirigir-se a países onde as aulas são dadas em inglês. Eles sentem-se muito
mais seguros com a garantia de que a língua não será um problema para o
aproveitamento de sua estada.
Na verdade, se ensinássemos regularmente em inglês estaríamos
fazendo muito mais pela divulgação e expansão da cultura brasileira e da língua
portuguesa.
Uma última objeção é que isso elitizaria ainda mais as já
elitizadas universidades brasileiras. Isso talvez fosse correto se deixássemos
de ensinar em português. No entanto, a coexistência de cursos em inglês e
português ofereceria oportunidades para estudantes brasileiros conviverem com
estrangeiros e aperfeiçoarem sua proficiência em inglês.
Foi divulgado recentemente que no programa Ciência sem
Fronteiras foram concedidas duas vezes mais bolsas para Portugal e Espanha do
que para o Reino Unido, os Estados Unidos e a Austrália, onde se concentram as
melhores universidades do mundo.
Isso só pode ser explicado pela deficiência na formação dos
estudantes em inglês. É urgente mudar isso.
Os primeiros passos para uma internacionalização efetiva do
nosso ensino superior já foram dados. Falta sermos mais atraentes para
estudantes de todo o mundo, como somos atualmente para os estudantes
latino-americanos. Falta termos mais resultados de pesquisas publicados em
inglês. Publicações acadêmicas em inglês atingem a um público muito maior e têm
mais impacto sobre o desenvolvimento científico e cultural da humanidade.
O Brasil tem tudo para se tornar um centro importante mundial de
ensino superior. Precisamos saber aproveitar a oportunidade histórica.
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