Hoje, recebi do professor Carlos Pio o artigo que Cláudio R. Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios e diretor no país do International Growth Center (London School of Economics e Oxford University), escreveu no VALOR ECONÔMICO, o qual compartilho abaixo.
A baixa taxa
de investimento no Brasil, associada à (quase) estagnação da produtividade, vem
progressivamente solapando a competitividade da economia brasileira e seu
potencial de crescimento no médio e longo prazo. Na última década, a economia
passou por dois ciclos de investimento: um longo, iniciado no segundo trimestre
de 2004 e interrompido no terceiro trimestre de 2008 pela Grande Recessão; e um
curto, partindo no segundo trimestre de 2009, atinge seu pico em 2010, e se
esgota dois anos após seu início (segundo trimestre de 2011, quando a taxa de
crescimento do investimento cai abaixo de 3% frente ao trimestre anterior).
A trajetória
recente do investimento aponta para seu colapso, no sentido de não apenas ter
perdido impulso, mas de ter se contraído em termos absolutos: a formação bruta
de capital fixo em 2012 cai 4% (frente a 2011) e a taxa de investimento no ano
se reduz a 18,1% (19,3% em 2011). Esse desempenho tem algumas explicações
tópicas, a exemplo da contração conjuntural na demanda de caminhões com a
adoção de um novo padrão de consumo de diesel, novos motores e preços mais
elevados. Contudo, em anos recentes, e principalmente desde 2011, foi
introduzido um conjunto de mudanças tributárias e no custo de capital que levou
a uma queda efetiva no custo de investimento. Ademais, incentivos fiscais, a
ampliação do crédito e o aumento real dos salários favoreceu o consumo,
enquanto que compras públicas ampliaram o mercado para máquinas e equipamentos.
Sob a premissa de que o "vazamento" da demanda doméstica em volumes
crescentes vem retirando dinamismo do mercado, o governo introduziu medidas de
proteção, e intervenções no mercado de cambio levaram à desvalorização do real.
No seu conjunto seriam medidas que estimulariam o investimento - a queda de seu
custo e a ampliação da demanda.
Como,
portanto explicar o desempenho do investimento à luz do amplo conjunto de
incentivos voltados à sua ampliação e à expansão da produção? E porque o novo
regime tem sido incapaz de constituir uma efetiva política de apoio à indústria
de transformação?
A decisão de
investimento é formada por um conjunto de informações objetivas a respeito da
economia e dos mercados, e por percepções subjetivas do ambiente de negócios e
de eventos futuros que afetam o ânimo investidor (ou o "espírito
animal", conforme Keynes). Sem necessariamente tentar hierarquizar a
importância relativa de cada fator, os resultados obtidos em 2011-2012 sugerem
que os incentivos diretos e indiretos ao investimento foram sobrepujados por um
conjunto relevante de fatores.
Primeiro, a
perda de competitividade da economia brasileira, agravado pelo contexto de
baixo crescimento da economia mundial. Com a possível exceção da produção
assentada em recursos naturais (as chamadas "commodities"), e alguns
segmentos da indústria de transformação, o país vem deixando de ser uma
plataforma competitiva de exportação de bens e serviços, e crescentemente de
produção de bens transacionáveis. Não há um fator determinante, mas a maior
fragilidade se explica por uma combinação de infraestrutura precária, baixos
níveis educacionais e de qualificação, inflação de custos em serviços, e
pressão tributária - o país sendo um ponto fora da curva em termos de carga
tributária para o nível de renda per capita.
Segundo, e
com impacto direto sobre a decisão de investir, o "capex" (gastos de
capital) dos projetos - e os tempos de execução - vem se elevando nos últimos
anos. Nos anos pré-crise, esse fenômeno se explica pela escassez e elevação dos
preços dos bens de capital, porém crescentemente pelo componente de serviços,
num contexto de custos unitários do trabalho em acentuada elevação no Brasil.
Terceiro,
houve uma deterioração da qualidade da política econômica. No plano macro, há
dificuldades de acomodar de forma simultânea a expansão do consumo (inclusive
do governo) e do investimento, o que se expressa nas tensões inflacionárias a
partir de 2010, e nas dúvidas se o governo continua compromissado com o sistema
de metas e seus fundamentos. As tentativas de encobrir a redução do superávit
primário com manobras fiscais heterodoxas e de comprimir artificialmente a
inflação, e os ruídos dissonantes de diferentes esferas do governo quanto à
política cambial, minaram sua credibilidade. Na realidade, a expansão do
consumo acentuou tensões que desaguam no mercado de trabalho (e no aumento do
déficit em conta corrente), e corroem a competitividade da economia. Porém
"esfriar" o mercado de trabalho seria apagar o ponto brilhante da
economia brasileira, que vem premiando a base da pirâmide com ganhos reais (e
possivelmente desproporcionais ao incremento da produtividade).
Finalmente, o
hiperativismo no plano das políticas industriais e comerciais agrava a
percepção de que, apesar da vontade de estimular a economia no seu conjunto e o
setor industrial em particular, corre-se atrás de um alvo móvel - seja pelo
diagnóstico errôneo, seja pelas falhas de execução. Em qualquer dos casos, a
volatilidade das políticas resultou na perda de confiança dos agentes quanto ao
rumo da economia. Na medida em que o ato de investir é uma aposta no futuro, a
falta de visibilidade quanto à trajetória da economia, combinada com elementos
objetivos relativos à perda de competitividade explica em grande medida o
colapso do investimento no país.
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