sábado, 1 de junho de 2013

A inflação brasileira e suas jabuticabas .

Antônio Corrêa de Lacerda, no Estadão de 31.05.2013. 

A inflação resistindo próxima do teto de 6,5% da meta anual não é uma situação confortável para a Nação. É preciso persistir no combate à elevação geral dos preços como um valor em si. A carestia afeta a todos, mas especialmente os mais pobres.

Para um diagnóstico mais abrangente, primeiro é necessário destacar que a inflação brasileira, inegavelmente elevada e que deve ser repudiada, está muito próxima da inflação média dos países em desenvolvimento, que é de 5,8%.no acumulado dos últimos 12 meses. Há, mesmo entre os Brics, países com inflação próxima à brasileira, como é o caso da África do Sul, com 5,9%, e de outros em situação ainda mais grave, como a índia, com 12%. Argentina e Venezuela têm indicadores oficiais mais elevados e fortemente questionados quanto à sua fidelidade.

A questão é por que países em desenvolvimento têm tido inflação média equivalente quase ao triplo da dos países desenvolvidos. Trata-se de uma questão estrutural. Esses países vêm experimentando mudanças expressivas do padrão populacional, com urbanização, elevação da renda e alterações de costumes. Isso tem aumentado a demanda por alimentos e por serviços, dois itens comuns de pressão de preços em vários países. A demanda por esses itens tem crescido mais rapidamente do que sua oferta, abrindo espaço para elevação de preços.

Isso não pode ser entendido como um álibi para a inflação brasileira, mas um alerta. Ao mesmo tempo que temos de tomar medidas para combater a inflação, é preciso sair da armadilha de considerar a elevação das taxas de juros como remédio único para a enfermidade, seja qual for o diagnóstico de sua origem. No caso brasileiro, temos o impacto das questões já citadas e comuns à maioria dos países em desenvolvimento, assim, temos peculiaridades próprias que precisam ser enfrentadas. São como nossas jabuticabas, fruto originariamente brasileiro: pouco presente ou praticamente ausente em outras paragens.

A primeira é a ainda elevada indexação ou o reajuste automático e regular dos preços baseados em indicadores da inflação passada. É o caso de preços administrados, como medicamentos, tarifas públicas como pedágios, energia, telefonia, água e esgoto e aluguéis. Grande parte deles indexadas a indicadores como o índice Geral de Preços (IGP) e sua variante, o IGP-M, ambos calculados pela Fundação Getúlio Vargas - cuja composição tem pouco a ver com a estrutura de custos dos setores.

Além disso, também influenciado por esse fator e pela cultura inflacionária,vivemos uma espécie de indexação informal de preços de serviços, especialmente os pessoais, que, por sua natureza, são pouco concorrenciais.

Um outro aspecto peculiar nosso está na indexação do mercado financeiro. Grande parte da dívida do governo é pós-fixada pela Selic, a taxa definida pelo Comitê de Política Monetária, redefinida a cada 45 dias, com grande repercussão midiática. Gomo grande parte dos títulos das dívidas oferece liquidez imediata e correção automática pela taxa de juros, há uma certa torcida pela subida da inflação.

Obviamente trata-se de um processo que, longe de ser neutro, provoca transferências bilionárias de renda. Daí a resistência e mitificação que envolve tudo o que se refere ao tema. Muitas vezes, intensificar as expectativas de inflação futura representa um verdadeiro prêmio, na forma de elevação dos juros, favorecendo os portadores de títulos da dívida pública pós-fixada.


É preciso desarmar o consenso pró-inflação. O enfrentamento do problema implica ações conjugadas que vão além dos juros e da ampliação da capacidade de oferta da economia. O problema hoje não reside tanto no setor industrial, que ainda opera com um nível de ociosidade média da ordem de 15%. Mas no macrossetor serviços o quadro é diferente. É preciso ampliar a competitividade, incentivando a formação de novos prestadores, e gerar maior concorrência, diminuindo o poder de elevação dos preços.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

A Economia do Papa Francisco: "o dinheiro deve servir e não governar".


Senhores Embaixadores, 

Com alegria acolho-os por ocasião da apresentação das Cartas, que os credenciam como Embaixadores extraordinários e plenipotenciários de seus respectivos Países junto à Santa Sé: Kyrgystão, Antígua e Barbuda, Grão Ducado de Luxemburgo e Botswana.

As cordiais palavras que me dirigiram, as quais agradeço com vivo apreço, testemunham que os Chefes de Estado de seus Países desejam desenvolver as relações de estima e de colaboração com a Santa Sé. Ficaria agradecido se os senhores lhes transmitissem os meus sentimentos de gratidão e de respeito, acompanhados das minhas orações pelas suas pessoas e seus compatriotas.

Senhores Embaixadores, a humanidade vive neste momento como um retorno à própria história, considerando os progressos registrados nos vários âmbitos. Devemos louvar os resultados positivos, que concorrem para um autêntico bem-estar da humanidade, como por exemplo, no campo da saúde, da educação e da comunicação.

No entanto, devemos reconhecer também que a maior parte dos homens e das mulheres do nosso tempo continuam a viver numa precariedade quotidiana com consequências funestas. Aumentam algumas patologias, com suas consequências psicológicas; o medo e o desespero arrebatam os corações de numerosas pessoas, mesmo nos Países considerados ricos; a alegria de viver começa a diminuir; a indecência e a violência estão em aumento; a pobreza se torna mais evidente. Deve-se lutar para viver e, muitas vezes, viver com pouca dignidade.

Uma das causas desta situação, na minha opinião, consiste na relação que temos com o dinheiro, ao aceitar o seu domínio sobre nós e sobre nossas sociedades. Assim, a crise financeira, pela qual estamos atravessando, faz-nos esquecer da sua origem primordial, arraigada numa profunda crise antropológica: a negação da primazia do homem! Criamos novos ídolos. A adoração do antigo bezerro de ouro (Cf. Ex 32,15-34) defronta-se com uma nova e impiedosa imagem do feiticismo do dinheiro e da ditadura da economia sem fisionomia e nem objetivo realmente humano.

A crise mundial, que envolve as finanças e a economia, parece colocar em luz as suas deformações e, sobretudo, a grave falta da sua perspectiva antropológica, que reduz o homem a uma única exigência: o consumismo. E, ainda pior, o ser humano, hoje, é considerado como um bem de consumo, que se pode usar e, depois, jogar fora. Este desvio se verifica, em nível individual e social, e é favorecido! Em tal contexto, a solidariedade, tesouro dos pobres, é, muitas vezes, considerada contraproducente, contrária à racionalidade financeira e econômica.

Enquanto a renda de uma minoria aumenta, de maneira exponencial, aquela da maioria enfraquece. Este desequilíbrio deriva de ideologias, que promovem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira, negando assim o direito de controle por parte dos Estados, que também devem prover o bem comum. Instaura-se, assim, uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que impõe, unilateralmente e sem recurso possível, suas leis e suas regras. O endividamento e o crédito, outrossim, distanciam os Países e a sua economia real e os cidadãos do seu poder de aquisição real. Além do mais, pode-se acrescentar a tudo isso uma corrupção tentadora e uma evasão fiscal egoísta, que assumiram dimensões mundiais. O desejo de poder e de posse tornou-se ilimitado.

Atrás desta atitude oculta-se a rejeição da ética, a rejeição de Deus. Como a solidariedade, também a ética incomoda; ela é considerada contraproducente; como muito humana, porque relativiza o dinheiro e o poder; como uma ameaça, porque rejeita a manipulação e a submissão da pessoa.

A ética conduz a Deus, que se aliena das categorias do mercado. Deus é considerado, pelos financeiros, economistas e políticos, como incontrolável ou até perigoso, porque induz o homem à sua plena realização e à independência de qualquer tipo de escravidão. A ética – uma ética naturalmente não ideológica – permite, na minha opinião, criar um equilíbrio e uma ordem social mais humanos.

Neste sentido, encorajo os peritos financeiros e os governantes dos seus Países a refletirem sobre as palavras de São João Crisóstomo: «Não compartilhar com os pobres os próprios bens é roubar deles e tirar-lhes a vida. Os bens que possuímos não são nossos, mas deles» (Homilia sobre Lázaro, 1, 6 : PG 48, 992D).

Prezados Embaixadores, seria de bom augúrio fazer uma reforma financeira, que seja ética e que comporte, por sua vez, uma reforma econômica salutar para todos. No entanto, ela requereria uma corajosa mudança de atitude dos dirigentes políticos. Exorto-lhes, pois, a enfrentar este desafio com determinação e perspicácia, levando em conta, naturalmente, a peculiaridade dos seus contextos. O dinheiro deve servir e não governar!

O Papa ama todos, ricos e pobres; mas o Papa tem o dever, em nome de Cristo, de recordar ao rico que deve ajudar o pobre, respeitá-lo, promovê-lo. O papa exorta à solidariedade desinteressada e a um retorno da ética para o bem do homem, na sua realidade financeira e econômica.

A Igreja, por sua vez, trabalha sempre para o desenvolvimento integral de cada pessoa. Neste sentido, ela recorda que o bem comum não deveria ser um simples acréscimo, um simples esquema conceitual de qualidade inferior, inserido nos programas políticos.

A Igreja encoraja os governantes a estarem, realmente, a serviço do bem comum das suas populações. Ela exorta os dirigentes das realidades financeiras a levarem em consideração a ética e a solidariedade. E por que não se dirigirem a Deus para inspirar seus desígnios? Assim, poder-se-ia criar uma nova mentalidade política e econômica, a fim de contribuir para transformar a dicotomia absoluta entre a esfera econômica e a social em uma sã convivência.
Enfim, saúdo com afeto, através dos senhores, os Pastores e os fiéis das comunidades católicas presentes em seus Países. Exorto-os a continuar o seu corajoso e alegre testemunho de fé e de amor fraterno ensinados por Cristo.

Não tenham medo de oferecer a sua contribuição para o desenvolvimento dos seus Países, mediante iniciativas e atitudes inspirados nas Sagradas Escrituras! E, no momento em que inauguram a sua missão, faço-lhes, Senhores Embaixadores, as minhas melhores felicitações, assegurando a colaboração da Cúria Romana para o cumprimento da sua função.

Enfim, invoco, com prazer, sobre os senhores e seus familiares, como também sobre seus colaboradores, a abundância das Bênçãos divinas.

Palácio Apostólico do Vaticano em 16 de maio de 2013.

The Economist.


domingo, 12 de maio de 2013

Ignácio Rangel.


Ignácio Rangel foi um grande economista brasileiro, porém desconhecido e pouco estudado em nossas aulas de Economia. MARCELO MITERHOF, economista do BNDES, escreveu este artigo na FOLHA, o qual compartilho para conhecimento dos meus, ainda espero, dois fiéis leitores. 

Antecipo as homenagens pelo centenário de Ignácio Rangel, que será em fevereiro de 2014. Faço isso porque nas últimas semanas distintos temas tratados neste espaço fazem lembrar dele, em especial sua capacidade de aliar uma criatividade aguda para elaborar conceitos com um senso de realidade raro entre economistas.

Uso textos como "O papel da inflação", publicado na Folha de 30/07/1990, indicação do economista Thiago Mitidieri, com quem discuti sobre Rangel.

Nos anos 30, Rangel entendia que a industrialização precisaria vir junto com a reforma agrária. Mais tarde, reconheceu que no Brasil a industrialização, se não fosse um projeto de lideranças dos proprietários rurais, teria sido natimorta.

No entanto, isso não ocorreria sem graves problemas. A mecanização do campo sob uma estrutura fundiária concentrada jogaria muitas pessoas nas cidades, sem que houvesse ocupação suficiente na indústria e nos serviços para absorvê-las, o que favoreceu a repressão salarial, travando o adensamento do mercado interno, o motor da industrialização brasileira.

Avançar na industrialização -- dos bens leves para os de consumo duráveis e daí para a indústria pesada -- era o jeito de continuar criando perspectivas. Porém os avanços ocorriam por saltos na estrutura produtiva em ciclos mais ou menos decenais, prósperos na primeira metade e recessivos na outra.

Não era tarefa fácil. Havia capacidade ociosa, por conta das grandes economias técnicas de escalas, e também estrangulamentos produtivos, fruto de desequilíbrios próprios de uma mudança estrutural e de restrições de divisas externas.

A inflação tinha até os anos 60 um comportamento inesperado, se intensificando na recessão. Os baixos ganhos salariais faziam a demanda agregada no Brasil ser estruturalmente deprimida, pois dependente do investimento.

Para Rangel, a inflação tinha outra fonte de aceleração: uma estrutura de mercado cartelizada, que elevava seus lucros espremendo tanto os consumidores finais quanto os produtores, em especial nos bens agrícolas. Como a procura de alimentos é pouco elástica, o aumento de seus preços fazia cair o consumo de outros bens pelos assalariados, aprofundando a recessão.

Mas a inflação era útil. Ao penalizar a liquidez, incentivava imobilizações - tanto pela antecipação da compra de bens duráveis pelos mais ricos quanto em investimentos incrementais -- quando um ciclo de mudança estrutural dava sinais de excesso de capacidade.

Essa imobilização especulativa mitigava a recessão e permitia alinhar as condições institucionais e o planejamento dos investimentos que fariam parte da nova fase de expansão industrial.

Rangel não vituperava contra a inflação, mas tampouco aderiu a ela, sabendo que seu papel foi circunstancial. A retomada do desenvolvimento viria pela realização de aperfeiçoamentos institucionais que o novo status de nação industrial exigia. Para isso, o capital financeiro precisava se integrar ao industrial, o que permitiria melhor coordenar os investimentos, algo que o país ainda está longe de ter.

Também estava claro que a capacidade de expandir a infraestrutura por meio de empresas públicas tinha se esgotado. Rangel tinha apontado nos anos 60 que esse modelo era útil, mas esbarraria na limitação de endividamento da União, o que ficou patente no início dos anos 80. Então, era preciso regenerar os sistemas de garantias, o que envolvia mudar o direito das concessões e realizar privatizações.

Hoje, a infraestrutura no Brasil se expande por meio do "project finance", em que sociedades de propósitos específicos, com controle privado, financiam os projetos com base na receita esperada. Nisso, a ideia de Rangel vingou.

Rangel não se furtava a mudar de posição, mas sem trocar uma crença idealizada no desenvolvimentismo e na cooperação por outra igualmente idealizada no liberalismo e na competição. Ele se manteve de esquerda e heterodoxo.

Isso não o impediu de transigir em questões concretas, defendendo que a industrialização, para se viabilizar, precisou da elite agrária e que a inflação não era um mal absoluto. Quando o projeto industrial mostrou sinais de esgotamento, defendeu as privatizações, antes de elas virarem uma efetiva bandeira liberal.

É possível discordar de Rangel em vários pontos, mas, houvesse mais economistas como ele, a economia avançaria bem mais, tanto como teoria quanto na política.

A lei da demanda.


SAMUEL PESSÔA , doutor em economia e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, escreveu neste domingo na FOLHA sobre a lei da demanda sobre escolhas morais.

Em geral, a elevação do preço de um bem reduz a quantidade consumida desse bem. Esse princípio geral é conhecido por lei da demanda.

É possível que haja exceções. A mais famosa é a demanda de alimentos baratos de elevado valor calórico e baixo conteúdo proteico.

Pode ser o caso de arroz na China de hoje; batatas na Irlanda ou pão na Inglaterra, ambos no século 19; farinha de mandioca no sertão nordestino na segunda metade do século passado etc.

Nesses casos, a maior parcela do orçamento familiar é comprometida com o consumo do alimento barato com elevado conteúdo energético e baixo conteúdo proteico.

Devido às necessidades calóricas mínimas diárias, a elevação do preço do alimento rico em calorias reduz muito a renda disponível para aquisição de alimentos de maior qualidade. A demanda pelo alimento mais barato (apesar de este ter ficado mais caro) sobe, dado que a família não tem renda suficiente para adquirir proteína.

Os bens que não obedecem à lei de demanda são chamados de bens de Giffen. O debate brasileiro em torno de escolhas morais sobre diversos assuntos aparentemente está povoado de bens de Giffen.

É comum lermos que a redução da maioridade penal elevará a criminalidade entre jovens, que a descriminalização do aborto reduzirá o número de abortos, que a liberalização das drogas reduzirá o consumo de drogas e que a criminalização da prostituição elevará a prática do comércio sexual.

Em todos esses casos, o preço de um bem subiu (ou desceu) e o consumo, segundo alguns analistas, elevou-se (ou reduziu-se).

Tenho dificuldade de imaginar que a elevação do custo ao menor que cometer crimes eleve a quantidade de crimes praticados pelo menor infrator ou que a elevação do custo do comércio sexual aumente seu consumo.

É igualmente difícil racionalizar que a redução do custo de cometer aborto ou de consumir droga reduza o número de abortos ou o uso de drogas.

Nada impede que as alterações legais elencadas tenham outras consequências e que estas possam ser empregadas como argumentos contrários ou favoráveis à alteração legal.

É possível que a descriminalização do aborto reduza o número de mulheres mortas em função de procedimentos médicos inadequados.

Também é possível que a legalização do consumo e do comércio de drogas reduza a violência e o número de homicídios ou que a criminalização da prostituição aumente a criminalidade.

Finalmente, é perfeitamente possível e justo defender posições favoráveis ou contrárias a esta ou aquela instituição, independentemente de suas consequências.

É possível ser favorável à legalização do comércio e consumo de drogas em função do princípio de liberdade de escolha individual.

Analogamente, é possível ser favorável à redução da maioridade penal em função do princípio da responsabilização individual.

Novamente independentemente do impacto da redução da maioridade penal sobre a criminalidade.

O mesmo princípio de liberdade de escolha individual aplica-se à manutenção da prostituição como atividade lícita.

O que não parece muito útil nem produtivo é enxergarmos bem de Giffen em toda parte. Confunde e dificulta o avanço do debate.

Os bens de Giffen são mais raros do que imaginamos. Até hoje os economistas têm dúvidas se a batata na grande fome na Irlanda no século 19 poderia ser de fato considerada bem de Giffen!

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Economia brasileira não volta a ter expansão de 7%. Alguma dúvida?


Leio na FOLHA entrevista com o economista Dani Rodrik, professor de política econômica internacional da Universidade Harvard e um dos maiores especialistas em economia do desenvolvimento.

Segundo Rodrik, o ambiente global benéfico -- alto crescimento da China, elevados preços das commodities, países avançados em expansão -- não vai se repetir. "É realista esperar uma taxa de crescimento de 3% a 4% no Brasil", disse à Folha Rodrik, que participou de seminário da revista "Carta Capital".

Folha - O Brasil cresceu 0,9% em 2012 e há uma percepção de que o modelo de crescimento baseado em consumo se esgotou. O que o sr. acha?
Dani Rodrik - Dois anos atrás, todo mundo dizia que o Brasil estava vivendo um novo milagre econômico. Eu achava que era um enorme exagero. Agora, as pessoas estão tirando conclusões apressadas em cima de apenas um ano de crescimento.
O Brasil não vai mais crescer 7%, como no milagre econômico antes da crise da dívida ou mesmo em 2010 [7,5%]. É realista esperar uma taxa de crescimento de 3% a 4%. Se o contexto global ajudar, 5% será uma taxa razoável.

O sr diz que, a partir de agora, alto crescimento no mundo será exceção. Como se situa o Brasil nesse cenário? As condições que permitiram crescimento de 7% a 8% não vão se repetir. Antes, tínhamos os estágios iniciais da industrialização --ao tirar mão de obra da zona rural ou do setor informal e levar para as indústrias, tínhamos ganhos de 400% na produtividade. Agora, não teremos grandes ganhos sem mais investimentos em educação e tecnologia. Com as mudanças tecnológicas, a indústria é muito mais intensiva em capital e não absorve tanta mão de obra. E o Brasil, na realidade, já atingiu o pico de industrialização e está agora se desindustrializando. Mas isso é verdade para a maioria dos países. É inevitável. A discussão agora é a velocidade da desindustrialização, se está mais rápida do que deveria. A indústria não mais será o motor do crescimento. Serviços e outras áreas irão gerar ganhos de produtividade.

O sr. ficou decepcionado com a decisão dos Brics [Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul] de criar um banco de desenvolvimento... Essa é uma noção dos anos 50, de que é preciso ter financiamento de infraestrutura. Frequentemente, o que emperra o desenvolvimento não é a falta de financiamento, mas sim instituições frágeis, excesso de regulação, falta de política industrial e moedas sobrevalorizadas. Financiamento é apenas um dos fatores. Não me parece o foco apropriado para os Brics. Faltam ideias novas de como consertar a globalização e criar uma nova relação entre emergentes e ricos.

O sr. diz que os Brics precisam parar de se comportar como "suplicantes". Qual é a mensagem que o Brasil deveria passar nos foros mundiais? Gostaria de ver o Brasil abordar o sistema internacional não como um país em desenvolvimento dizendo que é pobre e precisa de ajuda. Em vez disso, o Brasil precisa se posicionar como formador de políticas, que também tem grandes responsabilidades. Em áreas como mudança climática, por exemplo, não haverá redução de emissões se os emergentes não assumirem responsabilidade.

O que o sr. espera de Roberto Azevêdo à frente da Organização Mundial do Comércio? A agenda da OMC precisa mudar. A Rodada Doha morreu e as pessoas deveriam simplesmente declarar isso. O real desafio para a OMC é estabelecer uma nova narrativa, que não se restrinja a: "você reduz suas tarifas e em troca nós abrimos nossos mercados". No momento, o maior problema não é a falta de abertura comercial.
E o Brasil precisa mudar sua atitude. O Brasil ocasionalmente precisa proteger sua indústria, mas tem de entender que os países ricos passam por uma situação muito difícil e também precisam proteger a sua indústria. O Brasil, apesar de todas as elevações de tarifas recentes, não pode ser chamado de economia fechada. Aliás, acho que a atual estrutura de tarifas no Brasil é até positiva.

Por quê? Porque, na margem, está dando uma proteção temporária para algumas indústrias que estão sendo dizimadas pela valorização da moeda. Vivemos no mundo possível, não no mundo doutrinário.

Qual é a importância de ter um brasileiro liderando a OMC? O Brasil pode levar para a OMC uma abordagem pragmática, não doutrinária, que é uma evolução da proposta radical de livre mercado --é assim a política econômica do Brasil atualmente. Então ter um brasileiro no comando da OMC é muito positivo.

O sr. classifica os países de mercantilistas ou liberais. Em que faixa se situa o Brasil?
O Brasil é uma boa mistura -- usa regras liberais em seu sistema financeiro, políticas monetária e cambial, mas é mais mercantilista no que se refere às políticas industriais, proteção por tarifas, regras de conteúdo local e uso do BNDES. Talvez precise de menos liberalismo no fronte macroeconômico e mais no fronte comercial.

Como rasgar dinheiro, no caso, o seu.


Mais um caso para a série “Como rasgar dinheiro”:

Em 2012, lá no meu Ceará, foi inaugurado um aeroporto na cidade de Aracati a um custo de R$ 23.000.000,00. A pista do aeroporto é maior do que a de Congonhas, um "pequeno" aeroporto que atende à cidade de São Paulo.

É triste saber que até hoje não existe companhia aérea que atenda no aeroporto de Aracati, ficando o local aguardando voos que chegarão de Marte. 


Gestão de dinheiro público é coisa séria. Pense nisso agora e em 2014.   

Fonte: Revista EXAME.

domingo, 5 de maio de 2013

BC acompanhar superavit é erro.


SAMUEL PESSÔA, doutor em economia e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, em sua coluna na FOLHA DE S. PAULO, escreve que o superavit primário não é o conceito correto para avaliar o impacto do setor público sobre a economia.

Peço desculpas ao leitor, mas o tema hoje é particularmente aborrecido. Trata-se, no entanto, de questão muito relevante para o adequado manejo da política monetária.

No dia 25 passado, o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central divulgou a ata da 174ª reunião, que ocorrera em 16 e 17. Nessa oportunidade, o Copom decidira (com dois votos contrários e seis favoráveis) que era o momento de iniciar um ciclo de elevação dos juros. A taxa Selic foi elevada em 0,25 ponto percentual, de 7,25% para 7,50%. Os interessados podem ler a ata no site do BC (http://www.bcb.gov.br/?COPOM174).

No 16º parágrafo, na seção "Avaliação prospectiva das tendências de inflação", o Copom apresenta para a sociedade o valor com o qual trabalha para o superavit primário consolidado do setor público.

Segue o texto: "Em relação à política fiscal, considera-se como hipótese de trabalho a geração de superavit primário de R$ 155,9 bilhões em 2013, conforme os parâmetros da LDO-2913 (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Para 2014, admite-se, como hipótese de trabalho, a geração de superavit primário de R$ 167,4 bilhões, conforme parâmetros constantes do PLDO-2014 (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias)".

Ou seja, o Copom considera em suas projeções que a meta cheia de superavit primário de 3,1% do PIB será observada.

O superavit primário é a diferença entre a receita pública total e os gastos do setor público exclusive juros. Se o primário for maior do que o pagamento de juros, a dívida pública encolhe em termos absolutos. Se for menor, a dívida cresce.

Nesse último caso, se o primário como proporção do PIB for maior que a diferença entre a taxa de juros média que o setor público remunera sua dívida e a taxa de crescimento do produto, a dívida como percentual do PIB reduz-se. A dívida pública ano após ano tornar-se-á um fardo mais leve de ser carregado.

Ou seja, o superavit primário é o conceito relevante para avaliarmos a evolução do endividamento do setor público. Em particular, a receita pública que resulta da venda pelo setor público de uma empresa ou de reservas petrolíferas aumenta o superavit primário.

O problema é que essa receita pública é diferente da receita de impostos. O imposto é uma dedução da renda de um indivíduo. Assim, quando o setor público coleta renda de um agente econômico por meio de um imposto, o setor público reduz a renda disponível para o gasto desse agente. Com isso, o setor público contribui para reduzir a demanda da economia.

Quando o setor público vende uma empresa, não há redução de renda de ninguém. Alguém tinha recursos monetários que foram transferidos ao setor público. Este, em troca, transferiu a propriedade da empresa. Essa operação não altera a renda do setor público nem a renda do setor privado.

Portanto, a receita de privatização não reduz a renda do setor privado disponível para gasto. Há diversas receitas que são contabilizadas no conceito de superavit primário, mas que não contribuem para reduzir a demanda agregada.

Dado que a preocupação do BC é com o controle da inflação, ele não deveria acompanhar o superavit primário. Do ponto de vista do controle inflacionário, o BC tem que saber qual é o balanço líquido entre as ações do setor público que reduzem a demanda, por exemplo elevação dos impostos, e as ações que elevam a demanda, por exemplo elevação do gasto público.

Além de o superavit primário não ser o conceito correto para avaliar o impacto do setor público sobre a demanda agregada na economia, há algumas possibilidades legais que tornam a distância do primário de um indicador de demanda do setor público ainda maior.

Por exemplo, decidiu-se há alguns anos que os investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) podem ser excluídos do cômputo do primário para efeitos de atendimento da meta estabelecida em lei. Os gastos com o PAC, apesar dos efeitos benéficos sobre a inflação no longo prazo, no curto prazo elevam a demanda agregada e, portanto, devem ser considerados.

É urgente que o BC construa um indicador do impacto do setor público sobre a demanda da economia, divulgue sua metodologia e seu cenário para o indicador e o utilize em suas projeções.

Inflação: tolerância zero hoje e boas notícias em 2014.



Em recente pronunciamento no Dia do Trabalho, a presidente Dilma Rousseff disse que "o Brasil seguirá na rota de crescimento com estabilidade, distribuição de renda e diminuição das desigualdades, lutando pela redução de impostos e pela diminuição dos custos para o produtor e o consumidor".

“É mais do que óbvio que um governo que age assim e uma presidenta que pensa desta maneira não vão descuidar nunca do controle da inflação. Esta é uma luta constante, imutável, permanente. Não abandonaremos jamais os pilares da nossa política econômica, que têm por base o crescimento sustentado e a estabilidade”, afirmou.

Esperamos que sim, presidente, pois como nos alerta o genial Sinfrônio no nosso cearense Diário do Nordeste, a inflação não dorme em serviço e com ela não podemos ter uma conversa amigável. Se tivermos hoje tolerância zero com a inflação, boas notícias teremos para 2014.  


sábado, 4 de maio de 2013

Como rasgar dinheiro no Brasil: o governo arrecada, gasta mal e quem perde é você.


Do Jornal Nacional de hoje leia a matéria abaixo e questione como o governo gasta o seu, o meu, o nosso dinheiro. Alguém acredita que se fosse uma iniciativa privada o investidor deixaria o dinheiro dele indo literalmente para o LIXO

Acorda Brasil. Neste caso são "apenas" R$ 20.000.000,00 "investidos", mas acredito que temos "outras" obras nessas condições. Por falar nisso, como está a transposição do Rio São Francisco?      

Um terminal de pesca pronto há três anos está vazio em Manaus porque as autoridades não se entendem sobre quem deve administrar os armazéns. Enquanto isso, o peixe que não é vendido na hora vai para o lixo.

Toneladas de peixe jogadas fora. Sem ter onde estocar a produção, pescadores de Manaus usam o porão dos barcos. Mas os peixes acabam estragando e vão parar no lixo. Tudo isso com um terminal pesqueiro novinho em folha.

O lugar foi construído com dinheiro público, está pronto há três anos, mas não funciona. "Foi um investimento iniciado em 2005 e até hoje não foi inaugurado o terminal pesqueiro", diz Walzenir Falcão, presidente da Federação dos Pescadores do Amazonas

Faz tanto tempo que a obra acabou que os tanques estão cheios de teia de aranha. O galpão que deveria receber o pescado está completamente vazio. As câmaras frigoríficas estão prontinhas, mas, desde 2010, ninguém decide quem vai equipar e administrar o terminal.

A balsa de atracação e o galpão para estocagem do pescado foram construídos a partir de acordos entre a prefeitura de Manaus, Ministério da Pesca e Ministério dos Transportes. Já foram gastos R$ 20 milhões.

O Ministério dos Transportes diz que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), que fez a obra, vai repassar o terminal para o Ministério da Pesca. O Ministério da Pesca diz que não é o responsável e que vai apenas equipar o terminal. A prefeitura diz que, por questões burocráticas, ainda não pode assumir a administração.

"Infelizmente não foi repassado pra prefeitura. Estamos aguardando este processo que está em tramitação. E nós da prefeitura temos o maior interesse de administrar", aponta Jefferson Praia, secretário de Abastecimento de Manaus.

Enquanto não sai uma solução, pescadores decidiram invadir o terminal. Eles atracam os barcos mesmo antes da liberação.

terça-feira, 30 de abril de 2013

Situação fiscal e cambial no Brasil.


Delfim Netto, na FOLHA, comenta a atual situação fiscal e cambial brasileira.

A situação fiscal da economia brasileira e o seu equilíbrio externo apresentam alguns sinais nebulosos. Nada que possa ser considerado ameaçador no curto prazo, mas cuja evolução exige cuidado. O último "Fiscal Monitor do FMI" ("Fiscal Adjustment in a Uncertain World", April 2013) compara a situação fiscal dos países do mundo entre 2008 (o ano em que se iniciou a crise que teima em não terminar) e 2012.

A situação do Brasil revela três fatos importantes: 1º) a crise não produziu um aumento substancial da relação dívida pública bruta/PIB; 2º) esta estabilizou-se em nível desconfortável quando comparada com a dos outros países emergentes; e 3º) a relação dívida pública líquida/PIB é muito mais alta do que a deles. 

Os efeitos do nível de endividamento e das exigências de seu financiamento devem exercer alguma pressão sobre a formação da taxa de juros real. Por outro lado, como a participação do financiamento externo é relativamente baixo, tudo se passa hoje como se o Brasil estivesse endividado em sua própria moeda, o que reduz o seu risco. O problema é que a nossa relação dívida pública bruta/PIB continua igual ao dobro da dos países emergentes. É a quarta mais elevada do mundo.

Um fato curioso é revelado pelos números da tabela: a queda da relação entre a dívida líquida e a dívida bruta. Vemos que em 2008 ela era menos discrepante da média dos países emergentes (69% contra 60%, ou seja, 15% de diferença). Em 2012 a distância aumentou (70% contra 51%, ou seja, 37% de diferença). Isso sugere que provavelmente estamos misturando um pouco menos do que deveríamos, de dívida "bruta" no cálculo da "líquida". É claro que a situação não é a mesma de 2008 (basta olhar para a acumulação de reservas), mas é inegável que sem adequado esclarecimento, criam-se dúvidas sobre a situação fiscal.

Para se ter uma ideia do que significa uma dívida pública bruta/PIB de 68,5%, basta lembrar que antes da crise (2008), essa era a relação na Alemanha, 66,8% (hoje é de 90,3%), e na França, de 68,2% (hoje é de 92,9%). De qualquer forma não acreditamos que a correção eleve a relação dívida líquida/PIB em muito mais do que 3% ou 4%. A questão é que ela já é muito elevada quando comparada com a média dos outros países emergentes (35,2% contra 24,7%).

Uma boa solução para melhorar a credibilidade dos números fiscais, que sentiram os efeitos das inúteis manobras contábeis, seria aprovar o projeto de lei que cria o Conselho de Gestão Fiscal. Estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal, dorme esquecido no Congresso há pelo menos uma década.

O segundo assunto que ocupou o tempo dos analistas na última semana foram os resultados do balanço de transações correntes do primeiro trimestre, que atingiu 4,31% do PIB, contra 2,41% no seu homólogo de 2012. A balança comercial revelou redução de US$ 7,6 bilhões e depende de esclarecimento sobre os registros das importações da Petrobras.

As previsões do BC para o ano são menos sombrias: superávit comercial de US$ 15 bilhões, com as exportações crescendo 8,6%, e as importações, 11,6%. A estimativa para o déficit em transações correntes é da ordem de US$ 67 bilhões, quase igual ao montante dos investimentos diretos esperados para 2013, algo como US$ 65 bilhões. Entretanto, com as incertezas que cercam a economia, é natural que esses números sejam vistos com certa desconfiança.

Tal resultado não deveria ser surpresa, porque o comportamento da taxa de câmbio nominal e o salário nominal, ambos produto das próprias políticas social e econômica (ver gráfico), produziu fantástica valorização do câmbio real (a relação entre o câmbio nominal o salário real). Ela explica boa parte do persistente aumento do déficit em transações correntes. Um significativo montante desse déficit financia o consumo e não o investimento, o que tem sérias implicações para o longo prazo.

As alterações do câmbio real levam, em média, dois anos para influir no déficit em transações correntes. É o tempo que nos resta - em condições normais de pressão e temperatura - para reduzi-lo a partir de 2015.

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...