domingo, 25 de setembro de 2011

Como prevenir uma recessão.


NOURIEL ROUBINI é presidente da Roubini Global Economics, professor da Escola Stern de Administração de Empresas (Universidade de Nova York) e coautor do livro "Crisis Economics".  Este artigo foi distribuído pelo Project Syndicate e publicado na FOLHA DE S. PAULO.

Os mais recentes dados econômicos sugerem que a recessão está voltando nas economias mais avançadas, com os mercados financeiros atingindo agora níveis de desgaste semelhantes aos registrados quando do colapso de 2008. Os riscos de uma crise econômica e financeira ainda pior que a anterior -e agora envolvendo países insolventes- são significativos. 
Assim, o que se poderia fazer para minimizar as consequências adversas de nova contração econômica e prevenir uma depressão mais profunda e um colapso financeiro? 
Primeiro, devemos aceitar que medidas de austeridade, necessárias para evitar um desastre fiscal, acarretam efeitos recessivos sobre a produção. Assim, se os países na periferia da zona do euro se virem forçados a adotar medidas de austeridade fiscal, outras nações capazes de prover estímulo em curto prazo deveriam fazê-lo, adiando seus esforços de austeridade. 
Segundo, embora a política monetária tenha impacto limitado quando os problemas são dívida excessiva e insolvência, em vez de falta de liquidez, um relaxamento mais amplo das condições de crédito, em lugar de um simples relaxamento quantitativo, pode se provar útil. 
Terceiro, para restaurar o crescimento do crédito, os bancos da zona do euro e os sistemas bancários subcapitalizados deveriam ser reforçados via financiamento público em um programa que abarcaria toda a União Europeia. Para evitar nova compressão de crédito à medida que os bancos reduzam seu nível de endividamento, os requerimentos de capital e liquidez que os bancos precisam cumprir poderiam ser relaxados por um breve período. 
Quarto, é necessário prover liquidez em larga escala para os governos solventes, a fim de evitar uma disparada nos "spreads" e a perda de acesso a mercados que podem transformar a falta de liquidez em insolvência. Mesmo com mudanças de política econômica, governos precisam de tempo para restaurar sua credibilidade. Até que isso aconteça, os mercados manterão pressão sobre os "spreads" das dívidas nacionais, o que torna provável que o temor de uma crise ajude a criá-la. 
Quinto, dívidas acumuladas que não possam ser reduzidas via crescimento, poupança ou inflação devem ser tornadas sustentáveis por meio de reestruturações ordenadas, redução de dívidas e conversão de dívida em capital. 
Sexto, mesmo que a Grécia e outros países periféricos da zona do euro obtenham perdão de porção significativa de suas dívidas, o crescimento econômico não será restaurado até que a competitividade seja restaurada. E sem um retorno rápido ao crescimento, novos calotes, e novas inquietações sociais, não poderão ser evitados. 
Sétimo, o motivo para o alto desemprego e o crescimento anêmico das economias avançadas é estrutural e inclui competição mais acirrada vinda de mercados emergentes. A resposta correta a mudanças de tamanha abrangência não está no protecionismo. 
Oitavo, as economias de mercado emergente dispõem de mais ferramentas de política monetária que as economias avançadas, no momento, e deveriam relaxar sua política fiscal e monetária. O FMI e o Banco Mundial podem servir como recurso final de empréstimos aos mercados emergentes que corram risco de perda de acesso aos mercados financeiros, desde que aceitem reformas estruturais. 
Os riscos que nos aguardam não são de uma amena recessão de duplo mergulho, mas sim de uma contração severa que poderia se transformar em nova Grande Depressão, especialmente se a crise na zona do euro escapar ao controle e resultar em colapso financeiro mundial. 
Políticas econômicas incorretas e teimosas geraram guerras comerciais e cambiais, na primeira Grande Depressão, acompanhadas por calotes desordenados, deflação, alta na disparidade de renda e riqueza, pobreza, desespero e instabilidades econômicas e sociais que terminaram por produzir regimes autoritários e a Segunda Guerra. 
A melhor maneira de evitar o risco de que essa sequência se repita é uma ação audaciosa e agressiva das autoridades econômicas mundiais -e já.

Barbara Heliodora - A nossa Lady.


Neste último domingo de setembro, este blog divulga aos seus quase dois (milhões de) e-leitores a entrevista que a FOLHA fez com Barbara Heliodoradecana da crítica teatral, que aos 88 anos, encontra-se em plena forma. Viva Lady Heliodora!!!

RESUMO
Militante na imprensa carioca desde 1957, Barbara Heliodora repassa nesta entrevista a história do teatro brasileiro e aspectos de sua carreira; critica o falso experimentalismo nos palcos brasileiros; faz uma defesa do olhar conservador e denuncia os malefícios do mau teatro para a formação do público.
BARBARA HELIODORA não é apenas a decana da crítica de teatro brasileira, mas também o símbolo de um rigor que cultivou antipatias no meio teatral carioca.
As palavras duras que dirige às produções que não lhe agradam ("leitura óbvia", "texto confuso e gratuito", "direção agitada" "montagem desastrada") sobressaem em relação aos elogios que volta e meia distribui sem economia.
Ficou carimbada com uma crítica severa e durona. Atuante em jornais e revistas desde 1957, com um intervalo entre 1964 e 1985, escreve cerca de 80 críticas por ano. Especialista em Shakespeare e Nelson Rodrigues, ela recebeu a Folha em sua casa, no bairro carioca do Cosme Velho, um dia depois de fazer 88 anos.
 

Folha - Como a sra. avalia o teatro brasileiro de hoje?
Barbara Heliodora -
 Há vários aspectos diferentes. Uma coisa positiva é que estão sendo levados [ao palco] muito mais textos brasileiros, mas é claro que, como é algo recente, ainda há muita coisa ruim. Mas acho que tem que ser, tem que continuar a insistir.
Você pega dois países colonizados, os EUA e o Brasil. Os EUA também tiveram degredados. Tudo o que a gente teve aqui, eles tiveram lá também, mas eles foram colonizados pelos ingleses, que têm uma riqueza teatral imensa. Então, desde a colônia eles recebem uma influência teatral muito forte.
Portugal não tinha tradição teatral para nos legar. Além disso, o tipo de colonização, com as grandes propriedades, as capitanias hereditárias, aquele negócio todo. Não houve uma formação de núcleos urbanos a não ser praticamente no final do século 19. Você não faz teatro se não tem plateia.
A primeira arte cênica que teve plateia no Brasil foi o cinema, que era acessível por ser duplicável. O cinema nos EUA buscou o público que vinha do teatro; conosco, não, o teatro teve de ir catar público no cinema. Não houve essa transição, o que dificultou muito o processo. O pouco teatro que Portugal nos trouxe era francês, traduzido.
Então, você tem na Independência, logo depois, o [dramaturgo e diplomata] Martins Pena [1815-48], que é maravilhoso. E aí volta um período de silêncio. Mais tarde, por volta de 1850 ou 60, há algum teatro. No fim do século, na República, aí sim há um período de intensa atividade cênica, com "As Borboletas", do Arthur Azevedo, entre outros. Depois disso houve surtos de teatro brasileiro, mas sem continuidade.

Que dificuldades isso trouxe?
Isso dificultou a linguagem. O problema dos autores brasileiros era que, até poucas décadas atrás, você aprendia que até podia falar errado, quer dizer, da forma como se fala no Brasil, mas que tinha de escrever da forma correta, como se fala português em Portugal. Hoje em dia não é mais assim, mas isso só desde o Nelson [Rodrigues].
O Nelson foi quem quebrou isso, porque ele é um bom repórter. Vários autores pré-Nelson, na hora em que se sentavam, escreviam o português correto. Esqueciam que o que estavam escrevendo para ser uma linguagem falada. E, quando o ator dizia aquilo no palco, soava falso, porque ninguém falava daquele jeito. Isso prejudicou muito a dramaturgia brasileira. Você não reconhecia o brasileiro em cena. A partir do Nelson, você começa a reconhecer o brasileiro em cena.

E quem fez isso depois do Nelson?
Depois tem, por exemplo, o Silveira Sampaio, que fez pela zona sul [do Rio] o que o Nelson fez pela zona norte. Só que é um autor que ninguém mais monta, a família dele causou muita dificuldade para as montagens. Mas ele fez comédias maravilhosas. A "Trilogia do Herói Grotesco" é sensacional.
Ele tinha um talento fantástico, é pena que seja pouco conhecido. Um pouco depois veio o Millôr, que também domina a cena muito bem, de maneira que houve todo um movimento, mas eu acho que é porque o Brasil estava mudando.
No momento tem muito autor brasileiro que é bom, mas nem tudo pode ser bom, a verdade é essa. Mas tem que insistir para que apareçam autores de fôlego.
Quem a sra. destaca entre os nomes novos da dramaturgia?
Ah, não sei, não quero dizer assim, porque não conheço o bastante. Por exemplo, vejo no jornal de São Paulo autores de quem nunca ouvi falar, porque estão em São Paulo. Aqui tem o [Jô] Bilac, que é bom, tem vários, mas algumas coisas são muito interessantes e outras são mais fracas.

E o que a sra. acha do teatro experimental, de vanguarda?
Às vezes, as pessoas se iludem um pouco, e o que fazem não chega a ser uma experiência válida. Falta um domínio do teatro tradicional. As pessoas experimentam sem conhecer o que veio antes, então fica um pouco falso, apenas ilusoriamente experimental.
Há uma preocupação em ser original que fica superficial. Mas é preciso fazer. Eu sempre digo que o necessário são os conservadores, porque a mudança é fatal. Essa está sempre em dia. Então, para controlar um pouquinho, é preciso que alguém diga, "peraí", "aguenta aí". Mas vai passando o tempo e tudo vai mudando, e a mudança é desejável e inevitável.

A sra. se vê como conservadora?
Eu me vejo mais como neutra. Porque gosto das duas coisas. E acho que é uma ilusão considerar o teatro superado. Aqui é que tem isso, mas nos outros países a gente vê de tudo, tem que fazer uma coisa e outra. Porque o próprio público só vai realmente apreciar uma experiência se souber o que é teatro. Ele tem que já ter visto, para poder comparar uma coisa e outra e pensar: "Ah, mas isso aqui é novo"... Senão não tem referência.

A sra. acha que leva mais gente para o teatro ou faz um alerta sobre aquilo que não vale a pena?
Alguns produtores, diretores etc. já me disseram que a crítica negativa não tira ninguém do teatro. Mas a crítica positiva leva gente. Dizer que a crítica acaba com o espetáculo não é verdade.

A TV tem sido um centro de produção de dramaturgia, tem levado público ao teatro?
Não, acho que não. A televisão não só atrai um público que era do teatro. Há um grande problema para ir ao teatro ou a qualquer lugar. Casal jovem com filho pequeno não tem com quem deixar [o filho], então a televisão é uma distração para quem não tem condições de ir a lugar nenhum. É uma coisa difícil. Antigamente as famílias moravam juntas, sempre tinha uma tia em casa. Mas, hoje, como é muito unitário, não pode sair de casa porque não tem com quem deixar o filhinho pequeno.

A senhora não acredita numa dramaturgia vinda da televisão?
Não. São veículos completamente diferentes. A dramaturgia de telenovela é uma coisa, escrever para o teatro é outra coisa, e cinema é outra coisa. São caminhos diferentes. Agora, os melhores atores de televisão fizeram teatro. A televisão deveria ajudar o teatro porque o ator bem formado no teatro vai ser bom na televisão também.
Uma coisa angustiante é que os cursos de teatro estão atulhados de candidatos que só pensam na TV. Não pensam em fazer carreira no teatro, estão todos pensando em fazer carreira na Globo.

A sra. falou da família de Silveira Sampaio. O diretor Marco Antonio Braz se queixou da família de Nelson Rodrigues, que seria o autor mais caro do mundo.
Ele fala é que eles querem 10%, que é o que todo autor pede, 10% no mundo inteiro.

Ele diz é que a família pede 10% do patrocínio.
Ai, eu não li, porque vi o título [da reportagem] e essas brigas me cansam. Mas o que acho é que o problema do custo do espetáculo, com a legislação e o clima atual, não há mais sobrevivência com bilheteria. Está todo mundo dependendo de ser financiado, só que com esses financiamentos dá para montar e ficar dois meses. Qual espetáculo se paga em dois meses? E o que que nós estamos vendo? Uma enxurrada de monólogos que é uma coisa horrorosa.

O mau teatro afasta o público?
Essa frase não é minha. Gianni Ratto dizia isso. Eu me lembro claramente de uma vez ele me perguntar, eu tinha ido a uma peça e ele disse: "Como é que foi?". Eu digo: "Ah, foi muito fraca". Ele disse: "Isso prejudica todo o teatro". Isso é que é...
As pessoas da classe às vezes não têm noção disso. Uma pessoa que nunca foi ao teatro, o que acontece muito, vai pela primeira e vê uma coisa ruim, faz voto de castidade, nunca mais volta.
É o tal negócio: o mau cinema tem o mito de que custa barato, é quase tanto quanto o teatro hoje em dia, pelo menos a fotografia não está borrada, né, aquela coisa. Então, as pessoas vão ao cinema e voltam na semana seguinte, entram no meio, aquelas coisas.
Se é ruim, a pessoa não volta ao teatro durante muito tempo. Falta consciência. Prefiro um espetáculo que tentou muito, não conseguiu, mas a gente sente que foi sério. O pior são os autocomplacentes, que acham que tiram tudo de letra e fazem peças horríveis.

Como é a senhora se protege da complacência ao escrever?
Complacência é sempre condenável. A gente fala sobre o que viu.

Seu coração nunca amolece?
Não. Dói quando eu vejo um engano de gente que costuma até fazer bem. Procuro estabelecer que, quando vejo uma coisa que está errada, mas que a gente sente que foi bem trabalhada e que os atores estão atuando com responsabilidade, que houve uma direção... Pode ser que estivesse tudo errado, mas, como foi feito com seriedade, é outra coisa.
O que acho horrível é que quando a gente sente que está todo mundo ali, sabe, "eu sou maravilhoso" e tal, o que eu fizer está bom. Isso eu acho horrível.

A crítica pode preservar o trabalho de grandes atrizes, como a Sarah Bernhardt, por exemplo?
Mas quem é que sabe como ela era? Eu, por exemplo, acho que ela devia ser horrível.

Acha mesmo?
Acho. Ela devia ser mais personalidade do que atriz. Porque era a Sarah Bernhardt. Mas eu não sei, a única coisa que ouvi dela gravado é um horror. É um trecho do "Horace" [imita Sarah]. Eu tenho a impressão que ela devia ser uma personalidade muito marcante. Agora, não sei a qualidade dela como atriz. Ninguém sabe.
Ficar famoso é uma coisa, você saber como era é outra bem diferente. Cacilda [Becker] você não sabe como é que era, Cacilda era uma atriz deste tamanhinho, magrinha assim, e com uma vozinha assim [imita], e em "Quem tem Medo de Virginia Woolf" ela dizia que era gorda e todo mundo acreditava, ninguém reclamava que era dito que ela era gorda e na verdade não era. É a capacidade dela de persuasão.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

O dólar já não é mais o mesmo.


Prever o dólar para 31.12.2011 é fácil. Difícil é aguentar a ansiedade diária. O genial SINFRÔNIO, no Diário do Nordeste, avisa que a fera despertou... 

Ah, esse dólar....


Alberto Tamer, hoje no ESTADÃO, comenta, como não poderia deixar de ser, sobre o US$.

O dólar valorizado, mais de 14% este ano, está criando um dilema para o governo que tudo fez para chegar a esse resultado. Ele estimula a indústria, mas pressiona a inflação, em parte contida até agora por importações a preços menores em reais. E isso deve continuar ainda por algum tempo - já passa de R$1,80 e se fala em dólar próximo de R$ 1,90 - porque o Banco Central sinalizou novas reduções do juro para evitar uma retração ainda maior do PIB. A nova previsão de crescimento do FMI para o Brasil é de 3,8%, o governo já admite 3,7% e já existem instituições no mercado que falam em 3,5%.
A equipe econômica parece não ter aceito o dilema "é possível evitar a recessão sem perder o controle da inflação". Mas a pergunta permanece: até onde a valorização do dólar favorece a indústria sem aumentar excessivamente os seus custos de produção? Isso não acabaria por anular os efeitos positivos que se pretendia via câmbio?
Toda a questão se resume em avaliar quanto tempo levará para que o dólar valorizado beneficie a indústria e até quando pressionará o aumento dos preços dos produtos importados.
Não aumenta já. Os economistas também estão divididos quanto aos efeitos imediatos do câmbio na inflação. Para Antonio Comune, coordenador da Fipe, instituto que tem maior experiência no acompanhamento semanal dos índices, a contaminação via câmbio não é generalizada nem imediata. Pode afetar mais rapidamente alguns itens de bens de consumo, como informática e eletrodomésticos, mas não toda a cadeia dos importados.
O que pressiona os preços nos próximos meses são os alimentos, que dependem mais da entressafra atual do que da cotação do dólar, afirma ele. Mas a maioria dos analistas discorda. A contaminação da alta dos preços das commodities agrícolas ou minerais era sentida no mercado interno antes da alta do dólar. Um fato evidente que o IBGE registrou nas suas pesquisas. Os preços internos desses produtos dependem mais do valor real, agora desvalorizado, do que das cotações internacionais. Mesmo que as cotações recuem no mercado internacional, os preços em reais continuarão aumentando por força da desvalorização da moeda nacional em face do dólar. É inevitável e não há sinais de mudança.
Isso demora? Parece que não, porque os produtores de commodities, da soja ao petróleo e o minério, optam por exportar a preços melhores do que atender a um mercado interno, que lhes rende menos. Não é apenas uma "contaminação", são vasos comunicantes com efeito imediato sobre os preços internos.
Além disso há o que se chama em economia de "reposição de estoques." Os importadores antecipam reajustes dos preços prevendo que pagarão mais nas compras futuras para recompor seus estoques. Se não fizerem isso, terão de dispor de mais recursos nas novas importações.
Sem aliado. A verdade é que o governo perdeu um poderoso aliado na estabilização dos preços. O impacto da desvalorização vai atingir diretamente os preços. Principalmente agora que, nos últimos anos, as indústrias usaram e abusaram do produto importado, seja na forma direta, trazendo o produto final e montando aqui, seja na forma indireta, importando a matéria-prima.
Tudo indica que poderemos terminar o ano com uma inflação acima de 6,5%.

Brazil will fight back against the currency manipulators


Dilma, a presidente do Brasil, hoje no FINANCIAL TIMES

We are living in turbulent days. The financial crisis of 2008 is not over, especially in advanced economies. With growth still weak, these countries have been adopting extremely expansionary monetary policies, rather than a more balanced mix of monetary and fiscal stimulus. Emerging economies are sustaining the pace of growth, but cannot assume the role of global powerhouses unaided.
Economies that issue reserve currencies are managing international liquidity without a sense of the collective good. They are resorting to undervalued exchange rates to ensure their share of global markets. This wave of unilateral, competitive devaluations creates a vicious cycle that leads to trade and exchange rate protectionism. This has devastating effects for all but especially for developing countries.
The great challenge for the coming years is to address sovereign debt and fiscal imbalances in some countries, without stopping – or reversing – the global recovery.
Only economic growth, based on income distribution and social inclusion, can generate resources to pay the public debt and cut deficits. The experience of Latin America in past decades shows what recession brings in loss of output, rising social inequalities and unemployment.
If they are to overcome the crisis, the world’s major economies should give clear signs of political cohesion and macroeconomic co-ordination. There will be no recovery of confidence or growth without greater co-ordination among the Group of 20 countries. It is vital – for Europe in particular – that they regain the spirit of co-operation and solidarity shown at the height of the crisis.
That is why Brazil supports the G20 Framework for Strong, Sustainable and Balanced Growth, which must be managed by all and for all, without exception.
Other initiatives are needed in the international field: further regulation of the financial system, to minimise the possibility of new crises; reduced levels of leverage. We must proceed with the reform of multilateral financial institutions, increasing participation of emerging countries that now bear primary responsibility for global economic growth.
It is urgent to combat protectionism and all forms of currency manipulation, which give spurious competitiveness at the expense of trading partners. The G20 can offer a co-ordinated response, in which all big economies can adjust fiscal, monetary and/or exchange-rate policies, without fear of acting alone. An open global trade system requires this sense of mutual confidence.
Meanwhile, threatened by large speculative capital flows as well as by a rapid and unsustainable currency appreciation, developing countries that adopt a floating exchange rate regime, such as Brazil, are forced to take prudential measures to protect their economies and their national currencies. We will not succumb to inflationary pressures coming from outside. With firmness and serenity we will keep inflation under control, without having to give up the economic growth that is essential if we are to promote social inclusion. Our commitment to sustainable development with price stability is not negotiable and the economic policy fine-tuning will always work towards this goal.
As to long-term policies, Brazil has regained planning capacity in fields such as energy, transport, housing and sanitation by redefining the role of the state with a focus on developing social infrastructure.
The discovery of large offshore oil reserves will open a new cycle of industrialisation, especially in the naval, petrochemical and capital goods sectors: it will also enable Brazil to create a special fund to invest in social, scientific, technological and cultural policies.
The country has strengthened state-controlled companies such as Petrobras, Eletrobras and the public banks, to induce development. Through active trade defence mechanisms, supported by WTO rules, it will not allow its industry to be jeopardised by unfair competition.
Brazil is also committed to fight deforestation, especially in the Amazon; to promote sustainable agriculture; and to strengthen its energy mix. I am convinced of the need to consolidate these achievements, just as I am sure that we all bear responsibility for rebalancing the world economy. It’s time for global leaders to act with determination and boldness. This is what the world expects from us.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Garantia legal.


ANTONIO DELFIM NETTO, hoje na FOLHA DE S. PAULO, escreve sobre democracia liberal e capitalismo e, como não poderia deixar de ser, sobre o Estado.   

O "capitalismo" não foi inventado: é um processo de organização social e produtiva que os homens foram "descobrindo" ao longo de sua trajetória. Ele é sujeito a crises porque: 1º) O próprio comportamento do homem oscila entre o entusiasmo e a depressão e 2º) As "respostas" do sistema produtivo (variações da oferta) aos estímulos da demanda são, simultaneamente, condicionadas pelas incertezas do futuro opaco e pela natureza do avanço da tecnologia.
Ele sobreviveu porque, de cada crise, saiu mais ajustado ao processo civilizatório. A história mostra, sem nenhuma possibilidade de contradita, que a permanente elevação da produtividade do trabalho e a imensa elevação do padrão de vida que o acompanhou, com a liberdade individual que permite, são um enorme sucesso.
Obviamente ele tem muito a caminhar na direção de uma sociedade mais "justa" na qual prevaleça uma efetiva igualdade de oportunidade para todo cidadão, não importa o ambiente em que tenha sido gerado. O que justifica a nossa esperança é que a combinação de uma democracia liberal (urna) com o capitalismo (mercado) tende a se autocorrigir na direção daquele objetivo.
As duas instituições (a democracia liberal e o mercado) dependem de um Estado constitucionalmente limitado que dê garantias legais para que elas possam produzir o resultado desejado.
Talvez o exemplo mais palpável dessa simbiose seja o enorme crescimento da Inglaterra após a "Revolução Gloriosa de 1688", que eliminou o "poder do soberano" que podia mudar a regra à sua vontade; comprometeu o Estado com o respeito aos direitos da propriedade privada e tomou-lhe o poder de confiscá-la.
Talvez não seja exagerado dizer que foram essas mudanças e o desenvolvimento tecnológico (ele mesmo, talvez, estimulado por elas) que deram origem à primeira Revolução Industrial (1760-1830), que mudou o mundo.
A história econômica dos últimos 300 anos é pouco mais do que a descrição do aperfeiçoamento dos dispositivos legais de imposição do cumprimento dos contratos que obrigam ainda o poder incumbente.
Esse assunto é do maior interesse no estágio de desenvolvimento em que se encontra o Brasil, onde a "segurança jurídica" é ainda precária.
Como disse o ilustre ex-ministro Pedro Malan, "no Brasil até o passado é incerto". Isso é muito prejudicial ao desenvolvimento de longo prazo. Infelizmente, não vamos muito bem nesse quesito, como mostram o "Rule of Law Index" de 2011 e os dados do Economic Forum de 2011-2012.
Amanhã, por estímulo de um prêmio oferecido pela Fundação Getúlio Vargas, haverá uma discussão do assunto, no ambiente Leopoldo, a partir das 12 horas.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Brazil's President Dynamite DILMA.



Of the many war stories that Dilma Vana Rousseff tells of her rise from revolutionary to career bureaucrat to president of Brazil, one in particular stands out. It was early in the race to succeed Luiz Inácio Lula da Silva, and most Brazilians were waking up to the idea of life without their hyperpopular leader, the “father of the poor.” One day in a crowded airport a woman and her young daughter tentatively approached Rousseff to get a closer look at the upstart female frontrunner. “Can a woman be president?” the girl—whose name, fittingly, was Vitória—wanted to know. “She can,” Rousseff answered. With that Vitória thanked Rousseff, raised her chin, and walked off a few inches taller.

Rousseff smiled as she recalled the episode in an interview with Newsweek at Brasília’s presidential palace. It was close to 6 p.m. and the fierce sun over the Brazilian central plateau was already dimming, but Rousseff’s day was far from done. Flash floods in the south had left thousands homeless. Construction work for the soccer World Cup, which Brazil will host in 2014, was lagging. The press was still feasting on the carcass of corruption scandals and a cabinet flap that had cost her five ministers in less than nine months. And yet Rousseff, in a fuchsia jacket, black slacks, and oversize pearl drop earrings, looked unflustered as she spoke about Brazil, the world economy, poverty, and corruption. Her hair was thick and lustrous, her cheeks flush, with no trace of the grinding sessions of chemotherapy she underwent to treat a lymphoma she discovered in 2009. For nearly an hour she held forth, firing off data points and toggling easily from job creation (“We’ve generated 1,593,527 in the first six months”) to T. S. Eliot (“Ash Wednesday” is a favorite) to how women can rewrite the rules of political engagement. “When I was little I wanted to be a ballerina or a firefighter, full stop,” she said. “I don’t know if it’s a new world, but the world is changing. For a girl even to ask about being president is a sign of progress.”

Nessun dorma...


Antonio Delfim Netto, professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento, escreveu hoje no VALOR ECONÔMICO.

É um fato conhecido que os competentes economistas alemães representam a fina flor do mais extremo monetarismo ao qual somam uma boa dose de conservadorismo. Foram ferozmente contra as concessões (com implicações econômicas) feitas por Helmut Kohl, quando aproveitou uma janela semiaberta e teve a coragem de reunificar a Alemanha, objetivo político de longo prazo absolutamente desdenhado pelos "puristas econômicos".

Quando a Alemanha decidiu participar do euro, 150 dos seus mais reconhecidos acadêmicos publicaram um célebre manifesto contra, com bons argumentos, mas que de novo ignorava solenemente o objetivo político de longo prazo, que era a pacificação de um continente que durante os últimos mil anos foi atormentado por guerras.

Os argumentos eram respeitáveis e mostravam que o sucesso do euro dependia de um rigoroso controle da situação fiscal de cada país, preliminar para a construção de uma área monetária ótima: absoluto controle fiscal, liberdade de movimentos da mão de obra e de capitais e a cessão da emissão das moedas nacionais a um banco central autônomo, com uma nova unidade monetária, com relação à qual as taxas de câmbio de cada país seriam irrevogavelmente fixadas.

Eram contra, porque não acreditavam que os países se submeteriam a tal disciplina. Para impô-la, foi formalmente estabelecido e aprovado no acordo de Maastricht, que precedeu a introdução do euro, que: 1) nenhum país poderia ter déficit nominal superior a 3% do PIB; e 2) uma relação dívida/PIB maior do que 60%.

Por que não funcionou? Porque os governos de vários países (em particular da Grécia) mentiram, como suspeitavam os economistas alemães! Ilidiram aquelas condições com a conivência do sistema financeiro internacional e das agências de risco. Tudo veio à tona depois da "quebra" do Lehman Brothers, quando a "rede de patifarias" escondida nos derivativos tóxicos explodiu na cara dos bancos centrais, sob o nariz dos quais ela se realizara. É cada vez mais evidente que esses não se recuperaram do choque: nem o Federal Reserve dos EUA, nem o BCE da Eurolândia sabem, até agora, o que fazer.

Nos EUA, parece que começa a haver uma mudança. Mais de uma dezena de instituições financeiras, que ativamente (com a conivência das agências de risco) assaltaram os incautos aplicadores, começam a ser investigadas e, seguramente, algumas serão responsabilizadas criminalmente. Trata-se de um problema moral, que não pode mais ser escondido pelo governo Obama como foi até agora.

Tardiamente, ele propõe ao Congresso um novo pacote de estímulos para diminuir o sofrimento de 25 milhões de honestos trabalhadores (15 milhões com desemprego aberto e 10 milhões semiempregados), que acabaram desempregados com a política econômica (inspirada por distintos acadêmicos comprometidos com o sistema financeiro) que "salvou" os desonestos administradores.

Até agora, o presidente do Fed, Ben Bernanke, não disse a que veio: apenas repete, repete e repete o velho refrão, "farei o que tenho de fazer". Continua indeciso sobre como atender ao seu duplo mandato: manter alto o nível de emprego e manter baixa a taxa de inflação.

O sinal de que ainda resta vida inteligente nos EUA veio num artigo no "Financial Times", do secretário do Tesouro, Tim Geithner, onde afirmou que é hora dos governos deixarem de lado a paralisia política e esquecerem os medos infundados com a inflação.

No fundo, ele está transmitindo aos bancos centrais, que continuam mesmerizados pelos seus modelitos, que a taxa de juros nominal já é nula e que a taxa de inflação está na "meta", mas a taxa de desemprego é quase o dobro da famosa Nairu (a taxa de desemprego que não acelera a inflação). Logo, é uma eficaz política fiscal que deve ser ativada.

É por isso que ele afirma que os EUA resistirão a um rápido ajuste fiscal em 2012 e recomenda a todos os países em dificuldades que façam o mesmo. Essa coordenação, se realizada, tornará mais potente e mais veloz os resultados.

No Banco Central Europeu (BCE), a situação se agrava. Enquanto Trichet aguarda sua substituição formal por Mario Draghi, os representantes alemães (diante do iminente desastre político da chanceler Merkel) abandonam o barco, alegando "razões pessoais". Primeiro foi Alex Weber (presidente do Bundesbank). Agora foi Juergen Stark, o que aperta ainda mais a "saia justa" de Merkel.

Se não bastassem esses problemas, o ministro das Finanças da Holanda, Jan Kees de Jager, sugere claramente a expulsão da Grécia, a pedido: "Quando não conseguimos respeitar as regras do jogo, devemos deixá-lo". O FMI, por sua inexperiente diretora-gerente, Christine Lagarde, lança dúvidas sobre a higidez dos bancos europeus que têm em carteira títulos gregos. Como todos sabem que ela conhece apenas os bancos franceses, produziu uma corrida sobre eles.

Parece óbvio que ninguém se entende. Tem razão o dr. Tombini. Vamos pôr nossas barbas de molho e nos proteger da provável desintegração da economia mundial.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Entre Pangloss e Cassandra.


Marcelo de Paiva Abreu, escreve hoje no ESTADÃO sobre “Entre Pangloss e Cassandra

Há alguns meses o espírito de Pangloss, o personagem de Voltaire que só era capaz de ver razões para continuar otimista, dominava a maioria das avaliações sobre a economia do Brasil - avaliações reforçadas por diagnósticos internacionais que pareciam querer compensar o excesso de pessimismo no passado com excesso de otimismo em relação ao futuro. A capa da The Economist com o Cristo Redentor envolto em nuvens cinzentas no início de 1999 (Storm clouds from Brazil), em meio à crise cambial, custou a ser substituída por visão menos catastrófica. E, certamente, a capa do final de 2009, com o Cristo sendo propelido por um foguete (Brazil takes off) parece agora bem exagerada, subestimando os inúmeros obstáculos à retomada do crescimento econômico acelerado e sustentado.
Menos Pangloss e mais Cassandra - figura mitológica hoje associada ao pessimismo - é o que parece sugerir a disseminação de iniciativas recentes nos Três Poderes da República.
Iniciativas do Poder Judiciário indicam percepção inadequada de restrições orçamentárias e falta de sensibilidade quanto aos anseios da sociedade civil e à capacidade institucional de fazer justiça de forma equilibrada e expedita. É preocupante que as postulações salariais sejam acompanhadas por esforços de preservação de regalias quanto a direitos trabalhistas e que tenham como pano de fundo a constatação de que há ações judiciais pendentes de decisão que estão comemorando o 50.º aniversário. E que, no contexto de negociações salariais do Judiciário, sejam invocadas razões ancoradas na independência de Poderes. Com o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) definindo o teto salarial do funcionalismo público nos Três Poderes, o impacto sobre as contas públicas seria desastroso.
Quanto ao Poder Legislativo, pouco há a acrescentar a um diagnóstico que sublinhe o colapso de aderência mínima a princípios éticos que se constata com base nas práticas fisiológicas de políticos na administração pública e pelo esprit de corps maligno, evidenciado em votação secreta sobre a cassação de deputada acusada de corrupção. O único consolo é que tal diagnóstico da sociedade civil quanto ao modus operandi do grosso da classe política não configura novidade, especialmente desde que o PT dominou a tecnologia de administração de coalizões fisiológicas no início do governo Lula.
Iniciativas do Poder Executivo estimularam mais ainda a crescente desconfiança quanto às bases concretas que poderiam justificar a persistência de otimismo com a economia do País. A decisão do Banco Central (BC) de reduzir a taxa Selic, alegadamente lastreada em diagnóstico pessimista sobre a evolução da economia mundial, preocupa menos do que as reações que suscitou. Diversos ex-ministros da área econômica, com ampla experiência em épocas em que decididamente não se podia falar de autonomia do BC, manifestaram seu regozijo com a decisão, pois configuraria a reestatização do BC e teria sacramentado o fim da crença em modelos monetários. Nesse coro de congratulações, não faltou quem sublinhasse que decisões de política monetária envolvem mais "arte" que ciência, ao contrário do que defendem "sacerdotes" indevidamente comprometidos com o setor financeiro.
Há pelo menos dois problemas com tais análises. O primeiro é que foram exatamente ministros que no passado promoveram a aceleração inflacionária ou fracassaram em tentativa de estabilização - nos dois casos, com crescimento medíocre - que demonstraram mais entusiasmo com a audácia da política econômica atual de privilegiar o crescimento em detrimento do regime de metas.
Terá faltado "arte"? É oportuno lembrar Laurence Peter, do Peter Principle: "Só há uma coisa mais penosa do que aprender com a experiência: é não aprender com a experiência". Tudo o mais constante, acho que, às opiniões de sacerdotes enfáticos da hiperinflação com estagnação, prefiro o que Pedro Malan, Gustavo Franco, Ilan Goldfajn, Afonso Bevilaqua, Alexandre Schwartzman, Eduardo Loyo e Mário Mesquita, entre outros, têm a dizer sobre o assunto. Afinal, tiveram sucesso no controle da inflação, com algum crescimento.
O segundo problema são as alegações de que a Selic tem sido mantida em níveis elevados porque isso interessa ao setor financeiro. Trata-se de questão empírica sobre a qual não há evidência clara. Mas, em qualquer caso, a ninguém ocorreria sugerir que o setor financeiro deixa de tratar da melhor maneira possível a defesa dos seus interesses. Mas isso não é sua característica exclusiva. Da mesma forma agem os industriais ou seus áulicos que defendem sistematicamente proteção alta, ou generosos créditos públicos subsidiados, ou Selic reduzida, ou câmbio desvalorizado. É um mundo sem anjos.
A notória deterioração da governança mundial e o aumento da probabilidade de recrudescimento da crise mundial - na esteira da nova recessão nos EUA, das tensões da zona do euro e do arrefecimento do crescimento chinês - deveriam servir de estímulo para que o Brasil evitasse a adoção de políticas imprudentes ou simplesmente equivocadas. Os custos dos erros estão em alta.

sábado, 17 de setembro de 2011

Livre para morrer.


PAUL KRUGMAN, hoje na FOLHA DE S. PAULO, está "livre para morrer". Na realidade, ele escreveu mesmo foi "livre para escolher". 

EM 1980, justamente quando os Estados Unidos estavam descrevendo uma virada política para a direita, Milton Friedman defendeu a mudança com a famosa série de TV "Free to Choose". Em um episódio após outro, o simpático economista identificou a economia do laissez-faire com a escolha e o empoderamento pessoais -uma visão otimista que seria ecoada e ampliada por Ronald Reagan.
Mas, hoje, "livre para escolher" virou "livre para morrer".
No debate dos pré-candidatos republicanos na última segunda-feira, Wolf Blitzer, da CNN, perguntou ao deputado Ron Paul o que deveríamos fazer se um homem de 30 anos que optou por não ter convênio médico precisasse de seis meses de atendimento em UTI.
Paul respondeu: "A liberdade implica nisso -assumir seus próprios riscos". Blitzer o pressionou outra vez, perguntando se "a sociedade deveria simplesmente deixá-lo morrer". A plateia explodiu com aplausos e gritos de "sim, sim!".
O incidente destacou algo que a maioria dos comentaristas políticos ainda não absorveu: hoje, a política americana envolve visões morais fundamentalmente distintas.
Poucas das pessoas que morrem por falta de atendimento médico se parecem com o indivíduo hipotético postulado por Blitzer, que poderia ter pagado seguro médico.
A maioria dos americanos sem seguro médico ou tem renda baixa e não pode pagar, ou é rejeitada pelos convênios porque sofre de problemas médicos crônicos.
Então pessoas da direita estariam dispostas a permitir que as pessoas que não têm seguro médico, sem serem culpadas por isso, morram por falta de atendimento? Com base na história recente, a resposta é um "sim!" retumbante.
No dia seguinte ao debate, o Birô do Censo divulgou suas estimativas mais recentes. O quadro geral é lamentável, mas um ponto relativamente positivo foi o atendimento médico a crianças. A porcentagem de crianças sem cobertura foi mais baixa em 2010 que antes da recessão, graças à ampliação em 2009 do Programa de Seguro-Saúde Infantil do Estado, ou SCHIP.
O ex-presidente George W. Bush tinha bloqueado tentativas anteriores de proporcionar cobertura a mais crianças -sob aplausos de muitos da direita.
Logo, a liberdade de morrer se estende não apenas aos imprevidentes, mas também às crianças e às pessoas sem sorte. E a adesão da direita a essa noção assinala um deslocamento importante na natureza da política americana.
Agora, a compaixão está fora de moda -na realidade, a falta de compaixão tornou-se uma questão de princípio, pelo menos na base republicana.
O conservadorismo moderno é, na realidade, um movimento profundamente radical, hostil ao tipo de sociedade que temos há três gerações -que, agindo por meio do governo, procura mitigar alguns dos "perigos comuns da vida" por meio de programas como a Previdência Social, seguro-desemprego, Medicare e Medicaid.
Os eleitores estão preparados para aderir a uma rejeição tão radical do tipo de América em que todos nós crescemos? Vamos descobrir em 2012.

Época entrevista Andrés Oppenheimer.


Nestes tempos onde falta tempo, ler qualquer texto que tenha mais de 200 palavras é um grande sacrifício. Porém, existem situações onde devemos ler senão 200 palavras, que tal 2.000? É o que gostei lendo a entrevista de Andrés Oppenheimer - comentarista da CNN -  à ÉPOCA. Leiam e entendam um pouco mais com profundidade a nossa vida latino americana. E como estamos num final de semana, tempo não vai faltar.  

ÉPOCA – Que obsessão é essa pelo passado que existe na América Latina?
Andrés Oppenheimer – Os países da América Latina vivem numa revisão de suas histórias. Vamos pegar a Venezuela como exemplo. Lá, o presidente Hugo Chávez mudou o nome do país para um ridículo “República Bolivariana da Venezuela”. Ele fala ao país quase que diariamente em frente a uma imagem de Simon Bolívar. E diz que toda sua política é baseada no que Bolívar disse. Usa o passado para dar legitimidade histórica a suas ações. Mas Bolívar viveu há quase dois séculos. Ele morreu 150 anos antes da invenção da internet e 40 antes do telefone. Ele pode ter sido um grande herói do seu tempo, mas vivemos num mundo novo.
ÉPOCA – Ele não pode nos ajudar nos desafios atuais.
Oppenheimer – Claro que não. Ele não é a resposta para os desafios de um mundo globalizado. Estive em países como a Índia e China, que têm história milenar e não vi ninguém ficar falando no passado. Mas Chávez insiste nessa postura. Ano passado quis exumar o cadáver de Bolívar. A mesma coisa aconteceu no México e Equador e países da América Central. No livro, eu falo sobre minha surpresa quando cheguei a Cingapura, um dos países com maior renda per capta do mundo. Um exemplo simbólico é a moeda local. No dinheiro deles há imagem de uma universidade com o professor e os alunos e, abaixo, uma palavra: Educação. Na América Latina, como nos EUA, temos nossos heróis da independência. Nós olhamos para trás. Eles olham para frente.
ÉPOCA – Por que isso ocorre?
Oppenheimer – Talvez porque os países latino americanos sejam relativamente jovens, idolatrar o passado é uma forma de criar um senso de coesão ou identidade nacional. Mas não haveria problema se fosse só isso. O problema é que nós exageramos. Hoje ficou uma obsessão. Se você for a uma livraria em Buenos Aires, Cidade do México ou Lima vai ver que os best sellers são romances históricos, biografias de heróis do passado ou ensaios de história. Não vi isso na Ásia. Lá, vemos livros sobre o futuro. Não estou dizendo que devemos esquecer nossa história. Eu gosto de história. O que digo é que essa obsessão, esse exagero nos distrai de tarefas mais relevantes e urgentes como investir em educação, ciência, tecnologia, que são os assuntos do futuro.
ÉPOCA – O senhor diz que a educação é a chave para nosso futuro. Mas esse pensamento não existe desde o século 20?
Oppenheimer – Não era importante. Nós sempre medimos nosso sucesso pelo nosso crescimento econômico. E descobrimos que, sem uma boa educação, o crescimento da economia não reduz a pobreza nem a desigualdade, pelo menos tão rápido quando vem acompanhado de crescimento educacional. Os dois devem caminhar juntos. Caso contrário, não vamos nos desenvolver tão rápido quanto os asiáticos. A razão é simples. Quando a economia cresce, as pessoas que se beneficiam são pessoas como você e eu, que tiveram boa educação formal, que têm empregos formais. A mulher que vende limão na rua, que vive numa favela e não teve boa educação não vai conseguir um emprego tão bom. Se quisermos que essa senhora ascenda socialmente, precisamos dar a ela – e ao filho dela – uma boa educação. Senão, nunca fará parte da economia formal. Uma das coisas que proponho no livro é medir nosso sucesso pela educação, como um PIB para a educação, o Produto Educacional Bruto. Um, sem a outra, não nos ajudará a reduzir a pobreza
ÉPOCA – E como vai o nosso PEB?
Oppenheimer – Terrível. Posso te dar exemplos. Não temos uma única universidade da América do Sul entre as 200 melhores do mundo, segundo ranking feito pelo Times, de Londres. Somente a Universidade Autônoma do México (Unam) aparece na 190ª posição do ranking inglês. Isso é um escândalo. O Brasil está entre as 12 maiores economias do mundo. No Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), dos 65 países que participaram no ranking, os países latino americanos estão na parte de baixo. O Brasil está na 53ª posição em matemática. Outro exemplo: temos férias muito longas. No Japão, o ano letivo tem 243 dias. Na Coreia do Sul, é de 220. E no Brasil, 200. Se contarmos as greves, o ano letivo é ainda menor. Não estou nem falando das horas de estudo por dia. Uma criança chinesa estuda 12 horas por dia, muito mais do que uma criança brasileira ou de outro país da América Latina. E o mais crítico exemplo: nós, na América Latina, não registramos patentes, não inventamos nada. A Coreia do Sul, um pequeno país asiático, que há 40 anos era mais pobre que o Brasil, no ano passado registrou 8.800 patentes nos Estados Unidos. Enquanto o Brasil, muito maior que a Coreia do Sul, registrou 100 patentes. Não é coincidência que a renda per capta lá seja maior que no Brasil.
ÉPOCA – Não faz sentido o argumento de que nossas universidades não estão no ranking por preconceito e porque o inglês não é nossa língua nativa?
Oppenheimer – A última vez que fui à China o inglês não era a língua nativa por lá (risos). E esses países têm mais universidades no ranking do que nós. O que essas pessoas dizem sobre isso? É ridículo. E um ranking chinês com as 500 melhores universidades mostrou resultados parecidos que o ranking inglês. A Universidade de São Paulo (USP) ficou no grupo identificado como “entre a 100ª e 151ª posições”. A Unam e a Universidade de Buenos Aires estão entre a 152ª e 200ª posições.
ÉPOCA – Dentro da América Latina, qual país está melhor?
Oppenheimer – Brasil e Chile vão melhor na educação superior, não há a menor dúvida disso. E Brasil lidera nesse quesito. Produz 10 mil doutores por ano, tem indústrias de alta tecnologia como a Embraer. E o país anunciou recentemente que vai pagar por 100 mil bolsas de estudo para alunos estudarem fora. O Brasil está indo muito melhor do que outros países da América Latina. Mas está muito pior do que outros países com quem quer competir, como Índia ou China. Há muito a ser feito. Digo que é um “gigante com pés de barro”: tem boas universidades e péssimas escolas. E mesmo no sistema universitário, é preciso fazer mais para se destacar.
ÉPOCA – O que precisamos fazer?
Oppenheimer – Primeiro, criar uma cultura de inovação, que resulte em invenções e registro de mais patentes. Estamos no começo de uma era da Economia do Conhecimento. Se o Brasil quer se destacar nesse cenário, tem de produzir muito mais produtos de alta tecnologia do que hoje. O Brasil nunca vai ser tornar um poder mundial se registrar apenas cem patentes por ano nos Estados Unidos. No livro, cito como exemplo uma xícara de café brasileiro vendido no Starbucks nos Estados Unidos. Só 3% do que se paga pela xícara vai para os agricultores brasileiros. E 97% do preço vai para quem processou o café, para o marketing etc. O mesmo vale para uma camisa da Ralph Lauren vendida nos EUA. A fábrica peruana que entrega a camisa pronta fica com, no máximo, 13% do valor. Quem leva o resto? Quem criou o “estilo de vida Ralph Lauren” – o marketing, o design, a publicidade. Isso é um produto da Economia do Conhecimento. De qual lado da equação o Brasil quer estar? Do lado dos 3% ou dos 97%?
ÉPOCA – Mas como podemos investir em tecnologia se, como o senhor diz no livro, os estudantes brasileiros, como os latino americanos em geral, preferem Ciências Sociais e Humanas do que as Exatas?
Oppenheimer – Eu iria mencionar isso. Precisamos encorajar os estudantes a estudar mais engenharia e um pouco menos de Sociologia, Psicologia ou História.
ÉPOCA – Como explicar essa preferência?
Oppenheimer – Pode ser cultural, pode ser pelo fato de que engenharia é mais difícil e as pessoas escolhem o caminho mais tranquilo. Talvez porque muitos pensem que não vão conseguir empregos. Mas os governos não encorajam os alunos para áreas de Exatas. Na Ásia os governos encorajam.
ÉPOCA – O que esses países fazem?
Oppenheimer – Durante a pesquisa do livro eu estive em países como China, Índia, Cingapura, Israel ou Finlândia, que estão fazendo coisas muito interessantes nessa área. Na Índia, por exemplo, há muitos anos, começaram a produzir engenheiros. O governo deu bolsas de estudo, encorajou as universidades a aumentar seus programas de engenharia. Com tantos engenheiros, empresas multinacionais viram a grande quantidade de engenheiros e se instalaram lá. A Índia não esperou pela demanda de engenheiros. Criou a oferta e as multinacionais foram atrás.
ÉPOCA – Mesmo com os problemas educacionais, o Brasil cresce, a pobreza diminui e as classes média e alta estão maiores do que nunca.
Oppenheimer – Devemos celebrar isso, mas não podemos ignorar que esse crescimento não é sustentável. O crescimento está baseado na alta do preço das commodities e no bom momento da economia mundial. E quando o preço das matérias primas cair? E quando a China parar de comprar a soja e o aço produzidos aí? Se o Brasil quiser ter um crescimento sustentável, precisa melhorar sua educação e tecnologia. Repito: o Brasil nunca vai ser uma potência mundial se registrar apenas cem patentes por ano.
ÉPOCA –  Em suas visitas a universidades latinas, você notou se há preocupação em melhorar?
Oppenheimer – Não. Vi mais essa preocupação no Brasil do que em outros países. Na Argentina é patético. Quando o resultado do Pisa saiu e Argentina ficou nas últimas posições, o ministro da Educação argentino preferiu jogar a culpa no teste. Disse que o teste é quem estava errado. O Brasil está mais maduro e consciente. Mas precisa mais do que eu chamo de “paranoia construtiva”. Os países que se desenvolveram são paranoicos. Precisa olhar para Índia, China, Coreia.
ÉPOCA – O que é essa paranoia construtiva?
Oppenheimer – Países que pensam que não estão bem quando se comparam com outros países geralmente se empenham mais em melhorar. Enquanto que países que acreditam estar numa boa posição se tornam complacentes e acabam ficando para trás. China e Índia têm essa paranoia construtiva: eles acham que todos estão melhor do que eles. Na América Latina, muitos países acreditam que estão muito bem, apesar das evidências que mostram o contrário.
ÉPOCA – Como podemos pensar em tecnologias se vamos mal no ensino primário e não valorizamos o professor?
Oppenheimer – É algo pendente. Quando conversei com a presidente da Finlândia e perguntei por que o país vai tão bem, ela me respondeu: “Professores, professores e professores”. Para um aluno ser um professor na Finlândia, é preciso estar entre os 10% com melhor desempenho escolar. Se não está nesse grupo quando sai da escola, não pode se tornar um professor. Lá, se uma pessoa estuda para se tornar professor, você logo imagina que deve ser uma pessoa muito inteligente. Nos nossos países, pensamos: “Coitado, quis ser advogado e não conseguiu”. Precisamos formar bons professores, dar status à profissão, avaliar seus desempenhos e pagar bons salários aos bons profissionais.
ÉPOCA – O senhor acha que criar cotas para alunos negros ou de escolas públicas é benéfico?
Oppenheimer – De modo geral, sim. Mas a saída é melhorar qualidade das escolas. O nível hoje é muito baixo.
ÉPOCA – Por que não vemos revoluções na educação na América Latina como houve na Finlândia ou países asiáticos?
Oppenheimer – Porque confiamos demais na exportação de matérias primas. Fomos amaldiçoados com abundância de matérias primas. Não é coincidência que os países com maior renda per capta do mundo, como Luxemburgo, Liechtenstein ou Cingapura não têm recursos naturais. Por outro lado, países ricos em recursos naturais, como Nigéria ou Venezuela, estão entre os mais pobres. Não estou dizendo para pararmos de produzir recursos naturais. Digo que deveríamos fazer como a Noruega, que coloca o dinheiro obtido com a venda de recursos naturais num fundo que, no caso da América Latina, poderia ser usado para melhorar a educação e tecnologia.
ÉPOCA – O senhor cita no livro exemplos como Cingapura e China, onde as crianças e jovens estudam 12 ou mais horas por dia, são constantemente avaliadas em ranking de desempenho. Isso resulta em cidadãos felizes? Não é cruel?
Oppenheimer – Acho que muito mais cruel seria deixar nosso povo sem educação e sem as ferramentas para melhorar sua qualidade de vida. Não acredito no pensamento “eles são pobres, mas felizes” porque ninguém é feliz se passa a vida na pobreza. As pessoas devem ter o direito de sonhar e educar as crianças é a melhor forma de melhorar a vida delas. Nós somos guiados por ideologias e obcecados pelo passado. Os asiáticos são guiados por pragmatismo e obcecados com o futuro. Nós podemos aprender algo com eles.
ÉPOCA – Como está a democracia na América Latina?
Oppenheimer – Diria que muito melhor do que há 30 anos, mas pior do que há 10. Temos muitas democracias híbridas, como Venezuela, Bolívia ou Equador, que mantêm formalidades democráticas, mas, uma vez que o presidente assume o poder, adquire poderes absolutos e acaba com a separação dos poderes. Esses países criaram uma espécie de “clube”. Uns defendem os outros. E o Brasil teve muito a ver com isso.
ÉPOCA – De que forma?
Oppenheimer – Não sou entusiasta da política externa do Brasil, especialmente nos últimos anos do governo Lula.
ÉPOCA – Por quê?
Oppenheimer – Porque o Brasil parecia cair em amores por qualquer ditador do mundo.
ÉPOCA – A queda de influência de Hugo Chávez não seria prenúncio de que a situação está mudando?
Oppenheimer – Sim. A influência de Chávez na América Latina é diretamente proporcional ao preço do petróleo. Com o preço do óleo a US$ 150, Chávez era como Napoleão. Com o petróleo a US$ 90, Chávez já não tem tanto poder de influência.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Revista Exame.


Parabéns a revista EXAME pela sua 1.000ª edição. Leitura de cabeceira. E que venham mais 1000.

Dicas de leitura.

Recebo uma lista dos livros mais vendidos no mercado na área de Teoria e Análise. Para minha grata surpresa "A Saga Brasileira" de Miriam Leitão continua em 1º lugar. Realmente é um livro para ser lido com prazer, recordando momentos importantes da nossa história. Em 2º lugar esta "Crash - Uma Breve história da Economia", do Alexandre Versignassi. Esse ainda estou lendo, mas o autor mistura muita coisa e consegue ser feliz em suas conclusões. Em 3º temos o "Fundamentos de Economia" do Marco Antonio Sandoval Vasconcellos e Manuel E. Garcia, nosso velho conhecido. Em 4º temos o "Axiomas de Zurique" do Max Gunther. Todas as vezes que pensei em comprar esse livro, sempre mudo de opinião. Para finalizar, em 5º lugar o nosso super conhecido "Introdução à Economia" do colega blogueiro N. Gregory Mankiw. Esse não pode faltar na nossa mesa.
Boa leitura e um ótimo final de semana para os meus quase dois (milhões) de leitores.         

Pensar o impensável na Europa.


George Soros é presidente da Soros Fund Management. Copyright: Project Syndicate, 2011, hoje no VALOR ECONÔMICO.

Para resolver uma crise em que o impossível tornou-se possível, é necessário pensar o impensável. Assim, para resolver a crise da dívida soberana na Europa, é agora imperativo uma preparação para a possibilidade de inadimplência e de saída da Grécia, Portugal e, talvez, da Irlanda da zona do euro.

Em tal cenário, medidas terão de ser tomadas para evitar um colapso financeiro da zona do euro como um todo. Primeiro, os depósitos bancários precisam ser protegidos. Se um euro depositado num banco grego fosse perdido devido a um calote e saída da zona, um euro depositado num banco italiano passaria imediatamente a valer menos do que um euro em um banco alemão ou holandês, resultando em uma corrida aos bancos dos países deficitários.

Além disso, alguns bancos nos países inadimplentes teriam de ser mantidos em funcionamento para evitar um colapso econômico. Ao mesmo tempo, o sistema bancário europeu teria de ser recapitalizado e colocado sob supervisão europeia, em vez de fiscalização nacional. Finalmente, os títulos governamentais emitidos por outros países deficitários na zona do euro teriam de ser protegidos de contágio. (Os dois últimos requisitos seriam aplicáveis mesmo que nenhum país resultasse inadimplente).

Tudo isso custaria dinheiro, mas, nos termos do regime existente acordado pelos líderes nacionais da zona do euro, não há mais dinheiro mobilizável. Portanto, não há alternativa: é preciso criar o componente que falta: um Tesouro europeu com poder de tributar e, portanto, de captar empréstimos. Isso exigiria um novo tratado, transformando o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF, em inglês) em um Tesouro propriamente dito.

Mas isso pressupõe uma admissão de que circunstâncias radicalmente distintas exigem mudanças de posicionamento, particularmente na Alemanha. A opinião pública alemã continua acreditando que pode optar por dar ou não seu apoio ao euro. Esse é um erro grave. O euro existe, e os ativos e passivos do sistema financeiro mundial estão tão mesclados em função da moeda comum que seu colapso poderia causar uma implosão além da capacidade das autoridades alemãs - ou de qualquer outra - de contê-la. Quanto mais tempo levar para que os alemães percebam esse fato nu e cru, maior o preço que eles, e o resto do mundo, terão que pagar.

A questão é se o público alemão pode ser convencido desse argumento. A chanceler Angela Merkel pode não ser capaz de persuadir sua coalizão inteira dos méritos do argumento, mas poderia apoiar-se na oposição para construir uma nova maioria que defenda o que é necessário para preservar o euro. Tendo resolvido a crise do euro, ela teria menos a temer da próxima eleição.

Preparar-se para o possível calote ou a deserção de três pequenos países do euro não significa que esses países seriam, necessariamente, abandonados. Ao contrário, a possibilidade de um default coordenado - financiado pelos países da zona do euro e pelo Fundo Monetário Internacional - proporcionaria à Grécia e Portugal opções de política de governo. Adicionalmente, isso poria fim ao ciclo vicioso - que agora ameaça todos os países deficitários na zona do euro - em que a austeridade enfraquece suas perspectivas de crescimento, levando investidores a cobrar taxas de juros proibitivas e, portanto, obrigando seus governos a reduzir ainda mais seus gastos.

Sair da zona do euro facilitaria, para os países em dificuldades mais graves, recuperar sua competitividade. Mas, caso se disponham a assumir os sacrifícios necessários, poderiam também permanecer: o EFSF protegeria os depósitos em seus bancos domésticos e o FMI ajudaria a recapitalizar seus sistemas bancários, o que ajudaria esses países a escapar da armadilha atual. Seja qual for o caso, não é de interesse da União Europeia permitir que esses países entrem em colapso e arrastem consigo todo o sistema bancário mundial.

Os países membros da UE, e não apenas os pertencentes à zona do euro, precisam aceitar que é necessário um novo tratado para salvar o euro. Essa lógica é clara. Assim, as discussões sobre o que incluir em tal novo tratado deveria começar imediatamente, porque mesmo com os líderes europeus sob extrema pressão para chegarem rapidamente a um consenso, as negociações serão, necessariamente, um processo prolongado. Depois que houver um acordo em torno do princípio fundamental, porém, o Conselho Europeu poderia autorizar o BCE a preencher o vácuo, protegendo-o preventivametne contra riscos de solvência.

A perspectiva de uma solução para a crise da dívida soberana na zona do euro seria uma fonte de alívio para os mercados financeiros. Mesmo assim, uma vez que os termos de um novo tratado seriam, inevitavelmente, ditados pela Alemanha, seria quase certa uma grave desaceleração da atividade económica. Isso poderia induzir uma mudança de atitude adicional na Alemanha, o que, por sua vez, permitiria a adoção de políticas anticíclicas. Nesse ponto, o crescimento em grande parte da zona do euro poderia recomeçar.

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...