George Soros é presidente da Soros
Fund Management. Copyright: Project Syndicate, 2011, hoje no VALOR ECONÔMICO.
Para resolver uma crise em que o
impossível tornou-se possível, é necessário pensar o impensável. Assim, para
resolver a crise da dívida soberana na Europa, é agora imperativo uma
preparação para a possibilidade de inadimplência e de saída da Grécia, Portugal
e, talvez, da Irlanda da zona do euro.
Em tal cenário, medidas terão de ser
tomadas para evitar um colapso financeiro da zona do euro como um todo.
Primeiro, os depósitos bancários precisam ser protegidos. Se um euro depositado
num banco grego fosse perdido devido a um calote e saída da zona, um euro
depositado num banco italiano passaria imediatamente a valer menos do que um
euro em um banco alemão ou holandês, resultando em uma corrida aos bancos dos
países deficitários.
Além disso, alguns bancos nos países
inadimplentes teriam de ser mantidos em funcionamento para evitar um colapso
econômico. Ao mesmo tempo, o sistema bancário europeu teria de ser
recapitalizado e colocado sob supervisão europeia, em vez de fiscalização
nacional. Finalmente, os títulos governamentais emitidos por outros países
deficitários na zona do euro teriam de ser protegidos de contágio. (Os dois
últimos requisitos seriam aplicáveis mesmo que nenhum país resultasse
inadimplente).
Tudo isso custaria dinheiro, mas, nos
termos do regime existente acordado pelos líderes nacionais da zona do euro,
não há mais dinheiro mobilizável. Portanto, não há alternativa: é preciso criar
o componente que falta: um Tesouro europeu com poder de tributar e, portanto,
de captar empréstimos. Isso exigiria um novo tratado, transformando o Fundo
Europeu de Estabilidade Financeira (EFSF, em inglês) em um Tesouro propriamente
dito.
Mas isso pressupõe uma admissão de que
circunstâncias radicalmente distintas exigem mudanças de posicionamento,
particularmente na Alemanha. A opinião pública alemã continua acreditando que
pode optar por dar ou não seu apoio ao euro. Esse é um erro grave. O euro
existe, e os ativos e passivos do sistema financeiro mundial estão tão
mesclados em função da moeda comum que seu colapso poderia causar uma implosão
além da capacidade das autoridades alemãs - ou de qualquer outra - de contê-la.
Quanto mais tempo levar para que os alemães percebam esse fato nu e cru, maior
o preço que eles, e o resto do mundo, terão que pagar.
A questão é se o público alemão pode
ser convencido desse argumento. A chanceler Angela Merkel pode não ser capaz de
persuadir sua coalizão inteira dos méritos do argumento, mas poderia apoiar-se
na oposição para construir uma nova maioria que defenda o que é necessário para
preservar o euro. Tendo resolvido a crise do euro, ela teria menos a temer da
próxima eleição.
Preparar-se para o possível calote ou
a deserção de três pequenos países do euro não significa que esses países
seriam, necessariamente, abandonados. Ao contrário, a possibilidade de um
default coordenado - financiado pelos países da zona do euro e pelo Fundo
Monetário Internacional - proporcionaria à Grécia e Portugal opções de política
de governo. Adicionalmente, isso poria fim ao ciclo vicioso - que agora ameaça
todos os países deficitários na zona do euro - em que a austeridade enfraquece
suas perspectivas de crescimento, levando investidores a cobrar taxas de juros
proibitivas e, portanto, obrigando seus governos a reduzir ainda mais seus
gastos.
Sair da zona do euro facilitaria, para
os países em dificuldades mais graves, recuperar sua competitividade. Mas, caso
se disponham a assumir os sacrifícios necessários, poderiam também permanecer:
o EFSF protegeria os depósitos em seus bancos domésticos e o FMI ajudaria a
recapitalizar seus sistemas bancários, o que ajudaria esses países a escapar da
armadilha atual. Seja qual for o caso, não é de interesse da União Europeia
permitir que esses países entrem em colapso e arrastem consigo todo o sistema
bancário mundial.
Os países membros da UE, e não apenas
os pertencentes à zona do euro, precisam aceitar que é necessário um novo
tratado para salvar o euro. Essa lógica é clara. Assim, as discussões sobre o
que incluir em tal novo tratado deveria começar imediatamente, porque mesmo com
os líderes europeus sob extrema pressão para chegarem rapidamente a um
consenso, as negociações serão, necessariamente, um processo prolongado. Depois
que houver um acordo em torno do princípio fundamental, porém, o Conselho Europeu
poderia autorizar o BCE a preencher o vácuo, protegendo-o preventivametne
contra riscos de solvência.
A perspectiva de uma solução para a
crise da dívida soberana na zona do euro seria uma fonte de alívio para os
mercados financeiros. Mesmo assim, uma vez que os termos de um novo tratado
seriam, inevitavelmente, ditados pela Alemanha, seria quase certa uma grave
desaceleração da atividade económica. Isso poderia induzir uma mudança de
atitude adicional na Alemanha, o que, por sua vez, permitiria a adoção de
políticas anticíclicas. Nesse ponto, o crescimento em grande parte da zona do
euro poderia recomeçar.
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