domingo, 12 de maio de 2013

Ignácio Rangel.


Ignácio Rangel foi um grande economista brasileiro, porém desconhecido e pouco estudado em nossas aulas de Economia. MARCELO MITERHOF, economista do BNDES, escreveu este artigo na FOLHA, o qual compartilho para conhecimento dos meus, ainda espero, dois fiéis leitores. 

Antecipo as homenagens pelo centenário de Ignácio Rangel, que será em fevereiro de 2014. Faço isso porque nas últimas semanas distintos temas tratados neste espaço fazem lembrar dele, em especial sua capacidade de aliar uma criatividade aguda para elaborar conceitos com um senso de realidade raro entre economistas.

Uso textos como "O papel da inflação", publicado na Folha de 30/07/1990, indicação do economista Thiago Mitidieri, com quem discuti sobre Rangel.

Nos anos 30, Rangel entendia que a industrialização precisaria vir junto com a reforma agrária. Mais tarde, reconheceu que no Brasil a industrialização, se não fosse um projeto de lideranças dos proprietários rurais, teria sido natimorta.

No entanto, isso não ocorreria sem graves problemas. A mecanização do campo sob uma estrutura fundiária concentrada jogaria muitas pessoas nas cidades, sem que houvesse ocupação suficiente na indústria e nos serviços para absorvê-las, o que favoreceu a repressão salarial, travando o adensamento do mercado interno, o motor da industrialização brasileira.

Avançar na industrialização -- dos bens leves para os de consumo duráveis e daí para a indústria pesada -- era o jeito de continuar criando perspectivas. Porém os avanços ocorriam por saltos na estrutura produtiva em ciclos mais ou menos decenais, prósperos na primeira metade e recessivos na outra.

Não era tarefa fácil. Havia capacidade ociosa, por conta das grandes economias técnicas de escalas, e também estrangulamentos produtivos, fruto de desequilíbrios próprios de uma mudança estrutural e de restrições de divisas externas.

A inflação tinha até os anos 60 um comportamento inesperado, se intensificando na recessão. Os baixos ganhos salariais faziam a demanda agregada no Brasil ser estruturalmente deprimida, pois dependente do investimento.

Para Rangel, a inflação tinha outra fonte de aceleração: uma estrutura de mercado cartelizada, que elevava seus lucros espremendo tanto os consumidores finais quanto os produtores, em especial nos bens agrícolas. Como a procura de alimentos é pouco elástica, o aumento de seus preços fazia cair o consumo de outros bens pelos assalariados, aprofundando a recessão.

Mas a inflação era útil. Ao penalizar a liquidez, incentivava imobilizações - tanto pela antecipação da compra de bens duráveis pelos mais ricos quanto em investimentos incrementais -- quando um ciclo de mudança estrutural dava sinais de excesso de capacidade.

Essa imobilização especulativa mitigava a recessão e permitia alinhar as condições institucionais e o planejamento dos investimentos que fariam parte da nova fase de expansão industrial.

Rangel não vituperava contra a inflação, mas tampouco aderiu a ela, sabendo que seu papel foi circunstancial. A retomada do desenvolvimento viria pela realização de aperfeiçoamentos institucionais que o novo status de nação industrial exigia. Para isso, o capital financeiro precisava se integrar ao industrial, o que permitiria melhor coordenar os investimentos, algo que o país ainda está longe de ter.

Também estava claro que a capacidade de expandir a infraestrutura por meio de empresas públicas tinha se esgotado. Rangel tinha apontado nos anos 60 que esse modelo era útil, mas esbarraria na limitação de endividamento da União, o que ficou patente no início dos anos 80. Então, era preciso regenerar os sistemas de garantias, o que envolvia mudar o direito das concessões e realizar privatizações.

Hoje, a infraestrutura no Brasil se expande por meio do "project finance", em que sociedades de propósitos específicos, com controle privado, financiam os projetos com base na receita esperada. Nisso, a ideia de Rangel vingou.

Rangel não se furtava a mudar de posição, mas sem trocar uma crença idealizada no desenvolvimentismo e na cooperação por outra igualmente idealizada no liberalismo e na competição. Ele se manteve de esquerda e heterodoxo.

Isso não o impediu de transigir em questões concretas, defendendo que a industrialização, para se viabilizar, precisou da elite agrária e que a inflação não era um mal absoluto. Quando o projeto industrial mostrou sinais de esgotamento, defendeu as privatizações, antes de elas virarem uma efetiva bandeira liberal.

É possível discordar de Rangel em vários pontos, mas, houvesse mais economistas como ele, a economia avançaria bem mais, tanto como teoria quanto na política.

A lei da demanda.


SAMUEL PESSÔA , doutor em economia e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, escreveu neste domingo na FOLHA sobre a lei da demanda sobre escolhas morais.

Em geral, a elevação do preço de um bem reduz a quantidade consumida desse bem. Esse princípio geral é conhecido por lei da demanda.

É possível que haja exceções. A mais famosa é a demanda de alimentos baratos de elevado valor calórico e baixo conteúdo proteico.

Pode ser o caso de arroz na China de hoje; batatas na Irlanda ou pão na Inglaterra, ambos no século 19; farinha de mandioca no sertão nordestino na segunda metade do século passado etc.

Nesses casos, a maior parcela do orçamento familiar é comprometida com o consumo do alimento barato com elevado conteúdo energético e baixo conteúdo proteico.

Devido às necessidades calóricas mínimas diárias, a elevação do preço do alimento rico em calorias reduz muito a renda disponível para aquisição de alimentos de maior qualidade. A demanda pelo alimento mais barato (apesar de este ter ficado mais caro) sobe, dado que a família não tem renda suficiente para adquirir proteína.

Os bens que não obedecem à lei de demanda são chamados de bens de Giffen. O debate brasileiro em torno de escolhas morais sobre diversos assuntos aparentemente está povoado de bens de Giffen.

É comum lermos que a redução da maioridade penal elevará a criminalidade entre jovens, que a descriminalização do aborto reduzirá o número de abortos, que a liberalização das drogas reduzirá o consumo de drogas e que a criminalização da prostituição elevará a prática do comércio sexual.

Em todos esses casos, o preço de um bem subiu (ou desceu) e o consumo, segundo alguns analistas, elevou-se (ou reduziu-se).

Tenho dificuldade de imaginar que a elevação do custo ao menor que cometer crimes eleve a quantidade de crimes praticados pelo menor infrator ou que a elevação do custo do comércio sexual aumente seu consumo.

É igualmente difícil racionalizar que a redução do custo de cometer aborto ou de consumir droga reduza o número de abortos ou o uso de drogas.

Nada impede que as alterações legais elencadas tenham outras consequências e que estas possam ser empregadas como argumentos contrários ou favoráveis à alteração legal.

É possível que a descriminalização do aborto reduza o número de mulheres mortas em função de procedimentos médicos inadequados.

Também é possível que a legalização do consumo e do comércio de drogas reduza a violência e o número de homicídios ou que a criminalização da prostituição aumente a criminalidade.

Finalmente, é perfeitamente possível e justo defender posições favoráveis ou contrárias a esta ou aquela instituição, independentemente de suas consequências.

É possível ser favorável à legalização do comércio e consumo de drogas em função do princípio de liberdade de escolha individual.

Analogamente, é possível ser favorável à redução da maioridade penal em função do princípio da responsabilização individual.

Novamente independentemente do impacto da redução da maioridade penal sobre a criminalidade.

O mesmo princípio de liberdade de escolha individual aplica-se à manutenção da prostituição como atividade lícita.

O que não parece muito útil nem produtivo é enxergarmos bem de Giffen em toda parte. Confunde e dificulta o avanço do debate.

Os bens de Giffen são mais raros do que imaginamos. Até hoje os economistas têm dúvidas se a batata na grande fome na Irlanda no século 19 poderia ser de fato considerada bem de Giffen!

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Economia brasileira não volta a ter expansão de 7%. Alguma dúvida?


Leio na FOLHA entrevista com o economista Dani Rodrik, professor de política econômica internacional da Universidade Harvard e um dos maiores especialistas em economia do desenvolvimento.

Segundo Rodrik, o ambiente global benéfico -- alto crescimento da China, elevados preços das commodities, países avançados em expansão -- não vai se repetir. "É realista esperar uma taxa de crescimento de 3% a 4% no Brasil", disse à Folha Rodrik, que participou de seminário da revista "Carta Capital".

Folha - O Brasil cresceu 0,9% em 2012 e há uma percepção de que o modelo de crescimento baseado em consumo se esgotou. O que o sr. acha?
Dani Rodrik - Dois anos atrás, todo mundo dizia que o Brasil estava vivendo um novo milagre econômico. Eu achava que era um enorme exagero. Agora, as pessoas estão tirando conclusões apressadas em cima de apenas um ano de crescimento.
O Brasil não vai mais crescer 7%, como no milagre econômico antes da crise da dívida ou mesmo em 2010 [7,5%]. É realista esperar uma taxa de crescimento de 3% a 4%. Se o contexto global ajudar, 5% será uma taxa razoável.

O sr diz que, a partir de agora, alto crescimento no mundo será exceção. Como se situa o Brasil nesse cenário? As condições que permitiram crescimento de 7% a 8% não vão se repetir. Antes, tínhamos os estágios iniciais da industrialização --ao tirar mão de obra da zona rural ou do setor informal e levar para as indústrias, tínhamos ganhos de 400% na produtividade. Agora, não teremos grandes ganhos sem mais investimentos em educação e tecnologia. Com as mudanças tecnológicas, a indústria é muito mais intensiva em capital e não absorve tanta mão de obra. E o Brasil, na realidade, já atingiu o pico de industrialização e está agora se desindustrializando. Mas isso é verdade para a maioria dos países. É inevitável. A discussão agora é a velocidade da desindustrialização, se está mais rápida do que deveria. A indústria não mais será o motor do crescimento. Serviços e outras áreas irão gerar ganhos de produtividade.

O sr. ficou decepcionado com a decisão dos Brics [Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul] de criar um banco de desenvolvimento... Essa é uma noção dos anos 50, de que é preciso ter financiamento de infraestrutura. Frequentemente, o que emperra o desenvolvimento não é a falta de financiamento, mas sim instituições frágeis, excesso de regulação, falta de política industrial e moedas sobrevalorizadas. Financiamento é apenas um dos fatores. Não me parece o foco apropriado para os Brics. Faltam ideias novas de como consertar a globalização e criar uma nova relação entre emergentes e ricos.

O sr. diz que os Brics precisam parar de se comportar como "suplicantes". Qual é a mensagem que o Brasil deveria passar nos foros mundiais? Gostaria de ver o Brasil abordar o sistema internacional não como um país em desenvolvimento dizendo que é pobre e precisa de ajuda. Em vez disso, o Brasil precisa se posicionar como formador de políticas, que também tem grandes responsabilidades. Em áreas como mudança climática, por exemplo, não haverá redução de emissões se os emergentes não assumirem responsabilidade.

O que o sr. espera de Roberto Azevêdo à frente da Organização Mundial do Comércio? A agenda da OMC precisa mudar. A Rodada Doha morreu e as pessoas deveriam simplesmente declarar isso. O real desafio para a OMC é estabelecer uma nova narrativa, que não se restrinja a: "você reduz suas tarifas e em troca nós abrimos nossos mercados". No momento, o maior problema não é a falta de abertura comercial.
E o Brasil precisa mudar sua atitude. O Brasil ocasionalmente precisa proteger sua indústria, mas tem de entender que os países ricos passam por uma situação muito difícil e também precisam proteger a sua indústria. O Brasil, apesar de todas as elevações de tarifas recentes, não pode ser chamado de economia fechada. Aliás, acho que a atual estrutura de tarifas no Brasil é até positiva.

Por quê? Porque, na margem, está dando uma proteção temporária para algumas indústrias que estão sendo dizimadas pela valorização da moeda. Vivemos no mundo possível, não no mundo doutrinário.

Qual é a importância de ter um brasileiro liderando a OMC? O Brasil pode levar para a OMC uma abordagem pragmática, não doutrinária, que é uma evolução da proposta radical de livre mercado --é assim a política econômica do Brasil atualmente. Então ter um brasileiro no comando da OMC é muito positivo.

O sr. classifica os países de mercantilistas ou liberais. Em que faixa se situa o Brasil?
O Brasil é uma boa mistura -- usa regras liberais em seu sistema financeiro, políticas monetária e cambial, mas é mais mercantilista no que se refere às políticas industriais, proteção por tarifas, regras de conteúdo local e uso do BNDES. Talvez precise de menos liberalismo no fronte macroeconômico e mais no fronte comercial.

Como rasgar dinheiro, no caso, o seu.


Mais um caso para a série “Como rasgar dinheiro”:

Em 2012, lá no meu Ceará, foi inaugurado um aeroporto na cidade de Aracati a um custo de R$ 23.000.000,00. A pista do aeroporto é maior do que a de Congonhas, um "pequeno" aeroporto que atende à cidade de São Paulo.

É triste saber que até hoje não existe companhia aérea que atenda no aeroporto de Aracati, ficando o local aguardando voos que chegarão de Marte. 


Gestão de dinheiro público é coisa séria. Pense nisso agora e em 2014.   

Fonte: Revista EXAME.

domingo, 5 de maio de 2013

BC acompanhar superavit é erro.


SAMUEL PESSÔA, doutor em economia e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, em sua coluna na FOLHA DE S. PAULO, escreve que o superavit primário não é o conceito correto para avaliar o impacto do setor público sobre a economia.

Peço desculpas ao leitor, mas o tema hoje é particularmente aborrecido. Trata-se, no entanto, de questão muito relevante para o adequado manejo da política monetária.

No dia 25 passado, o Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central divulgou a ata da 174ª reunião, que ocorrera em 16 e 17. Nessa oportunidade, o Copom decidira (com dois votos contrários e seis favoráveis) que era o momento de iniciar um ciclo de elevação dos juros. A taxa Selic foi elevada em 0,25 ponto percentual, de 7,25% para 7,50%. Os interessados podem ler a ata no site do BC (http://www.bcb.gov.br/?COPOM174).

No 16º parágrafo, na seção "Avaliação prospectiva das tendências de inflação", o Copom apresenta para a sociedade o valor com o qual trabalha para o superavit primário consolidado do setor público.

Segue o texto: "Em relação à política fiscal, considera-se como hipótese de trabalho a geração de superavit primário de R$ 155,9 bilhões em 2013, conforme os parâmetros da LDO-2913 (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Para 2014, admite-se, como hipótese de trabalho, a geração de superavit primário de R$ 167,4 bilhões, conforme parâmetros constantes do PLDO-2014 (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias)".

Ou seja, o Copom considera em suas projeções que a meta cheia de superavit primário de 3,1% do PIB será observada.

O superavit primário é a diferença entre a receita pública total e os gastos do setor público exclusive juros. Se o primário for maior do que o pagamento de juros, a dívida pública encolhe em termos absolutos. Se for menor, a dívida cresce.

Nesse último caso, se o primário como proporção do PIB for maior que a diferença entre a taxa de juros média que o setor público remunera sua dívida e a taxa de crescimento do produto, a dívida como percentual do PIB reduz-se. A dívida pública ano após ano tornar-se-á um fardo mais leve de ser carregado.

Ou seja, o superavit primário é o conceito relevante para avaliarmos a evolução do endividamento do setor público. Em particular, a receita pública que resulta da venda pelo setor público de uma empresa ou de reservas petrolíferas aumenta o superavit primário.

O problema é que essa receita pública é diferente da receita de impostos. O imposto é uma dedução da renda de um indivíduo. Assim, quando o setor público coleta renda de um agente econômico por meio de um imposto, o setor público reduz a renda disponível para o gasto desse agente. Com isso, o setor público contribui para reduzir a demanda da economia.

Quando o setor público vende uma empresa, não há redução de renda de ninguém. Alguém tinha recursos monetários que foram transferidos ao setor público. Este, em troca, transferiu a propriedade da empresa. Essa operação não altera a renda do setor público nem a renda do setor privado.

Portanto, a receita de privatização não reduz a renda do setor privado disponível para gasto. Há diversas receitas que são contabilizadas no conceito de superavit primário, mas que não contribuem para reduzir a demanda agregada.

Dado que a preocupação do BC é com o controle da inflação, ele não deveria acompanhar o superavit primário. Do ponto de vista do controle inflacionário, o BC tem que saber qual é o balanço líquido entre as ações do setor público que reduzem a demanda, por exemplo elevação dos impostos, e as ações que elevam a demanda, por exemplo elevação do gasto público.

Além de o superavit primário não ser o conceito correto para avaliar o impacto do setor público sobre a demanda agregada na economia, há algumas possibilidades legais que tornam a distância do primário de um indicador de demanda do setor público ainda maior.

Por exemplo, decidiu-se há alguns anos que os investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) podem ser excluídos do cômputo do primário para efeitos de atendimento da meta estabelecida em lei. Os gastos com o PAC, apesar dos efeitos benéficos sobre a inflação no longo prazo, no curto prazo elevam a demanda agregada e, portanto, devem ser considerados.

É urgente que o BC construa um indicador do impacto do setor público sobre a demanda da economia, divulgue sua metodologia e seu cenário para o indicador e o utilize em suas projeções.

Inflação: tolerância zero hoje e boas notícias em 2014.



Em recente pronunciamento no Dia do Trabalho, a presidente Dilma Rousseff disse que "o Brasil seguirá na rota de crescimento com estabilidade, distribuição de renda e diminuição das desigualdades, lutando pela redução de impostos e pela diminuição dos custos para o produtor e o consumidor".

“É mais do que óbvio que um governo que age assim e uma presidenta que pensa desta maneira não vão descuidar nunca do controle da inflação. Esta é uma luta constante, imutável, permanente. Não abandonaremos jamais os pilares da nossa política econômica, que têm por base o crescimento sustentado e a estabilidade”, afirmou.

Esperamos que sim, presidente, pois como nos alerta o genial Sinfrônio no nosso cearense Diário do Nordeste, a inflação não dorme em serviço e com ela não podemos ter uma conversa amigável. Se tivermos hoje tolerância zero com a inflação, boas notícias teremos para 2014.  


sábado, 4 de maio de 2013

Como rasgar dinheiro no Brasil: o governo arrecada, gasta mal e quem perde é você.


Do Jornal Nacional de hoje leia a matéria abaixo e questione como o governo gasta o seu, o meu, o nosso dinheiro. Alguém acredita que se fosse uma iniciativa privada o investidor deixaria o dinheiro dele indo literalmente para o LIXO

Acorda Brasil. Neste caso são "apenas" R$ 20.000.000,00 "investidos", mas acredito que temos "outras" obras nessas condições. Por falar nisso, como está a transposição do Rio São Francisco?      

Um terminal de pesca pronto há três anos está vazio em Manaus porque as autoridades não se entendem sobre quem deve administrar os armazéns. Enquanto isso, o peixe que não é vendido na hora vai para o lixo.

Toneladas de peixe jogadas fora. Sem ter onde estocar a produção, pescadores de Manaus usam o porão dos barcos. Mas os peixes acabam estragando e vão parar no lixo. Tudo isso com um terminal pesqueiro novinho em folha.

O lugar foi construído com dinheiro público, está pronto há três anos, mas não funciona. "Foi um investimento iniciado em 2005 e até hoje não foi inaugurado o terminal pesqueiro", diz Walzenir Falcão, presidente da Federação dos Pescadores do Amazonas

Faz tanto tempo que a obra acabou que os tanques estão cheios de teia de aranha. O galpão que deveria receber o pescado está completamente vazio. As câmaras frigoríficas estão prontinhas, mas, desde 2010, ninguém decide quem vai equipar e administrar o terminal.

A balsa de atracação e o galpão para estocagem do pescado foram construídos a partir de acordos entre a prefeitura de Manaus, Ministério da Pesca e Ministério dos Transportes. Já foram gastos R$ 20 milhões.

O Ministério dos Transportes diz que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), que fez a obra, vai repassar o terminal para o Ministério da Pesca. O Ministério da Pesca diz que não é o responsável e que vai apenas equipar o terminal. A prefeitura diz que, por questões burocráticas, ainda não pode assumir a administração.

"Infelizmente não foi repassado pra prefeitura. Estamos aguardando este processo que está em tramitação. E nós da prefeitura temos o maior interesse de administrar", aponta Jefferson Praia, secretário de Abastecimento de Manaus.

Enquanto não sai uma solução, pescadores decidiram invadir o terminal. Eles atracam os barcos mesmo antes da liberação.

terça-feira, 30 de abril de 2013

Situação fiscal e cambial no Brasil.


Delfim Netto, na FOLHA, comenta a atual situação fiscal e cambial brasileira.

A situação fiscal da economia brasileira e o seu equilíbrio externo apresentam alguns sinais nebulosos. Nada que possa ser considerado ameaçador no curto prazo, mas cuja evolução exige cuidado. O último "Fiscal Monitor do FMI" ("Fiscal Adjustment in a Uncertain World", April 2013) compara a situação fiscal dos países do mundo entre 2008 (o ano em que se iniciou a crise que teima em não terminar) e 2012.

A situação do Brasil revela três fatos importantes: 1º) a crise não produziu um aumento substancial da relação dívida pública bruta/PIB; 2º) esta estabilizou-se em nível desconfortável quando comparada com a dos outros países emergentes; e 3º) a relação dívida pública líquida/PIB é muito mais alta do que a deles. 

Os efeitos do nível de endividamento e das exigências de seu financiamento devem exercer alguma pressão sobre a formação da taxa de juros real. Por outro lado, como a participação do financiamento externo é relativamente baixo, tudo se passa hoje como se o Brasil estivesse endividado em sua própria moeda, o que reduz o seu risco. O problema é que a nossa relação dívida pública bruta/PIB continua igual ao dobro da dos países emergentes. É a quarta mais elevada do mundo.

Um fato curioso é revelado pelos números da tabela: a queda da relação entre a dívida líquida e a dívida bruta. Vemos que em 2008 ela era menos discrepante da média dos países emergentes (69% contra 60%, ou seja, 15% de diferença). Em 2012 a distância aumentou (70% contra 51%, ou seja, 37% de diferença). Isso sugere que provavelmente estamos misturando um pouco menos do que deveríamos, de dívida "bruta" no cálculo da "líquida". É claro que a situação não é a mesma de 2008 (basta olhar para a acumulação de reservas), mas é inegável que sem adequado esclarecimento, criam-se dúvidas sobre a situação fiscal.

Para se ter uma ideia do que significa uma dívida pública bruta/PIB de 68,5%, basta lembrar que antes da crise (2008), essa era a relação na Alemanha, 66,8% (hoje é de 90,3%), e na França, de 68,2% (hoje é de 92,9%). De qualquer forma não acreditamos que a correção eleve a relação dívida líquida/PIB em muito mais do que 3% ou 4%. A questão é que ela já é muito elevada quando comparada com a média dos outros países emergentes (35,2% contra 24,7%).

Uma boa solução para melhorar a credibilidade dos números fiscais, que sentiram os efeitos das inúteis manobras contábeis, seria aprovar o projeto de lei que cria o Conselho de Gestão Fiscal. Estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal, dorme esquecido no Congresso há pelo menos uma década.

O segundo assunto que ocupou o tempo dos analistas na última semana foram os resultados do balanço de transações correntes do primeiro trimestre, que atingiu 4,31% do PIB, contra 2,41% no seu homólogo de 2012. A balança comercial revelou redução de US$ 7,6 bilhões e depende de esclarecimento sobre os registros das importações da Petrobras.

As previsões do BC para o ano são menos sombrias: superávit comercial de US$ 15 bilhões, com as exportações crescendo 8,6%, e as importações, 11,6%. A estimativa para o déficit em transações correntes é da ordem de US$ 67 bilhões, quase igual ao montante dos investimentos diretos esperados para 2013, algo como US$ 65 bilhões. Entretanto, com as incertezas que cercam a economia, é natural que esses números sejam vistos com certa desconfiança.

Tal resultado não deveria ser surpresa, porque o comportamento da taxa de câmbio nominal e o salário nominal, ambos produto das próprias políticas social e econômica (ver gráfico), produziu fantástica valorização do câmbio real (a relação entre o câmbio nominal o salário real). Ela explica boa parte do persistente aumento do déficit em transações correntes. Um significativo montante desse déficit financia o consumo e não o investimento, o que tem sérias implicações para o longo prazo.

As alterações do câmbio real levam, em média, dois anos para influir no déficit em transações correntes. É o tempo que nos resta - em condições normais de pressão e temperatura - para reduzi-lo a partir de 2015.

Análise das contas públicas.


ÍTALO MARTINS, pesquisador do Centro de Conjuntura e Política Econômica da Unicamp e PEDRO ROSSI, professor do Instituto de Economia da Unicamp, analisaram a atual situação da política fiscal para a FOLHA DE S. PAULO.

Os números recentes da arrecadação federal devem ser compreendidos no âmbito de uma mudança do papel da política fiscal como instrumento de política econômica.

Esta passou a ter três frentes de atuação.

A primeira segue a concepção keynesiana, que atribui à política fiscal o papel de afetar a demanda agregada no curto prazo de forma anticíclica.

Desde a crise de 2008, o governo brasileiro tem feito uso anticíclico da política fiscal principalmente por meio de desonerações de setores estratégicos, como o setor automobilístico e o da linha branca.

O objetivo, nesse caso, é estimular a demanda nesses setores, que possuem encadeamentos produtivos importantes, e, com isso, promover o crescimento econômico.

A outra frente de atuação da política fiscal tem o intuito de fomentar a competitividade da indústria brasileira e se expressa nas medidas de desonerações da folha de pagamento de vários setores industriais e aquelas associadas ao Plano Brasil Maior.

Nesse contexto, a política fiscal é utilizada como instrumento de política industrial, com o objetivo de atenuar a perda de competitividade recente da indústria brasileira, decorrente, entre outras coisas, do longo período de câmbio apreciado.

Assim, não se pode caracterizar tal política como meramente anticíclica, mas uma política de cunho estrutural, que se utiliza da política tributária com objetivos de médio e longo prazo.

Por fim, a terceira frente de atuação da política fiscal consiste nas desonerações em setores estratégicos, não para estimular demanda, mas com a finalidade de atenuar a pressão inflacionária e, assim, dar suporte à política monetária.

Entre os exemplos recentes, está a redução de tributos da cesta básica.

Nos três casos tratados, o instrumento fiscal utilizado foi a redução de tributos, redução essa que se desdobrou como queda de arrecadação nesse trimestre.

Apesar disso, a continuidade dessa nova política fiscal, mais flexível e abrangente, pode ser assegurada com a retomada do crescimento econômico.

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart na Folha: falhas econômicas.


Até a FOLHA registra em editorial o caso Rogoff e Reinhart.

A descoberta de erros em um estudo publicado em 2010 pelos economistas Kenneth Rogoff e Carmen Reinhart desencadeou grande polêmica sobre um problema macroeconômico: qual a relação entre o tamanho das dívidas e o crescimento da economia?

Em termos simples, a divisão teórica e política se refere a como governos já endividados devem reagir à lerdeza econômica.

É justificável aumentar ainda mais o endividamento, a fim de estimular a retomada do crescimento? Ou os governos devem gastar menos, para evitar problemas maiores, como inflação e desconfiança dos investidores (credores), entre outros, que poderiam solapar a economia no futuro?

Rogoff e Reinhart são professores de Harvard, autores de um respeitado estudo sobre crises financeiras ("Desta Vez é Diferente?"). Entre outras conclusões, no artigo afirmam que a relação entre a dívida do governo e o ritmo da economia não é muito relevante até um limite. Quando o endividamento supera 90% do PIB, o crescimento é severamente reduzido.

Recentemente, pesquisadores da Universidade de Massachusetts, liderados por um estudante de pós-graduação, descobriram naquele trabalho erros no uso de um programa de computador, omissão de dados e aplicação indevida de técnicas estatísticas. Mas tais falhas, bastante prosaicas, apenas reavivaram controvérsia mais séria, que vinha desde a crise de 2008.

Uma crítica essencial a Rogoff-Reinhard trata da direção da causalidade: a dívida causa baixo crescimento ou o contrário? Governos de países que crescem pouco têm receitas menores. Assim, aumentam o deficit, contraindo dívidas. De resto, o tamanho relativo do débito não diminui se uma economia não cresce.

Apesar dessas dúvidas conhecidas, o artigo dos economistas de Harvard tornou-se munição das escaramuças políticas. Reforçou os argumentos dos defensores da austeridade, da redução da dívida, em especial na União Europeia.

O episódio convida à reflexão sobre o consumo desses estudos. Cada pesquisa, por mais séria que seja, é uma contribuição preliminar, pelo menos até ser incorporada ao conjunto maior da teoria, e sempre passível de correção futura.

Qualquer aplicação científica, em particular nas ciências sociais, precisa levar em conta contextos. O sucesso de estudos e teorias muitas vezes está condicionado ao interesse social, econômico ou político que eles podem legitimar. 

domingo, 28 de abril de 2013

Feira do Livro em Belém.

Para quem está em Belém e gosta de uma ótima leitura a dica é passar na Feira Pan-Amazônica do Livro, em cartaz de 26/04 a 06/05/2013. Bom domingo e ótimas leituras! 

Brasil: ontem e hoje, nada muda OU A diferença entre Adam Smith e o Visconde de Cairu OU Capitalismo à Brasileira.


Indiferente de gostar ou não de ler o Elio Gaspari na FOLHA, a verdade é que ele tem sempre algo desconhecido a nos revelar. Abaixo um assunto relacionado a nossa turma e, retornando ao passado, pense se, no presente, o "capitalismo brasileiro" é muito diferente do padrão adotado em séculos passados... 

Adam Smith (1723-1790), o pai da economia moderna, vivia do seu trabalho como professor e diretor de uma alfândega. Quando interrompeu um curso, tentou devolver o dinheiro das aulas que não deu. Ensinou ao mundo as virtudes da "mão invisível" do mercado. Seu similar nacional, o Visconde de Cairu (1756-1835), conseguiu sua aposentadoria pública aos 50 anos e foi o primeiro professor de "ciência econômica" de Pindorama. Ganhava 400 mil réis (mais a aposentadoria), mas nunca deu uma aula. Cairu descobriu outra mão invisível, aquela que tira dinheiro de quem não o tem e o coloca no bolso de quem o tem. 

terça-feira, 23 de abril de 2013

Inflação no Brasil.


Nosso conhecido OLIVIER BLANCHARD concedeu uma longa entrevista ao VALOR ECONÔMICO conforme matéria abaixo. Os principais trechos da entrevista estão no site do jornal.   
  
O crescimento potencial do Brasil parece mais baixo do que se pensava, diz o economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), Olivier Blanchard, referindo-se ao ritmo de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) que não acelera a inflação. Para ele, se a economia brasileira estivesse muito abaixo do potencial, o país veria a inflação cair mais. "Com isso, a margem de manobra para usar políticas de estímulo à demanda é provavelmente limitada", afirma Blanchard, lembrando que o FMI reduziu a previsão de crescimento para a economia brasileira em 2013 de 3,5% para 3%. Gargalos de infraestrutura e no mercado de trabalho foram apontados pelos economistas da instituição como restrições de oferta importantes que afetam o país.

O economista francês diz ainda que o desempenho mais fraco do Brasil no passado recente tem grande relação com o comportamento frustrante do investimento. "É provável que um número de distorções, assim como alguma incerteza sobre políticas, tenham um papel nisso", disse Blanchard ao Valor, em meio à maratona de encontros e seminários da reunião de primavera do FMI e do Banco Mundial, realizada na semana passada em Washington.
Blanchard diz ainda que países emergentes como o Brasil devem "ser livres" para suavizar movimentos de recursos externos mais voláteis, usando "instrumentos de administração de fluxos de capitais, medidas macroprudenciais e intervenção no mercado de câmbio". Alguns desses capitais são desestabilizadores, afirma, observando, contudo, que parte do dinheiro que chega de fora vem por um bom motivo - aproveitar as perspectivas mais favoráveis dos mercados emergentes.

Para ele, aliás, o Brasil não abandonou o regime de câmbio flutuante. "Eu chamaria de flutuação administrada. O real flutua, mas com o uso de controle de capitais", diz Blanchard, um dos principais responsáveis pela adoção de ideias mais flexíveis pelo FMI no pós-crise, como o apoio a controles de capitais em determinadas circunstâncias e a recomendação para que alguns países não exagerem na dose da austeridade fiscal.

Para Blanchard, a recuperação americana mostra sinais robustos, pelo lado do setor privado. O país vai crescer quase 2% mesmo com o ajuste fiscal equivalendo a uma contração de 1,8% do PIB. O economista elogia também a política monetária japonesa, e não a encara como uma medida voltada para produzir uma desvalorização competitiva do câmbio, mas sim para de fato tirar o país da deflação.

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