MOISÉS
NAÍM, hoje na FOLHA DE S. PAULO, comparando a América Latina e a Europa.
Algumas
semanas atrás, participei de uma reunião em Bruxelas que coincidiu com a cúpula
em que líderes europeus traçaram o plano para estabilizar o velho continente.
Também por coincidência, muitas das delegações à cúpula estavam hospedadas no
hotel em que minha reunião -que não era ligada à cúpula- estava tendo lugar.
Inevitavelmente,
ao final do dia ou durante o café da manhã, vários colegas e eu conversávamos
informalmente com amigos que trabalham nas equipes técnicas que dão apoio às
negociações de alto nível.
As
histórias, a ansiedade e a exaustão deles (trabalhavam sem parar havia vários
meses) trouxeram de volta muitas memórias: numa carreira anterior, eu estive
envolvido em um processo semelhante em meu próprio país, a Venezuela, e depois
trabalhei no Banco Mundial e estive próximo de negociações semelhantes em
outros países.
Em
Bruxelas, fiquei fascinado com as semelhanças entre a crise europeia e as que
testemunhei no passado. Mas fiquei ainda mais surpreso ao constatar que as
autoridades europeias ignoravam as experiências de outros países com crises.
Qualquer
sugestão de que poderia haver lições úteis a tirar das crises de dívida
latino-americanas era rejeitada educadamente, mas com firmeza. "A Europa é
diferente" foi a reação automática deles. "Temos o euro; nossas
economias e sistemas financeiros são diferentes, assim como nossa política e
cultura."
Isso
tudo é verdade. Mas há outras realidades que também são verdade. Entre 1980 e
2003, a América Latina sofreu 38 crises econômicas, e a região -suas
autoridades, os reguladores e, sim, até mesmo o público e os políticos-
aprendeu com esses episódios dolorosos.
Talvez
a lição principal seja o que eu chamo "o poder do pacote". O
"pacote" é um conjunto abrangente, maciço, digno de crédito e
sustentável de medidas, que não oferece só cortes e austeridade, mas também
crescimento, redes de segurança social, reformas estruturais, empregos e
esperança para o futuro.
Decisões
econômicas fragmentadas, tomadas em partes e frequentemente contraditórias não
funcionam. Elas são muito tentadoras, porque criam a ilusão de uma solução que
evita as medidas mais impopulares. Mas, mais cedo do que tarde, a realidade
teima em mostrar que as medidas parciais não estão funcionando, que se
desperdiçaram tempo e dinheiro e que outra coisa se faz necessária.
E
essa outra coisa é o pacote abrangente, que inclui remédios fortes para todos
os males que afetam a economia: dívida demais, gastos governamentais demais,
bancos insuficientemente capitalizados, supervisão ineficiente, políticas
fiscal e monetária não coordenadas, baixa competitividade internacional e
regras que inibem o investimento e a geração de empregos.
Quando
críticos descrevem a crise europeia como sendo "semelhante à
latino-americana", pensam na América Latina que sofreu as crises, não na
que sabe como evitá-las.
Hoje,
a maioria dos países latino-americanos tem economias em crescimento e bancos
sólidos. O que desejamos para a Europa é que suas economias comecem a
assemelhar-se mais às da nova América Latina e menos às da velha Europa.
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