Leio hoje na FOLHA artigo do Professor Delfim Netto elogiando a mais nova sensação do mundo econômico nos últimos dias: o livro do Thomas Piketty.
A Folha prestou mais um
grande serviço traduzindo e publicando na semana passada (26/4) longa e
excelente resenha assinada por um competente provocador, o economista Paul
Krugman, de um livro destinado a ser um clássico. Trata-se de "Le Capital
au XXIe Siècle" (o capital no século 21), de Thomas Piketty, agora
traduzido para o inglês. Krugman acredita que ele vai mudar duas coisas: como
pensamos a sociedade e como fazemos teoria econômica.
Piketty está nos EUA,
numa espécie de "road show" de seu livro, em que expõe a indecente e
quase inacreditável concentração da renda e da riqueza do 1% (e do 0,1%) dos
americanos mais ricos. Num auditório lotado, foi sabatinado e aplaudido por dois
Prêmios Nobel: Joseph Stiglitz e o próprio Krugman. Como de costume, a esquerda
apressada viu nisso o espectro de Marx, e a direita retardada, apenas o
resultado do mérito!
Os números de Piketty
sugerem que o "capitalismo competitivo" está dando lugar a um "capitalismo
patrimonialista". É importante insistir que ele rejeita toda grande
história com suas leis determinísticas. A concentração da renda é, basicamente,
resultado de decisões do sistema político. Em palavras que não são de Piketty,
o processo civilizatório depende de um jogo paciente e dialético entre duas
instituições fundamentais: a urna (em que cada cidadão tem apenas o seu voto) e
o mercado (no qual cada cidadão tem votos proporcionais à sua riqueza), que
exige que elas sejam independentes entre si, o que não é um problema trivial.
Se o mercado se apropria da urna, o processo civilizatório entra em estagnação
ou em regressão. Se a urna se apropria do mercado, temos o populismo, que
termina no autoritarismo.
Nos EUA, Piketty afirmou:
"Acredito na propriedade privada, mas o capitalismo e o mercado devem ser
escravos da democracia, e não o oposto". Ao contrário do que pensam alguns
economistas, o amadurecimento do capitalismo não leva, necessariamente, à maior
igualdade ou à maior liberdade de iniciativa, duas componentes essenciais do
processo civilizatório.
Não é trivial porque o
controle político tem, por natureza, de procurar sua perpetuação e reprodução.
Estamos diante de um problema que só pode ser resolvido por uma profunda
reforma institucional. Por exemplo, o Senado, que é mais facilmente capturado
pelo "mercado", deve ter apenas o poder revisor para equilibrar a
Federação. O senador não deve ter iniciativa legislativa e, muito menos,
suplente. E o deputado deve ser escolhido por uma forma de eleição distrital,
para que o custo de campanha seja muito menor e visível aos eleitores.
Esperemos que alguma
editora enfrente a tarefa de traduzir e publicar o livro de Piketty.
Nenhum comentário:
Postar um comentário