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quarta-feira, 7 de março de 2012

Mudanças na política monetária?


MARIO MESQUITA,  doutor em economia pela Universidade de Oxford, escreveu este artigo na FOLHA DE S. PAULO.

Reportagens recentes sugerem que uma das razões para manter, ou quiçá aprofundar, a trajetória de redução das taxas de juros seria o fato de que o grosso da pressão inflacionária estaria associado aos preços dos serviços, que correspondem a cerca de um terço do IPCA (índice oficial de inflação), ao passo que os demais itens teriam inflação bem comportada.

Trata-se de uma variação surrada do tema da inflação estrutural, contra a qual nada pode ou deve ser feito. Essa é uma tese que tem popularidade impressionante na nossa região, que é também a que tem um dos piores históricos inflacionários do mundo, com o Brasil em papel de destaque.

Os países da Ásia, para sua sorte, nunca se empolgaram muito com esse atalho latino-americano, e decidiram perseguir o crescimento acelerado sem abrir mão da estabilidade de preços. Mas por aqui a tese da inflação estrutural ou inevitável ainda campeia.

Para ser geograficamente preciso, contudo, cabe reconhecer que a tese da inflação estrutural tem perdido seu "appeal" na parte setentrional da América Latina.

O Banco do México, por exemplo, tem recorrentemente notado em seus documentos oficiais que a inflação subjacente de serviços é aquela que melhor reflete os determinantes domésticos da inflação.

É fato que a inflação de serviços tem maior persistência do que a de mercadorias, mas ela é também menos sensível a fatores externos -à chamada inflação importada. É por essa razão que a maioria dos bancos centrais olha com atenção para a dinâmica de preços de serviços.

Outra forma de encarar o problema é notar que as medidas de núcleos de inflação por exclusão, no Brasil e em outros países, em geral descontam do índice cheio a variação de itens mais voláteis, como alimentos perecíveis e combustíveis, mas não o preço dos serviços.

Cabe notar também que, se a dinâmica dos preços de serviços manifesta inércia e reflete em parte indexação informal à inflação passada, é porque não conseguimos reduzir a inflação para um patamar que torne essas práticas obsoletas.

De fato, é plausível supor que a indexação só não é mais generalizada porque em diversos setores da economia a concorrência efetiva, ou temida, dos importados a tem inibido -evidentemente, maior protecionismo tenderia a favorecer o recrudescimento da indexação também nos mercados de produtos.

É verdade, também, que fatores estruturais, típicos do processo de desenvolvimento, tendem a promover a elevação dos preços dos serviços, mas, se isso ocorre com inflação de serviços a 5%, 6% ou 9%, como agora no Brasil, depende também da posição da política monetária.

Em suma, não faria sentido calibrar a política monetária apenas para conter a inflação dos serviços, mas excluí-la do conjunto de informações relevantes não parece razoável.

As inovações no campo do debate doméstico sobre política monetária não param por aí. Nas últimas semanas voltou a emergir a corrente dos que defendem que a política monetária deve dar peso não apenas à inflação e à atividade mas também à taxa de câmbio (é isso, um instrumento e três objetivos).

Mesmo que consideremos que o Banco Central dispõe também de instrumentos macroprudenciais, como sugerem muitas leituras da crise mundial de 2008, continuaríamos com um objetivo de sobra. Não parece muito sensato esperar tanto de uma só instituição.

Nesse ambiente, não surpreende que reine certa confusão no processo de formação de expectativas dos investidores sobre qual seria a real função da autoridade monetária no atual arcabouço de política -justiça seja feita, essa confusão não deriva dos documentos oficiais do Banco Central, ou de pronunciamentos de seus dirigentes, que mantém o compromisso com o regime de metas para a inflação.

Mas a confusão existe, influencia os preços de ativos e reflete ao menos em parte as sugestões de outras áreas do governo e de círculos alegadamente próximos ao poder.

Há limites para o que a comunicação oficial pode conseguir, e essa confusão acabará sendo dirimida pelas decisões a serem tomadas proximamente pelas autoridades.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Expectativas assimétricas.


MARIO MESQUITA, hoje na FOLHA DE S. PAULO, comenta que o  FMI e economistas preveem cenário pessimista para o desempenho da economia mundial em 2012

A economia mundial deve ter um desempenho razoável, segundo as mais recentes projeções dos economistas do FMI, em 2012. A taxa de crescimento mundial deve situar-se próxima de 4%, marginalmente acima daquela observada em 2011, abaixo das taxas vigentes em 2006/7 (média de 5,3%) e bem acima das taxas de 2,8% e de -0,7% de 2008 e de 2009.

Considerando-se grandes blocos e regiões, o crescimento mundial seguiria, na visão daquela instituição multilateral, sendo liderado pelas economias emergentes, com expansão esperada de 6,1%, sendo 8% na Ásia e 4% na América Latina, ao passo que as economias avançadas teriam crescimento bem mais modesto, de 1,9%, sendo somente 1,1% na zona do euro -que, se as projeções se materializarem, apenas em 2012 terá, por margem estreita, superado a contração de 2008.

Olhando os demais componentes do G4, espera-se crescimento de 1,8% para os EUA em 2012, ante 1,5% em 2011, 2,3% para o Japão, com recuperação expressiva, para os padrões japoneses, depois do terremoto e do tsunami de 2011, quando o PIB deve ter queda de 0,5%. Já a China deve desacelerar para 9% em 2012, ante 9,5% em 2011.

Em resumo, nada muito alentador, mas tampouco desastroso. Ocorre que o próprio Fundo alerta, em suas "Perspectivas Econômicas Mundiais", que os riscos para essas projeções são predominantemente negativos.

Nisso os economistas do FMI estão em boa companhia. Os mais renomados economistas têm, e não é de agora, disputado uma corrida para estabelecer quem é mais pessimista. Em um ambiente de recriminações sobre o papel, dúvidas (excessivas) sobre os fundamentos da profissão, os economistas embarcaram na onda da austeridade e das expectativas deprimidas. Essa atitude, apesar de ter um elemento de "efeito manada", pode perfeitamente estar correta. Os desafios perante a economia mundial são de fato bastante severos.

Nos EUA, temos um ambiente econômico complexo, com recuperação modesta e decepcionante no que se refere à geração de empregos. Aos problemas estruturais da desalavancagem das famílias e do setor imobiliário, pode se somar uma política fiscal contracionista, mais por conta do ambiente político carregado do que por decisão do governo Obama, que provavelmente teria de ser compensada por novas iniciativas do Fed (o BC do EUA).

A Europa vive, mais do que uma crise da dívida, uma crise política (quem determina as decisões de política fiscal da Itália, Roma ou Bruxelas, ou Frankfurt?) bem como uma crise estrutural -como fazer para que a periferia mediterrânea volte a crescer? A falta de informações claras sobre tais questões sugere que o nervosismo dos mercados com a situação do continente tende a persistir.

Mais recentemente, até a China tornou-se objeto de alguma preocupação. Nesse caso, a temática vai desde temores quanto a um pouso forçado, ou seja, crescimento mais para 7% do que para 9%, até uma possível crise financeira derivada do descontrole das finanças dos governos locais e seus efeitos sobre o sistema bancário.

Diante desse quadro, o predomínio do pessimismo é natural e de certa forma prudente -ninguém quer ser acusado de esquecer ou ignorar os chamados "downside risks". A concentração de opiniões nessa região pode, entretanto, apresentar situações interessantes. Em particular, a atual configuração de preços de ativos, em que pese a alta generalizada desde setembro, parece refletir não um cenário central parecido com aquele apresentado pelo FMI, mas sim os diversos riscos negativos que pairam no ar.

Nesse contexto, os economistas diriam que o pessimismo reflete um cenário central insosso e em especial um balanço de riscos para o crescimento mundial desfavorável. Por sua vez, os operadores de mercado diriam que, apesar de as preocupações listadas serem pertinentes, a posição técnica do pessimismo, que concentra a ampla maioria da opinião informada, é desfavorável -nesses momentos de consenso aparentemente inabalável, as mudanças de opinião podem ser substanciais e se traduzir em ajustes expressivos dos preços.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

De volta para o futuro.

MARIO MESQUITA, 45, doutor em economia pela Universidade de Oxford, escreveu hoje na FOLHA DE S. PAULO, sobre “DE VOLTA PARA O FUTURO.”

Observadores atentos da conjuntura econômica têm notado o saudosismo pelos anos 1970 que, aparentemente, permeia certos círculos. Na visão idealizada, o Brasil era, na época, uma ilha de prosperidade, em marcha forçada rumo a um destino glorioso.

O Estado, onipotente e onisciente, determinava o nível da taxa de câmbio, escolhia setores a desenvolver, bem como as empresas que liderariam esse processo, com farta utilização de crédito subsidiado, não raramente a taxas de juros reais negativas. A economia vivia além de suas possibilidades, como atestavam a ampliação do deficit em conta-corrente e a aceleração da inflação - aliás, controlar a inflação era algo que o Estado não prometia, nem, a rigor, tentava com muita convicção.

Tal estratégia, como sabemos, deu errado. Os anos 1970 do Brasil potência foram seguidos pelos anos 1980 da bancarrota nacional, pelo calote na dívida externa, pela explosão hiperinflacionária, pela desorganização da vida econômica e, não surpreendentemente, pelo colapso do investimento.

A despeito da herança ruim, um aspecto do arcabouço de política econômica "setentista" parece exercer atração permanente sobre certos economistas, especificamente o seu caráter discricionário.

A política econômica discricionária é cambiante, ora mira um objetivo, por exemplo a taxa de câmbio, ora outro, por exemplo, a inflação, seguindo a prioridade do momento determinada pelo governo. Ou então atira para todos os lados ao mesmo tempo, em uma cacofonia de metas e instrumentos.

Evidentemente, nesse ambiente discricionário a incerteza é maior, afinal de contas a sociedade não sabe com certeza o que se passa com as autoridades, logo os agentes econômicos demandam prêmios de risco mais elevados, o que leva à elevação das taxas de juros de mercado e ao encurtamento dos horizontes de planejamento e dos prazos.

A lição dos anos 1970, em termos de política econômica, é do valor da humildade. Em vez de ter autoridades onipotentes interferindo nos mais diversos aspectos da vida econômica, é melhor adotar regras que disciplinem a política econômica, aumentem a previsibilidade e, consequentemente, reduzam os prêmios de risco.

O fracasso do modelo discricionário nos anos 1970 levou a regimes de discricionariedade limitada, dos quais o melhor exemplo talvez seja o regime de metas para a inflação.

Nesse regime, o governo estabelece a meta para a política monetária, no caso um objetivo quantitativo para a inflação, e o BC tem autonomia para calibrar seus instrumentos de política, basicamente a taxa de juros, de forma a atingir esse objetivo.

Atribuir à autoridade monetária um outro objetivo, seja ele preservar um piso mínimo para a taxa de crescimento ou controlar as flutuações da taxa de câmbio, representa, na prática, um enfraquecimento do regime de metas para a inflação e uma guinada em direção de um regime mais discricionário.

Pode-se argumentar, contudo, que a crise de 2008 teria demonstrado a falência dos regimes puristas de política monetária e que nas atuais circunstâncias seria mais adequado reverter a uma política mais discricionária e ativista.

Tais argumentos seriam mais convincentes se a gênese da crise não estivesse, ao menos em parte, na política monetária americana, justamente uma das poucas, entre as praticadas nas economias maduras, que continuaram sendo pautadas, no ponto de vista institucional e legal, por seu caráter discricionário.

Uma narrativa plausível das origens da crise é que a política monetária nos EUA, visando combinar a estabilidade monetária com metas para crescimento e emprego, acabou tolerando um perigoso boom de preços de ativos, que, em um ambiente regulatório permissivo, gerou fragilidades sistêmicas severas.

Caso o Fed tivesse uma meta explícita para a inflação, de preferência definida em termos da inflação efetiva, e não de medidas "ad hoc" de núcleo inflacionário, então a atitude de política monetária provavelmente teria sido mais restritiva, e a acumulação de riscos no sistema financeiro, mais moderada.

Copiar os aspectos mais controversos da política monetária americana, como amparo para uma volta ao voluntarismo dos anos 70, parece, portanto, uma estratégia de alto risco, baseada em uma leitura tendenciosa das origens da crise.

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...