Mais, do melhor da Economia, para o nosso domingo, um artigo do nosso colega YOSHIAKI NAKANO, também diretor da nossa FGV, no ESTADÃO, com o sugestivo nome: CÂMBIO MATA.
"Inflação aleija, câmbio mata" - alerta de Mario Henrique Simonsen que continua válido para o grupo de países dependentes de condições internacionais para seu crescimento. São dependentes porque não conseguem traçar a própria trajetória; têm horizonte temporal curto, portanto não planejam a longo prazo, privilegiando sempre o consumo imediato em detrimento da poupança, ou seja, investimento com recursos próprios. Incorrem em déficits em transações correntes, endividamento externo e crises de balanço de pagamento, interrompendo repetidamente o seu crescimento. Com essa nova apreciação excessiva da taxa de câmbio, cabe alertar: por que mata o crescimento?
Parece fora de propósito falar em crise de balanço de endividamento externo e de balanço de pagamento quando o Brasil tem mais de US$ 200 bilhões de reserva cambial, a situação das contas externas é boa e o risco Brasil está num nível muito baixo. Mas o Brasil ainda não tem a característica fundamental de países que crescem persistentemente para alcançar os países desenvolvidos: horizonte temporal longo para tomada de decisões de política econômica. Não respeitamos ensinamentos básicos da teoria econômica: para crescer é preciso elevadas taxas de investimento e poupança.
Países que crescem persistentemente privilegiam os investimentos que ampliam a capacidade produtiva em vez do consumo imediato; as exportações diversificadas de manufaturados para construir uma estrutura produtiva moderna, enfrentando os próprios países desenvolvidos, e poder importar bens de capital para trazer o conhecimento e a fronteira tecnológica para o país sem se endividar. A taxa de câmbio mata esse processo porque é o preço-chave nessas economias.
A taxa real de câmbio define a escala de comparação entre os preços de todos os produtos nacionais em relação aos do resto do mundo. País que privilegia o consumo imediato prefere câmbio apreciado, pois os importados ficam mais baratos relativamente aos nacionais. Taxa de câmbio determina preços relativos macroeconômicos que definem a alocação de recursos ("tradables" x "non-tradables"), a distribuição de renda (lucro x salário, ou seja, poupança x consumo) e a demanda agregada (tirar proveito ou não da ampla e elástica demanda externa).
A taxa nominal de câmbio é preço de um ativo financeiro, a moeda nacional - assim é âncora nominal do sistema de preços e afeta a inflação tanto via custos como canal de transmissão da política monetária, e pode ser usado também para controlar as expectativas no mercado.
Assim, permitir a apreciação e a flutuação excessiva da taxa de câmbio é uma escolha entre consumo imediato ou crescimento; entre importar e transferir emprego para o exterior ou construir uma estrutura produtiva nacional competitiva e gerar emprego no país; entre flutuações na taxa de inflação ou estabilidade de preços; entre ganho imediato e único no salário real ou aumento contínuo nos salários acompanhado de aumento de produtividade; entre especulação, falso e momentâneo fortalecimento da moeda nacional (ancorado nos ciclos de fluxo de capitais) e instabilidade ou estabilidade no mercado financeiro e fortalecimento da moeda ancorado nos fundamentos (sistemáticos superávits transações correntes).