sábado, 24 de agosto de 2013

Dólar em alta traz desafios para a política monetária.

Editorial do VALOR ECONÔMICO de 23.08.2013 analisa a atual situação da economia brasileira.

A acelerada desvalorização do real, se não for parcialmente revertida logo, fará estragos nos índices de preços, que há tempos não vão bem. O país estava diante de opções ruins, agora exacerbadas pelo descolamento do câmbio - um ciclo de alta de juros para derrubar a inflação, com efeito contracionista em uma economia que relutava em crescer bem.

O câmbio maltrata países e economistas igualmente. É ainda mais difícil fazer prognósticos em meio a uma mudança dos padrões monetários do porte da que fará o Federal Reserve americano, em meio a turbulências e mercados nervosos. Nessas circunstâncias, "overshootings" são inevitáveis e a moeda brasileira está perto deles, após o uso de cerca de US$ 40 bilhões em swaps e, em dose pequena, linhas de câmbio. Uma parte da sobrevalorização do real já fora descontada com a correção de cerca de 20% realizada em 2012. Com os desequilíbrios já existentes na economia brasileira e outros amplificados pela dinâmica da instabilidade movida pela reversão de fluxos de capital, a cotação do dólar tem, sem dúvida, combustível para subir até onde a irracionalidade permitir, para depois se acomodar. O que interessa é o novo ponto de equilíbrio - um enigma.

Com a cotação de fim de período do mês de julho, de R$ 2,2897 ou pela média do mês, de R$ 2,2522, a moeda brasileira estava bem perto de zerar sua valorização. O índice da taxa efetiva real (com IPCA de deflator) naquele mês foi de 94, já próximo dos 100 de 2005 ou de junho de 1994. Isto é, uma diferença de 6,3%, o que pode sugerir, a grosso modo, que por esse parâmetro uma "boa" cotação estaria na casa dos R$ 2,40 a R$ 2,45. O Fundo Monetário Internacional estimou valorização de 10% a 15% do real em relação à cotação de maio, de R$ 2,03, indicando uma posição de algum equilíbrio com o dólar entre R$ 2,25 e R$ 2,35.

Há outros cálculos mais sofisticados e números para variados gostos. As previsões são feitas sob terrenos movediços, ao suporem que os juros dos títulos do Tesouro americano, que subiram para 2,88%, estacionem aí. O Itaú projeta câmbio a R$ 2,45 no fim do ano, com inflação de 6,1% e o Bradesco, em R$ 2,30 com os preços correndo a 5,9%. Ou seja, parece razoável supor que o câmbio pode momentaneamente escapar bastante dessas duas balizas, mas depois estacionará entre elas.

Os problemas causados por essa correção, porém, são desagradáveis. A correção dos combustíveis parece ser inevitável, como já se convenceu o governo, e só com esse reajuste, dificilmente a inflação será inferior aos 5,8% de 2012, uma meta que o Banco Central vem perseguindo com o ciclo de alta de juros. Ao que tudo indica, o esforço dos juros terá de ser maior para obter esse mesmo resultado. Dólar em alta costuma ser acompanhado por commodities em baixa, mas não foi isso que ocorreu em julho e no trimestre, quando o índice elaborado pelo BC evoluiu 2,27% e 8,32%, respectivamente. Não há disparada à vista, mas há pouca chance de recuos relevantes, que ajudem a conter os índices de preços.

O aumento dos juros busca contrair a demanda em uma economia que tem mostrado pouca disposição para elevar seu ritmo de crescimento. A disparada do dólar trouxe um ingrediente de pessimismo adicional aos já baixos índices de confiança de empresários e consumidores, que provocaram retração da demanda e, até certo ponto, também dos investimentos. Como os fatores negativos, nessas circunstâncias, aparecerão antes que os positivos - aumento das exportações, que tirará a indústria de sua letargia, fim da fogueira de preços no setor de serviços, por exemplo - é possível que a política de aperto terá de sacrificar mais o crescimento do que se previa antes das tempestades nos mercados de moedas.

O rearranjo do dólar e dos juros no mercado internacional, por outro lado, tornou mais difíceis as captações externas e reduziu muito o fluxo de ingressos no país em um momento em que o déficit em conta corrente sobe e a balança comercial arrasta um déficit ao longo do ano. Com isso, ficará mais trabalhoso fechar as contas externas, embora não haja, de novo, desastres à vista.

Na véspera de grandes guinadas na economia global, o Brasil parece estar sempre com a casa desarrumada. Na crise de 2008, o desequilíbrio se exprimia em juros lunares e taxa de câmbio apreciada. Agora, vive-se os efeitos de uma errada política fiscal cíclica e de tolerância com a inflação.

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