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sexta-feira, 11 de março de 2011

Os sinais que vêm do mercado.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, alerta hoje na FOLHA DE S. PAULO para “os sinais que vêm do mercado.”
Uma das qualidades de uma economia de mercado é a transparência com que eventuais problemas que ocorrem são percebidos. Isso permite que sejam tratados antes que se tornem graves ou crônicos.
Sistemas econômicos com pouca presença das forças de mercado acabam sendo surpreendidos -de tempos em tempos- por crises muito mais graves do que as que atingem economias abertas. Os acontecimentos recentes no Egito e em outros países do Oriente Médio são uma prova disso.
Mas quem reconhece as vantagens de uma economia de mercado deve entender também que ela está sujeita a certas desfuncionalidades criadas por essa liberdade de escolha. Se o Egito nos lembra a primeira alternativa, a crise financeira que atingiu a Europa e os Estados Unidos nos mostra a outra.
Por isso, sou defensor convicto de uma economia de mercado com forte presença do Estado na sua regulação e fiscalização. Temos no Brasil de hoje um dos exemplos mais bem-sucedidos dessa combinação de mercado com uma regulação que busca evitar distorções que derivam da maximização dos lucros pelo setor privado.
O sistema de telefonia brasileiro é um dos mais eficientes do mundo, do ponto de vista da competição, ao mesmo tempo em que a universalização compulsória de seus serviços o obriga a ir além de seus interesses meramente comerciais.
Na contramão da experiência brasileira temos o caso mexicano, em que a privatização do monopólio público levou o proprietário dessa empresa ao posto de homem mais rico do mundo.
Essas minhas reflexões estão relacionadas com a questão dos gargalos que estão se formando -já há algum tempo- na infraestrutura econômica no Brasil. Na semana passada, fui testemunha de um deles. Ao chegar de uma viagem ao exterior, nas primeiras horas da manhã do domingo de Carnaval, pude observar o estado da área de estacionamento do aeroporto de Guarulhos. Um verdadeiro caos, com automóveis estacionados nos lugares mais incríveis por falta de espaço.
Com meu raciocínio de engenheiro ainda intacto, imaginei o que aconteceria caso a Infraero realizasse uma licitação para um -ou mais- edifício-garagem naquela área. Seriam fixados no edital de licitação alguns parâmetros, como o número de vagas a serem implantadas e o prazo para sua construção, deixando a tarifa como a variável de sucesso no leilão. Poderia também ser determinada uma participação da Infraero na receita de exploração da concessão.
Embalado por meus pensamentos, imaginei que o mesmo procedimento poderia ser feito -inclusive ao mesmo tempo- em outros aeroportos pelo Brasil. Temos hoje um volume de capitais privados suficiente para financiar os investimentos necessários a esse ambicioso projeto.
O governo ficaria com o controle das operações aéreas, com as atividades ligadas à segurança e ao controle e com a fiscalização dos concessionários para garantir as cláusulas de proteção do consumidor dos serviços aeroportuários. Já o concessionário privado ficaria responsável pelos custos do investimento -pois isso será de seu interesse- e a operação dos serviços, evitando até as tradicionais tentativas de superfaturamento.
A Infraero -e o Tesouro- não teria de investir nenhum tostão e ainda teria um fluxo garantido de receita para financiar a operação em pequenos e médios aeroportos espalhados pelo Brasil.
Ainda nos meus sonhos, via essa mesma equação -tão simples como eficiente- sendo levada a outros setores, como o das estradas de rodagem, o dos portos. Embora com um grau de complexidade maior, seria possível também estender esse sistema de parceria público-privada para o importante setor de ferrovias, principalmente as vinculadas ao sistema logístico do país. Nesse caso, o papel do BNDES seria crucial, como já foi no caso da Ferronorte.
Mas, infelizmente, caí na real, quando um amigo com quem conversava me lembrou da campanha de Lula em 2006 e da demonização das privatizações do período FHC.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O medo esta de volta.

Hoje na FOLHA DE S. PAULO, na excelente avaliação de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, o medo está de volta.

Os mercados financeiros voltaram a viver dias de grande insegurança e ansiedade. Há três anos, em janeiro de 2008, teve início um longo período em que a volatilidade dos preços dos principais ativos financeiros fugiu dos padrões históricos anteriores.

Como sempre ocorre em eventos como esse, foi um drama pessoal que gerou a faísca que acabou incendiando um ambiente dominado pela especulação sem controle.

A descoberta de uma perda gigante - mais de US$ 4 bilhões - no banco francês Société Générale gerou uma crise de confiança no sistema bancário dos países desenvolvidos que culminou com a quebra do banco Lehman Brothers nos EUA.

A crise bancária que se seguiu fez com que as economias de todo o mundo mergulhassem no vazio de uma recessão econômica só vista nos anos 30 do século passado.

Graças a uma ação coordenada dos governos de vários países - inclusive o brasileiro - ao longo dos últimos dois anos, o pior cenário previsto pelos apocalípticos de plantão não ocorreu.

Pouco a pouco, a atividade econômica recuperou-se sob a ação de estímulos fiscais e monetários. Sempre seguindo os conselhos, que andavam meio esquecidos, do brilhante John Maynard Keynes. Primeiro foram os países emergentes, que, suportados pelos gastos dos consumidores, retomaram o caminho do crescimento. Um prêmio merecido por não terem participado da verdadeira farra do boi da especulação imobiliária e de crédito da maioria dos países ricos. Estavam nesse grupo países como Brasil, Austrália, China e Índia.

Nos últimos meses de 2010, mesmo as economias que mais sofreram com a ruptura da bolha de crédito, como a dos EUA, começaram a dar sinais de uma recuperação sólida e duradoura.

O encolhimento do crédito bancário terminou, o medo do desemprego foi sendo substituído por um moderado otimismo dos consumidores e os investimentos privados em algumas áreas voltaram ao normal. Tanto isso é verdade que as estimativas feitas ao fim do ano apontavam crescimento do PIB mundial superior ao dos anos anteriores à quebra do Lehman Brothers.

Mas as economias mais avançadas ainda precisam, para perenizar essa nova fase, da manutenção por mais algum tempo de condições financeiras favoráveis. Por isso, os bancos centrais na área do G7 continuam a manter os juros muito baixos e a liquidez bastante abundante. Talvez apenas em 2012 é que tenhamos as primeiras decisões de aumento dos juros.

Por tudo isso é que a disparada dos preços do petróleo, gerada pela crise política no Oriente Médio, trouxe de volta a insegurança às Bolsas de Valores e aos mercados de juros e câmbio em todo o mundo.

De um lado, ela afeta a renda do consumidor dos países do mundo desenvolvido, tanto pelo aumento desses gastos como pelas incertezas em relação ao futuro. De outro, ela chega aos países emergentes pelo impacto dos preços dos derivados de petróleo na inflação já bastante elevada.

De qualquer forma, tanto em economia como no caso de doenças humanas, sabemos que uma recidiva sempre ocorre com maior vigor e perigo que no caso da doença original. Esse cenário alternativo faz com que a maioria das apostas que os investidores vinham fazendo em relação ao futuro seja posta em xeque. Se antes era esperada uma elevação gradual dos juros nos Estados Unidos por conta da volta do crescimento, agora pode ocorrer o contrário caso a crise do petróleo se agrave ainda mais.

Da mesma forma, o movimento de valorização das ações das empresas americanas em razão de uma retomada dos lucros pode ser substituído por uma queda das cotações devido a uma nova recessão mundial.

Em momentos como este que estamos vivendo, quando cenários antagônicos podem ocorrer devido a eventos impossíveis de prever, o melhor conselho que posso dar ao leitor é o de pôr as barbas de molho. Isso quer dizer: dê prioridade à preservação de seu capital - e não a sua multiplicação.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O VOLUNTARISMO DO PT NA ECONOMIA

Ha dias nao leio o mestre LUIZ CARLOS MENDONCA DE BARROS, porem hoje na FOLHA DE S. PAULO, ele dedica-se a explicar a visao de economia do PT no poder.
Os mercados acompanham com interesse as primeiras ações do governo Dilma. Pequenas decisões ou movimentos mais relevantes da nova equipe instalada no Palácio do Planalto têm grande repercussão no vaivém dos mercados.
Afinal, o Brasil é uma das economias emergentes com maior visibilidade entre os investidores internacionais. Em 2010 fez parte -pela primeira vez- do seleto grupo dos dez países que mais receberam investimentos diretos estrangeiros.
O maior foco da atenção dos analistas tem sido a decisão do Copom sobre juros, a questão do salário mínimo e o corte de despesas no Orçamento fiscal para 2011. Não tenho visto, entretanto, uma análise mais estrutural de como será a gestão da economia nos próximos anos.
Talvez porque o sucesso do governo Lula tenha cristalizado a visão de que o governo do PT segue hoje o receituário econômico de Fernando Henrique Cardoso e ponto final.
Não é essa a minha impressão.
Embora aceite que os valores socialistas mais radicais, que dominaram o PT durante a fase fora do poder, estão hoje superados, entendo que sua visão da economia ainda é a de um grupo de esquerda democrática clássica.
O principal elemento do pensamento desse grupo é o de um voluntarismo da ação do governo na busca do crescimento acelerado.
Gosto da imagem sobre o comportamento do Exército francês na fase inicial da 1ª Guerra Mundial para descrever esse ativismo de grande parte dos governos de esquerda. Era o chamado ""élan", palavra francesa para descrever ""o ímpeto" como a força principal que movia os soldados franceses nas trincheiras da Europa.
No caso dos governos, como o da nossa presidente, a teoria do élan se aplica à busca do crescimento econômico. Nessa versão, as mortíferas metralhadoras alemãs são substituídas por limitações de natureza financeira e econômica que aparecem em uma economia de mercado nos momentos de boom.
Cito dois exemplos clássicos e que já ocorrem neste Brasil no início de 2011: o quase pleno emprego no mercado de trabalho e o deficit financeiro em nossas transações comerciais com o exterior.
O principal motivo dessas verdadeiras armadilhas, em que caem os governos mais tradicionais de esquerda -e é a história que nos mostra isso-, é a incapacidade de seus economistas em aceitar que movimentos importantes em uma economia de mercado acontecem em momentos diferentes. Os economistas chamam de "lags" esses espaços de tempo que ocorrem entre ações dos agentes econômicos -inclusive governos- e seus impactos nos vários mercados.
O exemplo da relação entre consumo e investimento em uma economia como a brasileira é um dos mais importantes para mim. Com o consumo das famílias e do governo em expansão vigorosa, já há alguns anos, começam a aparecer gargalos em vários setores da economia.
Como existe um grande otimismo em relação ao futuro, as empresas -e o governo- estão dispostas a investir na expansão de suas fábricas ou usinas hidrelétricas ou na exploração do petróleo do pré-sal.
Acontece que, durante um tempo, os gastos com investimentos produtivos se confundem com os de consumo, tornando ainda maior a pressão sobre fatores escassos como mão de obra, transportes e energia.
Somente após algum tempo -normalmente longo- esses gastos cessam e temos um aumento da oferta de bens e serviços. No caso do mercado de trabalho, essa armadilha é ainda mais delicada porque o tempo necessário para treinar e formar novos trabalhadores com alguma qualificação é muito elevado.
Vivemos essa situação no Brasil de hoje e, mesmo assim, o nosso ministro da Fazenda vem a público dizer que a meta do governo é crescer 5,5% nos próximos anos.
Isso não acontecerá sem que a inflação se acelere de forma perigosa e o deficit em conta-corrente atravesse a fronteira do bom senso econômico. É preciso reduzir a demanda agregada nos próximos anos para permitir que os gastos de investimento sejam realizados sem pressão sobre os preços.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

"FED E O DESCONHECIDO"

Há dias tento postar este texto do LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, publicado na FOLHA DE S. PAULO, com o título ”FED E O DESCONHECIDO”. Boa leitura!!!

Como era esperado, o Federal Reserve americano decidiu aumentar o estímulo monetário via compra adicional de US$ 600 bilhões de títulos federais em circulação.

Chamado de QE2 - "quantitative easing 2" -, ele representa, na prática, uma clássica emissão de moeda que deve levar o valor do balanço do banco central americano para a incrível cifra de US$ 2,6 trilhões.

Para entender essa decisão do Fed - e ao mesmo tempo os receios de um grupo mais conservador de analistas econômicos -, é preciso ter em conta que estamos em um campo da economia muito pouco explorado na academia.

Afinal, uma recessão como a que estamos vivendo há mais de dois anos no mundo desenvolvido tem acontecido muito raramente.

Talvez apenas a que ocorreu na década de 30 do século passado tenha as mesmas características da crise atual. Mas nesses 80 anos o entendimento teórico de momentos como esse evoluiu muito pouco. São ainda as ideias e sugestões de Keynes que compõem o arcabouço teórico com que contam os governantes para reanimar a economia.

O presidente atual do Fed - Ben Bernanke - é um dos economistas que mais contribuíram para moldar um plano de ação para enfrentar recessões profundas como a de hoje. Mas mesmo ele dá claros sinais de estar agindo mais por intuição do que por firmeza conceitual.

Afinal, os juros de curto prazo estão praticamente a zero e os de médio e longo prazos não superam os 2,5% ao ano. Qual o efeito prático de aumentar ainda mais a liquidez se os bancos não se sentem com coragem de aumentar seus empréstimos a consumidores e a pequenas e médias empresas?

Alguns vão responder a essa questão dizendo que o objetivo maior do Fed é inundar a economia mundial com dólares e provocar uma corrida para outras moedas, forçando, na prática, a desvalorização da moeda americana. Por que um dólar mais fraco ajuda no combate à recessão? Porque os últimos meses trouxeram uma recuperação no consumo do americano médio, que é responsável por mais de dois terços do PIB nos EUA. Mas a recuperação do consumo acabou vazando para o exterior via importações, deixando as empresas americanas sem o apoio necessário para voltar a empregar.

Em agosto, o volume das importações americanas sem o petróleo voltou ao nível de antes da crise. É uma realidade terrível para um país que está com quase 10% de desemprego e fazendo um tremendo esforço fiscal para tentar recuperar o poder de compra dos cidadãos. Para a maioria dos americanos, o grande vilão dessa situação é a China, que não permite a valorização do yuan.

Outro canal importante que pode ser afetado por mais uma rodada de expansão monetária é o da expectativa de consumidores e empresários, via alta dos preços das ações em Wall Street. Existe uma correlação positiva clara entre essas duas variáveis, como mostram séries estatísticas conhecidas. Aliás, é o que vem acontecendo nas últimas semanas, quando os mercados se convenceram de que o Fed iria caminhar para o QE2.

Mas os benefícios dessa nova rodada de estímulo monetário podem ocasionar efeitos contrários importantes se parte dos analistas e gestores financeiros se assustar com uma possível volta da inflação no curto prazo.

Para esses, a inflação é um fenômeno essencialmente monetário e o excesso de liquidez que existe hoje -e que vai aumentar de forma importante nos próximos meses por ação do Fed - vai desembocar em um período de aumento de preços. Não rezo pela cartilha desses analistas, mas estou preocupado com a inflação em 2011 em partes do mundo mais aquecidas.

O excesso de liquidez que vivemos hoje está provocando uma pressão altista sobre os preços das commodities, tanto pelo canal das compras especulativas como pela demanda real das economias de mercado que voltaram a crescer.

Nesse quadro, se a economia norte-americana voltar a respirar por conta do QE2, a inflação pode realmente assustar.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

ACORDAR PARA UMA NOVA AGENDA.

Hoje na FOLHA DE S. PAULO, o engenheiro e economista LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, recomenda ”ACORDAR PARA UMA NOVA AGENDA”.
O analista das coisas da economia precisa tomar muito cuidado quando vive em períodos de grandes transformações estruturais. Nesses momentos, a dinâmica conjuntural de uma economia acaba sendo afetada de forma importante por esses fatores estruturais. No início os sinais dessa interferência são muito esparsos e de difícil visualização. Mas, com o caminhar do tempo, as coisas vão ficando mais claras e passam a ser percebidas por um número maior de observadores. Posteriormente o processo de mudanças ganha maturidade e permite uma visualização histórica, quando os indícios iniciais ganham contornos tão claros que mesmo o mais medíocre observador é capaz de entender o que está ocorrendo. Vivemos nos últimos dez anos um desses períodos de profundas transformações estruturais na economia mundial. Ousaria dizer que vivemos hoje momentos tão importantes como os anos seguintes ao fim da Segunda Guerra. A década dos 50 do século passado trouxe de forma inquestionável a ascensão dos EUA ao posto de maior economia no então chamado mundo livre. Hoje, 60 anos depois desse verdadeiro movimento tectônico na economia mundial, entramos em outra fase de rearranjo estrutural e que deve nos levar a um mundo econômico totalmente diferente do de hoje. Assistimos à emergência de uma nova potência -a China- e à mudança do centro econômico para o lado do Pacífico. Mas o que ocorre hoje atinge de forma diferente nosso querido Brasil. Na segunda metade do século passado, a economia brasileira era muito pequena e frágil e não conseguimos ser -sequer- um ator de terceira categoria no processo de redesenho do mundo. Nos dias de hoje, o Brasil é um agente importante no processo de mudanças e faz parte do seleto grupo de nações que vai formar o centro da economia mundial do futuro. Mas, para que possamos usar essas mudanças -em toda a sua intensidade- em benefício da sociedade, é preciso que o novo governo, que tomará posse no início do próximo ano, acorde para o que vem acontecendo fora de nossas fronteiras. E esse não me parece ser o comportamento dos dois candidatos à Presidência no segundo turno das eleições deste ano. Os principais pontos de uma política econômica para o futuro, levantados nos debates a que assistimos, não incorporam os novos desafios que teremos que enfrentar. As propostas continuam a tratar apenas de questões meramente conjunturais, como taxa de juros, política de salário mínimo e questões orçamentárias, entre outras. Sei que, em uma campanha eleitoral nas democracias modernas, é muito difícil que os candidatos tratem de problemas estruturais ou especulem sobre o mundo dentro de dez anos. Mas discutir o que fazer no próximo mandato presidencial, sem sequer fazer referência aos novos desafios -e oportunidades- que vamos encontrar pela frente e à necessidade de mudanças no "soft" econômico que tem sido utilizado, me incomoda muito. Talvez esse comportamento seja ditado pelo péssimo hábito do brasileiro -herdado de nossa cultura futebolística- de não mexer em time que está ganhando. Nos últimos anos a economia brasileira tem sido vitoriosa e motivo de inveja de muitas nações. Mas, para que isso continue, é necessário que se preste atenção ao mundo que deve existir na terceira década do século e que se adapte nossa política econômica vitoriosa a esta nova realidade. Tenho escrito com frequência sobre essa questão neste espaço na Folha. E pretendo continuar a fazê-lo como uma contribuição pessoal ao debate que me parece essencial. Não tenho a pretensão de escrever uma proposta tipo receita de bolo, pois não saberia ir além de alinhar algumas questões que me parecem essenciais. O que viveremos nos próximos anos nas economias brasileira e mundial não tem paralelo histórico. Por isso uma nova política econômica só será construída com debate sério e profundo sobre alternativas. A simples repetição de princípios e propostas tradicionais -seja à direita ou à esquerda do espectro político- não vai nos levar a uma solução eficiente dos problemas que vamos enfrentar.

domingo, 18 de julho de 2010

A IRRACIONALIDADE DO TREM-BALA.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, escreveu na FOLHA DE S. PAULO sobre “A irracionalidade do trem-bala.” É por essas e outras que continuo afirmando que o Brasil obterá mais prejuízos do que lucros sediando Copa e Olimpíada. Por isso, independentemente de ser a favor ou contra o projeto do trem-bala, a leitura deste artigo é obrigatória para quem deseja, de verdade, entender um pouco como funciona as prioridades do governo.

Com o fim da Copa do Mundo, os analistas começam a pensar sobre o Brasil pós-Lula. Diria que o correto seria pensar no Brasil pós-Fernando Henrique Cardoso/Lula, mas isso fica a critério de cada um. Sei que muitos defendem a exclusividade do atual presidente na construção do Brasil dos próximos dez anos, mas estou convencido da dupla paternidade de uma economia brasileira nova.
Preocupa-me muito algumas prioridades do governo atual e que, no caso de vitória da candidata do Planalto, certamente farão parte de sua agenda de trabalho. Elas revelam uma guinada em direção a um estatismo que pensava estar fora da agenda política no Brasil.
Uma nova Telebrás pública e uma Seguradora estatal são sinais claros desse movimento. Mas outra fonte de preocupação minha - e esta não tem nada a ver com questões ideológicas - nasce do critério que está por trás da política de investimentos na infraestrutura econômica do país.
A importância desse tema é hoje quase consensual entre os analistas e de seu encaminhamento correto depende a intensidade do crescimento econômico na próxima década. Se forem realizados investimentos racionais que reduzam os custos de logística e evitem a formação de gargalos de oferta na área de energia, o Brasil pode crescer algo como 6% ao ano por um longo período.
Mas alguns sinais da direção do governo Lula - e certamente de sua candidata - apontam para outro lado. Tomemos o caso do chamado trem-bala, cujo leilão de concessão está marcado para dezembro. Sou radicalmente contra essa decisão, que revela uma leitura errada das prioridades para o país.
Afinal, serão mais de R$ 60 bilhões de investimentos - dos quais a maior parte virá do setor público- em um projeto de retorno econômico muito inferior a uma série de outros existentes.
Para ficar apenas no campo das ferrovias, citaria três outros projetos de importância muito superior a esse trem-bala caboclo: um complexo logístico ligando, por ferrovia, o centro de Mato Grosso a um porto na costa do Pacífico - Peru ou Chile - e a complementação de duas ferrovias hoje já existentes: a Ferronorte, em Mato Grosso, e a Norte Sul, no Tocantins.
Esses três projetos, que exigiriam menos recursos do que o trem-bala, se bem estruturados permitiriam a mobilização de investimentos do setor privado sem subsídios e contribuiriam para a redução importante do "custo Brasil" nas exportações de uma série de produtos primários.
Nosso país passaria a contar com uma extensa rede de transporte barato ligando portos - a leste e a oeste do país - com importantes centros de produção. Uma olhada rápida para os benefícios que a ferrovia que liga Carajás ao porto de Itaqui, no Maranhão, trouxe à economia deveria fazer corar os defensores - no governo e fora del e- desse exótico trem-bala. Além disso, a ligação portuária no Pacífico transformaria o Brasil em um ator de peso na Ásia, o polo mais importante do crescimento mundial nas próximas décadas.
Para enfrentar a questão dos aeroportos de São Paulo existem outras alternativas - talvez menos excitantes mas, certamente, mais eficientes economicamente - que serviriam ao mesmo propósito. Essa talvez seja a única motivação racional desse custoso projeto, pois não existe nenhum ganho logístico em uma ligação por trem de alta velocidade entre São Paulo e o Rio de Janeiro. Basta ver o custo de operação da movimentação de carga no sistema TGV na França apesar de sua rede de trilhos ser muitas vezes maior do que a ligação Campinas-Rio de Janeiro.
E não me venham com a história da Copa e da Olimpíada para justificar esse elefante branco que o governo atual quer deixar como herança para o próximo presidente. Para um empreendimento da dimensão de um trem de alta velocidade - e que precisa de várias décadas para se viabilizar -, não será a demanda gerada por empreendimentos esportivos ao longo de poucas semanas que vai ser decisivo para seu sucesso.

sábado, 1 de maio de 2010

LUIZ CARLOS E O CRESCIMENTO BRASILEIRO.

Em artigo na FOLHA DE S. PAULO, o economista LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS escreve sobre UM NOVO CICLO ECONÔMICO NO BRASIL.

A MB ASSOCIADOS acaba de publicar um interessante estudo sobre o crescimento brasileiro. A variação do PIB -medida do lado da demanda- nos mostra que o Brasil viveu duas fases distintas nos últimos dez anos: de 2000 a 2005 e de 2006 a 2010. Considerada a década como um todo, o crescimento do PIB pode ser explicado em 70% pelo consumo das famílias, em 20% pelo consumo do governo e em 13% pela formação bruta de capital fixo. Para fechar esse quadro de demanda interna, as importações foram maiores do que as exportações em 3% do PIB. Mas esse mesmo exercício para o período 2006/2010 mostra um quadro bem diferente. O consumo das famílias passa a explicar 85% do crescimento do PIB, com o consumo do governo caindo para 18% e os investimentos representando 16,4%. Para fechar a conta, as exportações líquidas negativas representaram 19,2% do PIB. Nos últimos cinco anos, o consumo interno total -governo mais famílias- ultrapassou o valor do PIB brasileiro. O pouco investimento realizado nestes cinco anos foi todo ele financiado com poupança externa. Em outras palavras, nos últimos cinco anos os brasileiros viveram o papel de cigarras, e não de formigas. Mas o economista Sergio Vale, da MB, construiu uma projeção desses componentes de demanda para os primeiros cinco anos da nova década. Como premissa, considerou um crescimento real de 10% ao ano para o volume de investimentos em capital fixo no Brasil. Além disso, trouxe a participação do consumo das famílias no PIB para o número médio de 70% e reduziu o consumo do governo para 17% do PIB. Nessas hipóteses, o setor externo continuará sendo a variável de ajuste para fazer o consumo caber no PIB. Os números obtidos por Sergio Vale, da MB, apenas quantificam o que alguns analistas vêm advertindo há algum tempo: não é possível continuar com essa farra do boi de consumismo que é a marca mais importante dos últimos cinco anos. Ter o consumo das famílias brasileiras representando 85% do crescimento PIB é uma irresponsabilidade que vai cobrar um preço elevadíssimo em futuro próximo. Mais ainda, ter a soma do consumo do governo e das famílias maior do que o PIB é uma situação insustentável no médio prazo. Daí resulta o ponto mais assustador do exercício da MB: mesmo com uma redução do consumo das famílias e do governo e um aumento mínimo no investimento de capital fixo, a deterioração de nossa conta-corrente pode chegar a níveis perigosos. Uma bela sinuca de bico para o próximo presidente da República. Quero terminar fazendo uma homenagem a meus filhos Marcello e Daniel. Depois de 12 anos no controle acionário da Link Investimentos, período em que ela alcançou a posição de maior corretora de valores independente no Brasil, eles e seus companheiros venderam a empresa para o banco suíço UBS. Acompanhei -como pai e conselheiro- toda a vida da Link, sofrendo juntos quando aloprados do PT resolveram acusá-los de utilização de informações privilegiadas fornecidas por mim -à época eu era ministro do governo FHC-, e agora, nos longos meses em que concretizaram a difícil decisão de vender a empresa. Neste novo Brasil internacionalizado, é muito difícil um grupo brasileiro de médio porte e líder de mercado ficar independente. Acho que tomaram a decisão correta.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

ECONOMIA BRASILEIRA E IMPORTAÇÕES.

Para os meus quase dois (milhões de) fiéis e devotados leitores/dia, hoje, 23/04/10, na FOLHA DE S. PAULO, o economista e engenheiro LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS escreve sobre a evolução da "ECONOMIA BRASILEIRA E IMPORTAÇÕES" e sua preocupação com o deficit em conta-corrente. Afinal, os dados do BACEN mostram que o país teve deficit de US$ 12,145 bilhões nas transações com o exterior (contas correntes) no primeiro trimestre do ano, o pior desempenho para o período desde 1947.
Ao longo dos últimos anos tenho acompanhado com muito entusiasmo a evolução da economia brasileira
Afinal, depois de muito tempo podia sentir que caminhávamos finalmente na direção de uma economia de mercado eficiente e moderna. Acordei para essa nova realidade - ou como gosto de chamar, para esse novo metabolismo econômico - em 2005, ao incorporar os elevados saldos comerciais dos anos anteriores à minha análise dos anos que viriam. Com uma nova dinâmica de preços e quantidades - devido principalmente ao crescimento da economia chinesa -, as exportações de produtos primários criavam condições para que o Brasil pudesse superar três décadas de fragilidade em suas contas externas.
Convencido de que o fenômeno China poderia ser projetado pelo menos para a década seguinte, passei a trabalhar com um cenário mais agressivo de abertura da economia brasileira. Minha vivência com empresas e empresários tinha me ensinado que a razão mais forte para o baixo coeficiente de importações no Brasil era o medo do futuro da taxa de câmbio.
Presenciei em várias ocasiões - dentro e fora do governo - os prejuízos daqueles que, acreditando na estabilidade da moeda brasileira, haviam incorporado produtos importados às suas cadeias produtivas e de distribuição. Sempre surpreendidos por uma desvalorização de grandes proporções, os que usavam fornecedores externos acabavam voltando atrás a cada frustração e depois de grandes perdas.
A partir de 2005, portanto, não tive mais dúvidas de que em um cenário de moeda nacional forte e com baixa volatilidade o movimento de integração produtiva com o exterior iria crescer de forma continuada.
As estatísticas do comércio exterior brasileiro nos primeiros três meses de 2010 mostram que eu tinha razão nas minhas projeções. Cinco anos depois do início dessa nova fase do real, as importações de componentes e de bens finais estão literalmente explodindo.
Uma das medidas usadas para quantificar a abertura da economia é a diferença física entre o valor das exportações e das importações. Até 2005, essa diferença era positiva, ou seja, o comércio exterior do Brasil representava uma fonte de demanda para a economia. A partir de 2005, de maneira ainda muito tímida, a quantidade importada passou a crescer mais rápido que a exportada. Em outras palavras, o comércio exterior brasileiro passava a ser uma fonte de oferta interna de bens e não de demanda, em termos líquidos.
Esse número veio crescendo de forma gradual, porém contínua, ao longo do tempo. Pouco antes da crise do banco Lehman Brothers, em setembro de 2008, as importações líquidas chegaram a subtrair três pontos percentuais do PIB, o que é um número muito grande. Com a crise bancária americana, a tendência foi temporariamente estancada, mas já em meados de 2009 as importações voltaram a crescer rapidamente.
Agora, conhecidos os números do primeiro trimestre, podemos ver que o processo de abertura continua com vigor. A diferença entre compras e vendas ao exterior já é de quatro pontos do PIB, e deve continuar a crescer. O próximo governo vai ter de olhar para esse movimento com atenção. Como tudo em economia, o aumento do coeficiente de importações tem aspectos bons e ruins. Do lado positivo há o aumento do consumo com menor pressão inflacionária. Mas o crescente déficit em conta-corrente deixará o país mais exposto aos humores do capital financeiro.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

A ECONOMIA BRASILEIRA EM 2010.

Mais uma vez, diretamente da FOLHA DE S. PAULO, vale ler com atenção “A ECONOMIA DO PAÍS EM DIREÇÃO AO MURO”, do economista e engenheiro LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS.

A aceleração do crescimento econômico no Brasil começa a me assustar. Com base nos dados do primeiro trimestre deste ano, um grupo de analistas já fala em crescimento do PIB de mais de 7% em 2010. Nós, na Quest Investimentos, ainda não chegamos a tal, talvez porque meus colegas sejam mais cautelosos do que eu... O crescimento da demanda interna pode ficar próximo a 10% em 2010. As importações respondem por essa diferença entre PIB e a chamada absorção interna. Mas elas acomodam a demanda aquecida apenas no grupo dos chamados bens "tradables", isto é, aqueles que podem ser comprados em outros países. A maior parte da oferta na economia brasileira é constituída por bens e serviços que não podem ser importados. O mais importante deles é o mercado de trabalho e nele é que está a componente mais ameaçadora que vejo para a frente. Também a infraestrutura econômica não está preparada para acomodar tal crescimento econômico. Afinal, são quase oito anos sem investimentos federais relevantes. Poderemos chegar ao fim deste ano com uma taxa de desemprego da ordem de 6%, mantido o crescimento atual da geração de postos de trabalho. Em março, o número de empregos formais aumentou em 266 mil, número muito forte para o mês. O ministro do Trabalho, encantado com o próprio sucesso, disse ontem que esse número deve se repetir neste mês. Dada a composição da oferta de mão de obra no país, a desocupação ainda elevada esconde uma situação de escassez nas faixas profissionais mais qualificadas. A pressão sobre os salários desse segmento dos trabalhadores já está ocorrendo e deve se acelerar. Na construção civil, um dos pontos mais aquecidos da economia, os salários já estão crescendo a mais de 10% ao ano. Mas outros sinais também alertam o analista mais cuidadoso. São evidências de instabilidade grave. Dou um exemplo: a produção de caminhões da Mercedes-Benz brasileira em março foi o dobro da matriz na Alemanha. Mesmo com a crise na Alemanha esse número é um aleijão para mim. Minha experiência profissional diz que estamos entrando em um daqueles momentos em que a euforia do brasileiro -aqui incluído trabalhadores, empresários e governo- vai nos levar a bater no muro das restrições econômicas. E a inflação é o problema mais grave que vamos enfrentar. Não me surpreenderia se, em poucos meses, estivermos falando de uma taxa de inflação, 12 meses à frente, superior a 6% ao ano. O governo -que teve atuação exemplar durante a curta crise que vivemos- entrou agora na defesa de uma macroeconomia keynesiana utópica e muito perigosa. Segundo a equipe econômica, os investimentos privados estão acontecendo e devem assegurar o equilíbrio entre oferta e demanda. São os eternos canarinhos que voam no universo dos economistas brasileiros. Já vi esse filme no passado e posso assegurar ao leitor que o final será triste. Por outro lado, a dinâmica eleitoral esta criando uma onda de benesses que apenas agrava o quadro de superaquecimento. Contabilizem os aumentos de gastos que estão saindo do Congresso nesses últimos meses e façam as contas. Isso joga mais lenha na fogueira da demanda privada. Para tentar esfriar o entusiasmo de todos, parece restar apenas a atuação do Banco Central. Mas trazer de volta o senso do real nesta altura do campeonato apenas com juros mais elevados será uma tarefa difícil e com prazo longo de maturação.

sábado, 13 de março de 2010

CAPITALISMO - CRISE?

No artigo do LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, uma frase para toda uma eternidade: “Recuperei um pouco de meu sangue-frio ao me lembrar de uma frase dita por um grande e sábio amigo meu: "Não aposte contra o capitalismo, pois você vai quebrar a cara."

domingo, 7 de fevereiro de 2010

ESCLARECENDO A ECONOMIA

Já que postamos hoje um artigo do irmão dele, vamos para a entrevista que LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS concedeu a FOLHA DE S. PAULO sobre um assunto que estamos acompanhando diariamente: CÂMBIO.

O Banco Central deixou o dólar subir até R$ 1,90, ao sabor das turbulências das últimas semanas, mas não terá outra escolha além de intervir vendendo a moeda para dar liquidez ao mercado de câmbio, segundo o ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros. Para ele, vai chegar o momento em que o dólar vai bater na inflação. "Não tenha dúvida de que o BC vai vender. Vai fazer atrasado, como sempre, mas vai." O dólar saltou de R$ 1,73 para R$ 1,89 em quatro semanas.

Mendonção, como é conhecido, vê uma segunda fase da crise global, agravada neste início de ano por uma "guinada populista" do governo Barack Obama, nos EUA, com objetivo de enfrentar a oposição republicana que radicalizou e ameaça tomar conta do Congresso. Essa guinada leva o governo americano a tomar medidas de apelo popular, como controle maior dos bancos, que podem emperrar a recuperação.

Na Europa, as dificuldades enfrentadas pelos Piigs (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha) para rolar suas dívidas, associadas a um quadro de baixo crescimento, deverão "enterrar" as ambições de transformar o euro em uma moeda forte, alternativa ao dólar. E o Brasil vai bem, segue o "queridinho" do mercado, mas sofrerá com esse rearranjo global.

FOLHA - Estamos vivendo uma segunda fase da crise?

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS - O quadro é ruim. Existe uma incerteza muito grande em relação aos países do G7. Apareceram alguns problemas adicionais, principalmente de natureza política. Nos EUA, a partir da derrota democrata em Massachusetts [na eleição de um membro para o Senado], o governo Obama começou a adotar uma linha um pouco mais populista. O problema é que tem uma eleição no final do ano para renovar o Congresso. Pode acontecer de os republicanos dominarem o Congresso.

Isso vai ser complicado para o governo Obama, porque a economia americana ainda vai precisar de alguma ajuda de natureza fiscal. A questão política está muito acirrada nos EUA. A ala mais radical tomou conta do Partido Republicano e eles querem simplesmente acabar com o Obama.

É mais um mal-estar que veio se agregar a essa insegurança econômica. Já tinha a situação difícil na Europa.

FOLHA - Por que só agora as dificuldades de países como Grécia parecem preocupar? Qual será a salvação para essas economias?

BARROS - Desde a formação da União Europeia não se sabia bem como seria o arranjo de regras únicas num universo de países e sociedades tão diferentes. E esta crise obrigou os governos da Europa a incorrer em deficit muito grande para segurar o sistema bancário. Acontece que os países mais periféricos, que não têm a mesma credibilidade que Alemanha e França, começaram a ter problema de credibilidade na rolagem da dívida. Na Europa, embora a moeda seja unificada, os títulos públicos são nacionais. Aí, começou a crise no tal dos Piigs [Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha]; e o mais frágil deles é a Grécia, que também tem problemas políticos.

Quando há algum bicho ferido, os chacais do mercado financeiro vão em cima mesmo... Foi o que aconteceu nessas últimas três semanas. Foram em cima da Grécia, e depois partiram para Irlanda e Portugal, que são pequenos. Agora chegaram até a Espanha, que não é tão pequena assim. Então, veio à tona esse problema de como se ajustam as economias nacionais com esse arranjo que eles têm. Todo mundo sabe que a Europa já tem problema de recuperação econômica e agora tem esse outro. A partir daí, é especulação do mercado. A gente sabe pelos relatórios que a liquidez caiu muito e que eles estão nas mãos do especulador.

As pessoas achavam que esse problema do deficit dos europeus só viria daqui a dois ou três anos. Apareceu, vai ficar aí e vai precisar de uma solução. E a solução é um sistema de ajuda mútua. Outra coisa é que aquele pessoal que pensava entrar na UE, como Polônia e Letônia, pode tirar o cavalinho da chuva. E o Reino Unido, que estava fora, agora que não entra mesmo.

FOLHA - Como esse quadro pode ser revertido? Qual o principal fator?

BARROS - Saiu um dado de emprego bom nos EUA, que precisa ainda de confirmação. O setor de serviços já gerou emprego, o industrial, também. Falta ainda o setor imobiliário. A taxa de desemprego caiu -muita gente deixa de procurar vaga quando o quadro está ruim-, mas não dá para dizer que mudou a tendência.

Nos EUA, é fundamental que mude a tendência do mercado de trabalho. Há 130 milhões de pessoas trabalhando e entre 14 e 15 milhões de desempregados. O cara que está empregado fica de olho no vizinho que perdeu o emprego. Ele fica tão inseguro que também não gasta. Na hora que reverte o mercado de trabalho, mesmo que o desemprego continue alto e a geração de emprego seja pequena, o comportamento de quem está empregado muda. É uma questão de confiança, que leva tempo. A economia de mercado precisa de tempo para corrigir tendências. Até lá, vai ter um período de especulação danada. Eu acho que isso se acalma.

FOLHA - Como fica o Brasil, que tinha se tornado o "queridinho" dos mercados internacionais?

BARROS - Ah, o Brasil está muito bem. É o "darling" do investidor. Até porque todo mundo sabe que a demanda interna de consumo não tem nada a ver com o que está acontecendo no mundo. O problema é que, em um ambiente de crise como este, o pessoal saca dinheiro dos fundos emergentes. Todo mundo fica mais conservador. Mas o Brasil está numa situação invejável. Para chegar aqui, precisa quebrar muita gente. E não vai quebrar.

Mesmo na Europa, esse arranjo foi construído ao longo de 60 anos. Não vão deixar ruir agora. Mas o euro está ferido de morte. Quem achava que ele poderia tomar o lugar do dólar como valor de reserva ficou assustado. Outra coisa que deve acontecer é um fortalecimento do dólar em relação às demais moedas, inclusive a nossa. A taxa de câmbio já não é mais R$ 1,75, vai ser mais perto de R$ 2, o que é bom para nós. Vai resolver o problema de muita gente. Ainda estou muito otimista, mas preocupado porque temos que ver como se resolve esse problema lá fora.

FOLHA - No mercado de câmbio, falam que o BC está jogando gasolina da fogueira. O BC está dando a atenção devida para o dólar?

BARROS - O que precisa agora é o Banco Central mudar a mão. Ele precisa mudar esse negócio e parar essa brincadeira. Até algum tempo atrás, tinha sobra de dólar no câmbio. Agora, vai faltar. O BC é lento, fica com aquela história de que não quer interferir na moeda. Aquela coisa de liberalzinho extremado. É a cara dele. Vai ter que mudar. E, quando mudar, acalma o mercado de câmbio. Porque, quando faltar algum dinheiro, ele vende. Além do que, o real se valorizando muito começa a mexer também com a inflação.

FOLHA - Mas será que eles vão fazer isso? Não parece...

BARROS - Ah, vai. Como sempre atrasado, mas vai ter que fazer. Não tem outro jeito.

FOLHA - Do contrário, quebrará muita gente?

BARROS - Onde vai quebrar muita gente é na Europa. Grandes empresas europeias estão como Sadia e outras companhias estavam aqui. Quando o euro estava só se valorizando, elas não estavam com medo. Mas não é nada dramático. É um período complicado.

FOLHA - A nossa eleição presidencial também pode trazer incertezas?

BARROS - Não estou muito preocupado. A não ser que um Ciro Gomes cresça ou apareça alguma novidade. Enquanto a eleição estiver entre Dilma e Serra, não vejo grande preocupação no mercado.

FOLHA - O aperto de crédito na China pode respingar no Brasil?

BARROS - Isso tudo é besteira. As empresas que estão na China sabem muito bem como as coisas funcionam lá. Nesses dois últimos meses, tomaram dinheiro emprestado e botaram no banco. Sabiam que em algum momento iria faltar. Eu vi as estatísticas de depósitos nos bancos, é um número brutal. Está todo mundo com dinheiro. Para mim, a China é a parte mais estável dessa história toda. A China é hoje um fator de certa estabilidade. E, como nós somos muito vinculados à China, essa estabilidade vem para cá também.

domingo, 1 de novembro de 2009

O CÂMBIO SEGUNDO MENDONÇA DE BARROS

Realmente, para colocar um pouco mais de luz no mundo cambial, li na Folha de S. Paulo o artigo “Câmbio: mais lenha na fogueira” de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso), que acredito possa ser útil tanto para a vida pessoal como para os negócios da empresa.

Entre as inúmeras questões que dividem os economistas, uma das mais importantes é a que envolve o cálculo da chamada taxa de câmbio de equilíbrio. Esse valor corresponde àquela que estabiliza o balanço de pagamentos de um país ao longo do tempo. Como o valor de uma moeda nacional nos mercados de câmbio é formado a partir de transações comerciais e financeiras das mais variadas origens, não existe uma regra precisa para a determinação do que seria o ponto de equilíbrio. Mesmo assim, os economistas têm mecanismos de certa forma eficientes para estimá-lo a partir de alguns parâmetros econômicos.

Em recente trabalho, um dos maiores bancos de investimento dos EUA atualizou - incorporando os dados mais recentes - o cálculo desse valor de equilíbrio nas economias mais importantes do mundo. Os resultados apontam os desvios das cotações de mercado em relação a seus valores de referência para países na Ásia, na Europa e na América Latina, em relação ao dólar e ao euro.

A publicação desse relatório, no momento em que a questão do real esquenta o debate no Brasil, é muito bem-vinda. Tenho muito respeito pelo trabalho de pesquisa desse banco e confio na qualidade de suas conclusões. Além disso, por ser uma instituição internacional com foco no mercado financeiro global, fica difícil associar suas conclusões com interesses ou posições de natureza ideológica. De fato, a equipe que realizou esse trabalho não faz juízo de valor em relação aos resultados obtidos.

A mais importante observação para nós, brasileiros, é que o real é hoje a moeda mais valorizada dentro de uma cesta de 30 países. O valor correto do real seria de R$ 2,63 por dólar, ou seja, hoje ele estaria 51% sobrevalorizado em relação à moeda americana. Segundo esses mesmos critérios, o euro deveria valer hoje US$ 1,20, estando atualmente nos mercados 23% acima de seu valor de equilíbrio. Assim, mesmo em relação ao valorizado euro, o real estaria 23% acima de seu valor de referência.

Outros números interessantes em relação à taxa de câmbio no Brasil: o desvio em relação ao peso argentino está hoje em 80%, ou seja, as empresas brasileiras têm um fardo pesadíssimo nas suas relações comerciais com nosso vizinho e parceiro.

Outro desvio importante - valorização de 50% - ocorre entre o real e a moeda chinesa. É marcante a diferença de comportamento do real em relação às moedas asiáticas, que têm se valorizado muito menos em relação ao dólar. Por exemplo, em relação ao won sul-coreano, o real está valorizado em 45%.

Os números da valorização do real vis-à-vis outras moedas são impressionantes. Mesmo que se façam algumas correções metodológicas, não acredito que esse quadro de uma moeda desalinhada vá ser alterado. O resultado desses desequilíbrios no médio prazo é conhecido: nos próximos anos, teremos um crescimento brutal das importações e do nosso deficit em conta corrente.

O bom momento da economia brasileira certamente vai permitir que esse deficit seja financiado por investimentos diretos e em carteira por algum tempo, que pode até ser longo. Mas já conhecemos esse filme, embora com outros personagens.

Eventualmente, um deficit em conta corrente de grande magnitude levará o mercado a corrigir o valor do real, trazendo novamente nossas contas comerciais para próximo do equilíbrio. Nesse meio tempo, nossa indústria sofrerá as consequências.

domingo, 30 de agosto de 2009

DA SÉRIE: TEXTOS INTERESSANTES - MENDONÇA DE BARROS

Direto da Folha de S. Paulo, mais um artigo do sempre lúcido LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, que compartilho com os meus quase dois (milhões) de e-leitores.

Meu irmão José Roberto tem usado uma imagem do atletismo para melhor explicar o momento atual da economia mundial. Segundo ele, nos próximos meses, a passagem do bastão de um corredor - o governo - para outro - o consumidor no mundo desenvolvido - será uma condição necessária para levar o processo de recuperação a bom termo. Nos últimos meses temos assistido a um aumento gradativo da atividade econômica em um grande número de países, tanto no âmbito do chamado G7 como no mundo emergente.

Essa recuperação foi induzida por recursos públicos injetados na economia privada em volume nunca antes visto. O primeiro movimento foi liderado pelos bancos centrais com a mobilização de recursos monetários, por meio de mecanismos clássicos e de corajosas inovações.

Com isso foram criadas as condições para se manter o sistema bancário mundial com um mínimo de funcionalidade, evitando o estrangulamento total da atividade produtiva. Em um segundo momento foram os governos que mobilizaram recursos de natureza fiscal para sustentar um nível mínimo de renda e consumo, afetados pela onda de desemprego que se espalhou por grande parte do mundo. Aqui também foram usados instrumentos tradicionais - como obras públicas e redução de tributos - ao lado de medidas criativas, como a compensação para a manutenção de emprego na Alemanha e os programas de subsídio para troca de carros. Foram os vários trilhões de dólares injetados em um grande número de economias que evitaram uma catástrofe inimaginável e que está agora afastada.

Todo esse esforço dos governos foi realizado no pressuposto de que, passada a tempestade e com a volta da confiança de consumidores e de empresas, a dinâmica privada voltará e recolocará a economia em uma rota de crescimento sustentado. É isso que diz o manual de enfrentamento de uma crise como a que ocorreu no ano passado.

Por isso, a imagem da passagem do bastão criada por meu irmão me parece muito feliz. Apenas a complementaria com algumas observações mais específicas quanto à natureza dessa troca de bastão. Em alguns países, como os EUA e a Inglaterra, o revezamento se parece com o chamado 4 x 100 metros. Ou seja, é uma corrida rápida, onde a passagem do bastão é sempre complicada e tensa. Em outros casos, como a China, a corrida é mais longa - algo como a corrida de 4 x 400 metros -, quando a passagem do bastão pode ocorrer de maneira mais tranquila.

No primeiro grupo estão países em situação fiscal mais complicada, em que o espaço para gastos fiscais por mais tempo é muito menor. No caso americano, há um grande mal - estar com os deficit já realizados, de modo que uma eventual necessidade de renovação dos estímulos fiscais no ano fiscal 2010/2011 pode criar uma crise com o dólar. O mesmo ocorre na Inglaterra e nas maiores economias da Europa Unida.

Já na China - e de certa forma no Brasil - o esforço fiscal do governo pode se estender por um período bem maior, tornando a passagem do bastão mais tranquila e segura. Nesse caso, o instrumento do gasto público em obras de infraestrutura ganha um peso maior. A sustentação do crescimento em 2010 dependerá do sucesso da passagem do bastão do gasto do governo para o setor privado. Nesse processo, o consumidor terá importância crucial, pois os investimentos privados ainda permanecerão deprimidos por algum tempo em razão da enorme capacidade ociosa hoje existente na grande maioria das economias. A conferir... LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...