Mostrando postagens com marcador LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Mendonça de Barros: "Meu conselho: muito juízo e Lexotan".

Coluna Exame 6 de novembro 2017- Meu conselho: muito juízo e lexotan.
Na minha coluna de hoje quero trazer ao leitor da Exame alguns conselhos de um velho analista das coisas brasileiras na economia e na política: nos próximos seis meses tenham muito juízo para enfrentar o que vamos viver no Brasil. 
Além de muito juízo, principalmente na avaliação dos eventos na economia e nos mercados financeiros, nos momentos mais difíceis um comprimido de Lexotan vai ajudar muito a não tomar atitudes insensatas e que podem trazer muito arrependimento no futuro. Os últimos dias que vivemos nos mercados financeiros, com uma alta volatilidade na Bovespa, nos mercados futuros de juros e de cambio, já são manifestações claras destes dias tormentosos que vamos viver. 
E porque eu, que tenho sido extremamente otimista nos últimos dois anos, estou assumindo esta posição de extrema cautela para os próximos seis meses? 
Porque vamos viver um período em que o vazio político que antecede a definição do verdadeiro quadro eleitoral que vai existir a partir de junho do próximo ano vai levar ao extremo as especulações sobre os resultados das eleições de outubro. Aliás isto já começou com as primeiras pesquisas eleitorais que tem aparecido na imprensa e nas análises dos especialistas. 
A polarização entre Lula e Bolsonaro tem sido tomada pelo seu valor nominal, projetando um quadro caótico para nosso futuro. No fundo estes candidatos representam duas utopias do passado e que se mostraram altamente destrutivas para a democracia brasileira. Não acredito que elas cheguem ao fim do processo eleitoral da forma que se apresentam hoje. Esta posição radical nas pesquisas deve ajudar os partidos de centro e de centro direita - que poderiam mudar esta polarização ao abrir uma alternativa terceira força – a construir ao longo dos próximos meses um candidato com viabilidade eleitoral. O mais importante deles - que é o PSDB - vive hoje seu inferno astral em função da sua divisão entre duas posturas radicais em relação ao governo Temer. Fortalece este conflito, idiota e infantil, a falta de lideranças claras e com uma visão estratégica sobre a responsabilidade do partido no cenário eleitoral de 2018. Espero que esta convergência ocorra a partir da eleição do novo presidente do partido em dezembro próximo.
Este cenário é perfeito para que o especulador nos mercados financeiros se sinta poderoso para explorar as manchetes diárias produzida por uma imprensa sedenta por cenários extremos. Por isto espero um aumento importante na volatilidade dos mercados financeiros no Brasil.
Por isto na coluna de hoje – além do conselho que dei acima - quero chamar a atenção do leitor para o fato de que nos próximos meses teremos uma ação política dos partidos de centro na construção de uma candidatura alternativa à polarização revelada pelas pesquisas, e com condições de vencer as eleições. Neste sentido a divulgação das pesquisas nestes próximos meses, ao mostrar a força de duas utopias regressivas de nossa história – a ditadura militar e o petismo deletério - serão cruciais para pôr um pouco de juízo no PSDB e nos partidos mais à direita em sua busca por um candidato de consenso. Se isto acontecer como espero, o quadro eleitoral de hoje é apenas mais uma manifestação do que se chama hoje de Fake News.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Luiz Carlos Mendonça de Barros: O Nobel de Economia de 2017.


Nesta coluna vou deixar de lado o foco principal das minhas reflexões dos últimos meses - a defesa de que vivemos uma recuperação cíclica clássica iniciada no segundo semestre do ano passado - para discorrer sobre a importância do prêmio Nobel de economia deste ano. Como sabem os leitores do Valor, o prêmio foi para o economista americano Richard Thaler, professor da Universidade de Chicago.

O trabalho do professor Thaler, sobre o comportamento do que se convencionou chamar de Homo Econômicus, está inserido na chamada Escola de "behavioral economics". Seu foco principal é o de estudar o comportamento do indivíduo real nas suas decisões no âmbito de uma economia de mercado. Este grupo de economistas começou a questionar, a partir dos anos oitenta do século passado, a figura do "homo economicus" ultra racional como definido no arcabouço teórico da escola chamada de Neoclássica. Para este grupo, dominante no pensamento econômico por várias décadas, a decisão individual tinha sempre um caráter racional na busca de maximizar seu bem-estar econômico. Junto com a racionalidade das empresas na busca da maximização de seus lucros, formavam os pontos centrais dos modelos econômicos que explicavam o funcionamento das economias de mercado.

No início de sua caminhada intelectual os economistas que questionavam a premissa racional do comportamento do cidadão e das empresas foram tratados com desdém pela nata dos economistas americanos. Afinal, se eles estivessem certos em suas críticas toda uma teoria construída a partir da racionalidade do indivíduo teria que ser revista. Por outro lado, durante mais de vinte anos o arcabouço teórico dominante vinha conseguindo explicar, com grande êxito, a evolução conjuntural das maiores economias de mercado. Por que estariam errados perguntavam?

A resposta a esta questão veio com a crise do chamado sub prime, no final da primeira década do novo século nos Estados Unidos. Mais uma vez a chamada racionalidade do agente econômico - seja ele consumidor, investidor ou banqueiro - ficou ridicularizada de um dia a outro. A melhor forma de constatar o ridículo do conceito do Homo Economicus racional que prevalecia então pode ser vista e sentida no filme The Big Short.

Com a frustração provocada pela desmoralização de parte importante da teoria econômica dominante à época, iniciou-se uma busca desesperada por uma nova referência para entender o que havia acontecido e, mais importante, sobre o que fazer para se enfrentar a crise gravíssima que atingiu a maior economia do mundo. A sombra do grande economista John Maynard Keynes, que havia sido enterrada intelectualmente pelo movimento Neo Clássico nos anos 60 do século XX, surgiu das trevas e passou a ser novamente uma referência. Em suas ideias sobre como se evitar depressão econômica, os desesperados membros da equipe do governo americano que estava de saída foram buscar elementos de ação totalmente fora dos padrões de Wall Street. 

Da mesma forma o governo Obama, que assumiu o comando dos Estados Unidos no olho do furacão da crise econômica e bancária, bebeu da mesma fonte. Um livro, já fora de circulação nos meios acadêmicos - "Stabilizing an Unstable Economy" -, de autoria de Hyman Minsky, um keynesiano assumido, passou a ser uma referência na terrível tempestade que se seguiu. 

A figura dos agentes econômicos racionais nas suas decisões econômicas foi colocada de lado e uma busca intelectual para substituí-lo, com alguém de carne e osso, começou. E foram os teóricos do "behavioral economics" que saíram na frente em suas pesquisas. Na busca comum de uma solução para resolver esta questão, o grupo de economistas dividiu-se em duas alas: uma delas mantinha a racionalidade estrutural do indivíduo, mas introduzia o conceito que haveria apenas um certo desvio nesta racionalidade. Portanto era fundamental modelar, com os instrumentos que a matemática disponibiliza ao pesquisador, e mensurar este desvio de racionalidade, recolocando o agente racional no modelo neoclássico.

Mas o grupo mais radical, na sua crítica ao agente econômico clássico, defendia que não seria possível separar o pedaço racional da parcela humana do Homo Econômicus. E para defender sua posição passou a escrever sobre os casos mais graves de irracionalidade que estavam presentes em ações usuais de certos grupos de cidadãos. Destruir a tese da racionalidade, mostrando a irracionalidade de padrões de comportamento considerados racionais pelo senso comum dos economistas, foi a arma escolhida por eles. Nesta batalha o professor Thaler foi um dos mais ativos elementos de seu grupo.

E o que prega como saída para este dilema do agente econômico humano e, portanto, cheio de defeitos tanto ao nível individual como coletivo? Acompanhar as economias de mercado com os instrumentos neoclássicos, mas sem cair na tentação de que tudo funciona sem descontinuidade. Portanto: estar atento a movimentos de euforia pois a probabilidade de que os sentimentos desestabilizadores ocorram em momentos como este é muito grande. 

Vale aqui o pensamento de um velho dirigente do Fed no pós-guerra, quando a economia americana viveu um boom muito forte por um período longo: "No auge da festa é sempre saudável esconder em algum lugar o pote de "punch". Aliás, se o governo da presidente Dilma, em 2011 tivesse escondido o "pote de caipirinha" que embebedava a todos, ainda estaria no poder.

sábado, 10 de agosto de 2013

É o crescimento da renda, estúpido.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, economista-chefe da Quest Investimentos, em mais um de seus ótimos artigos sobre a economia brasileira, ontem na FOLHA DE S. PAULO. E com uma visão otimista, que sempre é bem vinda nestes tempos de crise.  

Embora tenha durado apenas o tempo de uma flor de manacá, a exposição do aumento dos índices de IDHM dos municípios do Brasil na mídia precisa ser recuperada. Talvez tenha sido a notícia mais importante do ano para os analistas que procuram olhar o Brasil sob a ótica das mudanças estruturais de nossa sociedade.

Os números são impressionantes e mostram um país que passa de uma posição vergonhosa no campo de desenvolvimento social para a companhia de sociedades mais justas e ricas. Mas essas informações entram em choque com o clima de que estamos próximos de um desastre e que tomou conta de boa parte dos agentes econômicos -- empresários e financistas -- nos últimos meses.

Não é possível que uma economia que fez com que a renda média real da sociedade dobrasse em 17 anos esteja à beira do abismo, mesmo que os resultados nos últimos três anos sejam decepcionantes.

Em 1993, a renda média anual do brasileiro era -- a valores reais de 2012 -- de R$ 5.016,00, equivalentes ao câmbio também de 2012 a US$ 2.500. Em 2010, 17 anos depois, esse número atingiu R$ 10.884,00, ou seja, próximo de US$ 5.500. Um aumento de mais de 100% no período, o que corresponde a uma taxa anual composta de 4,7%.

Mesmo se tomarmos como base a renda média de 1994, início do período do real, os números chamam a nossa atenção. Nesses 16 anos, entre o início do período de estabilidade de nossa moeda e o fim do ciclo de crescimento em 2010, o aumento real da renda média do brasileiro chegou a 64%, ou seja, cresceu a uma taxa anual de 3,14%.

Todo economista sabe -- ou deveria saber -- que o fator mais importante por trás das mudanças sociais é o crescimento econômico por um prazo longo. Importa menos a taxa anual de crescimento e mais a duração do período em que esse crescimento se sustenta.

Uma segunda verdade em que acredito é a que nos diz que o principal -- e mais difícil -- fator por trás do crescimento econômico sustentado é o aumento da renda real das famílias. Isso é verdade principalmente em uma sociedade de cigarras como a nossa, em que o consumo representa mais de 2/3 do PIB (Produto Interno Bruto).

Por isso, os dados do Pnud da ONU, publicados recentemente, não surpreenderam a equipe de economistas da Quest Investimentos. Afinal, o quadro inicial das apresentações institucionais aos nossos clientes, desde 2007, apresenta um gráfico da renda real calculada pelo IBGE entre 1978 e 2013 e mostra, por meio de uma linha de tendência, seu comportamento nesse período.

Em 1979, último ano do milagre econômico dos militares, a renda real anual era de R$ 7.464,00. Em 1993, fim do período em que tivemos uma hiperinflação histórica, o brasileiro médio ganhava anualmente apenas R$ 5.016,00. Ou seja, uma queda de mais 30% em 14 anos. Podemos contar essa mesma terrível história dizendo que, nesse período negro, o brasileiro empobreceu em média mais de 2% ao ano.

A mais importante consequência desse longo período de crescimento que tivemos depois do Plano Real pode ser vista -- a olho nu -- em uma fotografia da sociedade brasileira dividida em classes de renda. Ela também faz parte, desde 2006, das apresentações da Quest como um de seus pontos centrais.

Para chegar a ela, dividimos os brasileiros em apenas duas classes de renda: na primeira estão aqueles que estão inseridos na economia de mercado, ou seja, têm carteira de trabalho assinada, acesso a crédito bancário e no comércio e estão protegidos por programas sociais como aposentadoria, seguro-desemprego e outros que não o Bolsa Família. Na outra classe, estão os brasileiros que vivem na informalidade e não têm acesso às instituições do mundo formal.

Em 1993, os brasileiros da classe formal representavam um terço da população, ficando o grupo informal com os outros dois terços. Hoje temos a situação oposta, ou seja, dois terços vivem no mundo formal e o outro terço no informal. Uma mudança extraordinária e muito difícil de ser encontrada na história das nações emergentes como a nossa.

Peço agora ao leitor que volte ao título desta coluna.

sábado, 20 de abril de 2013

As eleições de 2014 e a economia.


Recentes dois artigos do Luiz Carlos Mendonça de Barros publicados no VALOR avaliam a situação econômica brasileira, bem como previsões para 2014. Neste, o foco é a eleição e a economia.
A condução da política econômica no Brasil está dando sinais de estar passando por mudanças importantes. Os analistas precisam incorporar os efeitos de uma eleição presidencial - que se mostra hoje mais difícil do que as que consolidaram a hegemonia do PT no quadro político brasileiro - em suas previsões. Vou dividir com os leitores do Valor algumas observações que tenho sobre esse tema, embora deva ressaltar que ainda são ideias iniciais e que só os próximos meses poderão robustecê-las.
Em primeiro lugar, é preciso lembrar que o PT é um partido que segue os princípios do cientista político italiano Antonio Gramsci, adaptado ao cenário brasileiro ao longo dos últimos dez anos. E nesse quadro de princípios a manutenção do poder é um de seus principais itens. Em outras palavras, para o PT e sua liderança política, eleição é uma coisa muito séria que justifica tudo, inclusive a mudança de posições consolidadas ao longo do tempo. A própria presidenta nos lembrou, recentemente, desse fato ao dizer que em época de eleições faz-se o diabo para ganhá-las.
Um segundo ponto que gostaria de desenvolver diz respeito a uma observação feita pelo ex-governador Paulo Hartung - outro político que também leva a questão de eleições a sério - em recente conversa. Para ele as eleições presidenciais do próximo ano serão as mais difíceis que o PT enfrentará na sua fase "poder". As razões são várias, mas as mais importantes me parecem as seguintes:
1 - a economia em 2014 não será a maravilha que vivemos em 2006 e 2010;
2 - a se confirmarem as candidaturas que estão postas hoje, a presidente Dilma terá que enfrentar no Nordeste um político local e de grande visibilidade como Eduardo Campos e que certamente vai roubar muitos votos do PT;
3 - em Minas Gerais (outro curral eleitoral do PT nas últimas eleições) a presença do ex-governador Aécio Neves vai alterar de forma importante a distribuição dos votos;
4 - Marina Silva também pode representar uma alternativa eleitoral interessante para eleitores que votaram nos candidatos do PT nas últimas eleições;
5 - Em um eventual segundo turno entre Dilma Rousseff e Eduardo Campos os riscos de derrota aumentam muito;
Por tudo isso o governo e o PT sabem que o estado da economia vai ter um papel importante no comportamento do eleitor. E os resultados dos dois últimos anos não garantem que um cenário de céu de brigadeiro vá acontecer em 2014. Essa é a razão porque acredito que vamos assistir a algumas mudanças significativas na condução da política econômica nos próximos meses. A direção desses movimentos será nitidamente no sentido de reduzir o mau humor do setor privado em relação ao governo em função de traços claros de um autoritarismo estatal - que não ocorreu nos anos Lula - nas suas decisões.
A presidenta Dilma mudou de forma clara o soft econômico herdado de Lula, reduzindo o espaço e a liberdade da dinâmica privada na economia e aumentando as intervenções do governo, principalmente via regulação e ações de empresas estatais. A presidenta acredita em um modelo econômico em que o Estado deve liderar as ações na economia, inclusive interferindo em contratos em vigor como aconteceu recentemente com o setor elétrico. Por outro lado o governo tem demonstrado pouca disciplina na gestão das âncoras macro que herdou dos governos Fernando Henrique e Lula.
Com isso vem perdendo o apoio de amplas faixas do setor privado, tanto no Brasil como no exterior. Hoje o Brasil é visto com desconfiança pelos mercados financeiros, apesar ainda de ser um polo importante de investimentos de empresas que querem participar do fortalecimento do mercado de consumo nos próximos anos.
Por essa razão, apesar do mau humor dos investidores meramente financeiros, o volume de investimento direto do exterior continua forte, na faixa dos US$ 60 bilhões anuais. Mas o peso dos chamados mercados na construção do clima de negócios em um país emergente como o Brasil é suficiente para que, como acontece agora no Brasil, ocorra uma redução dos investimentos privados. A realidade do PIB do ano passado, com uma queda expressiva da formação bruta de capital, deve ter mostrado aos dirigentes do PT e ao governo a necessidade de restabelecer uma ponte de credibilidade com os mercados.
Alguns sinais dessa nova postura começam a aparecer em decisões do governo e, principalmente, no vazamento pela imprensa de comentários de fontes oficiais. No caso das concessões de serviços públicos parece que o governo vai aceitar que os leilões sejam realizados com taxas de rentabilidade compatíveis com os riscos envolvidos. Também nas negociações sobre a MP dos Portos essa postura, mais realista e favorável ao capital privado, parece estar ocorrendo.
Mas virão das decisões do Copom e das intervenções no mercado de câmbio nos próximos meses as indicações mais importantes destas mudanças. A dimensão e a velocidade da elevação dos juros Selic diante de uma inflação perigosa - inclusive para as eleições - e uma valorização maior do real nos mercados de câmbio mostrarão até onde o governo pretende ir para fortalecer a reeleição da presidenta Dilma.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Inflação: de volta ao passado?


Recentes dois artigos do Luiz Carlos Mendonça de Barros publicados no VALOR avaliam a situação econômica brasileira, bem como previsões para 2014. Neste, o foco é a atual inflação vista por ortodoxos e heterodoxos.  
É muito triste para o analista acompanhar o debate atual sobre a política monetária do Banco Central (BC). Este sentimento nasce principalmente em função da volta da inflação para o centro das discussões, depois de mais de dez anos de esquecimento por parte da sociedade. Esta nossa sensação de "déjà vu" fica reforçada pelo aparecimento de velhos protagonistas de corte heterodoxo - com suas mesmas ideias e soluções do passado - ao lado de novos economistas liberais, com os mesmos erros e utopias de seus colegas mais velhos. Ou seja, em mais de 30 anos, os membros destes dois grupos não esqueceram nada, mas também não aprenderam nada de novo.

Como escrevi acima, considero um retrocesso voltar à questão da inflação nos termos que vêm sendo colocados pela mídia, aqui e no exterior. Em um extraordinário trabalho a quatro mãos, os presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula conseguiram convencer a sociedade brasileira que a estabilidade de preços é uma condição absolutamente necessária para que o crescimento econômico seja perene. Mais do que isto, que para atingir este objetivo é preciso ter um Banco Central comprometido com uma meta clara para a inflação e com um mínimo de independência para persegui-la ao longo do tempo.

Aliás, é bom lembrar que foi por conta deste compromisso que a economia brasileira cresceu continuadamente entre 1994 e 2008, apesar das crises que enfrentamos. Nestes 14 anos, a renda real do brasileiro cresceu mais de 3,5% ao ano e a parcela da sociedade que vive na economia de mercado passou de 34% para mais de 60%. Um resultado incrível e que ganhou reconhecimento internacional. Pensava eu que, por isto, estivessem sepultadas de vez as teorias alternativas que sempre fizeram parte do programa de ação do Partido dos Trabalhadores e de parte da esquerda brasileira.

Também por isso me surpreendeu quando a presidenta Dilma começou a deixar de lado este compromisso com o aparecimento de alguns entraves ao crescimento da economia. Ela não percebeu que o problema tinha sua origem em questões estruturais não enfrentadas adequadamente nos anos Lula e no início de seu mandato. No começo, estas mudanças foram sutis, mais relacionadas a intervenções pontuais do governo. Mas, a partir da frustração com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado, as ações passaram a ser mais abrangentes, enfraquecendo o arcabouço macroeconômico que havia prevalecido até então.

Nos anos Lula o governo considerava os mercados como um instrumento de ação do governo na busca da geração de renda para, a partir daí, alterar a natureza da distribuição dos frutos do crescimento. De certa forma, o governo Lula utilizou-se da mesma estratégia que os chineses desenvolveram nos últimos anos para construir uma nova economia.

Já a presidenta Dilma colocou a ação do governo como peça central da política econômica, sujeitando a ação privada a um papel apenas complementar e secundário. Ao fazer isto recolocou o ideário do PT tradicional - e também do PDT brizolista - novamente no comando de suas ações. Daí o teor de suas declarações recentes de que não concorda com a utilização dos juros como instrumento de redução do consumo privado no combate à aceleração da inflação. E foi mais longe ainda, ao resgatar a antiga e desgastada imagem do remédio matando o paciente.

Mas vamos também olhar de forma crítica para o outro lado do espectro ideológico e que procura vender a imagem de que estamos próximos a um total descontrole da inflação. O gráfico abaixo mostra, de forma clara, dois momentos distintos dos números do IPCA nos últimos anos. No primeiro, que corresponde à passagem do ponto A para o B, temos um período de desinflação em função da valorização do real e da existência de espaços produtivos ociosos no tecido econômico, como o índice de desemprego de dois dígitos. Por isto a inflação chega a ficar momentaneamente abaixo do centro da meta do BC entre 2006 e 2007.

Já entre B e C temos um período em que pressões inflacionárias por conta da ocorrência de vários choques externos - câmbio e commodities - em um ambiente de redução rápida dos espaços ociosos na economia, levam a inflação a mais de 6% ao ano.

Em resumo, nos últimos anos, mesmo durante o período de um Banco Central ortodoxo e com liberdade de ação, a inflação no Brasil nunca ficou abaixo dos 5% ao ano por um período mais longo. Um sinal claro de que não conseguimos sair da armadilha de um sistema de preços indexados à inflação passada e, portanto, ultrassensível a choques externos de oferta. Por isto, quando voltamos agora a uma situação limite e perigosa, temos que buscar uma política de combate a inflação menos rudimentar do que a proposta pelos dois lados do espectro ideológico que domina o debate econômico nestes dias.

Não serão apenas medidas clássicas como a elevação da taxa Selic que vão tirar a dinâmica de aumento de preços da perigosa trajetória atual. Temos que voltar os olhos ao Plano Real e buscar na sua agenda um conjunto abrangente de medidas de política econômica.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

A privatização volta à agenda.


Luiz Carlos Mendonça de Barros, hoje na FOLHA DE S. PAULO. 

O governo federal poderá agora enfrentar com maior eficiência os desafios para o setor de infraestrutura.

Não posso deixar de comentar na coluna de hoje a privatização de três grandes aeroportos brasileiros, realizada nesta semana. Tive a sensação desse compromisso com o leitor quando me sentei diante do computador. Mas fiquei em dúvida sobre por onde começar minhas reflexões.

A tentação de escolher, como linha central desta coluna, a cobrança de coerência por parte do PT -por ter demonizado, por mais de uma década, esse instrumento de parceria entre setor público e privado- foi muito grande a princípio.

Eu teria toda a legitimidade para fazê-lo, pois durante muitos anos sofri com acusações gratuitas por ter sido o executor -como presidente do BNDES- de um grande número de privatizações de empresas estatais no governo FHC.

Mas abandonei esse caminho, por ter certeza de que o cidadão fará essa cobrança, de forma natural e autônoma, e não precisa ser lembrado por mim de tudo o que aconteceu.

Um segundo caminho seria o de usar minha experiência nas privatizações, como a da Vale e, principalmente, a das 12 subsidiárias da Telebrás, para analisar os detalhes mais importantes do leilão.

Poderia discutir a questão do incrível ágio pago pelos consórcios, ou a participação dos fundos de pensão de empresas estatais em um único consórcio -no caso da privatização da Telebrás, para aumentar a concorrência, eles participaram em consórcios diferentes.

Outro ponto que chamou a atenção da mídia, a participação da Infraero no capital das empresas que vão gerir os aeroportos, e que foi apresentado como uma grande mudança em relação aos padrões anteriores poderia também ser por mim comentado.

Mas também decidi não trilhar esse caminho. Para mim, essas questões ficam menores diante do ganho para a sociedade brasileira que foi a volta das privatizações à agenda de governo, como instrumento legítimo de ação na modernização e na ampliação da infraestrutura do país.

Durante mais de 16 anos, o PT e seus aliados de esquerda demonizaram a associação entre setor público e setor privado para a exploração de serviços públicos.

Todas as ações nesse sentido sempre foram catalogadas como contrárias aos interesses da sociedade. Com esse discurso, convenceram grandes parcelas da opinião pública de que havia um lado "demoníaco" nas privatizações e, certamente, atrasaram a experiência brasileira na direção da integração entre setor público e privado.

Um dos exemplos mais claros desse custo é o período de mais de oito anos em que não evoluímos -como sociedade- na busca da melhor relação entre as agências reguladoras e os concessionários de serviços públicos.

O modelo de privatizações desenvolvido no Brasil -e já testado de forma consistente- parte de uma leitura realista dos objetivos e responsabilidades do setor privado e do setor público em uma sociedade como a nossa.

O setor público, apesar das limitações conhecidas na sua eficiência operacional por questões legais e políticas, tem legitimidade para defender os direitos do cidadão na sua relação com os concessionários de serviços públicos.

Já as empresas concessionárias trazem para essa parceria sua agilidade e racionalidade operacional que a busca pela maximização de seus lucros gera na condução de seus negócios, mas, nessa forma de agir, não necessariamente levam em consideração os interesses e direitos de todos os consumidores de seus serviços.

A parceria definida no Brasil, entre Estado e concessionária, via agências reguladoras -embora com defeitos e riscos-, chegou a um equilíbrio bastante eficiente entre esses objetivos muitas vezes conflitantes.

Com a volta desse instrumento de ação pública, o governo federal poderá agora enfrentar com maior eficiência e chances de êxito os enormes desafios que os próximos anos trarão para o setor de infraestrutura.

Mais aeroportos, estradas federais como a Rio-Vitória, terminais portuários e outros projetos estão esperando para seguir o caminho aberto nesta semana.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Reflexões à margem do Sena.


Gosto de ler os artigos do Luiz Carlos Mendonça de Barros, principalmente estes com tom intimista, porém, como sempre, bem econômicos. 

Sempre que posso venho a Paris ainda no inverno, quando a cidade está mais livre das multidões de turistas e o viajante pode se sentir um pouco mais habitante desta cidade que realmente amo muito.

Meu espaço vital preferencial é sempre o Quartier Latin e suas pequenas ruas com traços ainda de uma Paris que sei que não existe mais. Longe de BlackBerries e iPads fica mais fácil -por incrível que pareça ao meu leitor da Folha- seguir os acontecimentos políticos e econômicos neste mundo em crise.

A internet e o dia a dia dos mercados financeiros, com suas informações minuto a minuto, levam-nos na maioria das vezes a análises superficiais e ditadas pela mídia na sua busca do imediato.

Nesta minha viagem fico restrito à leitura dos jornais tradicionais-aqui em Paris eles estão em todos os milhares de bancas de jornais espalhadas pela cidade-, sentado em uma mesa do Café de Flore, meu favorito entre os que existem no velho Quartier.

Apesar de 24 horas atrasado em relação aos mercados, a leitura de comentários e artigos sobre a crise europeia me colocam à frente no entendimento dos reais desafios enfrentados pelo euro.

Afinal, Paris sempre foi um dos centros mais importantes dessa região tão antiga e cheia de história que é a Europa e o "estar presente nos acontecimentos" ajuda muito o analista em sua busca.

O que tem escapado a muitos analistas é a profundidade e o escopo da experiência da Europa unida vivida depois do Tratado de Maastrich, que criou o euro. Esse foi apenas o último passo de uma longa marcha, iniciada em 1950 com a criação do tratado sobre a indústria de aço na Europa continental.

Com os traumas e sofrimentos trazidos pela Segunda Guerra Mundial ainda vivos e presentes em várias sociedades, as lideranças políticas de então iniciaram um ambicioso projeto político -e não apenas econômico- para evitar um novo conflito armado. Com um senso de realismo que faltou a Mitterrand e Kohl -os pais do euro-, começaram um projeto de cooperação centrado nas grandes potências da Europa, que eram a França e a Alemanha.

Foram pequenos passos na direção de uma integração possível e sólida, valores que foram abandonados depois que a queda do Muro de Berlim trouxe um sentimento de euforia e soberba aos líderes políticos de então.

Por isso o que está hoje em jogo são 60 anos de caminhar juntos no objetivo de evitar um novo período de caos e sofrimentos. E a grande maioria da opinião pública nos países envolvidos ainda sabe disso e não quer voltar ao estágio anterior.

Essa é a questão que escapa aos mercados e à mídia -principalmente na Inglaterra- quando pregam aos quatro ventos a inevitabilidade do abandono do euro e a volta da dominância das realidades nacionais no arranjo institucional no espaço europeu.

Isso não vai acontecer mesmo que o custo de reconstruir um euro mais realista e funcional seja elevado e obrigue a um esforço conjunto no espaço de dois ou três anos.

O que deve acontecer é uma volta atrás e a busca de regras que incorporem o fato de que, apesar de unidas em um espaço monetário comum, as nações ainda existem com seus valores culturais e individuais.

E o desenho dessa retirada ordenada em busca de uma união estável, mais realista, ainda não está pronto.

Não por outra razão, a primeira-ministra alemã, em um discurso ontem no encontro de Davos, pediu a confiança dos mercados para que esse novo desenho seja encontrado e implementado ao longo dos próximos meses. Em seu realismo germânico, -corretamente- disse que não existe a solução rápida e única exigida pelos mercados.

E a reação parece ter sido positiva, pois as medidas de risco associadas aos títulos de dívida soberana dos países mais afetados -Itália e Espanha principalmente- recuaram, apesar de a tragédia grega ainda estar em seu auge.

Continuo a confiar que, desafiada pelo fim de um sonho político real que esteve tão perto de ser alcançado, a liderança política da Europa vá ter sucesso nessa sua busca.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Minha bola de cristal para 2012.


Luiz Carlos Mendonça de Barros, também na FOLHA DE S. PAULO e suas previsões para 2012.   

Acredito que estejamos vivendo uma dolorosa fase de cura dos desequilíbrios do passado

Nesta primeira coluna de 2012, não posso deixar de fazer minhas previsões para o ano que se inicia. Essa responsabilidade, que já é pesada e difícil em tempos normais, fica ainda mais delicada em momentos de grandes incertezas como o que vamos viver em 2012.

Depois de quatro anos de crise, antigas referências de análise econômica estão desgastadas e sem credibilidade.

Por isso, nós, economistas, navegamos em momentos quase revolucionários, quando a ruptura de valores, já estabelecidos e aceitos como válidos pelos mercados, deixa um grande vazio analítico.

Dou um exemplo desse fenômeno: os dados de dez recessões que ocorreram nas economias desenvolvidas nas últimas décadas apontam para um período médio de dois anos entre o pico e o vale dos ciclos de ajuste. Na crise que se iniciou em fins de 2007, a queda do PIB dos Estados Unidos chegou a quatro anos e serão necessários mais dois para que a economia entre em velocidade de cruzeiro novamente.

Os analistas e os economistas estão sendo obrigados a entrar no metabolismo das economias de mercado para tentar entender o que está acontecendo nesse mundo novo e, com isso, terem condições de fazer algumas previsões.

Sem as regras de bolo que o pensamento neoclássico dava a seus seguidores e sem o treinamento necessário para entender a dinâmica microeconômica dos mercados, vivem momentos de grande insegurança.

Alguns, principalmente os vinculados à maioria dos "hedge funds", jogaram a toalha e mergulharam em um niilismo muito engraçado.

Por outro lado, os economistas vinculados ao pensamento mais heterodoxo vivem momentos de euforia por entenderem que a crise atual resgata o papel dominante do Estado na economia de um país e mostra os perigos do chamado neoliberalismo anglo-saxão. A súbita paixão de alguns deles pela política econômica da Argentina peronista mostra, para mim, que entenderam muito pouco da crise que vivemos e qual o papel do Estado nas economias de mercado no novo século.

Como sempre mantive uma posição equidistante desses dois extremos, tentando aplicar ao mundo de hoje os ensinamentos de Keynes, minha visão sobre o ano de 2012 é menos pessimista. Acredito em uma recuperação lenta e gradual das economias mais importantes, principalmente em razão das políticas adotadas em vários países.

Esse prognóstico vale inclusive para a Europa. Com isso, não trabalho com uma depressão econômica e uma ruptura no sistema bancário dos países desenvolvidos. Em outras palavras, acredito que estejamos vivendo uma dolorosa fase de cura dos desequilíbrios do passado e que deve durar ainda alguns anos. Mas o capitalismo não vai entrar em colapso, como muitos pensam.

No caso do Brasil, mantenho a visão de que vamos continuar crescendo entre 3% e 3,3%, com uma taxa menor nos dois primeiros trimestres do ano e uma aceleração na sua segunda metade.

Graças à queda dos preços das commodities por conta da crise no exterior, vamos ter um alívio na inflação ao longo do ano, o que vai permitir ao BC reduzir os juros Selic para até 9,5% ao ano. Nessa questão, fico com o economista Fabio Ramos, da Quest, que trabalha com um IPCA de 5,2% para 2012.

A fonte principal do crescimento continuará a vir do consumo interno, sustentado pelo aumento dos salários, do emprego e do crédito ao consumo. Nesse cenário, o Brasil vai continuar a receber volumes expressivos de investimentos internacionais e, com isso, conseguir complementar nossa escassa poupança interna e permitir manter um nível decente de investimentos.

Finalmente trabalho com a hipótese de um pouso suave da economia chinesa, com a reaceleração de seu crescimento na parte final do ano. Nesse cenário, os termos de troca do Brasil voltarão ao nível que tem prevalecido nos últimos tempos, mantendo a força de nossas exportações e garantindo a manutenção de um deficit em conta-corrente abaixo dos 3% do PIB.

Essa visão sobre a China é um ponto importante para meu cenário de crescimento no Brasil e espero estar certo em relação a ele. 

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Sucesso e fracasso.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, hoje na FOLHA DE S. PAULO, encerrando o ano útil de 2011. Argentina, nada a imitar. O Brasil está no caminho certo. 

Os fatos são suficientemente fortes para mostrar que olhar para a Argentina com inveja não faz o menor sentido

A mídia brasileira e a mundial deram grande destaque ao fato de que o Brasil tomou, em 2011, o lugar da Inglaterra como a sexta maior economia do mundo.

Isso estava previsto para ocorrer somente em 2013, mas a crise europeia e o elevado crescimento brasileiro no ano passado fizeram com que ocorresse agora.

Nos próximos anos -entre 2013 e 2014- será a vez da poderosa França ser ultrapassada pelo Brasil nessa competição entre nações emergentes e países desenvolvidos que já dura uma década.

Com a Europa entrando em um período longo -talvez mais de cinco anos- de ajustes estruturais e o Brasil surfando um crescimento continuado, talvez até a poderosa Alemanha fique para trás antes que a década atual termine.

Mas, nesta minha última coluna do ano, quero chamar a atenção do leitor para as economias emergentes perdedoras e que, por erros próprios, estão fora dessa arrancada de crescimento.

Entender por que países como a Argentina estão caminhando na direção oposta da do Brasil é uma forma de fortalecer o caminho que estamos trilhando desde que FHC assumiu o poder em 1995.

Até porque temos entre economistas brasileiros, muitos deles ligados ao governo, os que insistem em apresentar a política econômica peronista da família Kirchner como modelo a ser seguido.

Em 1980, entre as 20 maiores economias do mundo, a Argentina ocupava a 10ª posição e o Brasil, a 16ª. Vinte anos depois essas posições tinham se invertido, com o Brasil na 10ª posição e a Argentina na 16ª. Em 2010, o Brasil já era a 7ª economia no mundo e a Argentina estava fora da lista das 20 maiores. Um desastre completo nestes 30 anos.

Nas projeções do FMI para 2015, o Brasil já será a 5ª economia do mundo, ultrapassando a França, e a Argentina estará relegada à 27ª posição. Que fracasso...

Certamente o leitor vai concordar comigo que os fatos são suficientemente fortes para mostrar que olhar para a Argentina com inveja não faz o menor sentido. Pelo contrário, é fugir das ideias básicas que sustentam o modelo de política econômica no nosso vizinho como o diabo foge da cruz. E quais são os pontos de divergência entre a maneira brasileira de administrar a economia e a argentina?

Para mim a questão principal do modelo argentino é a constante intervenção do governo, sempre na busca de resultados econômicos e políticos de curto prazo, nas regras fundamentais de funcionamento dos mercados. Com isso não existe um futuro para as decisões empresariais fora das relações especiais com o governo. Cito a seguir alguns dos pontos centrais do modo argentino de gerir uma economia de mercado e que são resultantes da intervenção do governo.

A repressão financeira, que destruiu o mercado de crédito privado e de capitais, fez com que não exista oferta de recursos acima do prazo de um ano na economia e, mesmo assim, a taxas de juros nominais negativas. A Bolsa de Buenos Aires é uma piada quando comparada com a BMF/Bovespa.

A política de juros menores do que a inflação destruiu o sistema interno de poupança e provocou a exportação para o exterior das economias dos argentinos. Outro resultado perverso da constante intervenção do governo na economia privada é a falta de confiança dos agentes econômicos nas regras de funcionamento de vários mercados e que, por única decisão do governo, podem ser alteradas a qualquer instante.

Como resumo, podemos dizer que o sucesso brasileiro dos últimos anos vem de certa sabedoria - política e técnica- de equilibrar liberdade de mercado com uma intervenção limitada do governo. Já na Argentina a mão pesada -quase fascista- do peronismo destruiu as forças vivas que se desenvolvem em uma economia de mercado e criou um corpo deformado de monopólio de poder do Estado.

Manter esse equilíbrio no Brasil, respeitando as novas demandas por liberdade e racionalidade dos mercados na medida em que nossa economia se desenvolve, será a grande responsabilidade do governo Dilma nos próximos anos. Já a Argentina parece que não tem mais jeito.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Olhando para o Brasil.


Luiz Carlos Mendonça de Barros, hoje na Folha de S. Paulo, comenta sobre “Um novo crescimento virá certamente de estímulos ao crédito, tanto via bancos privados como públicos.”

Vou deixar de lado a crise europeia -cada vez pior e mais difícil de ser resolvida- e voltar minha atenção para a economia brasileira neste final de ano. Os sinais de desaceleração são cada vez mais evidentes, como mostra a estimativa do PIB mensal para setembro divulgada ontem pelo Banco Central.

Nas estimativas da equipe da Quest Investimentos, entre julho e setembro deste ano a economia contraiu-se à taxa de 0,1% em relação ao trimestre anterior e cresceu à taxa de apenas 2,2% em relação ao terceiro trimestre de 2010.

Com esses números, a Quest prevê crescimento de 2,8% para o ano fechado de 2011. Para 2012, as projeções apontam para crescimento da ordem de 3,2% a 3,5%, pouco acima da média histórica de 3,1% dos últimos 20 anos, mas inferior à dos últimos dez anos, de 3,6%.

Esses números são bem mais modestos do que as taxas de expansão entre 2004 e 2008, quando o Brasil cresceu à taxa média de 4,8% ao ano. Mas a presidente Dilma precisa entender que repetir o crescimento desse período de ouro do governo Lula será missão impossível no seu mandato por motivos objetivos que listo a seguir.

No final do primeiro mandato de Lula e nos dois primeiros anos do segundo, antes de a crise financeira nos EUA chegar ao Brasil, a economia brasileira crescia a taxas elevadas, influenciada por várias forças temporárias, criadas a partir da conversão de Lula à política econômica de seu antecessor, em 2003.

Quando o mercado entendeu que não haveria mudança de rumo na economia, o real recuperou seu valor anterior às eleições de 2002, provocando deflação importante no segmento de preços influenciados pelo câmbio. Isso permitiu ao Banco Central reduzir os juros elevadíssimos de então e estimular o consumo das famílias e o investimento privado via crescimento do crédito a taxas que chegaram a 30% ao ano.

Essas forças de expansão foram reforçadas a partir de 2004 com a política de ganhos reais elevados na fixação do salário mínimo. A massa salarial passou a crescer a taxas de mais de 6% ao ano pelo aumento do emprego e dos salários.

Alavancados pela expansão do crédito, os consumidores foram às compras, principalmente de bens duráveis, fazendo com que as vendas no varejo crescessem a taxas de dois dígitos altos. Com isso, o crescimento do PIB nos anos seguintes conseguiu superar largamente os 3% ao ano que parecia ser o limite a que estávamos condenados.

Mas essas forças que ajudaram o presidente Lula a romper limites históricos passaram a perder intensidade no final de seu mandato. E o governo Dilma, sem o auxilio delas, está enfrentando os mesmos limites que prevalecem há muitos anos na economia brasileira.

O principal deles continua sendo as baixas taxas de investimento -públicos e privados-, que são insuficientes para permitir um crescimento econômico mais vigoroso. No período Lula, essa limitação foi em parte contornada pela existência de capacidade ociosa em setores-chave da economia, inclusive no mercado de trabalho.

Hoje, vivemos uma situação oposta, com grandes gargalos que impedem um nível de atividade maior ou, ao estimular as importações devido aos custos crescentes no setor produtivo, desviam demanda interna para o exterior.

Para superar essas limitações, o governo teria de adotar uma agenda diversa da estabelecida por Lula ao longo de seu mandato e mantida quase intocada por Dilma. Entre seus pontos principais estariam a redução expressiva dos gastos de consumo e de transferências de natureza social do governo, abrindo espaço para o aumento dos investimentos, e a implementação de uma agressiva política de transferência da operação de serviços públicos para o setor privado.

Mas não parece ser esse o caminho a ser trilhado pelo governo, e a tentativa de acelerar novamente o crescimento virá certamente de estímulos ao crédito, tanto via bancos privados como públicos, bem como pela expansão de gastos correntes no Orçamento. Mas como os obstáculos para que isso possa ocorrer são estruturais, o resultado final desse esforço será muito limitado. 

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...