MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE, economista, é professora da PUC-RJ e diretora do Iepe/Casa das Garças, escreveu este texto especialmente para a FOLHA DE S. PAULO.
Como disse Nassim Taleb, autor do termo "cisne negro", usado para caracterizar eventos inesperados e, às vezes, cataclísmicos, a história não evolui gradualmente, mas em saltos descontínuos. O Japão acaba de ser atingido por três "cisnes negros" simultaneamente: um terremoto, um tsunami e um desastre nuclear. Como isso pode afetar o Brasil? Ainda é cedo para quantificar o impacto sobre a economia mundial. No entanto, é certo que as commodities continuarão a ser afetadas. No curtíssimo prazo, os efeitos mais relevantes estão relacionados à fuga de risco dos investidores e de realocação de liquidez, dada a necessidade de recursos de algumas empresas. A queda observada nos preços das matérias-primas reflete tanto essas necessidades imediatas quanto os temores dos investidores. A interrupção parcial da indústria japonesa também exerce uma influência negativa sobre as matérias-primas, já que uma parte relevante da demanda global por esses produtos fica temporariamente prejudicada. Portanto, no curto prazo, a queda nos preços das commodities tem duas possíveis implicações para o Brasil. De um lado, pode piorar um pouco a evolução dos termos de troca, que tem ajudado a segurar a deterioração da conta-corrente. De outro, alivia as pressões inflacionárias mais imediatas. Entretanto, há motivos para crer que esses movimentos de queda sejam não só revertidos como também acentuados na direção inversa. Primeiro, o Japão terá de encontrar fontes alternativas de energia, adicionando à demanda global por petróleo e derivados o peso da terceira maior economia do mundo. Além disso, o país terá, temporariamente, uma demanda de energia superior à que prevalecia antes do terremoto devido à reconstrução. Por fim, o drama japonês expôs, mais uma vez, o potencial catastrófico dessa fonte de energia quando algo dá errado, levando vários países a reavaliar os seus planos de usinas nucleares. Esses desdobramentos aumentam as chances de que as economias avançadas atravessem um período prolongado de "semiestagflação", isto é, de crescimento baixo e inflação alta. Como isso afeta o Brasil? Para uma economia que já enfrentava graves pressões sobre os preços, um ambiente internacional de maior hostilidade inflacionária não é nada animador. Esse é o lado escuro do cisne brasileiro. O lado "branco" é a possibilidade de que o país torne-se ainda mais atraente aos olhos dos investidores externos, diante de um quadro nebuloso para as economias maduras. Haja fôlego para evitar a valorização da moeda brasileira...