Editorial do "O
Estado de S. Paulo" e a piora nas contas públicas.
A
redução da conta de luz, um dos truques do governo para maquiar as pressões
inflacionárias, poderá custar ao Tesouro Nacional R$ 17 bilhões, segundo
cálculo da consultoria PSR, de Mário Veiga, um respeitado especialista em
energia.
Se
o cálculo estiver correto, o governo terá de gastar com essa política o dobro
do estimado no começo do ano, de acordo com reportagem publicada no Estado na
sexta-feira passada. Relatório distribuído pela consultoria a seus clientes
apontou falhas importantes nas projeções oficiais: faltou acrescentar o custo
adicional das térmicas, ligadas mais tempo do que o normal, e o aumento de
preço da eletricidade comprada pelas distribuidoras. Esse documento é mais um
de uma série de más notícias sobre as condições reais das contas públicas.
Bastaria
esse gasto a mais com a política da conta de luz para neutralizar quase toda a
economia de R$ 10 bilhões anunciada na última revisão bimestral do Orçamento. A
maior parte dessa economia será provavelmente um corte de vento, mas está
incluída nas novas estimativas do resultado fiscal.
Essas
estimativas já haviam sido prejudicadas, logo depois do anúncio, pela decisão
da presidente Dilma Rousseff de liberar R$ 6 bilhões para emendas de senadores
e deputados ao Orçamento-Geral da União (OGU).
Essa
liberação é parte do costumeiro toma lá dá cá entre o Executivo e a base
aliada, uma barganha para obtenção de apoio em votações importantes para o
Palácio do Planalto.
Ninguém
deveria criminalizar as emendas, disse recentemente secretário-geral da
Presidência, Gilberto Carvalho. Mas não se trata de criminalizar. As emendas,
geralmente usadas para atender a interesses eleitorais dos parlamentares,
independem de objetivos próprios da administração federal Na prática, são uma
forma de apropriação de recursos para fins privados.
Apesar
da prometida liberação de verbas, a base abandonou o governo em duas questões
importantes: a destinação dos royalties do petróleo e a proposta de emenda
constitucional para adoção do orçamento impositivo, aprovada há poucos dias na
Câmara.
Se
esse projeto for sacramentado nas duas Casas do Parlamento, a presidente Dilma
Rousseff poderá, como último recurso, tentar derrubá-lo na Justiça, mas
enfrentará resistência política e precisará arregimentar mais forças. Se a
emenda entrar em vigor, o Tesouro será forçado, provavelmente já no próximo
ano, a soltar mais dinheiro para as emendas. Isso resultará em mais
pulverização e mais desperdício de verbas e, naturalmente, em piora das contas
públicas.
A
iniciativa dos parlamentares, nesse caso, é apenas uma contribuição adicional à
demolição das contas fiscais. Sem essa ajuda, o Executivo já tem feito mais que
o suficiente para bagunçar a política orçamentária e enterrar todo compromisso
com a disciplina fiscal.
Democraticamente,
a presidente Dilma Rousseff e sua equipe econômica têm procurado abrir espaço para
também os governos estaduais e municipais participarem da farra. A ampliação de
limites de endividamento é uma eficiente forma de inclusão nessa festa, mas é
também uma forma de afrouxar as normas da gestão pública.
Autoridades
têm exibido, no entanto, pouca preocupação com essas normas, apesar de alguma
encenação, como a proposta, formulada pela presidente, de um pacto de
responsabilidade fiscal. Não há como levar a sério essa proposta, quando se
considera a prática efetiva.
Até
o fim do ano haverá ocasiões para novos golpes contra as finanças públicas. O
presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES),
Luciano Coutinho, anunciou negociações para obter mais dinheiro do Tesouro.
Essa ajuda, segundo informação extraoficial, poderá ficar entre R$ 20 bilhões e
R$ 30 bilhões. Para isso, o Tesouro emitirá títulos e aumentará sua dívida.
O
mercado anotará o desmando, mas o governo continuará agindo como se nada
importante houvesse ocorrido. Em breve, a Lei de Responsabilidade Fiscal será
menos seguida que o Código de Hamurabi.