sábado, 1 de junho de 2013

A inflação brasileira e suas jabuticabas .

Antônio Corrêa de Lacerda, no Estadão de 31.05.2013. 

A inflação resistindo próxima do teto de 6,5% da meta anual não é uma situação confortável para a Nação. É preciso persistir no combate à elevação geral dos preços como um valor em si. A carestia afeta a todos, mas especialmente os mais pobres.

Para um diagnóstico mais abrangente, primeiro é necessário destacar que a inflação brasileira, inegavelmente elevada e que deve ser repudiada, está muito próxima da inflação média dos países em desenvolvimento, que é de 5,8%.no acumulado dos últimos 12 meses. Há, mesmo entre os Brics, países com inflação próxima à brasileira, como é o caso da África do Sul, com 5,9%, e de outros em situação ainda mais grave, como a índia, com 12%. Argentina e Venezuela têm indicadores oficiais mais elevados e fortemente questionados quanto à sua fidelidade.

A questão é por que países em desenvolvimento têm tido inflação média equivalente quase ao triplo da dos países desenvolvidos. Trata-se de uma questão estrutural. Esses países vêm experimentando mudanças expressivas do padrão populacional, com urbanização, elevação da renda e alterações de costumes. Isso tem aumentado a demanda por alimentos e por serviços, dois itens comuns de pressão de preços em vários países. A demanda por esses itens tem crescido mais rapidamente do que sua oferta, abrindo espaço para elevação de preços.

Isso não pode ser entendido como um álibi para a inflação brasileira, mas um alerta. Ao mesmo tempo que temos de tomar medidas para combater a inflação, é preciso sair da armadilha de considerar a elevação das taxas de juros como remédio único para a enfermidade, seja qual for o diagnóstico de sua origem. No caso brasileiro, temos o impacto das questões já citadas e comuns à maioria dos países em desenvolvimento, assim, temos peculiaridades próprias que precisam ser enfrentadas. São como nossas jabuticabas, fruto originariamente brasileiro: pouco presente ou praticamente ausente em outras paragens.

A primeira é a ainda elevada indexação ou o reajuste automático e regular dos preços baseados em indicadores da inflação passada. É o caso de preços administrados, como medicamentos, tarifas públicas como pedágios, energia, telefonia, água e esgoto e aluguéis. Grande parte deles indexadas a indicadores como o índice Geral de Preços (IGP) e sua variante, o IGP-M, ambos calculados pela Fundação Getúlio Vargas - cuja composição tem pouco a ver com a estrutura de custos dos setores.

Além disso, também influenciado por esse fator e pela cultura inflacionária,vivemos uma espécie de indexação informal de preços de serviços, especialmente os pessoais, que, por sua natureza, são pouco concorrenciais.

Um outro aspecto peculiar nosso está na indexação do mercado financeiro. Grande parte da dívida do governo é pós-fixada pela Selic, a taxa definida pelo Comitê de Política Monetária, redefinida a cada 45 dias, com grande repercussão midiática. Gomo grande parte dos títulos das dívidas oferece liquidez imediata e correção automática pela taxa de juros, há uma certa torcida pela subida da inflação.

Obviamente trata-se de um processo que, longe de ser neutro, provoca transferências bilionárias de renda. Daí a resistência e mitificação que envolve tudo o que se refere ao tema. Muitas vezes, intensificar as expectativas de inflação futura representa um verdadeiro prêmio, na forma de elevação dos juros, favorecendo os portadores de títulos da dívida pública pós-fixada.


É preciso desarmar o consenso pró-inflação. O enfrentamento do problema implica ações conjugadas que vão além dos juros e da ampliação da capacidade de oferta da economia. O problema hoje não reside tanto no setor industrial, que ainda opera com um nível de ociosidade média da ordem de 15%. Mas no macrossetor serviços o quadro é diferente. É preciso ampliar a competitividade, incentivando a formação de novos prestadores, e gerar maior concorrência, diminuindo o poder de elevação dos preços.

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