Leio na FOLHA DE S. PAULO mais um artigo do Mestre Delfim Netto.
A economia brasileira encontra-se numa situação desagradável, mas
longe de estar à beira do apocalipse. Se, entretanto, insistirmos em não
enfrentar os seus desequilíbrios, os cavaleiros podem nos visitar...
Na inflação --a despeito de alguns controles-- continuamos a
namorar com o limite superior da banda de tolerância, que fingimos ser a
"meta". A "boa notícia" é que a distância entre a taxa de
inflação registrada nos preços "administrados" e nos preços "livres",
que era menor do que 10% no final de 2011 e chegou a mais de 150% em 2013, foi
reduzida e se encontra ao redor de 40%.
Na área fiscal a situação em 2014 piorou visivelmente, em parte
porque o crescimento do PIB murchou. O deficit fiscal/PIB aproxima-se de 4%. A
promessa de superávit primário de 1,9% do PIB, arrancado a fórceps no sufoco da
ameaça da perda de rating pela agência S&P, tornou-se irrelevante e a
dívida bruta/PIB aparenta um viés de crescimento.
A situação é delicada, mas perfeitamente reversível --sem custos
exorbitantes-- com um programa monetário e fiscal coerente e transparente,
capaz de dar previsibilidade às políticas públicas e tranquilizar o
"espírito animal" assustado por intervenções pontuais bem
intencionadas, mas erráticas. Irreversível é o crescimento perdido que vai nos
acompanhar pelo resto do tempo.
Onde o ajuste será mais complexo é na política cambial. Voltamos a
cometer o erro que nos tem perseguido há décadas: o uso da taxa de câmbio como
coadjuvante do controle da inflação como substituto das políticas monetária e
fiscal, cada vez que somos premiados com uma melhoria nas "relações de
troca", ou seja, cada vez que os preços de nossas exportações crescem mais
rapidamente do que os das nossas importações.
Não pode haver dúvida sobre as causas de um fato: não foi apenas a
valorização cambial, mas foi principalmente a valorização cambial sistemática,
prolongada, previsível, sustentada pelas maiores taxas de juros reais do
universo, que destruiu o sofisticado setor manufatureiro nacional. De 2011 a
2014, o deficit comercial do setor manufatureiro foi da ordem de US$ 199
bilhões. É por isso que a indústria, que encolheu cerca de 1,5% ao ano entre
julho de 2011/2014, foi a principal causa da murcha do PIB para 1,76% ao ano.
Já devíamos ter aprendido que é tudo inútil. Os especuladores sabem
que a desvalorização é uma questão de tempo. Não há outra saída para a
recuperação do equilíbrio a não ser a lenta e mais custosa política da
"desinflação competitiva", como provaram todos os países que a
experimentaram.
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