Amity Shlaes, é colunista da Bloomberg News e diretora do Four Percent Growth Project, no Bush Institute. Este artigo foi publicado especialmente para o Valor Econômico.
Então, é oficial. O "The New York
Times", ou pelo menos o colunista Paul Krugman, declarou que estamos em
uma depressão mundial. E chegou bem a tempo para o Natal.
A democracia está em jogo, sustentou
Krugman em sua coluna de 11 de dezembro e a Europa, social e economicamente, se
inclinará ao fascismo, se não deixar de buscar uma "austeridade cada vez
mais rigorosa, sem esforço de contrabalanço para promover o crescimento".
São suposições importantes e previsões
assustadoras. Krugman, no entanto, sente-se à vontade em fazê-las porque diz
ter evidências. Sua evidência de que a democracia europeia cambaleia em favor
de uma repressão é o caso da Hungria, membro da União Europeia (UE), mas que
ainda tem sua própria moeda, o florim. No país, o partido governista Fidesz
defende políticas que suprimem a liberdade de expressão, a independência
judicial e a mídia jornalística.
Quanto à teoria de que a austeridade
desacelera o crescimento, Krugman evoca a Grande Depressão. Fazê-lo traz
autoridade por si só, já que a Grande Depressão é misteriosa e sua força na
imaginação pública é forte.
O colunista, frequentemente, faz
referências ao relato em três estágios. No fim dos anos 20 ou início dos 30, o
presidente dos Estados Unidos, Herbert Hoover, cometeu um erro fatal e impôs
medidas de austeridade, na forma de aumentos de impostos e cortes orçamentários.
A economia dos EUA faliu. O presidente Franklin Roosevelt veio, gastou e
começamos a nos recuperar. Depois de 1936, Roosevelt hesitou e apertou o cinto
governamental - de novo, a austeridade. Caímos em depressão econômica. A
economia não voltou às taxas de crescimento de 1929 até o aumento de gastos da
Segunda Guerra Mundial.
Nem todos entre nós concordam com os
detalhes desse roteiro. Hoover, por exemplo, aumentou os gastos. Argumentar, no
entanto, que a austeridade, caso tivesse sido promovida em grau suficiente,
teria promovido o crescimento e a recuperação nos anos 30 é embarcar em uma
aventura condicional vulnerável.
Há evidências de que a austeridade
promoveu o crescimento no passado e não o fascismo. Esses exemplos podem ser
menos conhecidos, mas sugerem que a austeridade pode trazer a recuperação com
mais velocidade do que quando se gasta.
Um forte exemplo na história dos EUA é a
recessão no início dos anos 20. O governo reagiu à desaceleração sem gastar;
cortou-se pela metade. A recuperação foi tão rápida que poucas pessoas se
lembram dessa recessão.
Para seguir o modelo de Krugman de
selecionar um único país, podemos observar a Austrália dos anos 30. No início
da década, a Austrália, assim como os EUA, sofria de deflação e desemprego
acentuado. A renda nacional havia encolhido em todos os anos entre 1925 e 1932.
Nesse ano, o índice de desemprego chegou a 19,7%. O governo considerou
substituir o padrão-ouro com um "padrão-mercadorias", atrelado às
commodities.
Os australianos se perguntavam se os
gastos poderiam trazer a recuperação. O poderoso premiê de Nova Gales do Sul,
J.T. Lang, procurou focar seus eleitores em um projeto de obras públicas, a
grande ponte Sydney Harbour Bridge, que foi completada em 1932. Muitas
autoridades imaginaram que ainda mais liquidez seria a resposta para os
problemas da Austrália.
Como a escritora Anne Henderson destaca
na nova biografia de Joseph Lyons, o primeiro-ministro do país na época, o
governo federal australiano afastou-se da política de gastos e optou pela
austeridade. A partir de 1932, Lyons liderou o país em meio a uma campanha de
corte de orçamento para reduzir em 20% todos os gastos desvinculados, que o
governo pode usar livremente, o que incluiu os salários do setor público. Lyons
e outros líderes se comprometeram a pagar dívidas australianas, no que ficou
conhecido como o "plano dos premiês".
"A Austrália converteu empréstimos
imensos em Londres" e recomprou dívidas "para assegurar, aos que
emprestavam dinheiro, a solidez da política da Austrália", contou-me
Henderson, por e-mail. Os impostos foram elevados em uma campanha total para
transformar o déficit federal em superávit. A Austrália permitiu-se apenas um
ano de déficit.
De início, as pessoas disseram que Lang,
e não Lyons, estava certo. De 1933 em diante, no entanto, a Austrália começou a
recuperar-se. Em 1936, o desemprego havia recuado para cerca de 11%. E
continuou em queda. A Austrália recuperou-se com muito mais velocidade que os
EUA.
Em 1935, um Lyons triunfante navegou aos
EUA, no cruzeiro italiano Renault, para relatar o sucesso de seu governo:
"Tivemos de cortar salários e aposentadorias cruelmente durante o auge da
Depressão", disse Lyons a repórteres no píer, em Nova York. Naquele
momento, contudo, já estava recuperando as aposentadorias. Ao cortar, a
Austrália deu à sua economia a chance de crescer e, à sua moeda a crucial
credibilidade. Lyon pode ter elogiado Mussolini, mas a Austrália não virou
fascista.
Outros contam a história da Austrália de
forma diferente. Enfatizam a depreciação da libra australiana e a resultante
melhora das relações de troca. Ou argumentam que a Austrália, pequena, e os
EUA, um país poderoso, não são comparáveis.
A questão é, contudo, que esses tipos de
dados, da Hungria à Austrália, precisam ser examinados cuidadosamente. Os
roteiros normalmente conhecidos nem sempre são os certos.
E nem sempre são análogos ao presente. O
experimento de austeridade de David Cameron, primeiro-ministro do Reino Unido,
é recente demais para ser declarado como um fracasso. A recuperação pode ser
lenta, como foi a da Austrália. O Reino Unido, no entanto, verá os benefícios a
sua competitividade relativa criados pelos cortes mais cedo do que tarde. O
dinheiro que evita a incerta área do euro fluirá para o Reino Unido.
Em resumo, só porque alguém evoca a
Grande Depressão não significa que uma nova era fascista esteja sobre nós. Ou
que é hora de uma "suspensão da descrença".