Na Folha de S.Paulo, LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso). No texto abaixo ele coloca os pontos nos iiss para quem ainda possa achar que entre uma política econômica séria e uma eleição em 2010, de que lado o governo fica.
O processo de decisão sobre mudanças no superávit primário para 2009 mostra o que de pior tem o governo Luiz Inácio Lula da Silva: hesitação, confusão de conceitos e mistificação da opinião pública. Até as pedras sabem que a aproximação do ano eleitoral de 2010 está no centro dessa questão. O acaso, que tanto afeta a vida dos governantes nesta era da democracia de massas, tirou de Lula os benefícios de uma economia que crescia de forma exuberante. Em uma situação mais tensa, com a perspectiva de uma batalha eleitoral no mínimo equilibrada, o governo deixou de lado o discurso racional dos últimos anos.
Assistimos agora a um debate dentro do governo entre os que colocam a disputa eleitoral como centro de suas ações e alguns membros da equipe econômica que procuram navegar na crise econômica com um mínimo de cuidado. Os sinais externos desse conflito são assustadores. Os agentes políticos já perceberam essa armadilha e passaram a exercer uma pressão sobre o governo que excede os limites do razoável.
Tomemos o exemplo dos prefeitos. Seus Orçamentos foram feitos no pressuposto da manutenção da bonança dos últimos anos. Poucos foram os que, aos primeiros sinais da crise, definiram Orçamentos menos ambiciosos. Acreditaram piamente na imagem oficial da marolinha. Posteriormente, em um alegre encontro em Brasília, ouviram as doces palavras de um presidente à beira da euforia. Agora foram acordados desse sonho pela dura realidade da arrecadação fiscal nos primeiros meses do ano. Personagens-chave na campanha eleitoral do próximo ano, colocaram uma faca no pescoço de nosso presidente, e a chantagem triunfou. Também no governo federal a realidade de uma arrecadação em queda cobrou seu preço.
Os gastos com pessoal e benefícios da Previdência Social, contratados na época da euforia e a serem pagos neste ano de vacas mais magras, comprometerão o Orçamento federal. O espaço de redução de despesas - principalmente no item investimentos- é muito pequeno para compensar os erros cometidos. Além disso, o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) é uma das marcas da possível candidata oficial nas eleições de 2010 e não pode ser ainda mais desmoralizado. A única solução possível é a redução do superávit primário.
Pressionado, o governo reagiu no estilo Lula: com mistificação da opinião pública por meio da manipulação de conceitos e dos números. Aproveitando-se da crise, carimbou a redução do superávit primário como medida anticíclica. Para defender-se, um gaguejante ministro da Fazenda apontou o aumento do déficit fiscal decidido em Brasília como um dos menores entre as maiores economias do mundo. Não diferenciou, entretanto, a qualidade do esforço fiscal em outros países - estes, sim, de natureza anticíclica - com o nosso.
Aumentar os gastos com salários de funcionários públicos em 27% não é medida anticíclica nem no Brasil de Lula, nem na China de Mao e, muito menos, nem na nova China da dupla Hu-Wen. A mesma observação vale para as prefeituras que vão usar os recursos adicionais apenas para gastos correntes.
Medidas anticíclicas de verdade abrangem controle estrito do custeio, redução de impostos - como o do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) dos carros - e aumento de investimentos produtivos. Um pouco de verdade nas justificativas oficiais para a redução do superávit primário não faria mal a ninguém.
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