sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Investimento ou poupança?


Diretamente do Valor Econômico de hoje, artigo do Professor Armando Castelar Pinheiro. 

A maior parte das análises sobre o potencial de crescimento do Brasil enfatiza a limitação imposta à expansão da economia pela nossa baixa taxa de investimento. Desde 1995, quando tem início a nova série das contas nacionais do IBGE, em apenas três anos - 1995, 2008 e 2010 - essa taxa superou 18% do PIB. Estima-se que para sustentar um crescimento do PIB da ordem de 5% ao ano é necessário investir algo como 22% do PIB. Isso, mesmo com premissas otimistas sobre a expansão da produtividade total dos fatores.

As consequências do baixo nível de investimento são visíveis: portos, aeroportos e rodovias congestionadas, apagões na rede elétrica, transporte urbano ruim, baixa cobertura da rede de esgotos etc. No setor imobiliário também é óbvia a falta de investimento, estimando-se que alguns milhões de famílias vivem em condições inapropriadas.

Essa carência de investimentos, por sua vez, é em geral atribuída à nossa baixa taxa de poupança: em 1995-2010, de apenas 15,5% do PIB, em média. O argumento básico é que a demanda por investimento no Brasil é alta, dado o grande potencial de crescimento do país, mas ela esbarra em nossa escassa poupança. O resultado é uma taxa de juros elevada e um baixo nível de inversão.

Não há como contestar que a poupança nacional é baixa e que é necessário elevá-la. Sem isso, uma alta do investimento exigiria déficits elevados com o resto do mundo, potencialmente geradores de crises de financiamento externo. Mas será uma alta da poupança também condição suficiente para elevar o investimento, como sugere o argumento acima? Algumas evidências recentes e outras mais antigas sugerem que não.

No Global Competitiveness Report (Relatório de Competitividade Global) de 2011-12, do Fórum Econômico Mundial, por exemplo, só 3,3% dos empresários consultados consideraram as condições de financiamento como o maior obstáculo para fazer negócios no país. Muito mais importantes são a elevada carga tributária (19,3%), a regulação tributária (16,6%) e a má qualidade da infraestrutura (15,1%), para ficar nos principais. Em suma, o problema maior é o ambiente de negócios ruim.

A recém-divulgada pesquisa do Doing Business, do Banco Mundial, confirma o perfil hostil do ambiente de negócios no Brasil. O país ficou na 126ª posição, entre 183 economias pesquisadas, seis colocações abaixo da do ano passado. O Brasil andou para trás em metade dos itens considerados. Vários dos problemas dizem respeito ao número elevado de procedimentos burocráticos e ao tempo necessário para se cumprir as regras administrativas: por exemplo, no Brasil, uma licença para construção leva 469 dias para ser obtida, contra 221 na média da América Latina e 151 na da OCDE.

No quinquênio 2003-07, o Brasil registrou superávits em conta corrente. Portanto, exportou poupança, o que significa que apesar de baixa, esta foi então mais do que suficiente para financiar a demanda por investimento no país. Atualmente o país registra um déficit, mas este poderia ser maior, dada a disposição dos investidores estrangeiros, se houvesse bons projetos a implantar.

O custo de captação via ações no Brasil não é alto, sendo essa uma opção para empresas grandes, e até algumas médias, captarem recursos para investimentos. No último quinquênio, as captações primárias - portanto, recursos novos - na Bovespa somaram 1,5% do PIB, contra basicamente zero na década anterior. Também isso parece ter tido pouco impacto sobre o investimento agregado.

Nos últimos quinze anos aumentou muito a disponibilidade de financiamento a baixo custo pelo BNDES: de 1,0% do PIB em 1995 para 4,6% do PIB em 2010. Neste ano, a TJLP, descontada a inflação, foi zero. O impacto no investimento da alta na oferta e da queda no custo de recursos foi nulo: em 2010, a taxa de investimento (18,4% do PIB) foi igual à de 1995 (18,3% do PIB). Com isso, tudo que se conseguiu foi quintuplicar a razão entre os desembolsos do Banco e a taxa de investimento, de 5% em 1995 para 25% em 2010. Mudou a forma de financiamento, mas não o ritmo de inversão. A reação das empresas à maior disponibilidade de recursos baratos não foi investir.

O ponto que se deseja fazer não é o da irrelevância de medidas para elevar a poupança, em especial a pública, que ao manter-se sistematicamente negativa penaliza todo o resto da economia. Longe disso, o Brasil precisa de medidas que fomentem a poupança e aumentem a eficiência com que essa é intermediada. O que se quer é chamar a atenção para a necessidade de, em paralelo, remover as barreiras que desincentivam o investimento no país.

A falta de políticas voltadas para melhorar o ambiente de negócios e investimento no Brasil é compreensível, mas lastimável. Compreensível, pois é um processo lento, que exige persistência e não dá aos políticos a oportunidade de se promover em eventos de inauguração. Uma lástima, pois é uma agenda positiva, de baixo custo financeiro e com grande potencial distributivo, já que beneficia desproporcionalmente os pequenos empresários.

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