domingo, 30 de junho de 2013

Gustavo Franco: E o real foi para as ruas...

Leio no ESTADÃO o mestre Gustavo Franco e a relação ruas x R$.

O real se tornou a moeda nacional há 19 anos, quando a inflação beirava 50% mensais, mas não havia ninguém nas ruas. Durante os 15 anos anteriores, quando a inflação acumulou 20.759.903.275.651% (vinte trilhões e troco), o brasileiro produziu grandes manifestações em raras ocasiões: para pedir eleições diretas, e depois para derrubar o primeiro presidente que elegeu nesse formato. A hiperinflação, a maior desgraça econômica que o País já viveu (exceto pela escravidão), não chegou a produzir mais que episódios isolados, seu efeito mais marcante e paradoxal foi o torpor.

Como foi possível que uma monstruosidade econômica desta grandeza não pusesse o País submerso em protestos e passeatas?

Talvez nunca seja possível responder com precisão. A hiperinflação foi um fenômeno gigantesco e incompreensível, inclusive por que faltava clareza quanto ao autor. Não havia uma causa, pois se dizia que a inflação de hoje era a de ontem, portanto, de "natureza inercial", e não tínhamos responsável. Contra quem protestar?

Na verdade, a própria inflação era o protesto, pois a experiência de quem viveu aqueles dias sombrios era sempre a do repasse, ou de "correr atrás" para recuperar poder de compra que se derretia. O custo de vida se elevava 1% ou 2% ao dia, era preciso passar adiante os aumentos, pois era um Tsunami, uma reação em cadeia, um conflito distributivo que nos impunha um comportamento nefasto, pois buscava-se "correr à frente" do processo, e assim nos tornávamos cúmplices do vício, ainda que em legítima defesa.

Conforme observou Elias Canetti, numa passagem famosa do livro Massa e Poder, a hiperinflação pode ser tomada como "um sabá de desvalorização no qual homens e unidade monetária confundem-se da maneira mais estranha. Um representa o outro; o homem sente-se tão mal quanto o dinheiro, que segue cada vez pior; juntos, todos se encontram à mercê desse dinheiro ruim e, juntos, sentem-se igualmente desprovidos de valor".

A hiperinflação era, portanto, um fenômeno depressivo, um exercício cotidiano de queimar a própria bandeira, uma destruição de valores de forma ampla, o suicídio de um símbolo nacional, uma ferida ética. O sentimento de culpa talvez explique, em parte ao menos, o desinteresse na busca de responsáveis. A vilania jamais era associada aos líderes políticos que ordenaram a gastança, as pirâmides e estádios, as transposições, as emendas orçamentárias e a generosidade nos bancos oficiais. Nenhum desses farsantes jamais defendeu a inflação diretamente: apenas atacavam quem queria combater a inflação a sério, os miseráveis neoliberais ortodoxos a serviço do FMI e da globalização.

A imprensa jamais conseguiu produzir um rosto, um vilão, quando muito um ministro que naufragou com um plano de estabilização, e o Ministério Público nunca conseguiu processar ninguém por produzir inflação. Nenhuma CPI funcionou com esses termos de referência. Foi o crime perfeito.

Pois agora, passados 19 anos, ao invés de festejar a monotonia da estabilidade, a ocasião serve para o registro que muitos desses personagens estão de volta. Parece novamente recomposta a mesma coalizão inflacionária da "Nova República", movida pelo "tudo pelo social", ou pela promessa de inclusão social, ou de conquistas, a qualquer custo, e também por projetos megalomaníacos e pela descrença em limites fiscais, tudo isso resultando em um "hiperinflacionamento de desejos" no orçamento ou nos bancos oficiais, bem além das possibilidades dadas pela disposição da sociedade em pagar impostos.

Esta é a matriz da hiperinflação, cujo desenrolar invariavelmente compreende a descoberta da capacidade de administrar "politicamente" a realização de desejos incorporando seletivamente grupos beneficiados na coalizão governista numa espécie de clientelismo de massa. Em seguida, para que o processo ganhe escala, é preciso capturar o Banco Central, a fim de adquirir o controle sobre o crédito e sobre a fabricação de papel pintado, mágica que pode ser compartilhada com os Estados, cada qual com o seu banco emissor e sem limites quanto à capacidade de se endividar.

Agora, todavia, esses canais monetários e creditícios estão bloqueados, embora com alguns vazamentos. A inconsistência entre o inflacionismo da política fiscal e as barreiras institucionais à inflação, notadamente na forma das metas de inflação e dos impedimentos ao endividamento dos Estados (Lei de Responsabilidade Fiscal e outros acordos de reestruturação de dívidas), nunca foi tão aguda, parecendo configurar um quadro de inflação reprimida. O sistema político se vê pressionado a fazer escolhas, as tensões vão se multiplicando, e também o intervencionismo, pois o Estado tenciona ser maior que a Sociedade.

Diante dessas limitações, o governo precisa racionar a realização dos desejos que inflou, e para tanto parece ter criado uma espécie de feira de favorecimentos e seletividades, fiscais e regulatórias, guiadas por idiossincrasias, amizades, preferências e por clientelismo. A Casa prevalece sobre a Rua, como diria Roberto da Matta, não há impessoalidade nos atos da administração, tudo tem o seu destinatário, aos amigos tudo, aos outros a horizontalidade do mercado e a hostilidade dos reguladores. Instala-se o primado da malandragem, o investimento em lobby toma o lugar daqueles que se destinam à produção e à competitividade, o país do futebol se torna propriedade dos cartolas e a Rua se levanta.

Soa familiar? Não é parecido com as reclamações que se ouve nas ruas?

É surpreendente e alvissareiro que a sociedade exiba uma capacidade antes inexistente de perceber a vilania dos velhos mecanismos de socialização dos custos de estádios de futebol ou do apoio aos "campeões nacionais". A imprensa não tem dificuldade em identificar os enredos e beneficiários, bem como as fórmulas de ocultação e os truques contábeis e manipulações. A irritação se torna cotidiana e crescente. Ninguém quer pagar as contas que não lhe pertencem, as escolhas do governo são equivocadas e provocam indignação: se há dinheiro para o Itaquerão e para o trem-bala, como as escolas, hospitais e ônibus podem ser tão ruins?

O "sistema político" tem muitos defeitos, mas o problema aqui tem muito mais que ver com a liderança e há uma eleição logo à frente. No mundo plano da globalização e das redes sociais, seria normal que a aversão a esse pseudo-capitalismo de quadrilhas trouxesse para o centro da política o desejo de horizontalidade, transparência, responsabilidade fiscal, probidade, meritocracia e impessoalidade nas regras do jogo econômico. Era disso que se tratava o Plano Real, sobretudo no seu capítulo sobre reformas. Mas o que estamos vendo nos últimos anos é muito diferente. É compreensível a irritação dessa maioria silenciosa com a epidemia de "seletividade", privilégio e compadrio, que se sabe serem o berço da corrupção. Surpreendente mesmo não é o protesto e seus temas, mas o timing e a faísca que o determinou.


A política econômica de Armínio Fraga para os dias de hoje.

Armínio Fraga no GLOBO, diz o que ele mudaria na atual política econômica se estivesse no poder.


Muita coisa, mas nem estou, nem sou candidato a nada... Escrevi com colegas recentemente um artigo, na verdade dois artigos, que vocês publicaram, argumentando que o Brasil vivia uma certa encruzilhada. O primeiro artigo sugeria que poderíamos estar caminhando em direção a um modelo que deu errado, parecido com o da década de 70, com pouco foco em produtividade, modelo mais fechado, bancos públicos tendo papel grande demais, pouca capacidade de mobilizar investimento em infraestrutura e outras questões como essas. Sem prejuízo de muita coisa boa que aconteceu no combate à pobreza, na melhoria da distribuição de renda, isso tudo é essencial e obviamente tem que continuar. Agora de fato me parece que o Brasil tende a ir nessa direção que deu errado no passado. Rever esse modelo me parece essencial. Esse modelo que comentei no início da conversa, onde Brasília passa a ser um destino de peregrinação de empresários, pleiteando subsídios, proteções, crédito barato, é um modelo muito ruim, inclusive do ponto de vista distributivo. É um modelo pró empresa e não pró mercado. Melhor reduzir o Custo Brasil e deixar os empresários competirem entre si. A política recente de combustíveis e automóveis, discutida recentemente em coluna da Miriam Leitão, carece de mudanças: o Brasil subsidia carbono e automóvel, quando o mundo inteiro parece querer diminuir a sua pegada e ter menos carros andando nas ruas, focar mais em transporte público, menos poluente e “engarrafante”. Quando o governo segura o preço do petróleo como segurou durante muito tempo com o objetivo de afetar o índice de inflação, se vê o Brasil indo em direção contrária da que seria correta. O foco do governo Fernando Henrique Cardoso em saúde e educação é atual e correto tanto do ponto de vista de justiça social quanto de crescimento. Tudo que está acontecendo no mundo da infraestrutura, a meu ver, requer muita atenção e vejo bastante espaço para melhorias. Faço questão de registrar aqui que o próprio governo tem dado sinais de que quer caminhar nessa direção e espero que as incertezas com relação aos investimentos na infraestrutura não atrapalhem demais a retomada do investimento, que já está muito atrasada.

sábado, 29 de junho de 2013

O sinal e o ruído - por que tantas previsões falham e outras não.


Neste final de semana minha agenda é com o livro do Nate Silver “O Sinal e o Ruído - Por que Tantas Previsões Falham e Outras não.” Conforme li na EXAME trata-se de um dos melhores livros de economia lançado nos Estados Unidos em 2012 e agora aqui no Brasil. Recomendo a todos os colegas economistas que também utilizam a estatística em seus trabalhos.    

Cita a EXAME que “o tema do livro ganha peso quando se lembra das previsões de Nate Silver, estatístico do New York Times, para as eleições norte-americanas. “Não é um livro só de economia, e sim um livro sobre a ciência e arte de fazer previsões”, segundo Tony Volpon, chefe de pesquisa para mercados emergentes do Nomura.


Silver investiga como se pode distinguir sinais verdadeiros em um universo de dados confusos. Para Silver, o excesso de confiança é, geralmente, o motivo da ruína de muitas previsões – e elas poderiam melhorar com um aperfeiçoamento da incerteza.”

Problemas demais, governo de menos.

Leio hoje no ESTADÃO de 27.06.2013 artigo de José Serra sobre o atual momento econômico e político brasileiro. Apesar de Serra ter muitos críticos, a sua opinião merece ser conhecida.   

As manifestações que tomaram conta do Brasil nas últimas semanas derreteram a agenda política nacional, até então dominada pela prematuríssima campanha eleitoral, com três ou quatro candidatos já definidos. Sejam quais forem suas origens, seus mecanismos de propagação, virtudes, defeitos e consequências, o fato é que as mobilizações já produziram na vida brasileira um daqueles momentos em que "o futuro não será mais como era", para evocar Paul Valery.

Neste momento, partidos e governos, nas três esferas, sentem-se acuados, mas o foco principal de tensões situa-se no Palácio do Planalto, o grande responsável, aos olhos da população (e é mesmo!), pela condução do País.

O governo federal já vivia uma situação difícil, em razão do esgotamento do modelo econômico lulista: rápido crescimento do consumo, baixo investimento, forte criação empregos menos qualificados e inflação baixa. Esse modelo foi viabilizado pela notável bonança externa, juntamente com o crescimento acelerado das importações, o aumento do crédito para o consumo e a sobrevalorização cambial. Foi a época da farra de divisas e da lei do menor esforço, com estatuto semelhante ao da lei da gravidade.

A eclosão das manifestações coincidiu com o fim desse ciclo e a estagflação. Elas podem não ser efeito direto das condições da economia, mas é evidente que eclodem numa dada realidade, e não no vácuo: desaceleração do consumo em razão do menor crescimento da renda, do endividamento familiar elevado e da maior inflação; desaceleração da criação de empregos menos qualificados e falta de perspectivas para os assalariados de maior renda.

Nada pior para um governo já sem rumo do que a ventania contrária das ruas. Daí a ansiedade, a atrapalhação e a exacerbação do marketing das soluções virtuais. O emblema do desatino foi a tal Constituinte com o fim específico de fazer a reforma política. A proposta, tida como irrevogável, era de tal sorte absurda que foi revogada em 24 horas. Ficou a pergunta: como pôde a Presidência da República errar de forma tão bisonha? Agora, a fim de disfarçar o recuo, trocou-se a Constituinte exclusiva pelo plebiscito, proposta impraticável.

Além do "pacto" da reforma política, a presidente propôs o pacto da educação: 100% dos royalties do petróleo para o setor. Resumir os problemas da educação à elevação do orçamento seria equivocado. Mesmo assim, os novos recursos vindos desses royalties serão bem menores do que se alardeia, pois a vinculação só vale para contratos de exploração firmados a partir de dezembro de 2002. E eles não gerarão petróleo antes de seis anos; dentro de uns dez o total destinado à educação poderia chegar a R$ 8,5 bilhões anuais - cerca de 3% do Orçamento da União, dos Estados e municípios.

Já o "pacto" da saúde consiste em importar uns 6 mil médicos estrangeiros - a quase totalidade, cubanos. Alguém é contra água encanada ou luz elétrica? Assim, quem se opõe a que o Brasil tenha mais médicos? O problema é como fazer. Eles estão é mal distribuídos, concentrados nas regiões do País com mais infraestrutura. É preciso criar condições para que atuem no interior - e pouco se faz nesse sentido. Nada contra, é evidente, a que profissionais de outros países atuem aqui, desde que seus diplomas sejam revalidados mediante exames, que o Ministério da Saúde quer dispensar. Nota: apenas 5% dos médicos cubanos que a eles se submeteram foram aprovados.

A má distribuição dos médicos é apenas um dos problemas da saúde. O PT reduziu de 53% para 44% a fatia dos gastos totais no setor, jogando mais peso nas costas de Estados e municípios. A Anvisa foi loteada, padrão Agnelo Queiroz; a Funasa, degradada. Durante a gestão petista, a participação das despesas correntes do Ministério da Saúde no SUS caiu de 17% para 14% do total do governo federal (excluídos o benefícios previdenciários). A rede hospitalar tem sido fragilizada, sufocando as Santas Casas. Se a proporção de recursos do SUS para o atendimento hospitalar fosse a herdada do governo FHC, hoje seriam destinados a essa área R$ 7,5 bilhões a mais por ano.

Outro ""pacto" anunciado é o dos transportes urbanos: R$ 50 bilhões. A gente fica com a impressão de que são recursos a fundo perdido. Não! Viriam principalmente na forma de oferta de crédito a Estados e municípios. Além disso, matéria do Valor evidenciou que, dos recursos federais disponíveis para essa finalidade, 93% não foram ainda utilizados. Na prática, transportes urbanos nunca foram prioridade do governo petista. Do contrário, jamais teria lançado, há seis anos, o alucinado projeto do trem-bala entre São Paulo e Rio, cujo custo deve andar ali pelos R$ 70 bilhões. Por sorte, a incapacidade executiva do governo não permitiu que o projeto andasse depressa, mas já deve ter consumido cerca de R$ 1 bilhão, com direito à criação de mais uma estatal. Cancelar o trem-bala e concentrar os recursos em trens urbanos seria medida mais que oportuna quando se fala em pactos pelo Brasil.

O bom senso, aliás, recomendaria o barateamento do custo das eleições e maior proximidade entre eleitor e eleito, como a adoção do voto distrital. Se o Planalto quer diminuir a corrupção na máquina pública, não precisa de propostas mirabolantes. Que se exija certificação dos 25 mil cargos de confiança e dos altos funcionários de todas as empresas federais e se refaça com critérios técnicos todo o quadro de dirigentes de agências reguladoras. Mais ainda, que se regulamente com urgência o parágrafo 3.º do artigo 37 da Constituição federal, sobre a participação dos usuários na administração pública direta e indireta, com ênfase no controle da qualidade dos serviços.

Tais medidas, entre outras, seriam simples e eficazes. Mas no petismo o fácil é sempre difícil, pois eles são especialistas em obter vantagens com as dificuldades que criam, e têm a convicção de que os problemas do País se resolvem com marketing e anúncios solenes.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Ressaca monetária.

Editorial da FOLHA e a ressaca monetária. E as previsões são pessimistas para o que vem por aí. E ainda estamos em 2013...

Dólar sobe no mundo todo após anúncio de reviravolta do Fed, e efeito no Brasil se agrava com as deficiências da política econômica de Dilma

Se o governo Dilma Rousseff antes perdia o sono com o "tsunami monetário" -- como caracterizava o fluxo de entrada de capitais resultante da política do Fed (banco central americano) de inundar o mercado com recursos --, sobram agora razões para se preocupar com a retração da onda.

Os sinais de reversão da maré estão à vista de todos. Há mais otimismo com a recuperação da economia americana, que deve crescer 2% neste ano e talvez bem mais que isso em 2014. Com a melhora, o estímulo monetário deixaria de ser necessário.

O Fed já navega nessa direção. Seu presidente, Ben Bernanke, disse que as compras de títulos no mercado -- hoje no ritmo de US$ 85 bilhões ao mês -- serão contraídas em breve e suspensas até meados de 2014. Para prevenir sobressaltos, disse que a retirada será gradual e que a taxa de juros deve permanecer perto de zero até 2015.

O mercado financeiro não tem paciência com detalhes. Quando identifica mudanças como essa, antecipa as consequências: menos recursos no mercado global, juros em alta nos EUA e valorização do dólar perante outras moedas, especialmente de países emergentes.

No caso do Brasil, há o fator agravante da política econômica errática, em particular na questão da austeridade fiscal, que prejudica a imagem do país. Acentua-se, com isso, o temor pela perda de valor dos investimentos aqui realizados, o que provoca a saída de dólares e a consequente desvalorização da moeda nacional.

A cotação do real frente ao dólar fechou em quase R$ 2,26, ontem, mesmo após o Banco Central comprometer US$ 3 bilhões para conter a desvalorização. Foi o pior nível desde abril de 2009, quando a crise internacional estava no auge.

Um sintoma da deterioração do cenário foi o adiamento da oferta de ações da Votorantim Cimentos na Bolsa, que deveria levantar até R$ 10 bilhões. É notável o contraste com a situação de abril passado, quando a BB Seguridade conseguiu captar R$ 11,4 bilhões.

Salvo uma improvável grande decepção com a economia americana, nos próximos anos haverá um enxugamento do capital farto em circulação pelo mundo.

O Brasil está mais preparado que no passado para enfrentar a turbulência: tem US$ 375 bilhões em reservas, e a dívida em dólar do governo foi eliminada, entre outros fatores. Mas aproveitou mal a liquidez externa: não aumentou a taxa de investimento, não ajustou as contas públicas como deveria e não reforçou a competitividade da economia para enfrentar a saída de capitais.

A alta do dólar encarece importações e incentiva aumentos de preços domésticos, realimentando a inflação. O Banco Central se vê forçado a elevar ainda mais os juros. Nesse mar revolto, vai a pique o otimismo postiço do governo federal nos últimos anos


quarta-feira, 19 de junho de 2013

Indexação.

Antonio Delfim Netto, diretamente da FOLHA DE S. PAULO.  

No dia 16/6, a excelente jornalista Raquel Landim, especializada em assuntos econômicos, escreveu nesta Folha um artigo importante, "Obsessão nacional".

Nele, revela uma das jabuticabas da realidade brasileira: a existência de nada menos que 29 índices construídos por quatro instituições (IBGE, FGV, Fipe e Dieese) para medir no tempo, em setores e no espaço a nossa taxa de inflação. São divulgados nas mais diversas frequências. Até índices diários, exclusivos, pagos à FGV pelos interessados por necessidade de ofício.

Por incrível que pareça, a lista já está desatualizada: a Ordem dos Economistas do Brasil relançou, no último dia 7, o seu Índice de Custo de Vida da Classe Média (ICVM), que inclui 468 bens e serviços.

Se a confusão fizesse sentido, poderíamos dizer que o brasileiro é o cidadão mais bem informado e atualizado do mundo sobre a taxa de inflação. Há aqui, entretanto, um problema trágico. Como a taxa de inflação é uma espécie de radiador que dissipa o calor dos atritos produzidos pelo mau uso dos fatores de produção, o desperdício de tempo e recursos para construir essa multiplicidade de medidas é, ele mesmo, uma causa infinitesimal da inflação!

O artigo chama a atenção para o fato de que, "na Austrália, a inflação é divulgada uma vez a cada três meses". Talvez esta seja uma pequena causa para ajudar a explicar por que lá a taxa de inflação anda às voltas de 2,4% e, no Brasil, ela teima em rodar no limite superior da meta, 6,5%.

Uma das poucas afirmações seguras sobre a taxa de inflação é a de que a inflação de 2013 será igual à "expectativa" de inflação formada pela sociedade, corrigida, positiva ou negativamente, pela política econômica de 2013.

No Brasil, há um fator que mexe com as "expectativas" e, fisicamente, liga a inflação de 2013 à de 2012 de forma inexorável: é o mecanismo de indexação informal e formal do qual não fomos capazes de nos livrar, mesmo com o bem-sucedido Plano Real.

O ilustre e competente professor de econometria da FEA-USP, José Tiacci Kirsten, fez uma análise (ainda não publicada) do novo índice, onde mostra que os bens e serviços indexados representam 36,1% do peso no índice geral. No exercício feito com o mês de maio, 451 dos 468 preços apurados têm alguma forma de indexação (pelo salário mínimo, por sindicatos, pelas administrações públicas, por índices de preços anteriores e "tutti quanti"), o que mostra o pequeno papel do mercado.


O prof. Kirsten conclui que, no "núcleo duro da inflação, cerca de 90% é representado pelos preços dos bens e serviços indexados, o que gera uma inflação inercial cuja barreira será difícil de transpor". 

Unicamp - a melhor universidade com menos de 50 anos.

Leio no UOL uma ótima notícia nestes dias tão confusos e preocupantes para os brasileiros. 

A Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) é a única instituição de ensino superior da América Latina na lista das cem melhores universidades com menos de 50 anos. A universidade brasileira está em 28o lugar na lista preparada pelo THE (Times Higher Education) -- posição bem melhor do que no ranking do ano passado, em que estava em 44o lugar.

A universidade brasileira é também a única dos BRICs. China, Rússia e Índia têm universidades "jovens", mas nenhuma delas está entre as cem melhores do mundo com menos de 50 anos.

Os primeiros lugares da lista são ocupados por universidades de países europeus e asiáticos. Ao todo, 28 países têm universidades no rankings das mais jovens.

Uma diferença em relação à listagem do ano passado, de acordo com a análise do físico da Unicamp Leandro Tessler, estudioso em ensino superior, é a entrada de instituições de países em desenvolvimento como Irã, Arábia Saudita e Turquia. A Universidade Koç, da Turquia, por exemplo, está em 31o lugar. No ano passado, ela nem entrou na lista das cem melhores instituições jovens.

Apesar de o Brasil estar bem em relação aos países vizinhos, o número de instituições brasileiras na listagem caiu. A Unesp (Universidade Estadual Paulista) perdeu posições e saiu da lista das cem melhores. No ano passado, a Unesp estava em 99o lugar.

Desde 2012 o THE elabora uma listagem específica com metodologia própria para as universidades com menos de 50 anos. A ideia é estabelecer uma comparação mais justa entre essas instituições.

No ranking internacional do THE, feito desde 2004, todas as universidades são comparadas entre si a partir de critérios ligados à qualidade de ensino e de pesquisa. Isso prejudica a avaliação das instituições mais jovens, que são comparadas a instituições como Harvard, dos Estados Unidos, que começou a funcionar no século 17.

A lista das melhores com menos de 50 anos, no entanto, muda a cada ano porque as universidades "envelhecem". Se passar dos 50 anos, a instituição deixa de fazer parte do grupo

domingo, 16 de junho de 2013

Contas públicas brasileiras em 2013.

NILSON TEIXEIRA, Ph.D em economia pela Universidade da Pensilvânia e economista-chefe do Credit Suisse, recentemente analisou na FOLHA as contas públicas brasileiras.

O tema das contas públicas ganhou destaque na imprensa nos últimos meses, por causa do novo ciclo de aumento dos juros, do alto nível da dívida pública e da adoção de sucessivas medidas de desoneração.

Nesse ambiente, nosso cenário para as contas públicas ainda pode ser classificado como favorável. Prevemos superavit primário (diferença entre as receitas e despesas do setor público, exceto as despesas com os juros líquidos sobre a dívida pública) ligeiramente inferior a 2,0% do PIB em 2013 e 2014.

Quando deduzimos o pagamento dos juros, temos uma projeção de deficit nominal em torno de 3,0% do PIB em ambos os anos, com dívida pública bruta próxima a 60% do PIB no período.

Esse quadro pode ser tido como favorável, em parte porque adotamos um cenário que está longe de ser consensual: crescimento do PIB de 3,0% em 2013 e 4,0% em 2014 e taxa Selic estável em 8,75% a partir de agosto.

Se assumíssemos menor crescimento ou mais juros, teríamos um superavit primário provavelmente inferior ao necessário para uma dívida pública estável, condição mínima para sustentabilidade fiscal de longo prazo.

Essas simulações já não sugerem, portanto, um cenário tão benigno. O mesmo pode ser dito sobre a fragilidade dos resultados fiscais neste ano. O superavit primário acumulado até abril, de 0,9% do PIB, é o menor desde 2005, com exceção de 2006 e dos anos em que a meta fiscal de 3,1% do PIB não foi cumprida (2009 e 2010).

Em todos os anos, a média do superavit primário entre maio e dezembro diminuiu na comparação com a média entre janeiro e abril, sendo o menor recuo de 38% em 2011 e o maior de 70% em 2012.

Caso o recuo seja de 55% entre os dois períodos deste ano, similar ao declínio médio entre 2006-2012, o superavit primário será de 1,6% do PIB. Um primário de 2,3%, conforme prometido pelo governo, seria compatível com um recuo de apenas 15% na média entre esses períodos, muito abaixo do usual.

A incerteza sobre a gestão de política fiscal aumentou também devido a sucessivas alterações dos parâmetros de sua execução, que incluem a retirada de certas estatais da contabilidade fiscal em 2009 e 2010; a maior anuência com a expansão dos gastos de Estados e municípios; o uso das operações de triangulação de ativos entre o Tesouro e outras entidades; e a utilização de receitas extraordinárias, como de privatização, para o cumprimento da meta.

As alterações propostas sobre a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2013 e 2014 reduzem o superavit primário mínimo, para efeito de cumprimento da meta, para cerca de 1,0% do PIB. A mera possibilidade de um valor tão baixo compromete o papel da meta como referência para a política fiscal e eleva o risco de aumento da dívida.

Certamente, o quadro recente não representa uma deterioração fiscal irreversível. Porém faz-se necessário reduzir a incerteza sobre as contas públicas, o que requer uma política fiscal mais austera, que garanta, por exemplo, uma redução da dívida pública dos atuais cerca de 60% do PIB para patamar próximo ao de outros emergentes, em torno de 35% do PIB na média (veja gráfico).

Isso contemplaria um período com superavit primário alto o suficiente para garantir o rápido declínio do deficit nominal e da dívida pública. Mesmo com o nível de endividamento ainda alto, seria razoável admitir alguma flexibilidade. Nesse caso, poderia ser adotada uma estratégia que, de modo transparente, interrompesse o declínio da dívida bruta como proporção do PIB, de forma a estimular a economia.

Para que essa abordagem seja crível, seria necessário definir, de forma precisa, as condições para a retomada da estratégia anterior de redução da dívida.

O que torna o problema ainda mais crítico é que, desde 2008, foi emitida dívida mobiliária extra de cerca de R$ 400 bilhões, em torno de 20% do estoque da dívida total, visando atender apenas os aportes a instituições públicas, notadamente financeiras.

Dada a provável demanda por financiamento de bancos públicos para infraestrutura nos próximos anos, haverá a necessidade de emissão de mais de R$ 50 bilhões ao ano até o fim desta década.

Sem discutir seu mérito, esses aportes embutem a concessão de subsídios crescentes e disseminados e geram um fluxo também crescente de despesas com o pagamento de juros nos próximos anos, o que dificulta muito a redução do deficit nominal.

Em suma, é preciso recuperar a credibilidade da gestão da política fiscal. Isso pode ser alcançado com a aprovação de regras críveis, que, em última instância, eliminem o deficit nominal nos próximos anos. Porém os eventos aqui mencionados sugerem que esse objetivo seria perseguido pelo governo apenas no caso de expressiva expansão da arrecadação e do PIB.

Ainda que fosse o caso, uma regra contingente não seria suficiente para transmitir maior credibilidade, em um contexto de recorrentes extensões e inclusões de novas cláusulas de escape para a meta de superavit primário integral. Compromissos vagos e contingentes à recuperação da atividade não resolverão o impasse atual.


domingo, 9 de junho de 2013

Entrevista com Delfim Netto.

Abaixo os principais trechos da entrevista de Delfim Netto que li no portal UOL, mas a matéria é do ESTADÃO.  

Por que o sr. defende uma política fiscal austera e déficit nominal zero?
Porque só a política monetária (taxa de juros) é incapaz de controlar essa inflação. Os juros sozinhos impõem um custo social gigantesco, muito maior que o necessário. Mas o governo está mudando. Ele deixou o dólar flutuar um pouco mais, acabou aceitando a ideia de que precisa de uma política monetária um pouco mais ativa. Falta um complemento fundamental que é uma mudança radical no entendimento da economia brasileira.

Há muitas críticas de economistas que acreditam que o governo vai gerar um superávit primário (economia para pagamento dos juros da dívida pública) menor que 2% do PIB neste ano.
Tem de esquecer o superávit primário. Temos de ir para o déficit nominal zero. O que interessa é o déficit fiscal.

O que ocorreria se a presidente Dilma Rousseff anunciasse agora que vai buscar o déficit nominal zero?
Se ela disser "eu vou buscar o déficit nominal zero nos próximos três anos", o efeito ocorre hoje, pois ela tem credibilidade. E estamos nas vésperas de recuperar a credibilidade. Está na mão dela fazer isso. O governo precisa fazer com que todos os gastos avancem menos que o PIB, sobretudo despesas correntes. Graças aos enormes truques contábeis, ninguém mais acredita em nada. A tal quadrangulação fiscal realizada no fim do ano foi a gota que derrubou a água do copo.

E isso melhoraria o sentimento dos empresários para investir e rebaixaria os juros futuros?
E criaria também um ambiente favorável para as novas concessões públicas, como estradas, aeroportos, ferrovias. A presidente é uma mulher inteligente, preparada e pragmática. Tudo o que ela fez está correto. A forma de fazer você pode discutir. Ela agiu bem na mudança das regras da poupança, na desoneração de impostos federais da folha de pagamento, no acordo do aumento salarial do serviço público. Só que na execução tem muito atrito. Daqui a dois anos tudo isso estará no lugar certo e vai ajudar o crescimento.

A adoção do déficit nominal zero pode ocorrer no curto prazo?
Sim. O mercado tem a percepção de que a situação fiscal no Brasil é uma esculhambação. Há uma crença no mercado, que não é a minha opinião, de que o governo já não sabe mais qual é o déficit público que está criando. Para o mercado, o governo faz tanto truque, mexe com tanta coisa, que não tem mais credibilidade. É preciso encontrar um caminho claro e transparente que não tenha mais truque.

Essa percepção ruim sobre a política fiscal colaborou para que a Standard & Poors mudasse a perspectiva do Brasil de estável para negativa.
A decisão da Standard & Poors reflete esse pensamento do mercado, que é exagerado. O governo mexeu tanto que as pessoas adquiriram uma percepção de que o sistema está caminhando mal. Não adianta insistir que a situação não é essa, pois as pessoas respondem à situação na qual elas acreditam.

Por que o BC aumentou o ritmo da alta de juros pela primeira vez no governo Dilma?
O BC adotou essa postura para cortar a demanda mesmo. Mas vai cortar a demanda privada, quando o que tem de ocorrer é a redução da demanda pública. E, na medida em que isso não acontece, sobe o custo da dívida, que eleva o déficit público. A solução para o problema é fiscal. O Tombini vai aumentar os juros para onde eles terão de ir. Só que, se tiver que subir os juros sem o ajuste fiscal, a Selic vai aumentar para dois dígitos, seguramente. Se deixar tudo na mão do BC, e se ele for cumprir o seu papel, isso vai gerar uma recessão muito mais profunda do que em qualquer outra condição.

Nesse contexto, o crescimento do País de 2,5% neste ano estará de bom tamanho?
Eu acho que deve ser por aí mesmo. Mas o ano não está acabado.

O BC disse na ata da última reunião do Copom que o caminho do dólar é de fortalecimento. O sr. Concorda?

É de fortalecimento mesmo, o que tem consequências, como a queda do preço das matérias-primas. E sobem os juros nos EUA. Ou seja, a direção do investimento estrangeiro vai mudar. Os EUA são um elefante na sala. Ele mexe o rabo e quebra quatro ou cinco peças de louça, e nós somos uma louça que está lá na sala. Hoje é o momento próprio para fazer essa inversão: dar para o setor externo aquela convicção que existia há três anos de que o Brasil é um país no qual as oportunidades de investimentos são as mais seguras. 

Dilma ensaia retorno à receita de FHC.

Hoje, na FOLHA, um "resumo" da atual situação da economia brasileira e a necessidade do retorno ao que era observado nos governos de FHC e Lula. 

Com a inflação ameaçando sair do controle e a popularidade em queda, a presidente Dilma Rousseff vem promovendo uma mudança na sua política econômica ao elevar os juros e soltar as amarras da taxa de câmbio.

Economistas renomados avaliam que o governo vem sendo obrigado a adotar, parcialmente, a receita que garantiu a estabilidade de preços nos governos FHC e Lula.

Com exceção do controle de gastos públicos, pouco a pouco o governo retoma as outras duas bases do tripé econômico: metas de inflação e câmbio flutuante.

"O Banco Central resolveu se mexer e isso representa um reforço ao tripé", disse à Folha o ex-presidente do BC, Armínio Fraga, que instalou o sistema de metas de inflação no Brasil em 1999.

Nas duas últimas semanas, o BC apertou o ritmo de elevação da taxa básica de juros e o governo baixou impostos para atrair investidores estrangeiros em renda fixa. Dilma frisou publicamente que "o câmbio é flutuante".

O discurso marca uma diferença em relação ao que vinha sendo praticado até então. O governo havia flexibilizado o tripé em direção ao que chamou de "nova matriz econômica": juros baixos, câmbio forçadamente desvalorizado e desonerações.

Para economistas, as mudanças promovidas pelo governo não estão sendo feitas por convicção, mas por necessidade, por conta do aumento dos preços e do movimento global de apreciação do dólar.

"Está começando a pegar fogo na sala, então jogam um balde de água", diz Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC. A inflação acumulada em 12 meses até abril está em 6,5% --teto da meta do BC.

Pastore avalia que a política econômica de Dilma não gerou crescimento e, sim, inflação. "O governo ficou preso num dilema: crescimento baixo e inflação alta."

Apesar dos sinais de mudança, o mercado financeiro ainda não está convencido de que é para valer, por conta da resistência do governo em controlar seus gastos.

Sem reduzir as despesas públicas é mais difícil conter a inflação e o BC tem que elevar ainda mais os juros. Há uma descrença no mercado de que o governo está disposto a subir a taxa o suficiente para trazer a inflação de volta para a meta (4,5%).

Na quinta-feira à noite, a S&P ameaçou rebaixar a classificação do Brasil, citando a "perda de credibilidade" da política econômica.

Segundo a Folha apurou, a avaliação no Ministério da Fazenda é que a política fiscal "já é austera, anticíclica e vai continuar sendo".

Para Armínio Fraga, o tripé econômico não tinha sido abandonado, mas "flexibilizado". "A inflação foi saindo de controle e o governo respondeu com medidas pontuais, que mascaram o problema. Agora o BC agiu."

Para ele, o mercado teve a impressão que o dólar estava "tabelado" em torno de R$ 2, mas isso foi "desmentido pelos fatos". "O que me preocupa é que a política fiscal segue expansionista e isso prejudica o trabalho do BC".

Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Unicamp e conselheiro da presidente Dilma, concorda que o governo está economizando menos.

Mas, para ele, isso é resultado da queda da arrecadação, provocada pela fraqueza da economia, e das reduções de impostos para recuperar o crescimento.

"O BC está elevando os juros porque o ajuste fiscal é mais difícil. E isso é o preço que pagamos pelo desarranjo do passado", afirma, referindo-se aos efeitos da valorização do dólar por anos sobre a indústria brasileira.

Para o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, o governo está aproveitando o momento de alta global do dólar, provocado pela recuperação da economia americana, e permitindo minidesvalorizações do real.

"Há uma pressão de depreciação no mercado, devido ao deficit comercial e à redução de entrada de capital, e o governo deixou o dólar chegar a R$ 2,15", disse Bresser.

O ex-ministro tem críticas ao tripé macroeconômico. Segundo ele, nesse regime, o dólar barato foi o principal instrumento contra a inflação. Tampouco prevê como exitosa a estratégia de Dilma:


"Com essa política, não vamos retomar o crescimento, porque a taxa de câmbio continua apreciada."

segunda-feira, 3 de junho de 2013

A caminho do fracasso.

Que bom ler hoje na FOLHA o reconhecimento pelo Bresser-Pereira que, afinal, a Argentina não é um exemplo a ser seguido.  

Liberalismo econômico e desenvolvimentismo são duas formas de organização econômica e social do capitalismo e dois estilos de política econômica. Nesta segunda acepção, a escolha do estilo envolveria uma troca: mais estabilidade no liberalismo, mais crescimento no desenvolvimentismo.

Na realidade, o liberalismo econômico rejeita deficit públicos, mas aceita deficit crônicos em conta corrente, o que o deixa sujeito a crise de balanço de pagamentos.

Já o desenvolvimentismo competente rejeita ambos os deficit, e promove crescimento com estabilidade, enquanto o desenvolvimentismo populista aceita os dois deficit, e acaba não logrando nem crescimento nem estabilidade.

As políticas econômicas liberais, ao aprovarem deficit em conta corrente crônicos, estão praticando populismo cambial: pensam que promovem o aumento do investimento, mas, ao levar o país como um todo a gastar mais do que suas receitas de exportação permitem, apreciam o câmbio, incentivam mais o consumo do que o investimento e, afinal, levam o país à crise.

O caso argentino mostra como um desenvolvimentismo que começou competente pode derivar para o populismo fiscal e cambial ("fiscal" se o Estado gastar irresponsavelmente, "cambial" se o país como um todo fizer o mesmo).

Depois de uma brutal crise causada pela adoção de políticas ortodoxas, o peso se desvalorizou. O novo governo que surgiu da crise estabeleceu uma retenção sobre as exportações de commodities que neutralizou a doença holandesa e produziu superavit em conta corrente; ao mesmo tempo, adotou política fiscal responsável, alcançou superavit fiscais e reestruturou sua dívida externa com coragem e firmeza.

O resultado foi o surgimento de oportunidades de investimento lucrativo para as empresas. A taxa de investimento aumentou, e o país cresceu a taxas elevadíssimas durante vários anos: em média, 8,5%.

Entretanto, em 2007, a inflação, que estava em torno de 9%, saltou para 18%, devido a um crescimento acelerado dos anos anteriores.

O governo, no quadro do pleno emprego, ao invés de adotar políticas duras e ajustar a economia, segurou o câmbio para controlar a inflação, e aumentou a despesa pública. Em consequência, o peso valorizou-se 41% entre 2007 e 2012, o país perdeu competitividade e entrou em deficit em conta corrente.

Devido a essa combinação de populismo cambial e fiscal, em 2012 o crescimento do PIB foi de apenas 1,9%, enquanto surgia novamente um mercado paralelo de dólar, hoje comprado pelo dobro do preço oficial, porque o medo de nova crise cambial ressurgiu na população.

Durante um tempo, vendo a responsabilidade fiscal, o superavit em conta corrente e a neutralização da doença holandesa, acreditei que os argentinos haviam aprendido a administrar o câmbio e a garantir a competitividade do país, e que poderiam ser um exemplo de novo desenvolvimentismo para o Brasil, que até hoje não aprendeu essa lição.


Mas, com tristeza, vejo agora uma estratégia de desenvolvimento que poderia ter garantido prosperidade e estabilidade para a Argentina caminhar para o fracasso.

domingo, 2 de junho de 2013

O mundo não é culpado.

Apesar de ser leitor da Míriam Leitão, raramente comento algum artigo seu neste espaço. Porém, neste domingo em sua coluna no GLOBO e em seu blog, consegue bem escrever o que muitos sensatos colegas também pensam.  

Esta semana se soube que Brasil e Estados Unidos cresceram no mesmo ritmo no primeiro trimestre de 2013. Nós, 0,6%, e eles, 2,4%. É a mesma coisa. A diferença é apenas a forma como se calcula: eles apresentam o índice de forma anualizada e nós temos o hábito de olhar o dado do trimestre em relação ao anterior. Mas ficou claro que o que é bom para os Estados Unidos não é bom para o Brasil.

Para eles, o número significa a continuação da recuperação. Para nós, sinal de que estamos perto da estagflação: crescemos pouco com inflação alta. Eles são a maior economia do mundo, vivem ainda uma crise sistêmica e fizeram um forte corte de gastos públicos. Nós estamos aumentando os gastos e desidratando o superavit primário. Eles estão demonstrando dinamismo econômico. O Brasil tem perdido competitividade.

Nós sentimos os abalos da crise, mas o Brasil estava mais bem preparado do que em outros eventos de crise externa. O problema é o ponto em que estamos agora. O país não consegue sair do baixo crescimento. Os cálculos apontavam números mais robustos mas eles definharam novamente. Tem sido assim desde o começo de 2011.

Se o Brasil não é o centro da crise e se está mais forte do que em outros eventos internacionais, por que não consegue crescer? E, se não está crescendo, por que não consegue derrubar a inflação?

São as inquietações do momento. Elas é que fazem o 0,6% de crescimento no primeiro trimestre parecer pior do que é. Esperava-se mais, porque nada nos impede de crescer em ritmo maior a não ser a gestão confusa da economia.

O governo anunciou uma sequência tão grande de pacotes de estímulo que nem é necessário parar para contar. Seria perda de tempo. Todos viram a hiperatividade sem rumo com a qual o governo administrou a economia nos últimos dois anos e meio. Foram vários pacotes, desonerações, R$ 400 bilhões transferidos para o BNDES, estímulos ao consumo, bancos oficiais oferecendo dinheiro aos clientes para alavancar as compras, subsídios a vários setores industriais, subsídios ao uso da gasolina. Ao fim disso, o país colheu... PIBs pequenos e minguantes.

Talvez seja porque o governo está no rumo errado. Menos hiperatividade e mais estratégia trariam os resultados esperados. Ao intervir demais na economia, criou incertezas e distorções. O governo concedeu benefícios fiscais a setores industriais para incentivar o consumo. Conseguiu no máximo antecipar decisões de compra. Estimulou o consumo das famílias através do endividamento. Aumentou seus gastos. Desta forma, foi alimentando a inflação, que tirou capacidade de consumo das famílias.

Aos investidores, o país tem emitido sinais erráticos. A intervenção na energia descapitalizou o setor. Para cobrir o custo da decisão de reduzir o preço da energia, o governo tem inventado fórmulas que caem abruptamente sobre as empresas. Um desses aparecimentos repentinos foi a resolução do Conselho de Política Energética estabelecendo que todas as geradores, mesmo as de fontes limpas, tenham que pagar pelo custo extra do uso das térmicas. Algumas já entraram na Justiça contra a decisão estranha.

O setor de petróleo ficou cinco anos sem fazer leilão de concessão porque o governo argumentava que era necessário mudar o modelo. Acabou retomando as rodadas no modelo velho. Nesse meio tempo, a produção e área prospectada diminuíram. O governo baixou regras para privatizar os aeroportos que afastaram operadores internacionais experientes e incentivaram os grupos menores a darem grandes lances. Por uma razão nunca explicada, não incluiu o Galeão na primeira etapa da privatização. Agora, o Galeão será licitado, mas as regras já mudaram. Decidiu-se criar normas que evitem grupos com pouca experiência em administração de aeroportos. Mas os atrasos nos colocam na marca do pênalti. O governo quer que o grupo que ganhar a licitação — que ainda não feita — garanta que vai melhorar a situação do aeroporto até a Copa do Mundo. Difícil ter mudança importante em tempo tão exíguo.


Para controlar a inflação — da forma errada — subsidiou o uso da gasolina e com isso desorganizou o setor de biocombustíveis. Fez anúncios preparados por marqueteiros sobre obras e licitações na área da infraestrutura que ainda não deslancharam. Olhando bem, o baixo crescimento brasileiro tem razões internas. O mundo não tem culpa.

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...