Editorial
de hoje do ESTADÃO avalia o recém-divulgado Relatório de Inflação.
Baixo
crescimento e inflação elevada ainda vão assombrar os brasileiros nos próximos
dois anos, mas as contas públicas poderão melhorar, segundo as novas projeções
do Banco Central (BC). Previsões sombrias sobre a evolução dos negócios e dos
preços têm como contraponto um surpreendente otimismo em relação à política
fiscal, no recém-divulgado Relatório de Inflação, um amplo panorama trimestral
da economia. Nesta altura, e com base na experiência dos últimos anos, é mais
fácil apostar nas estimativas mais sombrias do que nas hipóteses mais
cor-de-rosa, apesar do provérbio chinês citado pelo diretor de Política
Econômica do BC, Carlos Hamilton; "Achar é a mãe de todos os erros".
Os
autores do relatório reduziram de 6% para 5,8% a inflação estimada para este ano,
mas aumentaram de 5,4% para 5,7% a alta de preços ao consumidor calculada para
o próximo ano. Além disso, estenderam até o terceiro trimestre de 2015 a taxa
de 5,5% acumulada em quatro trimestres. Na edição de junho, essa projeção valia
para o período encerrado nos primeiros três meses daquele ano. Por mais dois
anos, portanto, os brasileiros deverão viver com uma inflação bem acima da meta oficial, 4,5%, já muito alta pelos padrões internacionais.
No
entanto, fazer a alta de preços convergir para a meta continua sendo a missão
principal do BC, segundo disse na semana passada seu presidente, Alexandre
Tombin. A cada nova estimativa, no entanto, essa meta parece mais distante.
Outras
projeções do BC se tornaram bem menos animadoras nos últimos três meses. O
crescimento do PIB estimado para este ano caiu de 2,7% para 2,5%. De acordo com
os novos cálculos, essa ainda será a expansão anual acumulada até o segundo
trimestre de 2014.
Se
os autores do relatório estiverem certos, a recuperação prometida pelo governo
e aparentemente indicada pelos números do segundo trimestre do ano ainda será
muito lenta.
Os
economistas do BC também indicam uma reativação da economia puxada
principalmente pelo investimento em máquinas, equipamentos, construção civil e
obras de infraestrutura. O consumo, no entanto, ainda continuará em alta,
puxado pelo aumento de renda dos trabalhadores e pelo crédito em expansão
"moderada".
O
baixo ritmo de crescimento da economia continuará associado, obviamente, ao
desempenho medíocre da indústria. Como a demanda dos consumidores deverá ainda
aumentar, é fácil de prever novas pressões sobre a importação de bens -tanto
insumos quanto produtos finais. Por enquanto, as projeções do BC para o balanço
de pagamentos terminam em dezembro. Os novos números foram publicados
recentemente: exportações 0,7% menores que as do ano passado, importações 7,1%
maiores e superávit comercial de U5$ 2 bilhões (US$ 7 bilhões na projeção de junho
e USS 19,4 bilhões contabilizados em 2012). A estimativa do déficit em
transações correntes foi mantida em US$ 75 bilhões, com a cobertura
parcialmente garantida pelo investimento estrangeiro direto. O resto dependerá
de investimentos financeiros, mais instáveis.
De
forma um tanto inesperada, o relatório combina a estimativa de inflação elevada
nos próximos dois anos com a expectativa de avanço das contas públicas na
direção da neutralidade. Os técnicos do BC abandonaram há alguns meses a
avaliação da política fiscal com base no resultado primário convencional.
Passaram a usar como referência o resultado estrutural, expurgado das variações
cíclicas e das despesas e receitas extraordinárias.
Superávits
primários parecidos com aqueles "gerados recentemente" manterão a
dívida pública em "trajetória sustentável", segundo o relatório. Além
disso, resultados mais ou menos estáveis tenderão a ser neutros em termos de
impacto sobre a demanda e, portanto, sobre a inflação. Essa expectativa é baseada
em cálculos, insistiu Hamilton. Ainda assim, fica difícil de entender essa
possibilidade diante dos resultados deste ano - de janeiro a agosto, um
superávit primário de R$ 54 bilhões, o menor desde 2010 - e a previsível
gastança da fase eleitoral.