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domingo, 18 de janeiro de 2015

Delfim Netto: O perigo.

Recentemente li na FOLHA um novo artigo do mestre Delfim Netto. 

Depois de um extraordinário e justificado entusiasmo nacional por termos reencontrado o caminho da construção de uma sociedade "civilizada": 1) com o "milagre" da Constituição de 1988; 2) com o movimento de reequilíbrio geral iniciado, mas nunca terminado, pelo Plano Real de 1994/95 e, afinal 3) com a aceleração da inclusão social a partir de 2003 apoiada por um fantástico e passageiro donativo externo, terminamos 2010 com brilhante superação da maior crise econômica e social que o mundo conheceu depois da Segunda Guerra Mundial.

Com essa história, Dilma Rousseff elegeu-se com relativa facilidade. Os estresses internos estavam escondidos pela velocidade do crescimento e a condição externa estava mudando, o que exigiu um forte ajuste em 2011. O seu primeiro mandato foi testemunha do primeiro grito de desconforto da sociedade brasileira nos últimos 30 anos, e a sua reeleição marcada por um embate político de rara agressividade.

Nossa situação econômica é certamente delicada, mas claramente superável. O fenômeno mais grave que estamos vivendo, entretanto, é a generalização da recusa à política que está se apropriando de boa parte da juventude brasileira.

Sem perceber, ela tem sido vítima da mais incompetente história "engajada" ensinada há décadas nas escolas de todo nível (da base às universidades), sob os auspícios do MEC e de sindicatos de funcionários públicos que se acreditam "professores".

Com raras exceções, não aprenderam nada, nem da história pátria, nem da universal. Continuam comparando o socialismo "ideal" com o capitalismo "real", esquecendo o socialismo "real". Continuam ensinando que a "verdadeira" democracia é o sistema em que a "maioria" decide que a "minoria" não tem outro direito que não o de obedecer-lhes. É a matriz do pensamento autoritário que infecciona a sociedade e que sempre terminará numa "verdadeira" democracia de direita que dura 20 anos, ou numa "verdadeira" democracia de esquerda, em geral mais competente, que costuma durar pelo menos 70...

Quando a maioria da sociedade empodera pelo sufrágio universal um governo para atender a todas as suas vontades, o mais provável é que (inclusive a minoria que se negou a fazê-lo) vai entregar-lhe tudo, a começar por sua liberdade. Disso já sabiam os "founding fathers" da nação americana que construíram, na sua Constituição os mais altos obstáculos ao autoritarismo, sob o controle de um Supremo Tribunal, cuja função básica é garantir os inalienáveis direitos das minorias.


Os fatos dão razão à História: quem a ignora --que é o caso das nossas "direita" boçalizada e "esquerda" imbecilizada-- está mesmo destinado a repeti-la.

domingo, 12 de outubro de 2014

Minhas irritações com a presidente.

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, 79, advogado, é professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra e escreveu este artigo na Folha de S. Paulo.
Para reflexão dos indecisos de segundo turno... 
Em 16 de março de 2011, publiquei nesta Folha um artigo em que apoiava a presidente Dilma e seu vice, Michel Temer --meu confrade em duas Academias e companheiro de conferências universitárias--, pelas ideias apresentadas para o combate à corrupção e a promoção do desenvolvimento nacional.
Como mero cidadão, não ligado a qualquer partido ou governo, tenho, quase quatro anos depois, o direito de expressar minha irritação com o fracasso de seu governo e com as afirmações não verdadeiras de que o Brasil economicamente é uma maravilha e que seu governo é o paladino da luta contra a corrupção.
Começo pela corrupção. Não é verdade que, graças a ela, os oito anos de assalto à maior empresa do Brasil, estão sendo rigorosamente investigados. Se quisesse mesmo fazê-lo, teria apoiado a CPI para apurar os fantásticos desvios, no Congresso Nacional.
A investigação se deve à independência e à qualidade da Polícia e do Ministério Público federais que agem com autonomia e não prestam vênia aos detentores do poder. Nem é verdade que demitiu o principal diretor envolvido. Este, ao pedir demissão, recebeu alcandorados elogios pelos serviços prestados!
Por outro lado, não é verdade que a economia vai bem. Vai muito mal. Os recordes sucessivos de baixo crescimento, culminando, em 2014, com um PIB previsto em 0,3% pelo FMI, demonstram que seu ministro da Fazenda especializou-se em nunca acertar prognósticos.
Acrescente-se que também não é verdade que controla a inflação, pois, se o PIB baixo decorresse de austeridade fiscal, estaria ela sob controle. O teto das metas, arranhado permanentemente, demonstra que a presidente gerou um baixo PIB e alta inflação.
Adotando a pior das formas de seu controle, que é o congelamento de tarifas, afetou a Petrobras e a Eletrobras, fragilizando o setor energético, além de destruir a indústria de etanol, sem perceber que desde Hamurabi (em torno de 1700 a.C.) e Diocleciano (301 d.C.) o controle de preços, que fere as leis da economia de mercado, fracassou, como se vê nas economias argentina e venezuelana, que estão em frangalhos.
O mais curioso é que o Plano Real, que tanto foi combatido por Lula e pelo PT, é o que ainda dá alguma sustentação à Presidência.
Em matéria de comércio internacional, os governos anteriores aos atuais conseguiram expressivos saldos na balança comercial, que foram eliminados pela presidente Dilma. Apenas com artimanhas de falsas exportações é que conseguiu obter inexpressivos saldos. O "superavit primário" nem vale a pena falar, pois os truques contábeis são tantos, que, se qualquer empresa privada os fizesse, teria autos de infração elevadíssimos.
Seu principal eleitor (o programa Bolsa Família) consome apenas 3% da receita tributária. Os 97% restantes são desperdiçados entre 22 mil cargos comissionados, 39 ministérios, obras superfaturadas, na visão do Tribunal de Contas da União, e incompletas.
Tenho, pois, como cidadão que elogiou Sua Senhoria, no início --para mim Sua Excelência é o cidadão, a quem a presidente deve servir--, o direito de, no fim de seu governo, mostrar a minha profunda decepção com o desastre econômico que gerou e que me preocupa ainda mais, por culpar os que criam riqueza e empregos em discurso que pretende, no estilo marxista, promover o conflito entre ricos e pobres.
Gostaria, neste artigo --ao lembrar as palavras de apoio daquele que escrevi neste mesmo jornal quase quatro anos atrás--, dizer que, infelizmente, o fracasso de seu projeto reduziu o país a um mero exportador de produtos primários, tornando este governo um desastre econômico.

domingo, 14 de setembro de 2014

A nota em risco.

Editorial da FOLHA DE S. PAULO sobre a recente avaliação da agência Moody's. 

A Moody's, agência norte-americana de classificação de risco, emitiu ontem mais um sinal de alerta a respeito dos fundamentos econômicos do Brasil. 

No ano passado, havia diminuído a perspectiva da nota do crédito brasileiro de "positiva" para "neutra"; agora, passou-a para "negativa". Se for dado um próximo passo nessa mesma direção, o país terá seu crédito rebaixado de acordo com os critérios da agência. 

O Brasil, hoje, está na categoria Baa2, que indica um grau de investimento com risco moderado. Esse patamar é o segundo acima do "especulativo", que implica menor segurança para investidores.

Ainda que estejam desacreditadas desde 2008, quando papéis imobiliários com a nota máxima viraram pó nos EUA, e mesmo considerando conflitos de interesses, já que seus financiadores compram títulos, as agências balizam inúmeros investidores. Alguns, como os fundos de pensão internacionais, por vezes nem podem aplicar em países considerados especulativos.

Não é só por isso, contudo, que o alerta da Moody's deve ser levado em consideração. A agência reuniu três fortes argumentos para justificar sua decisão. O primeiro diz respeito à perda de vigor da economia nacional, que deve permanecer até pelo menos 2015.

Há, além disso, o colapso da confiança empresarial e a retração dos investimentos --estes caíram em nove dos últimos 12 trimestres e estão no mesmo patamar de 2010. Tal comportamento resulta, para a agência, do intervencionismo do governo Dilma Rousseff (PT).

Sem investimento, a capacidade de produção da economia não aumenta, com o que uma expansão do PIB provocará mais inflação.

A falta de crescimento, por sua vez, é um problema para a nota de crédito por comprometer a geração de renda e reduzir a arrecadação. Levando-se em conta os crescentes gastos federais, tem-se um processo de aumento da dívida pública --que, como proporção do PIB, já é cerca de 50% maior que a da média de países de risco similar.

Esse é o terceiro motivo de preocupação da agência. Diante dessa combinação de fatores, os desafios não serão pequenos para o próximo governo, qualquer que seja ele.

Por fim, a Moodys não deixa de destacar pontos fortes da nossa economia: reservas internacionais elevadas, diversificação produtiva e sistema bancário sólido, entre outros. Se não houver alteração no horizonte próximo, entretanto, o corte da nota será inevitável.


A receita para não haver esse retrocesso é conhecida e tem sido repetida por incontáveis analistas brasileiros: restaurar a credibilidade das contas públicas e estabelecer uma gestão competente.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Thomas Piketty e Delfim Netto novamente na FOLHA.

Antonio Delfim Netto e o seu artigo de hoje na FOLHA DE S. PAULO: DESIGUALDADE.

Folha presta um excelente serviço à sociedade brasileira ao continuar dando espaço à interessante discussão em torno do livro do economista francês Thomas Piketty, "O Capital no Século 21".

Foi imenso o "choque" que a obra produziu após o lançamento de sua tradução em inglês. Olhada com cuidado, a sua tese está longe de provar empiricamente o inevitável fim do "capitalismo", imposto por alguma "lei" histórica (o que Marx pensou ter feito com o uso de argumentos lógicos).

Reduzida à sua essência, ela é o resultado de pura aritmética: se a taxa de retorno do capital (que ele, como a maioria dos economistas em seus modelos chama de "r") for permanentemente maior do que a taxa de crescimento do PIB (que ele, como os economistas, chama de "g"), então haverá, necessariamente, uma acumulação de renda e patrimônio que, ao fim e ao cabo, submeterá a democracia ao controle do capital e tornará o "capitalismo" disfuncional.

O problema não é econômico, é político! Não tem nada a ver com "esquerda" ou "direita". Instituições mal construídas permitem que uma classe se aproprie do excedente econômico produzido pelo trabalho, como ocorria no regime colonial e ocorre no capitalismo de "compadres"...

O problema é que "g" e "r" não são constantes e não satisfazem, necessariamente, a desigualdade: "r" sempre maior do que "g". Dependem da qualidade das instituições e, portanto, são de extrapolação duvidosa. A relação entre eles controla aritmeticamente, no longo prazo, a distribuição da renda entre o trabalho e o capital e a acumulação dos patrimônios. São as instituições e o jogo dialético permanente entre o bom funcionamento dos "mercados" e o bom funcionamento das "urnas" que determinam a relação entre "g" e "r".

O livro de Piketty já produziu dois resultados notáveis. O primeiro, muito triste para nós que amamos a França. Infelizmente, o francês transformou-se numa língua paroquial em matéria de economia, para prejuízo do próprio pensamento econômico universal. O livro só teve a merecida repercussão quando vertido para o inglês.

O segundo, é que mostra a insanidade do "cientificismo" que domina a pobre modelização de alguns economistas que têm inveja da física e se recusam entender que o átomo da economia (o cidadão comum, sujeito da política do governo) tem memória, aprende e reage num jogo dinâmico com a autoridade. E, o que é pior e mais grave, protesta e vota!

A distribuição da renda sempre implicará uma valorização filosófica. Como ensinou Adam Smith há mais de 250 anos ("A Teoria dos Sentimentos Morais", 1759), se a economia for um dia "ciência", ela há de ser uma ciência moral.

domingo, 2 de março de 2014

Ambição real.

Editorial da FOLHA DE S. PAULO e os 20 anos do Plano Real.

O aniversário de 20 anos da medida provisória 434/1994, que instituiu a URV (Unidade Real de Valor) e preparou o caminho para o lançamento do real, decerto merece celebração.

Não pela nostalgia de um momento de grandes mudanças, quando os artífices do Plano Real demonstraram singular visão de Estado --destaque-se, além do então presidente Itamar Franco e seu ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, os economistas André Lara Resende, Edmar Bacha, Gustavo Franco e Pérsio Arida.

A lembrança é válida pela constatação de que, mesmo em meio às dificuldades daqueles dias, o governo construiu consensos e obteve legitimidade para um salto de qualidade nas instituições. Há, portanto, lições para o Brasil de hoje.

Sem a estabilização da moeda não teriam sido possíveis os avanços posteriores, como o alargamento dos direitos sociais e a redução da desigualdade. O fim da inflação galopante, em si, foi o primeiro passo para isso, pois eram os mais pobres os mais prejudicados.

Houve erros graves, como os desequilíbrios que fizeram o Brasil recorrer ao FMI em 1998. Mas mudanças de monta na condução da economia deram ao país uma estabilidade havia tempo esquecida.

Depois, o presidente Lula construiu sobre esses alicerces, criando um grande mercado interno de massas. Manteve, especialmente no primeiro mandato, a aderência aos pilares macroeconômicos e acelerou a inclusão social.

O bom momento mundial catalisou as ações internas, e o Brasil registrou crescimento acelerado. Foram criados mais de 15 milhões de empregos entre 2003 e 2010.

Nos últimos anos, porém, cessaram as propostas ambiciosas. A administração Dilma Rousseff, em especial, abusou do modelo de consumo, sem enxergar a necessidade de novas estratégias à luz das transformações globais e da baixa produtividade interna.

Reformas em áreas como Previdência e tributação, fundamentais para o equilíbrio das contas públicas e recuperação da capacidade de investimento do Estado, permanecem paralisadas enquanto as autoridades de turno vendem a ilusão de que tudo vai muito bem.

O ex-presidente Fernando Henrique tem razão quando fala da natural fadiga que acomete grupos políticos instalados por muito tempo no poder --regra que vale para todos os partidos, em todos os níveis da Federação.

Fundamental, nesse sentido, oxigenar o debate --não necessariamente com novos mandatários, mas sem dúvida com novas ideias.


Forças governistas e seus opositores poderiam se inspirar nos exemplos do passado. Pouco importam, no fundo, discussões sobre o mérito do que já desbota no tempo; o país demanda uma visão de futuro. O ano é propício.

sábado, 19 de outubro de 2013

Brasil: um país atrasado.

O texto do FERNANDO RODRIGUES hoje na FOLHA DE S. PAULO demonstra a triste realidade brasileira. Excelente.

BRASÍLIA - Sou a favor da liberdade de expressão. Considero uma regressão civilizatória a retirada de um livro do mercado só porque um biografado se sentiu ofendido. Um cidadão incomodado deve ir à Justiça e ser ressarcido pelo dano causado. Mas quem vive e ganha dinheiro se expondo na mídia não tem como reclamar quando seus hábitos no café da manhã são revelados.

Apesar de pensar assim, acredito que Caetano Veloso, Chico Buarque e Djavan, entre outros, prestam um serviço ao ficarem do outro lado do muro. Eles nos ajudam a enxergar o óbvio: o Brasil é um país atrasado. Não estão disseminados por aqui os valores republicanos clássicos. Liberdade de expressão é uma abstração que não faz parte da vida real da imensa maioria dos brasileiros.

Caetano, Chico e Djavan compõem essa paisagem. Chocam parte dos leitores daFolha, mas será que a reação seria a mesma na maioria da população? Não somos o Brasil potência dos anúncios do governo na TV, em que os pobres estão sempre sorrindo e os direitos parecem plenos para todos.

O Brasil real é o das ruas com calçadas esburacadas e ônibus sujos e lotados. Da Justiça lenta e improdutiva. O Brasil é conservador. Seu conjunto de valores está em formação. A democracia só tem 25 anos.

Talvez o Datafolha pudesse perguntar a brasileiros que circulam no viaduto do Chá, em São Paulo, ou na Cinelândia, no Rio: "Você é a favor ou contra retirar do mercado um livro que exponha a vida de Roberto Carlos, incluindo a intimidade do cantor, dramas pessoais na infância sobre os quais ele não fala em público, casamentos malsucedidos e um lado menos conhecido da vida desse artista? Está certo publicar um livro que seja verdadeiro, porém constrangedor para Roberto Carlos?".


Suspeito que muitos aprovariam a censura prévia. O Brasil profundo é assim. Continua refém daquela velha profecia: corre o risco de ficar obsoleto antes de ficar pronto.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Mudanças.

Leio na FOLHA de S. PAULO, o otimismo de Delfim Netto, embora não acredite em tudo que o mestre escreveu.  

Na última semana, alguma coisa se moveu. No campo político, assistimos à redução de dois estresses institucionais que devem trabalhar na direção de diminuir a angústia depressiva que se apropriou da sociedade.

Primeiro, a presidente tomou a iniciativa do diálogo e diminuiu a tensão entre o Executivo e o Legislativo, que ameaçava tornar-se um cabo de guerra na apreciação de cada projeto e de seus vetos. Segundo, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que pode eventualmente condenar membros do Legislativo, mas que a cassação do mandato obtido na urna deve ser feita pelo Congresso.
Dois movimentos no sentido do mútuo respeito à independência harmônica dos Poderes da República e, portanto, no sentido da consolidação institucional.

No campo econômico externo algumas notícias como a aceleração das exportações chinesas e coreanas, e o aumento dos indicadores de compras industriais nos EUA e Europa, parecem dar alento a uma recuperação ainda que lenta da produção. No interno, tem havido uma mudança no comportamento do governo em relação à cooptação do setor privado para competir nas obras de infraestrutura cuja eficácia será testada nos próximos leilões de concessões de rodovias, ferrovias, portos e energia.

Talvez nada indique melhor a confusão que está levando os agentes econômicos a cultivarem um desânimo devastador do que a sua reação à situação externa mencionada acima. Em resposta ao que pode ser um movimento pontual aleatório das exportações chinesas, a Bovespa subiu 3,12%. Até a ação da OGX-ON subiu 9,25% (infelizmente para R$ 0,50!).

Isso revela que boa parte do pessimismo é, seguramente, exagerado. É claro que nossa situação não é confortável: crescimento medíocre por falta de investimento público e dificuldade de cooptar o do setor privado; taxa de inflação no teto superior da "meta" e um déficit em conta corrente de mais de 75 bilhões de dólares. Mas deve ser claro, também, que não há qualquer ameaça à estabilidade de nossa economia.

Recentes mudanças na política econômica: 1º) a melhoria da interlocução do governo e o reconhecimento de que ele deve melhorar a qualidade dos leilões nas concessões; 2º) o reconhecimento de que não há mais espaço para a política fiscal e que empréstimo interno do Tesouro não é recurso, a não ser quando financiado com superavit fiscal; 3º) a nova disposição do Banco Central de buscar a "meta" da inflação num prazo adequado, mas não indefinidamente prorrogável e 4º) Tudo isso e mais a flutuação da taxa de câmbio, que deverá aliviar a indústria, sugerem que estamos nos preparando para melhorar.


domingo, 14 de julho de 2013

Luciano Coutinho fala sobre a economia brasileira.

Leio na Folha entrevista concedida pelo Luciano Coutinho, presidente do BNDES, e sua análise sobre a cotação do dólar e outros pontos da economia brasileira. 

Folha - O dólar não deve voltar a ficar abaixo de R$ 2,10?
Luciano Coutinho - Não volta ao patamar do começo do ano. Fizemos um teste de estresse com o câmbio fechando o ano a R$ 2,30 e é perfeitamente palatável para a estrutura empresarial brasileira absorver o impacto. Não estou projetando esse câmbio, foi apenas um teste de estresse. É diferente do que ocorreu [no início da crise global] em 2008, quando houve pesadas perdas provocadas pelos derivativos de câmbio. Qual é o desafio paralelo a isso? Administrar os efeitos do câmbio na inflação. É imperioso manter a inflação sob controle. É uma orientação de governo.

O setor empresarial critica a taxa de retorno do programa de concessão. Isso pode afetar os leilões e pôr em risco o crescimento do país?
Não creio, porque o governo ajustou vários fatores. O que tenho verificado nas consultas ao banco é que teremos muitos interessados. É preciso diferenciar o que se diz em público para conseguir melhorias adicionais e o que observamos no diálogo individual com as empresas.

Após os protestos, Estados e municípios seguraram reajuste de tarifas. Isso vai afetar o interesse dos investidores?
Pelo que entendi, as tarifas de pedágio serão compensadas, protegendo os investidores. Logo, não vai criar efeitos negativos sobre as expectativas. O meu sonho é que a taxa de investimento chegue perto de 19% do PIB neste ano e dê um salto adicional em 2014.

O BC subiu os juros. O senhor vê necessidade de um ajuste fiscal mais rigoroso para ajudar a controlar a inflação?
A gestão macroeconômica precisa avaliar o andamento da economia. Ainda não sabemos qual será o impacto dessa transição, que pode afetar o crescimento negativamente. A calibragem fiscal não é algo trivial. Tem que ser muito cuidadosa. A orientação da presidente é manter a inflação sob controle.

O sr. teme que um arrocho forte derrube o crescimento?
O que estou dizendo é que precisamos considerar o que já aconteceu na esfera privada. Se houver uma redução do gasto privado, vai ter impacto. É claro que a política fiscal deve ajudar a política monetária e trabalhar coordenadamente. O mercado exige, às vezes até por cacoete, que se tomem certas iniciativas.

É preciso calibrar inflação e crescimento na política fiscal?
Sim.

Mas a credibilidade do governo na área fiscal foi muito questionada após a contabilidade criativa. Isso não prejudica a calibragem?
Eu olho para os resultados. A trajetória de dívida do Brasil é invejável. Acredito que há uma cobrança desfocada da realidade do Brasil.

domingo, 7 de julho de 2013

Delfim Netto na Folha de S. Paulo: A voz da rua não é a voz de Deus nem a voz da lógica.

Folha - Por que as pessoas foram às ruas?
Delfim Netto - É uma emergência. Alguns fenômenos vão ocorrendo aos poucos e, de repente, a acumulação provoca uma mudança qualitativa. São Paulo é um inferno, mas aos poucos as pessoas se convenceram de que a solução é impossível, porque não tem recursos. De repente, aparece recurso para fazer estádio. O povo é muito sábio. Recurso não é dinheiro, mas cimento e ferro. O povo concluiu o seguinte: o cimento e o ferro que construíram o estádio são o cimento e o ferro que não construíram o metrô.

Mas há recursos para fazer mais metrô?
Claro que não. O problema é que as prioridades do governo não eram as que a sociedade desejava. A primeira reação do governo foi de susto e produziu uma esquizofrenia hiperativa. De repente, o Congresso aprova projetos parados há dez anos em quatro horas. Mas aprovou sonhos, ideias. Ou seja, nada será cumprido. Teremos de devolver racionalidade ao sistema.

Qual vai ser o resultado dessa esquizofrenia hiperativa?
Provavelmente vamos ter uma reforma política. O cerne da questão é se o financiamento de campanha deve ser público ou privado. Numa sociedade decente, quem pertence a um partido tem que colocar seu dinheiro para eleger seu deputado. No Brasil, como não há controle, vai haver duplo financiamento. Não há nada mais conservador do que eleição financiada por governo, porque tende a reforçar a maioria do governo.

Por que não será possível cumprir as leis que foram aprovadas após os protestos?
Só é possível distribuir o que já foi produzido,ou tem que tomar emprestado. Chegamos ao limite. Estamos praticamente em pleno emprego e não podemos mais elevar o deficit em conta-corrente.
A voz da rua tem que ser educada a entender que pode escolher prioridades, mas que a soma das prioridades não pode ser maior do que o PIB.
Como queremos uma sociedade com liberdade individual, relativa igualdade e eficiência produtiva, é preciso escolher um mecanismo para atingir esses objetivos, que não são inteiramente conciliáveis. Esse mecanismo é o mercado e a urna. Se a urna exagera, o mercado vem corrigir. Se o mercado exagera, a urna corrige.
A educação é fundamental para que o eleitor saiba que vai ser atendido dentro de limitações. É fundamental para salvar não só a economia, mas a democracia.

Mas educar leva tempo, e a insatisfação das pessoas é imediata.
É uma questão de liderança política para convencer as pessoas de que leva tempo para as prioridades serem corrigidas.

O senhor vê na presidente Dilma essa liderança?
Não tenho dúvida. A presidente é uma mulher muito competente e séria, com desejo enorme de acertar.
Ela também vai escolher prioridades novas e entender que é preciso acelerar as concessões. Ela vai entender que, quando atende as condições do mercado, não está numa queda de braço.

Após as manifestações, os governos congelaram pedágios e tarifas. Isso vai atrapalhar os leilões de concessão?
Muito. Pioraram demais as condições de segurança jurídica das concessões. O prejuízo que o Brasil teve é imenso e contraditório com tudo o que queremos.
É por isso que eu digo: a voz da rua não é a voz de Deus. Também não é a voz da lógica. É um sinal amarelo para que façamos as as coisas corretamente.

O BC vem sinalizando que vai subir mais os juros. O senhor concorda?
O Banco Central já provou que sabe mais que o setor financeiro. Na minha opinião, Tombini [Alexandre Tombini, presidente do BC] cansou de ter esperança de que a política fiscal ajudasse no combate à inflação. O BC vai subir os juros até alcançar a meta, dentro de um horizonte de tempo de 15 ou 20 meses.

O senhor defende um ajuste fiscal rigoroso?
Tivemos truques demais. Destruímos coisas importantes. O transparente é esquecer os truques e anunciar um programa para um equilíbrio fiscal em quatro ou cinco anos.

A presidente tem credibilidade. Quando ela decide, enfrenta furacão. O sujeito que pensa que vai viajar de ônibus grátis tem que entender que vai pagar mais no feijão.

domingo, 12 de maio de 2013

A lei da demanda.


SAMUEL PESSÔA , doutor em economia e pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da FGV, escreveu neste domingo na FOLHA sobre a lei da demanda sobre escolhas morais.

Em geral, a elevação do preço de um bem reduz a quantidade consumida desse bem. Esse princípio geral é conhecido por lei da demanda.

É possível que haja exceções. A mais famosa é a demanda de alimentos baratos de elevado valor calórico e baixo conteúdo proteico.

Pode ser o caso de arroz na China de hoje; batatas na Irlanda ou pão na Inglaterra, ambos no século 19; farinha de mandioca no sertão nordestino na segunda metade do século passado etc.

Nesses casos, a maior parcela do orçamento familiar é comprometida com o consumo do alimento barato com elevado conteúdo energético e baixo conteúdo proteico.

Devido às necessidades calóricas mínimas diárias, a elevação do preço do alimento rico em calorias reduz muito a renda disponível para aquisição de alimentos de maior qualidade. A demanda pelo alimento mais barato (apesar de este ter ficado mais caro) sobe, dado que a família não tem renda suficiente para adquirir proteína.

Os bens que não obedecem à lei de demanda são chamados de bens de Giffen. O debate brasileiro em torno de escolhas morais sobre diversos assuntos aparentemente está povoado de bens de Giffen.

É comum lermos que a redução da maioridade penal elevará a criminalidade entre jovens, que a descriminalização do aborto reduzirá o número de abortos, que a liberalização das drogas reduzirá o consumo de drogas e que a criminalização da prostituição elevará a prática do comércio sexual.

Em todos esses casos, o preço de um bem subiu (ou desceu) e o consumo, segundo alguns analistas, elevou-se (ou reduziu-se).

Tenho dificuldade de imaginar que a elevação do custo ao menor que cometer crimes eleve a quantidade de crimes praticados pelo menor infrator ou que a elevação do custo do comércio sexual aumente seu consumo.

É igualmente difícil racionalizar que a redução do custo de cometer aborto ou de consumir droga reduza o número de abortos ou o uso de drogas.

Nada impede que as alterações legais elencadas tenham outras consequências e que estas possam ser empregadas como argumentos contrários ou favoráveis à alteração legal.

É possível que a descriminalização do aborto reduza o número de mulheres mortas em função de procedimentos médicos inadequados.

Também é possível que a legalização do consumo e do comércio de drogas reduza a violência e o número de homicídios ou que a criminalização da prostituição aumente a criminalidade.

Finalmente, é perfeitamente possível e justo defender posições favoráveis ou contrárias a esta ou aquela instituição, independentemente de suas consequências.

É possível ser favorável à legalização do comércio e consumo de drogas em função do princípio de liberdade de escolha individual.

Analogamente, é possível ser favorável à redução da maioridade penal em função do princípio da responsabilização individual.

Novamente independentemente do impacto da redução da maioridade penal sobre a criminalidade.

O mesmo princípio de liberdade de escolha individual aplica-se à manutenção da prostituição como atividade lícita.

O que não parece muito útil nem produtivo é enxergarmos bem de Giffen em toda parte. Confunde e dificulta o avanço do debate.

Os bens de Giffen são mais raros do que imaginamos. Até hoje os economistas têm dúvidas se a batata na grande fome na Irlanda no século 19 poderia ser de fato considerada bem de Giffen!

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Economia brasileira não volta a ter expansão de 7%. Alguma dúvida?


Leio na FOLHA entrevista com o economista Dani Rodrik, professor de política econômica internacional da Universidade Harvard e um dos maiores especialistas em economia do desenvolvimento.

Segundo Rodrik, o ambiente global benéfico -- alto crescimento da China, elevados preços das commodities, países avançados em expansão -- não vai se repetir. "É realista esperar uma taxa de crescimento de 3% a 4% no Brasil", disse à Folha Rodrik, que participou de seminário da revista "Carta Capital".

Folha - O Brasil cresceu 0,9% em 2012 e há uma percepção de que o modelo de crescimento baseado em consumo se esgotou. O que o sr. acha?
Dani Rodrik - Dois anos atrás, todo mundo dizia que o Brasil estava vivendo um novo milagre econômico. Eu achava que era um enorme exagero. Agora, as pessoas estão tirando conclusões apressadas em cima de apenas um ano de crescimento.
O Brasil não vai mais crescer 7%, como no milagre econômico antes da crise da dívida ou mesmo em 2010 [7,5%]. É realista esperar uma taxa de crescimento de 3% a 4%. Se o contexto global ajudar, 5% será uma taxa razoável.

O sr diz que, a partir de agora, alto crescimento no mundo será exceção. Como se situa o Brasil nesse cenário? As condições que permitiram crescimento de 7% a 8% não vão se repetir. Antes, tínhamos os estágios iniciais da industrialização --ao tirar mão de obra da zona rural ou do setor informal e levar para as indústrias, tínhamos ganhos de 400% na produtividade. Agora, não teremos grandes ganhos sem mais investimentos em educação e tecnologia. Com as mudanças tecnológicas, a indústria é muito mais intensiva em capital e não absorve tanta mão de obra. E o Brasil, na realidade, já atingiu o pico de industrialização e está agora se desindustrializando. Mas isso é verdade para a maioria dos países. É inevitável. A discussão agora é a velocidade da desindustrialização, se está mais rápida do que deveria. A indústria não mais será o motor do crescimento. Serviços e outras áreas irão gerar ganhos de produtividade.

O sr. ficou decepcionado com a decisão dos Brics [Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul] de criar um banco de desenvolvimento... Essa é uma noção dos anos 50, de que é preciso ter financiamento de infraestrutura. Frequentemente, o que emperra o desenvolvimento não é a falta de financiamento, mas sim instituições frágeis, excesso de regulação, falta de política industrial e moedas sobrevalorizadas. Financiamento é apenas um dos fatores. Não me parece o foco apropriado para os Brics. Faltam ideias novas de como consertar a globalização e criar uma nova relação entre emergentes e ricos.

O sr. diz que os Brics precisam parar de se comportar como "suplicantes". Qual é a mensagem que o Brasil deveria passar nos foros mundiais? Gostaria de ver o Brasil abordar o sistema internacional não como um país em desenvolvimento dizendo que é pobre e precisa de ajuda. Em vez disso, o Brasil precisa se posicionar como formador de políticas, que também tem grandes responsabilidades. Em áreas como mudança climática, por exemplo, não haverá redução de emissões se os emergentes não assumirem responsabilidade.

O que o sr. espera de Roberto Azevêdo à frente da Organização Mundial do Comércio? A agenda da OMC precisa mudar. A Rodada Doha morreu e as pessoas deveriam simplesmente declarar isso. O real desafio para a OMC é estabelecer uma nova narrativa, que não se restrinja a: "você reduz suas tarifas e em troca nós abrimos nossos mercados". No momento, o maior problema não é a falta de abertura comercial.
E o Brasil precisa mudar sua atitude. O Brasil ocasionalmente precisa proteger sua indústria, mas tem de entender que os países ricos passam por uma situação muito difícil e também precisam proteger a sua indústria. O Brasil, apesar de todas as elevações de tarifas recentes, não pode ser chamado de economia fechada. Aliás, acho que a atual estrutura de tarifas no Brasil é até positiva.

Por quê? Porque, na margem, está dando uma proteção temporária para algumas indústrias que estão sendo dizimadas pela valorização da moeda. Vivemos no mundo possível, não no mundo doutrinário.

Qual é a importância de ter um brasileiro liderando a OMC? O Brasil pode levar para a OMC uma abordagem pragmática, não doutrinária, que é uma evolução da proposta radical de livre mercado --é assim a política econômica do Brasil atualmente. Então ter um brasileiro no comando da OMC é muito positivo.

O sr. classifica os países de mercantilistas ou liberais. Em que faixa se situa o Brasil?
O Brasil é uma boa mistura -- usa regras liberais em seu sistema financeiro, políticas monetária e cambial, mas é mais mercantilista no que se refere às políticas industriais, proteção por tarifas, regras de conteúdo local e uso do BNDES. Talvez precise de menos liberalismo no fronte macroeconômico e mais no fronte comercial.

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...