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sábado, 1 de junho de 2013
Debelar a inflação é a escolha correta.
A inflação brasileira e suas jabuticabas .
Antônio Corrêa de Lacerda, no Estadão de 31.05.2013.
A inflação
resistindo próxima do teto de 6,5% da meta anual não é uma situação confortável
para a Nação. É preciso persistir no combate à elevação geral dos preços como
um valor em si. A carestia afeta a todos, mas especialmente os mais pobres.
Para um diagnóstico
mais abrangente, primeiro é necessário destacar que a inflação brasileira,
inegavelmente elevada e que deve ser repudiada, está muito próxima da inflação
média dos países em desenvolvimento, que é de 5,8%.no acumulado dos últimos 12
meses. Há, mesmo entre os Brics, países com inflação próxima à brasileira, como
é o caso da África do Sul, com 5,9%, e de outros em situação ainda mais grave,
como a índia, com 12%. Argentina e Venezuela têm indicadores oficiais mais
elevados e fortemente questionados quanto à sua fidelidade.
A questão é
por que países em desenvolvimento têm tido inflação média equivalente quase ao
triplo da dos países desenvolvidos. Trata-se de uma questão estrutural. Esses
países vêm experimentando mudanças expressivas do padrão populacional, com
urbanização, elevação da renda e alterações de costumes. Isso tem aumentado a
demanda por alimentos e por serviços, dois itens comuns de pressão de preços em
vários países. A demanda por esses itens tem crescido mais rapidamente do que
sua oferta, abrindo espaço para elevação de preços.
Isso não pode
ser entendido como um álibi para a inflação brasileira, mas um alerta. Ao mesmo
tempo que temos de tomar medidas para combater a inflação, é preciso sair da
armadilha de considerar a elevação das taxas de juros como remédio único para a
enfermidade, seja qual for o diagnóstico de sua origem. No caso brasileiro,
temos o impacto das questões já citadas e comuns à maioria dos países em
desenvolvimento, assim, temos peculiaridades próprias que precisam ser
enfrentadas. São como nossas jabuticabas, fruto originariamente brasileiro:
pouco presente ou praticamente ausente em outras paragens.
A primeira é
a ainda elevada indexação ou o reajuste automático e regular dos preços
baseados em indicadores da inflação passada. É o caso de preços administrados,
como medicamentos, tarifas públicas como pedágios, energia, telefonia, água e
esgoto e aluguéis. Grande parte deles indexadas a indicadores como o índice
Geral de Preços (IGP) e sua variante, o IGP-M, ambos calculados pela Fundação
Getúlio Vargas - cuja composição tem pouco a ver com a estrutura de custos dos
setores.
Além disso,
também influenciado por esse fator e pela cultura inflacionária,vivemos uma
espécie de indexação informal de preços de serviços, especialmente os pessoais,
que, por sua natureza, são pouco concorrenciais.
Um outro
aspecto peculiar nosso está na indexação do mercado financeiro. Grande parte da
dívida do governo é pós-fixada pela Selic, a taxa definida pelo Comitê de
Política Monetária, redefinida a cada 45 dias, com grande repercussão
midiática. Gomo grande parte dos títulos das dívidas oferece liquidez imediata
e correção automática pela taxa de juros, há uma certa torcida pela subida da
inflação.
Obviamente
trata-se de um processo que, longe de ser neutro, provoca transferências
bilionárias de renda. Daí a resistência e mitificação que envolve tudo o que se
refere ao tema. Muitas vezes, intensificar as expectativas de inflação futura
representa um verdadeiro prêmio, na forma de elevação dos juros, favorecendo os
portadores de títulos da dívida pública pós-fixada.
É preciso
desarmar o consenso pró-inflação. O enfrentamento do problema implica ações
conjugadas que vão além dos juros e da ampliação da capacidade de oferta da
economia. O problema hoje não reside tanto no setor industrial, que ainda opera
com um nível de ociosidade média da ordem de 15%. Mas no macrossetor serviços o
quadro é diferente. É preciso ampliar a competitividade, incentivando a
formação de novos prestadores, e gerar maior concorrência, diminuindo o poder
de elevação dos preços.
domingo, 5 de maio de 2013
Inflação: tolerância zero hoje e boas notícias em 2014.
Em recente pronunciamento no Dia do Trabalho, a presidente Dilma Rousseff disse que "o Brasil seguirá na rota de crescimento com estabilidade,
distribuição de renda e diminuição das desigualdades, lutando pela redução de
impostos e pela diminuição dos custos para o produtor e o consumidor".
“É mais do
que óbvio que um governo que age assim e uma presidenta que pensa desta maneira
não vão descuidar nunca do controle da inflação. Esta é uma luta constante,
imutável, permanente. Não abandonaremos jamais os pilares da nossa política
econômica, que têm por base o crescimento sustentado e a estabilidade”,
afirmou.
Esperamos que sim, presidente, pois como nos alerta o genial Sinfrônio no nosso cearense Diário do Nordeste, a inflação não dorme em serviço e com ela não podemos ter uma conversa amigável. Se tivermos hoje tolerância zero com a inflação, boas notícias teremos para 2014.
terça-feira, 23 de abril de 2013
Inflação no Brasil.
Nosso conhecido OLIVIER BLANCHARD
concedeu uma longa entrevista ao VALOR ECONÔMICO conforme matéria abaixo. Os
principais trechos da entrevista estão no site do jornal.
O crescimento potencial
do Brasil parece mais baixo do que se pensava, diz o economista-chefe do Fundo
Monetário Internacional (FMI), Olivier Blanchard, referindo-se ao ritmo de
expansão do Produto Interno Bruto (PIB) que não acelera a inflação. Para ele, se a
economia brasileira estivesse muito abaixo do potencial, o país veria a
inflação cair mais. "Com isso, a margem de manobra para usar políticas de
estímulo à demanda é provavelmente limitada", afirma Blanchard, lembrando
que o FMI reduziu a previsão de crescimento
para a economia brasileira em 2013 de 3,5% para 3%. Gargalos de
infraestrutura e no mercado de trabalho foram apontados pelos economistas da
instituição como restrições de oferta importantes que afetam o país.
O economista francês diz ainda que o
desempenho mais fraco do Brasil no passado recente tem grande relação com o
comportamento frustrante do investimento. "É provável que um número de
distorções, assim como alguma incerteza sobre políticas, tenham um papel
nisso", disse Blanchard ao Valor, em meio à maratona de encontros e
seminários da reunião de primavera do FMI e do Banco Mundial, realizada na
semana passada em Washington.
Blanchard diz ainda que países emergentes
como o Brasil devem "ser livres" para suavizar movimentos de recursos
externos mais voláteis, usando "instrumentos de administração de fluxos de
capitais, medidas macroprudenciais e intervenção no mercado de câmbio".
Alguns desses capitais são desestabilizadores, afirma, observando, contudo, que
parte do dinheiro que chega de fora vem por um bom motivo - aproveitar as
perspectivas mais favoráveis dos mercados emergentes.
Para ele, aliás, o Brasil
não abandonou o regime de câmbio flutuante. "Eu chamaria de flutuação
administrada. O real flutua, mas com o uso de controle de capitais", diz
Blanchard,
um dos principais responsáveis pela adoção de ideias mais flexíveis pelo FMI no
pós-crise, como o apoio a controles de capitais em determinadas circunstâncias
e a recomendação para que alguns países não exagerem na dose da austeridade
fiscal.
Para Blanchard, a
recuperação americana mostra sinais robustos, pelo lado do setor privado. O
país vai crescer quase 2% mesmo com o ajuste fiscal equivalendo a uma contração
de 1,8% do PIB.
O economista elogia também a política monetária japonesa, e não a encara como
uma medida voltada para produzir uma desvalorização competitiva do câmbio, mas
sim para de fato tirar o país da deflação.
segunda-feira, 15 de abril de 2013
Inflação: de volta ao passado?
Recentes dois artigos do Luiz Carlos Mendonça de Barros publicados
no VALOR avaliam a situação econômica brasileira, bem como previsões para 2014.
Neste, o foco é a atual inflação vista por ortodoxos e heterodoxos.
É muito
triste para o analista acompanhar o debate atual sobre a política monetária do
Banco Central (BC). Este sentimento nasce principalmente em função da volta da
inflação para o centro das discussões, depois de mais de dez anos de
esquecimento por parte da sociedade. Esta nossa sensação de "déjà vu"
fica reforçada pelo aparecimento de velhos protagonistas de corte heterodoxo -
com suas mesmas ideias e soluções do passado - ao lado de novos economistas
liberais, com os mesmos erros e utopias de seus colegas mais velhos. Ou seja, em
mais de 30 anos, os membros destes dois grupos não esqueceram nada, mas também
não aprenderam nada de novo.
Como escrevi acima, considero
um retrocesso voltar à questão da inflação nos termos que vêm sendo colocados
pela mídia, aqui e no exterior. Em um
extraordinário trabalho a quatro mãos, os presidentes Fernando Henrique Cardoso
e Lula conseguiram convencer a sociedade brasileira que a estabilidade de
preços é uma condição absolutamente necessária para que o crescimento econômico
seja perene. Mais do que isto, que para atingir este objetivo é preciso ter um
Banco Central comprometido com uma meta clara para a inflação e com um mínimo
de independência para persegui-la ao longo do tempo.
Aliás, é bom lembrar que foi
por conta deste compromisso que a economia brasileira cresceu continuadamente
entre 1994 e 2008, apesar das crises que enfrentamos. Nestes 14 anos, a renda
real do brasileiro cresceu mais de 3,5% ao ano e a parcela da sociedade que
vive na economia de mercado passou de 34% para mais de 60%. Um resultado incrível
e que ganhou reconhecimento internacional. Pensava eu que, por isto, estivessem
sepultadas de vez as teorias alternativas que sempre fizeram parte do programa
de ação do Partido dos Trabalhadores e de parte da esquerda brasileira.
Também por isso me surpreendeu
quando a presidenta Dilma começou a deixar de lado este compromisso com o
aparecimento de alguns entraves ao crescimento da economia. Ela não percebeu
que o problema tinha sua origem em questões estruturais não enfrentadas
adequadamente nos anos Lula e no início de seu mandato. No começo, estas
mudanças foram sutis, mais relacionadas a intervenções pontuais do governo.
Mas, a partir da frustração com o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no
ano passado, as ações passaram a ser mais abrangentes, enfraquecendo o
arcabouço macroeconômico que havia prevalecido até então.
Nos anos Lula o governo
considerava os mercados como um instrumento de ação do governo na busca da
geração de renda para, a partir daí, alterar a natureza da distribuição dos
frutos do crescimento. De certa forma, o governo Lula utilizou-se da mesma
estratégia que os chineses desenvolveram nos últimos anos para construir uma
nova economia.
Já a presidenta Dilma colocou a
ação do governo como peça central da política econômica, sujeitando a ação
privada a um papel apenas complementar e secundário. Ao fazer isto recolocou o
ideário do PT tradicional - e também do PDT brizolista - novamente no comando
de suas ações. Daí o teor de suas declarações recentes de que não concorda com
a utilização dos juros como instrumento de redução do consumo privado no
combate à aceleração da inflação. E foi mais longe ainda, ao resgatar a antiga
e desgastada imagem do remédio matando o paciente.
Mas vamos também olhar de forma
crítica para o outro lado do espectro ideológico e que procura vender a imagem
de que estamos próximos a um total descontrole da inflação. O gráfico abaixo
mostra, de forma clara, dois momentos distintos dos números do IPCA nos últimos
anos. No primeiro, que corresponde à passagem do ponto A para o B, temos um
período de desinflação em função da valorização do real e da existência de
espaços produtivos ociosos no tecido econômico, como o índice de desemprego de
dois dígitos. Por isto a inflação chega a ficar momentaneamente abaixo do
centro da meta do BC entre 2006 e 2007.
Já entre B e C temos um período
em que pressões inflacionárias por conta da ocorrência de vários choques
externos - câmbio e commodities - em um ambiente de redução rápida dos espaços
ociosos na economia, levam a inflação a mais de 6% ao ano.
Em resumo,
nos últimos anos, mesmo durante o período de um Banco Central ortodoxo e com
liberdade de ação, a inflação no Brasil nunca ficou abaixo dos 5% ao ano por um
período mais longo. Um sinal claro de que não conseguimos sair da armadilha de
um sistema de preços indexados à inflação passada e, portanto, ultrassensível a
choques externos de oferta. Por isto, quando voltamos agora a uma situação
limite e perigosa, temos que buscar uma política de combate a inflação menos
rudimentar do que a proposta pelos dois lados do espectro ideológico que domina
o debate econômico nestes dias.
Não serão
apenas medidas clássicas como a elevação da taxa Selic que vão tirar a dinâmica
de aumento de preços da perigosa trajetória atual. Temos que voltar os olhos ao
Plano Real e buscar na sua agenda um conjunto abrangente de medidas de política
econômica.
segunda-feira, 1 de abril de 2013
Desafios para a política monetária.
Carlos Thadeu de Freitas Gomes, chefe da divisão econômica da
Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) e Marianne
Lorena Hanson, economista da Confederação Nacional do Comércio de Bens,
Serviços e Turismo (CNC), escreveram neste texto para o Valor Econômico, os
desafios para a política monetária, onde destacam que é fundamental ancorar as
expectativas inflacionárias dentro do regime de metas .
Durante muito tempo, acreditou-se que o sistema
de metas de inflação não só era o conjunto de regras de política monetária mais
eficaz para manter a inflação sob controle, como também era capaz de promover a
estabilidade macroeconômica como um todo, suavizando os ciclos econômicos. De
fato, desde sua adoção e consolidação por boa parte dos bancos centrais pelo
mundo, na década de 1990, experimentou-se um longo período de crescimento
moderado e estabilidade de preços.
O sistema de metas de inflação foi introduzido
pela primeira vez pelo Banco Central da Nova Zelândia, em 1988. Ele consiste em
um conjunto de regras que visa criar uma âncora de política monetária baseada
nas expectativas dos agentes. Ao se comprometer exclusivamente com uma meta
para a inflação e ajustar a taxa de juros para o alcance dessa meta, a política
monetária atua diretamente sobre as expectativas, e a demanda agregada converge
para o pleno emprego no longo prazo. A transparência na comunicação e a
credibilidade da autoridade monetária são premissas essenciais para esse
modelo.
No entanto, no período de "grande moderação" que
precedeu a crise financeira mais aguda desde a grande depressão, o sistema não
foi capaz de impedir desequilíbrios macroeconômicos relacionados ao
endividamento excessivo de famílias, empresas e governos, além da
sobrealavancagem do sistema financeiro, que culminaram no colapso do mercado de
crédito nos países desenvolvidos.
O arcabouço de regras rígidas do sistema de
metas de inflação também não fornecia instrumentos para tratar das
consequências dessa crise. Os canais tradicionais de política monetária
deixaram de funcionar, a taxa de juros foi rapidamente trazida para patamares
próximos de zero e outros instrumentos foram criados para prover expansão
monetária - as políticas de "quantitative easing" (QE).
Adicionalmente, para lidar com os efeitos das políticas monetárias
quantitativas e de taxa de juros reais negativas, foi necessária a adoção de
políticas macroprudenciais por países com diferenciais de juros e de
crescimento, como o Brasil, que foram afetados com forte influxo de capitais e
valorização de ativos.
Países com elevado patamar de endividamento também tiveram que
adotar políticas macroprudenciais - por meio de instrumentos regulatórios -
para lidar com desequilíbrios financeiros. Nesse contexto, sem essas medidas, a
política monetária tradicional pode estimular desequilíbrios nos fluxos de
capitais, no mercado de crédito e no preço de ativos e moedas.
A política monetária teve que se adaptar em tempos de crise. Com o risco iminente de uma prolongada recessão e a
manutenção de taxas de desemprego em patamares muito elevados, as metas para
inflação foram colocadas de lado. A crise atual de endividamento público
engessa a política fiscal e coloca a política monetária ainda mais em evidência,
colocando-a a serviço, inclusive, da própria redução da dívida, por meio da
repressão financeira. Os bancos centrais da zona do euro e dos Estados
Unidos saíram na frente e sinalizaram que aceitam uma taxa de inflação maior,
para não comprometer a recuperação econômica.
O presidente do Banco Central do Canadá, Mark Carney, sugeriu,
recentemente, a adoção de metas para o Produto Interno Bruto (PIB) nominal em
substituição às metas de inflação. Outras propostas incluem a mudança para uma
meta de nível de preços que absorva choques positivos e represente um custo
menor para o nível de atividade.
No Brasil, a política monetária também foi
flexibilizada para combater os efeitos adversos da liquidez excessiva
proveniente da expansão monetária sem precedentes dos países centrais. Para
conter os efeitos do forte influxo de capitais sobre os preços dos ativos, o
mercado de crédito e o câmbio, uma política monetária tradicional anticíclica,
ao aumentar o diferencial de juros, poderia agravar o problema.
Contudo, apesar de o uso de políticas macroprudenciais - tais como
requerimentos de capitais, barreiras aos fluxos de capitais, intervenções no
mercado de câmbio, entre outros - ter tido sucesso ao evitar a fragilidade
financeira e reduzir volatilidades nocivas, não conseguiu impedir os efeitos
dos choques externos sobre preços e atividade.
Embora o PIB tenha crescido apenas 0,9% em 2012,
a taxa de desemprego atingiu patamares historicamente baixos. Ou seja, mesmo
com a atividade mais fraca, a inflação de salários não deixou de ser uma
preocupação. O aumento no custo de produção de um bem devido à elevação dos
salários acaba sendo, ao menos em parte, repassado para os preços,
realimentando o processo inflacionário.
Há uma dinâmica favorável no país, principalmente no que diz
respeito ao consumo das famílias, apoiada no espaço que ainda existe para a
ampliação do crédito e no bônus fiscal gerado pelo desaperto monetário. Se isso
é bom por um lado, por outro, pode implicar taxa de inflação mais elevada à
frente. Adicionalmente, é preciso lembrar que alguns reajustes de preços estão
sendo postergados. No curto prazo, esses adiamentos seguram a inflação mas, no
médio prazo, têm efeito contrário. A elevada
inércia inflacionária remanescente no país e a vulnerabilidade externa latente
aumenta o custo de uma inflação mais alta.
Logo, é fundamental ancorar as expectativas
inflacionárias dentro do regime de metas, mesmo que isso, temporariamente,
afete a recuperação da atividade econômica, permitindo a sua sustentabilidade
no longo prazo. A flexibilização da política monetária teve a sua importância
num contexto de grandes desequilíbrios externos e atividade fraca. Agora, mesmo
que seja reconhecida a necessidade de repensá-la à luz dos episódios recentes,
a política monetária precisa retornar a sua função mais importante, que é
estabilizar as expectativas inflacionárias.
terça-feira, 19 de março de 2013
Banco Central precisa ser firme contra a inflação.
Editorial do GLOBO alerta para o risco de retorno da inflação.
A inflação no Brasil sempre foi muito desafiadora, e, não por acaso,
várias tentativas de vencê-la na fase aguda do problema fracassaram, até que
a engenhosidade do Plano Real, favorecida pela conjugação de um momento
político e econômico oportuno, livrou o país daquele pesadelo que parecia sem
fim.
Diante do que ocorreu nesse longo período, a economia brasileira, após
o lançamento do real, passou a conviver com uma relativa estabilidade
monetária. Não sem sacrifícios. O esforço para se disciplinar as finanças
públicas até hoje perdura, com os contribuintes tendo de arcar com uma carga
tributária extremamente pesada (36% do PIB). A política monetária foi
essencialmente restritiva nesses quase vinte anos, com percentuais elevados
de recolhimentos compulsórios sobre os depósitos bancários e taxas de juros
bem elevadas.
Mas, não fosse isso, dificilmente teria sido possível manter a
inflação dentro das metas previamente fixadas pelo governo. Metas que, por
sinal, miram em um ponto central (4,5%) acima da média apurada nas economias
mais maduras e até de países com crescimento mais acelerado que o Brasil. Em
face das peculiaridades do processo inflacionário no país, as autoridades
governamentais adotaram metas com razoável grau de tolerância (dois pontos
percentuais para cima ou para baixo do ponto central).
Com o agravamento da crise financeira nas chamadas economias mais
maduras, a política de taxas de juros muito elevadas precisou ser ajustada no
Brasil para evitar movimentos indesejáveis nos fluxos de capitais. Com isso,
as autoridades monetárias deixaram de contar com um instrumento de alto poder
de fogo contra a inflação. Assim, mesmo com um baixo crescimento, a inflação
tem se comportado de maneira preocupante, oscilando bem próximo do teto da
meta (6,5%).
Na reunião realizada este mês, o Comitê de Política Monetária (Copom)
reconheceu esse risco de mudança do patamar da inflação. Não são poucos os
fatores que têm contribuído para impulsionar os preços (entre os quais a
remanescente indexação automática de tarifas e do próprio salário mínimo),
mas também se espera que outros ajudem a segurar a alta, como a boa safra de
alimentos este ano.
O Copom preferiu aguardar um pouco mais para decidir o que fazer. É
compreensível, considerando-se o momento confuso no mundo e da ainda
indefinida tendência da economia brasileira. No entanto, se a inflação
persistir no atual patamar, as autoridades monetárias terão de agir mais
duramente. Essa possibilidade ficou no ar na ata do último Copom, e, por
isso, o próximo, marcado para abril, será cercado de grande expectativa. É
importante que fique claro que o Banco Central tem autonomia para adotar
remédios fortes, se forem necessários.
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sábado, 9 de março de 2013
Controlar a inflação.
Editorial da FOLHA DE S. PAULO e análise do resultado da última reunião do Copom.
Após os
alertas recentes de seu presidente, o Banco Central deu um sinal claro nesta
semana de que deverá voltar a elevar os juros para combater a inflação.
Segundo
comunicado oficial, o Comitê de Política Monetária (Copom) "irá acompanhar
a evolução do cenário macroeconômico até sua próxima reunião para então definir
os próximos passos na sua estratégia de política monetária".
No jargão,
significa que a alta de juros é muito provável e pode ocorrer já na próxima
reunião, em meados de abril, ou na seguinte.
Verdade que a
economia ainda patina, apesar dos sinais de retomada do PIB, para um ritmo
próximo a 3% (contra 0,9% em 2012).
A inflação,
porém, acelerou - cálculos que desconsideram oscilações de curto prazo apontam
para um quadro estrutural preocupante. Nos doze meses encerrados em fevereiro,
o IPCA (índice oficial) acumulou alta de 6,33%; em março, deve atingir 6,5% (o
máximo aceito acima da meta fixada pelo próprio governo, de 4,5%).
No cômputo
geral, a inflação é o fator predominante. Embora o governo deva ganhar margem
de manobra com novas desonerações tributárias em itens com peso importante na
alta de preços, como a cesta básica, é difícil imaginar que tais iniciativas
possam, sozinhas, reverter o processo inflacionário.
O principal
empecilho é a credibilidade do BC, arranhada nos últimos dois anos pela
impressão de leniência que passou para os agentes econômicos. As numerosas
intervenções verbais da Fazenda apenas reforçaram a desconfiança. Uma vez
perdida a expectativa de controle dos preços, é muito mais difícil conter a
inflação.
O cálculo do
BC - e do Planalto - é claro: não fazer nada e deixar a inflação correr solta
neste ano pode resultar em um cenário de descontrole para 2014 e complicar a
vida da presidente Dilma Rousseff no ano da eleição.
Uma alta
moderada dos juros em curto prazo - e, neste cenário, quanto antes ela ocorrer,
melhor - reduziria tais riscos. Analistas parecem concordar que a taxa básica
(Selic), hoje em 7,25%, subirá pouco mais de um ponto, a partir de abril ou
maio, salvo improvável melhora dos índices de inflação.
Ainda que
despertada por interesse eleitoral, é bem-vinda a disposição do BC de combater
o processo inflacionário. Há, além disso, sinais de que o governo passará a
adotar atitude menos aventureira em vários campos - gestão da Petrobras e
concessões de infraestrutura, por exemplo.
Maior
coerência e mais cuidado na gestão da economia podem reduzir o mau humor do
empresariado e, quem sabe, impulsionar os investimentos.
terça-feira, 12 de fevereiro de 2013
Carnaval com inflação!
Na linha de frente deste Carnaval, a inflação tenta comandar a folia. No
cearense Diário do Nordeste, o genial SINFRÔNIO, alerta para esse perigo.
quarta-feira, 15 de agosto de 2012
Um Brasil que sobe e desce.
Na FOLHA DE S. PAULO de ontem:
Pela quinta semana, o mercado elevou as projeções
para o IPCA, índice oficial da meta de inflação, devido ao aumento
internacional nos preços dos alimentos.
A expectativa agora é que o IPCA suba 5,11% em 2012. No início de
julho, a previsão era de alta 4,85%. Até julho, o índice subira 2,76%. Para o PIB, a projeção é de alta de 1,81%.
Há um mês, era de 2,01%.
sábado, 11 de agosto de 2012
Uma questão de opinião.
Em 11 de abril de 2004, a FOLHA DE S. PAULO publicou no Painel do Leitor este meu comentário:
"Considerando que a inflação reduz o salário real e tende a
aumentar a remuneração dos outros fatores de produção, principalmente os
lucros, é estranho que, no poder, a esquerda do PT busque, quem diria,
empobrecer muitos e enriquecer alguns com essa idéia de
"flexibilizar" a meta de inflação. Ainda bem que o ministro Palocci
considerou a proposta como um "equívoco técnico gravíssimo". Não
devemos brincar com o dragão da inflação. Afinal, ele pode acordar."
Decorridos mais de oito anos da publicação, o assunto continua em pauta.
quinta-feira, 22 de março de 2012
Previsão 2012: PIB e inflação.
Segundo o Sensor Econômico, boletim bimestral do IPEA, o PIB brasileiro
crescerá 3,5% neste 2012, menor do que o percentual de 4,5% que trabalha o
governo. A taxa de inflação estimada é de 5,3%, superior a meta de 4,5% estabelecida
pelo Conselho Monetário Nacional, mas dentro da margem de tolerância permitida de 2%.
quarta-feira, 7 de março de 2012
Mudanças na política monetária?
MARIO MESQUITA, doutor em economia pela
Universidade de Oxford, escreveu este artigo na FOLHA DE S. PAULO.
Reportagens recentes sugerem que uma das
razões para manter, ou quiçá aprofundar, a trajetória de redução das taxas de
juros seria o fato de que o grosso da pressão inflacionária estaria associado
aos preços dos serviços, que correspondem a cerca de um terço do IPCA (índice
oficial de inflação), ao passo que os demais itens teriam inflação bem
comportada.
Trata-se de uma variação surrada do tema da
inflação estrutural, contra a qual nada pode ou deve ser feito. Essa é uma tese
que tem popularidade impressionante na nossa região, que é também a que tem um
dos piores históricos inflacionários do mundo, com o Brasil em papel de
destaque.
Os países da Ásia, para sua sorte, nunca se
empolgaram muito com esse atalho latino-americano, e decidiram perseguir o crescimento
acelerado sem abrir mão da estabilidade de preços. Mas por aqui a tese da
inflação estrutural ou inevitável ainda campeia.
Para ser geograficamente preciso, contudo,
cabe reconhecer que a tese da inflação estrutural tem perdido seu
"appeal" na parte setentrional da América Latina.
O Banco do México, por exemplo, tem
recorrentemente notado em seus documentos oficiais que a inflação subjacente de
serviços é aquela que melhor reflete os determinantes domésticos da inflação.
É fato que a inflação de serviços tem maior
persistência do que a de mercadorias, mas ela é também menos sensível a fatores
externos -à chamada inflação importada. É por essa razão que a maioria dos
bancos centrais olha com atenção para a dinâmica de preços de serviços.
Outra forma de encarar o problema é notar que
as medidas de núcleos de inflação por exclusão, no Brasil e em outros países,
em geral descontam do índice cheio a variação de itens mais voláteis, como
alimentos perecíveis e combustíveis, mas não o preço dos serviços.
Cabe notar também que, se a dinâmica dos
preços de serviços manifesta inércia e reflete em parte indexação informal à
inflação passada, é porque não conseguimos reduzir a inflação para um patamar
que torne essas práticas obsoletas.
De fato, é plausível supor que a indexação só
não é mais generalizada porque em diversos setores da economia a concorrência
efetiva, ou temida, dos importados a tem inibido -evidentemente, maior
protecionismo tenderia a favorecer o recrudescimento da indexação também nos
mercados de produtos.
É verdade, também, que fatores estruturais,
típicos do processo de desenvolvimento, tendem a promover a elevação dos preços
dos serviços, mas, se isso ocorre com inflação de serviços a 5%, 6% ou 9%, como
agora no Brasil, depende também da posição da política monetária.
Em suma, não faria sentido calibrar a
política monetária apenas para conter a inflação dos serviços, mas excluí-la do
conjunto de informações relevantes não parece razoável.
As inovações no campo do debate doméstico
sobre política monetária não param por aí. Nas últimas semanas voltou a emergir
a corrente dos que defendem que a política monetária deve dar peso não apenas à
inflação e à atividade mas também à taxa de câmbio (é isso, um instrumento e
três objetivos).
Mesmo que consideremos que o Banco Central
dispõe também de instrumentos macroprudenciais, como sugerem muitas leituras da
crise mundial de 2008, continuaríamos com um objetivo de sobra. Não parece
muito sensato esperar tanto de uma só instituição.
Nesse ambiente, não surpreende que reine
certa confusão no processo de formação de expectativas dos investidores sobre
qual seria a real função da autoridade monetária no atual arcabouço de política
-justiça seja feita, essa confusão não deriva dos documentos oficiais do Banco
Central, ou de pronunciamentos de seus dirigentes, que mantém o compromisso com
o regime de metas para a inflação.
Mas a confusão existe, influencia os preços
de ativos e reflete ao menos em parte as sugestões de outras áreas do governo e
de círculos alegadamente próximos ao poder.
Há limites para o que a comunicação oficial
pode conseguir, e essa confusão acabará sendo dirimida pelas decisões a serem
tomadas proximamente pelas autoridades.
terça-feira, 6 de março de 2012
Metas inflacionárias.
Antonio Delfim Netto, no Valor Econômico de hoje.
O sistema de metas
inflacionárias tem características interessantes: 1) O poder incumbente eleito
fixa a "meta" para a taxa de inflação. Reconhecendo as tecnicalidades
e incertezas da tarefa, e a necessidade de preservá-la da influência da política
partidária, escolhe para o comando do Banco Central, e submete ao Senado, nomes
de técnicos independentes e competentes para atingi-la, atribuindo-lhes
inamovibilidade com mandatos fixos; 2) Para cumpri-la, o Banco Central tem que
construir sua credibilidade. Trabalhar não apenas para fazer a sociedade
acreditar que pode fazê-lo, mas ancorar fortemente a "expectativa" da
taxa de inflação com comportamento persistente e coerente; e 3) O Banco Central
tem que criar relações de absoluta confiança com a sociedade, particularmente o
seu setor produtivo (trabalhadores, industriais, banqueiros), com uma
comunicação sem ruídos, total transparência e adequada prestação de contas
("accountability").
A entrega, pelo poder
incumbente, eleito por milhões de votos, a um grupo de cidadãos sem
representação direta, da responsabilidade de administrar um importante bem
público (o valor da moeda) exige uma explicação convincente. Para construir uma
ponte, atendendo à necessidade de quem o elegeu, o poder incumbente procura o
melhor engenheiro especializado para projetá-la. É essa mesma exigência que
justifica, pela especificidade da tarefa, a sua entrega a pessoas com um
conhecimento adequado.
Mas há uma diferença. No
caso da ponte existem conhecimentos físicos objetivos e materiais testados
secularmente, que "garantem" que, em condições normais de pressão e
temperatura ("ceteris paribus" = todo o resto igual), a ponte vai
resistir à carga e servir por muitos anos. No caso da "garantia" do
valor da moeda é diferente.
No sistema econômico, temos
relações tênues entre o que se supõe causa e seu efeito. O tempo para uma causa
produzir um efeito é variável e depende da circunstância que o cerca.
Exatamente porque a complexidade do processo impede a existência de relações
estáveis, o exercício da difícil arte de controlar o valor da moeda precisa ser
entregue a profissionais que têm consciência de tais dificuldades e reconhecem
os limites do seu conhecimento.
É uma grave ilusão supor
que apenas a política monetária pode levar a um resultado satisfatório. Não
apenas a teoria é precária, mas seu exercício envolve alguma bruxaria:
adivinhar qual é a taxa de juro "neutra", qual é o "produto
potencial", qual é a taxa de desemprego "natural" e, acima de
tudo, "prever" a taxa de inflação. Basta olhar com atenção os
resultados da recente pesquisa estimulada pelo Banco Central para senti-la.
As respostas não são
completamente coerentes dentro dos modelos conhecidos. Olhando os gráficos, há
sinais que eles parecem combinar "distribuições" produzidas por
informantes com diferentes modelos e diferentes definições do objeto da
estimativa. Sem o conhecimento de como essas foram produzidas, não há garantia
que a mediana, a média e a moda façam sentido, da mesma forma que ocorre quando
misturamos uma distribuição de pesos de laranja com outra de maçãs...
Nada disso sugere que não
devamos levar a sério o sistema de metas inflacionárias. Quando a expectativa
de inflação está bem ancorada, ele é um instrumento formidável para diminuir as
tensões da distribuição da renda entre o trabalho e o capital. O seu exercício,
entretanto, deve ser cuidadoso, como mostra o exemplo seguinte.
Lars Erik Oskar Svensson é
um competente economista monetário sueco. É conhecido na academia e nos bancos
centrais de todo o mundo como um dos mais importantes pesquisadores do sistema
de metas inflacionárias. Desde 1990, Svensson foi assessor do Sveriges
Riksbank, o banco central da Suécia, que há alguns anos utiliza o sistema. Em
2007, foi nomeado para a diretoria do banco para um mandato de seis anos e
serviu por um ano como um dos seis membros do seu comitê executivo.
Ele acaba de publicar um
artigo imperdível (Svensson, L. - "Practical Monetary Policy: Exemples
from Sweden and the United States", NBER - WP. 17823, Feb. 2012) para mostrar
o papel das "circunstâncias", isto é, das condicionalidades não
explícitas, nas previsões que informam a política monetária. É um breviário
contra a arrogância e a intolerância de alguns analistas.
No terceiro trimestre de
2010, os EUA e a Suécia estavam nas mesmas condições: 1) taxa de inflação
abaixo da meta; e 2) taxa de desemprego maior que a natural. Tanto os EUA (com
sua "meta" escondida, e agora anunciada) quanto a Suécia, que aplica
o regime de metas, tinham de fazer a mesma coisa: reduzir a taxa de juros. Pois
bem, os EUA fez o correto (baixou o juro, fez o QE2) e se deu mal. A Suécia fez
o errado (elevou os juros) e se deu bem. Tudo por conta das
"circunstâncias"...
Isso não é desculpa para
fazermos o errado. A política monetária exige modéstia e cuidado e só funciona
quando apoiada por uma robusta política fiscal. A nossa tem nos servido bem. O
crescimento robusto sem pressões inflacionárias exige que enfrentemos
corajosamente o desequilíbrio do mercado de trabalho e aceleremos a aprovação
dos projetos de mudanças estruturais que estão dormindo no Congresso.
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012
O BC e as expectativas de inflação.
Fabio Giambiagi, economista, co-organizador
do livro "Economia Brasileira Contemporânea: 1945/2010" (Editora
Campus), hoje no VALOR ECONÔMICO.
O regime de metas de inflação sofreu alguns
arranhões na sua credibilidade desde 2010. Para explicar isso, convém olhar as
duas tabelas que acompanham este texto. A tabela I mostra o que aconteceu a
cada ano t, com: a) a expectativa de inflação dos Top 5 de médio prazo (as
instituições com melhor índice de acerto para o médio prazo, na pesquisa
Focus), feita no começo de janeiro do ano anterior; b) a expectativa da mediana
de mercado para o próprio ano; e c) a inflação de fato observada no final do
ano.
A tabela I sugere, primeiro, que até 2007 o
mercado trabalhava com o cenário de que o governo, dando continuidade à
política de combate à inflação reafirmada no início do governo Lula e mantida,
até então, com excelentes resultados, promoveria reduções posteriores da
própria meta de inflação a partir de 2009, a ponto de o mercado acreditar na
época que a inflação de 2008 seria inferior à meta daquele ano (no começo de
2007, o mercado achava que a inflação de 2008 seria 3,5 %!). E, segundo, que
desvios da inflação acima da meta eram vistos como temporários.
Isso começou a mudar durante 2010. Até o
começo daquele ano, com meta de 4,5%, não se duvidava que o governo voltaria a
alcançar a meta, mesmo que não no ano, pelo menos no ano seguinte. Já a tabela
I indica que, em 2011, pela primeira vez, não apenas duvidou-se que a inflação
estaria na meta naquele ano, como desde o começo do ano os Top 5 de médio prazo
já sinalizavam que sequer a meta de 2012 seria alcançada.
A rigor, não haveria problemas se o BC
explicasse por A + B que por alguma razão a meta no ano não seria cumprida, mas
que no futuro a trajetória convergiria para 4,5%. Quando no começo de cada ano
se insiste que a meta será alcançada e depois isso não ocorre, porém, os
efeitos cumulativos sobre a capacidade de inspirar confiança são óbvios.
Observe-se na tabela II que a comparação da inflação prevista para 2011 entre o
cenário de mercado do Relatório Trimestral do BC e a previsão dos Top 5 (de
médio prazo em 2010 e de curto prazo em 2011) mostra uma subestimação
sistemática da inflação futura por parte do BC que vinha se arrastando desde
2010.
O fato é que tivemos inflação distante da
meta por dois anos consecutivos em 2010 e 2011 e com expectativas descoladas da
meta em 2011 e 2012. O nosso BC é muito melhor que o de nossos vizinhos
heterodoxos e é difícil fazer política monetária em um mundo conturbado como o
atual. Os fatos de 2011 sugerem, de qualquer forma, que a comunicação
institucional do BC deve ser aprimorada. Ao mesmo tempo, a repetição de alguns
desses problemas recomenda que o horizonte de referência da meta seja
explicitamente estendido para um período de 24 meses à frente.
Faz mais sentido o BC agir a cada reunião
para tentar que 24 meses depois a inflação esteja na meta - dando tempo para um
ajustamento suave a eventuais choques - do que ficar repetindo em janeiro
promessas que em dezembro acabam se frustrando. Comunicação é o nome do jogo. A
propósito: a expectativa de inflação da mediana dos Top 5 de médio prazo para o
ano que vem (2013) está subindo e já está em 5,3%. Os Top 5 podem errar? Sim,
mas nos últimos tempos acertaram bastante. O BC deveria prestar atenção nos
sinais que eles estão emitindo.
sexta-feira, 14 de outubro de 2011
A inflação passada e os juros altos.
Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP, em artigo especialmente para o VALOR ECONÔMICO.
Toda decisão do Banco Central de
aumentar ou reduzir a taxa de juros envolve interesses setoriais. Não é a toa
que a decisão da última reunião gerou uma controvérsia maior do que a usual,
pois significou uma ruptura com o comportamento passado. Aqueles que fizeram
análise defendendo a redução na taxa de juros foram taxados, pelos
"sábios" consultores e economistas de bancos, como se eles não
tivessem fundamentos em teoria econômica e nos fatos empíricos. Nada mais longe
da verdade. Aqui neste espaço o que apontei no mês passado foi uma mudança, na
direção correta, no comportamento do Banco Central, baseado na boa teoria e
prática das metas de inflação.
Os críticos da decisão do Banco Central
apontam que a taxa de inflação medida pelo IPCA estaria aumentando e estão
fazendo um estardalhaço com o índice que atingiu 7,31% em setembro e que as
previsões para 2011 ultrapassarão o teto. Mas antes de mais nada é preciso
lembrar que a redução na taxa de juros, na última reunião do Copom, terá
efeitos sobre o nível de demanda agregada e os preços somente nos próximos
meses; seus efeitos mais fortes serão sentidos daqui a seis a doze meses.
Portanto, a boa teoria e boa prática
recomendam que a taxa de inflação de referência como meta deve sempre ser a
inflação prevista para os próximos doze meses, a partir da data da tomada de
decisão. Logo, o pré-requisito para implantar um modelo formal de meta de
inflação é a existência de algum modelo econométrico transparente e confiável.
O que a boa teoria nos diz é que, na ausência desse modelo, é melhor não adotar
um modelo formal e rígido de metas - é o que recomenda um dos maiores
estudiosos do tema, Lars Svensson, do banco central sueco. Por essas e outras
razões, Greenspan também rejeitava a política de metas de inflação.
Assim, utilizar a taxa de inflação dos
últimos doze meses é um erro grosseiro do nosso sistema vigente, desde a sua
implantação. Quando a inflação está em queda, a inflação passada gera uma
inércia longa na taxa de juros, desnecessária e de elevados custos sociais.
Quando a inflação sobe, provoca uma reação tardia do banco central, levando na
maioria dos casos, a uma elevação da taxa de juros acima do necessário. Pior ainda,
inexplicavelmente no nosso sistema, a inflação refere-se ao ano calendário.
Levando estritamente ao pé da letra, é como se o Banco Central, nesta próxima
reunião de outubro, tivesse que fixar uma taxa de juros capaz ou de reduzir a
inflação nos meses de novembro e dezembro, de tal forma a atingir a meta no
final de dezembro ou teríamos que fazer a "mágica" da taxa de juros
ter efeitos retroativos a janeiro, reescrevendo a trajetória dos preços.
Evidentemente, ambas alternativas são inviáveis ou absurdas.
Deixando de lado esse rigor teórico e na
ausência de um modelo econométrico confiável de previsão da inflação, para pelo
menos os próximos 12 meses, é inevitável que pragmaticamente se utilize a
inflação passada para formar a previsão da inflação futura, mas aí existem pelo
menos dois critérios alternativos: 1) a taxa média mensal anualizada do período
mais recente (por exemplo, ultimo trimestre 4,1% a.a.); e 2) a taxa acumulada
da inflação passada (acumulado de 12 meses 7,31%). Qual melhor critério? Quais
as implicações de cada critério? No primeiro, temos maior flexibilidade de
detectar se existem ou não pressões inflacionarias persistentes; mudanças de
patamar; se elas desapareceram e, de tornar a inércia nas taxas de juros
menores. No segundo caso, a inércia é mais longa e acelerações desaparecidas,
há mais de três trimestres, podem estar afetando a taxa de juros que, de fato,
terá efeitos no futuro.
Vamos aos fatos. Analisando a trajetória
da inflação medida pelo IPCA nos últimos 12 meses verificamos que até setembro
de 2010, a inflação estava sob controle, dentro da meta. A inflação acelerou a
partir de outubro de 2010, quando aumentou 0,75%, em relação ao mês anterior,
permanecendo nesse patamar até abril de 2010. Nesse período, a taxa media mensal
alcançou 0,77% ao mês, o que nos dá uma taxa anualizada de 9,65%, estourando a
meta. O que esses dados mostram é que houve uma pressão inflacionária que se
manifestou nos índices entre outubro de 2010 e abril de 2011 que levou a taxa
de inflação anualizada para um patamar fora da meta. A função do Banco Central
é exatamente antecipar essas pressões e tomar medidas para que a inflação fique
dentro da meta. É importante lembrar que, em dezembro de 2010, o Banco Central,
com defasagem de pelo menos três meses, pois a taxa de inflação de 12 meses tem
forte componente inercial, tomou medidas macro-prudenciais restringindo o
crédito. O que já sinalizava também mudanças técnicas, com utilização de novos
instrumentos que equivalem a uma elevação na taxa de juros.
Em seguida, a taxa de inflação sofreu
uma queda de 0,77% em abril, para 0,47% em maio, tendo ficado em junho e julho
em 0,15% e 0,16%, voltando a acelerar um pouco em agosto e setembro, sempre em
relação ao mês anterior. De qualquer forma, a taxa média mensal de maio a
setembro de 2011 passou para 0,34%, o que anualizada nos dá 4,1%, portanto por
esse critério de taxa anualizada dentro da meta.
Nada mais correto que o Banco Central
reduzir a taxa de inflação no final do mês de agosto, pois desde o mês de maio
a inflação passada mais recente já dava sinais de que as pressões de aceleração
da inflação haviam desaparecido. Mais justificado ainda se havia já indicadores
confiáveis de que o crescimento da economia estava caminhando para um nível
abaixo do potencial.
terça-feira, 6 de setembro de 2011
O regime de metas para inflação agoniza
Gustavo Loyola, doutor em economia pela EPGE/FGV, foi presidente do Banco Central e é sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo, escreveu hoje no VALOR ECONÔMICO que “o regime de metas para inflação agoniza”.
Com a surpreendente decisão de reduzir os juros em meio ponto percentual, o Banco Central subverteu alguns princípios basilares do regime de metas para inflação. Esse regime, como se sabe, implica que o BC, embora possuindo autonomia operacional em relação aos agentes políticos, tenha “discricionariedade limitada” na política monetária. A limitação na discricionariedade do BC vem não apenas da própria meta numérica — que deve ser observada pelo BC, embora não seja por ele fixada — como também da transparência de que deve se revestir a execução da política monetária. Por isso a importância da “ritualística” das reuniões pré-agendadas do Copom, da divulgação periódica das atas dessas reuniões e dos relatórios de inflação, do comparecimento regular dos dirigentes do BC ao Congresso, etc. No regime de metas, domina o pressuposto básico de que as expectativas são importantes e que cabe ao BC coordená-las, utilizando meios de comunicação transparentes.
Ora, na decisão da semana passada, quase nada disso foi observado. O BC surpreendeu o mercado, de forma mais ou menos gratuita. Não se configurava uma situação excepcional em que o BC pode (e em algumas vezes deve) surpreender ou se contrapor às expectativas de mercado. Ao contrário, as expectativas sobre a decisão do BC estavam “ancoradas” na manutenção dos juros, o que se alinhava com toda a comunicação anterior, formal ou informal, do BC com os agentes econômicos. Nada indicava que o Copom tivesse como cenário básico um choque desinflacionário vindo do exterior que demandasse o imediato afrouxamento monetário no Brasil.
Longe disso. Não apenas os números, efetivos e projetados, da inflação doméstica continuavam muito fora da meta, como também a tônica das manifestações do BC levava a crer que sua visão do balanço de riscos colocava ainda peso maior no risco inflacionário, a exigir, portanto, uma política monetária relativamente mais apertada. Vale ressaltar, a propósito, que a recente decisão do Copom foi a primeira vez, no regime de metas, que o Comitê reverteu o sinal do movimento dos juros de uma reunião para outra, sem um período transicional mínimo.
A desobediência à ritualística mínima é sinal de que tal regime não mais será observado na prática
De forma inusitada, aliás, quem fez um esforço de coordenar as expectativas foi a própria presidente da República que, na véspera da reunião do Copom, admitiu a possibilidade de redução das taxas de juros, a partir do aumento da meta fiscal para 2011.
Lastimavelmente, a manifestação da presidente, antecipando o corte das taxas, acabou por lançar dúvidas sobre a autonomia operacional do BC, pressuposto fundamental para o funcionamento do regime de metas para a inflação.
Portanto, a derrubada dos juros acabou por ter consequências muito além de seus efeitos sobre a inflação e as expectativas. A desobediência à ritualística mínima do regime de metas inflacionárias pode ser entendida como sinal de que tal regime não mais será observado na prática, já que o BC teria adquirido “discricionariedade ilimitada” ou, na hipótese pior, teria deixado de ser operacionalmente autônomo na execução da política monetária. Em ambas as situações, as consequências da decisão do Copom sobre a funcionalidade do regime de metas no futuro são graves, mesmo se “ex-post” a avaliação prospectiva do cenário macroeconômico pelo BC vier a se mostrar correta.
Adicionalmente, não sendo bastante o atropelamento das expectativas pelo BC, o cenário com o qual a instituição justifica o corte da taxa de juros se mostra muito pouco provável, embora, evidentemente, não se possa atribuir a ele uma probabilidade igual a zero.
O longo comunicado divulgado pelo BC após a reunião do Copom menciona como razão principal para sua decisão a “substancial deterioração” do cenário internacional que manifesta viés desinflacionário “no horizonte relevante”. Essa piora do ambiente externo, na visão do BC, intensificará o processo em curso de moderação de atividade doméstica, o que melhora o balanço de riscos para inflação, ajudado ainda pela revisão do cenário da política fiscal. Assim, o corte de juros seria uma forma de mitigar tempestivamente os efeitos de um ambiente global mais restritivo.
Ocorre que esse não é o cenário mais provável. Embora se possa esperar crescimento muito modesto das economias desenvolvidas em 2012, tal cenário não deve provocar efeitos desinflacionários relevantes sobre o Brasil, onde a demanda doméstica sustenta a atividade econômica. Além disso, a moderação na atividade hoje observada ainda é muito leve para trazer a inflação de volta a um patamar compatível com a meta de 4,5% em 2012. Por sua vez, com relação à “revisão do cenário fiscal”, a proposta de orçamento para 2012, divulgada no mesmo dia da decisão do Copom, deveria levar o BC a ser mais conservador na política monetária e não o contrário, pois prevê queda relevante do superávit primário em relação ao ano anterior (2,5% contra 2,9%).
Pelas razões acima apontadas, o regime de metas para inflação encontra-se num momento crítico no Brasil. È uma triste constatação, principalmente porque, da chamada “tríade” da estabilidade macroeconômica resta pouco: o câmbio é cada vez menos flutuante e a política fiscal, cada vez menos superavitária.
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