Considero de menor importância esta discussão sobre se devemos chamar Presidenta Dilma ou Presidente Dilma. Entendo que a situação econômica é complexa e deveria merecer maior atenção do que ficar discutindo esse assunto. Mas gostaria de ratificar a minha posição, utilizada desde o início do governo da Presidente Dilma Rousseff, e para isso utilizo do artigo do Professor PASQUALE CIPRO NETO, hoje na FOLHA DE S.PAULO.
A Senadora Marta Suplicy interrompeu o presidente da Casa para "corrigi-lo". José Sarney usou a forma "presidente" para referir-se a Dilma Rousseff; Marta o interrompeu ("Pela ordem, senhor presidente: presidenta da República", disse ela a Sarney, que, em seguida, disse à senadora que as duas formas são corretas gramaticalmente). O fato é que Dilma Rousseff assumiu há 41 dias, e a polêmica continua, como continuam as manifestações a respeito do tema, algumas descabidas.
Já expliquei aqui que a terminação "-nte", presente em inúmeras palavras portuguesas, espanholas e italianas (e também inglesas e francesas, em que passa a "-nt" -em inglês, "presidente" é "president"; em francês, "président"), vem do particípio presente latino. Seu valor, em nossa língua e nas outras, é o de indicar o agente ("presidente" é "aquele/a que preside").
Também já disse que 99,99% das palavras terminadas em "-nte" têm forma única para o masculino e para o feminino. A mulher que gere (sim, "gere", do verbo "gerir", sinônimo de "gerenciar") uma agência bancária, por exemplo, não é gerenta; é gerente (gerenta, aliás, parece ter um certo tom pejorativo, não?).
A forma "presidenta" é uma das raras exceções, registrada -há muito- por vários dicionários (desde o de Cândido Figueiredo, por exemplo, publicado há quase um século). Outra das exceções, também antiga, é "infanta" ("1. Em Portugal ou Espanha, filha de reis que não é herdeira da coroa"; "2. Esposa do infante", explica o "Houaiss", que define "infante", no caso, como "Em Portugal e Espanha, filho de reis, porém não herdeiro do trono").
"Presidenta" é uma variante de "presidente", que, como as demais palavras terminadas em "-nte", é "substantivo ou adjetivo de dois gêneros". Em outras palavras, tanto faz, ou seja, pode-se empregar "a presidente Dilma Rousseff" ou "a presidenta Dilma Rousseff". Pois bem. O fato de haver registro de "presidenta" certamente decorre do fato de haver uso dessa forma (os dicionários não inventam palavras; registram as que ocorrem no corpus definido para a pesquisa). Mas a existência da variante de uma palavra não dá a ninguém o direito de exigir dos outros o uso dessa variante, muito menos o direito de corrigir quem não a usa, mas...
Posto isso, talvez pudéssemos trocar dois dedos de prosa sobre os possíveis motivos do pito que Marta deu em Sarney. Poder-se-ia pensar que o pito tem tom feminista, mas, como esse campo é minadíssimo, explosivo, prefiro não entrar nele.
Outra hipótese (talvez mais consistente) está em que, com o pito, Marta contesta o fato de que, ao empregar "a presidente", o presidente do Senado ignora o opção de Dilma Roussef por "presidenta". Aí o terreno se torna movediço...
Aproveito o mote para lembrar outros vocábulos que terminam em "-nte", como "adolescente" e "valente", que derivam, respectivamente, dos verbos "adolescer" e "valer". Sim, "adolescente" é "aquele/a que adolesce", assim como "valente" é "aquele/a que vale".
O caro leitor já empregou alguma forma de "adolescer"? Já disse a um de seus filhos algo como "Pobre de mim quando você adolescer!"? Elaiá! Certamente, não. O mais comum é algo como "Pobre de mim quando você entrar na adolescência!", não? Isso prova (mais uma vez) que nem sempre temos noção da relação que há entre as palavras ou de seu processo de formação.
Antes que me esqueça, "adolescer" vem do latim, em que significa "desenvolver-se, crescer". É isso.