segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A equação não fecha.


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA, hoje na FOLHA DE S. PAULO. 

Uma política que combina alta cambial com aumento nominal de salários é suicida no médio prazo.

A aposta do governo é que o mercado interno salvará a economia brasileira: que o aumento dos salários acima da produtividade, além de reduzir a desigualdade, criará demanda para a indústria e compensará a taxa de câmbio sobreapreciada. Em outras palavras, a mesma receita que deu bons resultados no governo Lula poderia ser repetida no governo Dilma.

Mas desta vez temo que a equação não feche. Ainda será possível elevar salários reais sem alta da inflação, porque o preço global das commodities tende a baixar, mas é exatamente isso que tira espaço à política econômica do governo.

Durante o governo Lula, a taxa de crescimento do PIB dobrou, enquanto que a diminuição da desigualdade econômica, que já vinha ocorrendo, se acelerou. Mas isso foi alcançado sem que o governo enfrentasse o problema fundamental: a taxa de câmbio sobreapreciada.

Em vez disso, aproveitou a contínua apreciação do real para manter a inflação baixa, ao mesmo tempo em que os salários aumentavam.

Nesse quadro, a desindustrialização iniciada em 1990 prosseguiu, mas o setor sobreviveu porque contou com o mercado interno duplamente aquecido: pelo aumento do mínimo e pelo aumento dos salários reais decorrente da baixa do dólar.

O país, que deveria apresentar elevado superavit graças ao aumento do preço das commodities, voltou ao deficit em conta-corrente.

A médio prazo uma política de crescimento voltada para o mercado interno é tão inviável quanto a alternativa de uma economia voltada para as exportações. Mercado interno e exportações precisam crescer concomitantemente.

Uma política que combina apreciação cambial com aumento nominal de salários é suicida no médio prazo porque em pouco tempo empresas menos eficientes que as nossas ocuparão nosso mercado interno. É o que acontece atualmente.

O Brasil deverá crescer menos de 3% neste ano e é pouco provável que tenha desempenho melhor no próximo ano. Os investidores não estão sendo estimulados a investir nem pelo mercado interno nem pelo externo. Este está em plena queda, puxado pela Europa e acompanhado pela China e pela Índia.

Neste quadro global adverso, e sem espaço interno para política econômica, o mais provável é que a economia continue crescendo pouco. E sempre há o risco de uma queda forte no preço das commodities, que terá efeito desastroso.

Por enquanto, o único grande gesto do governo Dilma na área econômica foi a baixa da taxa de juros, que abriu espaço para o Estado investir mais em infraestrutura.

O aumento forte do salário mínimo, já previsto em lei, será outro estímulo. Mas são insuficientes. O país continuará a crescer lentamente, e os economistas ortodoxos e as classes médias alienadas que eles guiam continuarão a atribuir a desindustrialização à "ineficiência" das empresas brasileiras.

Assim como os conservadores atribuem a culpa da pobreza e da exclusão aos pobres, os neoliberais estão agora atribuindo a desindustrialização aos empresários.

É o reacionário processo de culpabilização da vítima que se repete, ainda que aplicado a vítimas muito diferentes. E o governo parece paralisado diante desse quadro.

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