quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Entrevista com o economista William Handorf.


Entrevista no ESTADÃO com o Professor da Universidade George Washington, o economista americano William Handorf foi testemunha privilegiada do processo que, em 2008, culminou no estouro da bolha imobiliária americana. Era diretor do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) entre 2001 e 2006. Na função que exercia, não votava nas decisões de política monetária (taxa de juros). Mas participava do dia a dia da instituição.
Especialista justamente em finanças do setor imobiliário, Handorf conta que, pouco antes de deixar o Fed, provocou os colegas. Para ele, estava claro que a instituição falhava na supervisão do sistema financeiro. Durante uma exposição, afirmou: "Acredito que estamos entrando em uma nova fase que mostrará falhas na supervisão. Digam-me se - e por que - estou errado." Segundo ele, a reação foi de incredulidade.
Handorf avalia que a economia americana só vai recuperar a vitalidade, na melhor das hipóteses, em 2013. Até lá, afirmou, a taxa de desemprego continuará elevada (hoje está na casa dos 10%). "É uma recessão longa e severa." Ele conversou com o Estado após dar palestra num evento da Fecomércio em São Paulo. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O sr. acredita que o Federal Reserve adotará mais uma rodada do chamado afrouxamento quantitativo (QE3)? Se adotar, terá efeito positivo na economia?
Se vão adotar ou não, é uma questão que cabe ao Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) do Fed. Se eles deveriam fazer ou não, minha resposta é a seguinte: a probabilidade de que funcione é muito pequena. As taxas de juros nos EUA já estão muito baixas.

O Fed acertou ao informar publicamente, em sua última reunião de política monetária, que a taxa de juros vai ficar baixa ao menos até 2013?
Se eu fosse um integrante do Fed com direito a voto, teria sido mais um a discordar (dos dez diretores do Fed que votaram, três foram contrários). Não há dúvida de que o Fed tem de manter os juros baixos, pois o mandato do BC americano não é apenas para manter a inflação baixa. Deve também dar atenção ao crescimento. É algo que faz o Fed ser diferente de muitos bancos centrais. Mas, apesar disso, não se pode brincar com a inflação. É uma experiência, aliás, que vocês brasileiros conhecem bem. Leva um tempo muito longo para a inflação e as expectativas baixarem.

Cresceu a probabilidade de uma nova recessão nos EUA?
Sim. No ano passado, a probabilidade de uma recessão era de 5%. Diria que, nos últimos seis meses, essa chance cresceu para 20%. O cenário eleitoral contribuiu para essa elevação.

Como assim?
Já de olho na eleição, o Congresso e o Executivo demoraram para encontrar um acordo sobre o aumento do teto da dívida. O gatilho para esse assunto - o rebaixamento da nota de classificação de risco pela agência Standard & Poor’s - foi apenas simbólico. Mas indica, de qualquer maneira, que temos problemas no país. Goste-se ou não dessas agências, é uma opinião respeitada no mercado.

O sr. disse, em sua apresentação, que a questão do emprego é a chave para a economia americana hoje. Por quê?
Cerca de 8 milhões de americanos perderam seus empregos durante a recessão. Alguns empregos têm sido criados tanto no setor público quanto no privado, mas em quantidade insuficiente. O problema é que os EUA precisam criar entre 1 milhão e 2 milhões de empregos por ano apenas para dar conta da imigração e dos jovens que entram no mercado. Ou seja, enquanto todos esses empregos não forem criados, com salários minimamente razoáveis, será difícil imaginar uma recuperação.

Quando o sr. imagina que o cenário para o emprego nos EUA apresentará melhora?
Provavelmente não antes de 2013, talvez só em 2014. É uma recessão longa e muito severa. Não é uma recessão que se resolverá facilmente, pois há algo que continua machucando a economia: o setor imobiliário, que demanda enorme contingente de mão de obra.

O sr. foi diretor do Fed.
Fui diretor. Não votava nas decisões do Fomc.

Trabalhou na época em que Alan Greenspan era o presidente.
Sim, em parte. Fui diretor entre 2001 e 2006 (Greenspan deixou o cargo justamente em fevereiro daquele ano).

Como avalia o trabalho dele? Naquela época, ele era uma espécie de deus do mercado.
Greenspan não era uma espécie de deus. Era um deus. Concordo com a maneira como Greenspan comandou a política monetária, mas ele falhou na supervisão do sistema. Ele não reconheceu o alto risco dos empréstimos hipotecários. Se fosse eleger as cinco causas principais da crise, colocaria em primeiro lugar o papel do Fed. Certa vez, minha mulher me viu chegar em casa chateado após uma reunião em que havia falado sobre o alto risco daqueles empréstimos e as consequências para o mercado. A percepção era de que tudo estava bem. No fim de meu período no Fed, fiz uma colocação, não era um discurso formal, em que disse: "O Fed tem uma longa história de falhas em política monetária e na política de supervisão. Acredito que estamos entrando em uma nova fase que mostrará falhas na supervisão. Digam-me se - e por que - estou errado."

E qual foi a reação?
Foi de incredulidade. Como um diretor do Fed poderia dizer aquilo? O homem a quem fiz a pergunta ficou indignado.

Quando os EUA voltarão a crescer de acordo com o potencial?
Os EUA precisam crescer de 3% a 4% ao ano para criar os empregos necessários. Ficaria surpreso se isso acontecesse antes de um ano e meio ou dois.

E o Brasil nesse cenário?
Não gostaria de falar sobre o Brasil. Meu foco de análise são os Estados Unidos. O que se pode dizer, genericamente, é que o Brasil tem uma classe média emergente muito grande, que vai gerar demanda doméstica.

Entendendo economia brasileira com Gustavo Franco.


Ao alerta de GUSTAVO FRANCO, hoje no ESTADÃO, deve ser dada uma boa atenção.
A situação fiscal do Brasil é hoje muito semelhante à da Grécia, avalia o ex-presidente do Banco Central (BC) e sócio da Rio Bravo Investimentos, Gustavo Franco. A diferença, segundo ele, é que, por ter a mais alta taxa básica de juros do mundo, o Brasil tem maior facilidade para rolar sua dívida que a média dos países que formam o chamado grupo dos PIIGS - Portugal, Itália, Irlanda, Espanha e Grécia. Franco se baseia em dados do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Em 2007, a Grécia possuía um nível de dívida com vencimento de curto prazo de 13% do Produto Interno Bruto (PIB), proporção inferior aos números do Brasil, que chegavam a 17,7%. Mesmo em 2011, o Brasil ainda possui uma dívida de curto prazo equivalente a 16,9% do PIB, nível superior ao da Grécia, de 16,6%.
A maior diferença entre Brasil e Grécia, segundo o FMI, residia no déficit nominal, que em 2007 correspondia a 6,7% do PIB grego - e neste ano aumentou para 7,4%, enquanto o déficit nominal brasileiro, que era de 2,7% do PIB em 2007, caiu para 2,4% neste ano. Somados o déficit nominal e a dívida a vencer no curto prazo, que correspondem à necessidade de financiamento do setor público, em 2007 o endividamento da Grécia era de 19,7% do PIB e o do Brasil alcançava 20,4%. Em 2011, a situação se inverteu, com a dívida grega aumentando para 24% do PIB e a do Brasil caindo para 19,3%.
"No decorrer do tempo, nos acostumamos a ignorar essa história da rolagem da dívida porque é algo meio automático. A gente não presta atenção, não vê que isso é um problema. Basta olhar o que a Grécia está passando nos dias de hoje para ver que, às vezes, a rolagem da dívida pode se tornar todo o problema", afirmou Franco. "A dívida é déficit acumulado. São as nossas irresponsabilidades acumuladas no passado e que não vão desaparecer."
Na avaliação de Franco, o endividamento de curto prazo é uma das explicações para que o Brasil mantenha uma taxa de juros tão elevada, bem acima da média mundial. "Os juros opressivamente altos que temos no Brasil têm a ver com esse custo de um sistema de rolagem de dívida que faz com que nós, brasileiros, carreguemos um montante de dívida do governo que não gostaríamos de carregar em condições normais", disse.
De acordo com o Franco, isso ficou claro em 2009 e 2010, quando o BC não pôde reduzir a Selic além dos 8,75% ao ano para impedir uma corrida dos recursos aplicados em títulos públicos para a caderneta de poupança e para a Bolsa de Valores. "Vimos os perigos de o dinheiro fugir para a caderneta de poupança e aí ele entraria num circuito meio viciado de crédito subsidiado e fundings regulatórios subsidiados", afirmou. "Veríamos o dinheiro saindo do financiamento dos títulos públicos e indo para a bolsa e outras aplicações. Provavelmente o Brasil não conseguiria rolar 17% do PIB todo ano se não tivesse uma taxa de juros muito alta."
Franco explica que, para reduzir os juros, a situação fiscal do País deveria estar em condições muito melhores. "Aqui começamos a ver a importância dessa jabuticaba, os juros altos, que não entendemos bem", disse. O economista considera que os juros altos são o preço que o Brasil paga por não ter uma política de austeridade fiscal. "A dívida de hoje são os impostos de amanhã. A menos que usemos truques e bruxarias, os juros que pagamos hoje são o preço de não baixarmos os impostos e as despesas, empurrando o problema para as mãos daqueles que estão ausentes na discussão política: nossas futuras gerações", afirmou.
Segundo o ex-presidente do BC, a situação é agravada pelo fato de o Brasil não possuir, politicamente, uma maturidade para apresentar um orçamento claro e realista a respeito das receitas e despesas. "Se tivéssemos um orçamento realista, a avaliação seria feita corretamente, considerando o quanto custa ter aspirações em matéria de gastos superiores ao que a sociedade quer pagar de impostos."
Para Franco, a questão sobre o endividamento e a taxa de juros se assemelha à antiga correção monetária, que está para a inflação assim como o BNDES está para a taxa de juros. "É a falsa solução. Não resolve o problema. Na hiperinflação, a gente não podia fazer mais e melhor que a correção monetária para eliminar o problema da inflação e neutralizá-la completamente, assim como o BNDES nunca será do tamanho da economia para resolver o problema sozinho. A correção monetária, tal como o BNDES, é seletiva. E essa seletividade também tem lá seus defeitos."
Na opinião de Franco, a crise internacional, que evidencia uma exaustão fiscal em diversos países, pode contribuir para que esse debate seja feito no País. "Não se criou ainda o impulso político para arrumar as contas fiscais, movimento que deve abrir a janela para reduzir os juros", afirmou. "Talvez o próprio contexto internacional, onde a exaustão fiscal parece ser um bom título para o problema internacional, nos arraste para uma execução fiscal mais madura e organizada."

Ventro contra.


ANTONIO DELFIM NETTO, hoje na FOLHA DE S. PAULO, escreve sobre o “vento contra”.


O futuro é opaco e se nega a ser decifrado. Mesmo quando explorado pelas melhores inteligências apoiadas nos mais recentes modelos e torturado com as mais recentes técnicas econométricas, ele se recusa a confessar qual o caminho que tomará. Essa realidade e a prudência levam a comportamentos defensivos.

As autoridades responsáveis pela política econômica devem pesar cuidadosamente os riscos alternativos sem deixar-se imobilizar, mesmo porque não há caminho de custo zero. Os analistas, para preservar a credibilidade, procurarão acertar (ou errar!) juntos.

Estamos num momento grave. Com a conivência dos governos, construíram-se "inovações" financeiras cujas consequências foram ignoradas. Alguns economistas foram ridicularizados pelos que detinham o poder político porque apontaram, inadvertidamente, os perigos que as "inovações" embutiam.

O resultado dessa aventura explodiu quando a miopia dos bancos centrais dos EUA (o Fed), da Inglaterra e da Comunidade Econômica Europeia, permitiu a liquidação desordenada do Lehman Brothers.

Ignoraram a rede construída pelas "inovações" e seus abusos. De fato, como confessou Alan Greenspan -que durante 18 anos foi "el maestro" e agora é demonizado-, "ninguém sabia o que estava acontecendo".

A chamada "grande moderação" (alto crescimento e baixa inflação), na qual surfaram os bancos centrais, nada tinha a ver com eles. O mundo vive o rescaldo da crise financeira que ainda não terminou.

O grave é que os instrumentos disponíveis (a política fiscal e a monetária) esgotaram os seus efeitos no mundo desenvolvido sem restabelecer o "circuito econômico", cujo funcionamento depende da confiança dos trabalhadores, dos empresários e do sistema financeiro.

Paradoxalmente, o mundo precisa agora do ritmo de crescimento dos países emergentes. As notícias não são boas.
Vencidos dois terços de 2011, a perspectiva de crescimento no ano dos países desenvolvidos é da ordem de 1,4% (contra 2,6% em 2010) e dos emergentes da ordem de 5,4% (contra 7,3% em 2010), o que sugere um crescimento global da ordem de 2,5%, com viés de baixa (contra 3,9% em 2010).

Mesmo a China e a Índia começam a dar sinais de fadiga.

Toda essa tragédia sugere que o vento de cauda que ajudou o crescimento do Brasil com o modelo exportador agromineral induzido pela China, está terminando.

Se quisermos crescer à taxa de 4,5% a 5% nos próximos anos, devemos complementá-lo e dar especial atenção ao nosso mercado com um programa que fortaleça a poupança e a competitividade internas e dê inteligente proteção externa, como luta para realizar o governo Dilma. 

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Taxa de juros - previsão COPOM.


O Brasil não deve tentar manter uma inflação superior a meta à custa de uma redução na taxa básica de juros. Não é porque a taxa de juros americana e japonesa, por exemplo, tendem a zero que, nesses casos, devemos repetir a situação. Os anos inflacionários brasileiros, como em qualquer outra economia, resultaram em prejuízos que devem ser fortemente evitados. Sem esquecer que os pobres são mais prejudicados com o processo inflacionário. Diante disso, entendemos que o Comitê de Política Monetária deva manter a taxa de juros Selic em 12,50% ao ano em sua reunião de amanhã.

O crédito continua farto e o brasileiro é um consumidor que calcula o preço do produto apenas verificando se o valor da prestação cabe em seu orçamento mensal. Além disso, evidencia-se uma pressão política do governo para que a taxa Selic seja reduzida amanhã. No entanto, como o IPCA dos últimos 12 meses atingindo 6,87% ao ano, entendemos que a taxa deve ser mantida.   

Antonio Barros de Castro.


A perda de Antonio Barros de Castro, “Um pensador do desenvolvimento (1938-2011)”, no texto de Luiz Carlos Mendonça de Barros publicado na revista ÉPOCA. O economista presidiu o BNDES e deixou uma obra que tenta entender os desafios da economia brasileira em toda a sua complexidade.

Antonio Barros de Castro morreu de forma trágica em sua casa no Rio de Janeiro no fim de semana passado. Apesar da perda que sua morte traz para todos nós, prefiro lembrar as coisas boas que dividimos por várias décadas. Barros de Castro e eu pertencíamos a uma escola de pensamento que entendia a economia como um fenômeno de natureza social e, portanto, sujeito a limitações do tempo histórico, dos valores sociais e da dinâmica política. Nunca aceitamos, por isso, que fosse possível colocar a economia sob as amarras de um modelo matemático determinista. Mas sabíamos também ser a opção por uma economia de mercado a única possível em uma sociedade plural como a brasileira. Nosso entendimento sobre a relação entre Estado e setor privado também era bastante próximo.

Nunca flertamos com um liberalismo extremado, da mesma forma que víamos qualquer opção socialista como apenas uma utopia típica de pensamento juvenil. Barros de Castro nunca esteve preso às amarras do debate ligeiro, conjuntural. Ao contrário, sempre buscou compreender os desafios do desenvolvimento brasileiro em toda a sua complexidade. Ofereceu valiosas contribuições à discussão e à prática, pois tinha em mente não apenas a dimensão econômica, mas também a história e a geopolítica. Seus estudos sobre inovação e desenvolvimento tecnológico são hoje referências para economistas mais jovens.

Nessa nossa busca por sermos atores na economia, e não apenas pensadores, aceitamos, em momentos distintos, presidir o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – Barros de Castro assumiu essa responsabilidade entre 1992 e 1993. A instituição nos cativava por sua herança, por sua longa história de relevância e principalmente por se manter no presente como um agente importante na busca do desenvolvimento do Brasil. O BNDES propiciava a seus dirigentes a possibilidade de criar ferramentas econômicas de impacto, como programas especiais de crédito para tentar acelerar mudanças estruturais que eles entendessem necessárias para tornar a economia brasileira mais eficiente e produtiva.

Barros de Castro e eu sempre fomos apaixonados pelo estudo das mudanças estruturais que ocorrem na economia de uma sociedade dinâmica e diversa como a brasileira. Esse gosto comum nos aproximou nos últimos anos, na tentativa de entender o fenômeno do desenvolvimento chinês e sua influência na economia brasileira. Em 2007, em conjunto com meu irmão José Roberto e com Paulo Pereira Miguel, escrevi o artigo China, um dragão de três cabeças – a que devora energia e matérias-primas, a que cospe produtos industrializados cada vez mais sofisticados e a que quer consumir quantidades crescentes de produtos elaborados mundo afora, inclusive no Brasil. Barros de Castro me escreveu para manifestar concordância com nossa visão e complementá-la com observações suas. Nos últimos tempos, ele vinha participando ativamente das atividades do Instituto de Estudos Brasil-China (Ibrach) e do Centro China-Brasil de Mudança Climática e Tecnologias Inovadoras para Energia, da Coppe (o departamento de pós-graduação em engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro). Nem ele nem eu comungamos com a visão de que a economia chinesa se baseia apenas na produção de bens industriais baratos e sem qualidade. Dividíamos o entendimento de que a China é o fenômeno mais importante nas transformações estruturais que vive nosso país. É uma pena que a partida de Barros de Castro tenha ocorrido neste momento, tão rico para um economista no Brasil.

Reconhecendo a ausência de recuperação.


Paul Krugman, em seu blog aqui publicado pelo ESTADÃO, “reconhecendo a ausência da recuperação”.


Um aspecto positivo do discurso de Bernanke - estou tentando ser otimista – é o fato de, pela primeira vez, ele ter mais ou menos reconhecido que não estamos de maneira nenhuma testemunhando uma recuperação:
“Mas, independentemente destes desenvolvimentos mais positivos, tornou-se claro que a recuperação após a crise tem sido muito menos robusta do que o esperado. Com as mais recentes revisões abrangentes à contabilidade nacional e também com as mais recentes estimativas de crescimento para a primeira metade deste ano, aprendemos que a recessão foi ainda mais profunda – e a recuperação, ainda mais fraca – do que tínhamos pensado; de fato, a produção agregada nos Estados Unidos ainda não retornou ao nível alcançado antes da crise. É importante o dado de que o crescimento econômico tem apresentado em geral um ritmo insuficiente para produzir reduções sustentáveis no desemprego, que tem ultimamente pairado um pouco acima dos 9%.”
Pois é. Costumo ilustrar a ausência da recuperação por meio da proporção entre população e postos de trabalho, mas há uma representação alternativa: a proporção entre o PIB real e a estimativa de potencial elaborada pela Comissão Orçamentária do Congresso (que representa um nível de atividade consistente com a inflação estável, e não o máximo absoluto que a economia seria capaz de produzir):
Por acaso isto se assemelha a uma recuperação sólida, ainda que lenta? É claro que não.
Num mundo ideal, a conclusão de que a economia não está se recuperando faria com que o Fed adotasse o tipo de medida que Bernanke recomendou dez anos atrás quando o Japão se encontrava numa armadilha parecida, de longo prazo. Mas parece que ainda não chegamos a este ponto.

A fogueira das vaidades!


Semanalmente leio e gosto do texto de JOÃO PEREIRA COUTINHO. Ele não é economista, mas hoje não podemos deixar de ler seu artigo na FOLHA DE S. PAULO sobre “A fogueira das vaidades”. Ele resume exatamente o atual momento econômico: Os ricos que paguem a crise? Erro. Em Estados balofos são os pobres que acabarão por pagar.

A estupidez não paga imposto. Pena. Depois de ler as palavras de Warren Buffett no "New York Times", a pedir mais impostos para ricos como ele, é a sua estupidez, não a sua riqueza, que deveria ser fortemente tributada.

Digo estupidez, mas digo mal. Vaidade, a palavra certa é vaidade. Entendo Buffett. Uma pessoa acumula uma fortuna colossal. Compra casas, carros. Excentricidades.

Mas eis que chega a gadanha do tédio para arranhar a nossa consciência mortal. Como resolver esse desconforto e fazer as pazes com a culpa primitiva?

Adotando, por exemplo. Celebridades de Hollywood foram cultivando a moda: viagens repetidas a África, Ásia e outros recantos de miséria, em busca do órfão respectivo. Toda a gente pode tomar o café da manhã na Tiffany, pelo menos a partir de um certo patamar (obrigado, Truman Capote).

Mas um órfão é outra história: exige trabalho, disponibilidade e uma dose maciça de sentimentalismo, que sempre comove as lentes fotográficas. Passear um diamante na passadeira vermelha é "kitsch". Passear um cambojano ou um etíope, o cúmulo da sofisticação.

E quem não adota contribui. Tenho respeito pelos filantropos. Mas apenas pelos filantropos anônimos, que partilham a fortuna anonimamente. Não é preciso ler Kant para saber que a base da moralidade é o ato de tratar alguém como um fim, não como um meio.

Infelizmente, os filantropos que conheço, alguns pessoalmente, gostam de ajudar os pobres desde que isso renda boas matérias de jornal. O efeito, por vezes, é irônico e até perverso: eles querem partilhar a fortuna; mas, à custa da propaganda, multiplicam a fortuna porque os consumidores gostam de premiar a "consciência social".

Caro leitor: se você é rico, ou deseja ser mais rico, esqueça os mecanismos vulgares de gerar riqueza. O melhor negócio é adotar um sudanês (nunca um brasileiro!) e montar uma fundação humanitária com o seu nome em letras garrafais.

Ou então pedir mais impostos sobre sua própria fortuna. Fato: nenhum imposto especial sobre os ricos resolve os problemas estruturais dos países deficitários do Ocidente. Pelo contrário, agrava-os (já lá irei). Mas, pelo menos, consola a alma e, no caso de Warren Buffett, faz sucesso dentro e fora de portas.

Dentro de portas, já há mais bilionários americanos na fila, dispostos a ceder fortunas na fogueira das vaidades. Fora de portas, 16 bilionários franceses pediram tratamento de chicote. "Noblesse oblige": o governo Sarkozy promete descer o dito cujo sobre contribuintes cujas receitas fiscais superem € 1 milhão.

E até no exaurido Portugal, onde bato estas linhas, a ideia de Buffett promete frutificar, com presidente da República e primeiro-ministro a aceitarem um dos mantras mais famosos do "verão revolucionário" de 1975: os ricos que paguem a crise. Os ricos prometem pagar, claro. Pelo menos aqueles que não tencionam fazer as malas e fugir.

Moral da história? Não vale a pena repetir o óbvio: um sistema fiscal justo é aquele em que quem tem mais contribui com mais. Mas é também um sistema que não demoniza a riqueza e aqueles que a criam. Exceto se o modelo de sociedade ideal estiver em Cuba ou na Coreia do Norte, onde os únicos recursos são a fome e a violência.

Até Marx, que não era propriamente um capitalista (Engels fazia esse serviço por ele), sabia que, sem riqueza criada, não há riqueza para redistribuir. Nem riqueza, nem investimento, nem emprego.

Quando alguns ricos abrem as portas às predações do Estado, seja por vaidade ou interesse, eles não resolvem coisa nenhuma com suas esmolas generosas.

Apenas consolam o ego; afugentam parceiros sem sentimentos de culpa para outras paragens; e, pior, ajudam a perpetuar a exata doença que tem enterrado a Europa e os Estados Unidos: Estados falidos que, incapazes de controlar gastos, persistem de forma suicida num "modelo social" insustentável no século 21. Um modelo que, quando estourar, não vai estourar em cima de Warren Buffett e amigos. Vai estourar sobre os pobres e remendados.

Os ricos que paguem a crise? Erro. Em Estados balofos e sem incentivo para reformarem seus modos de vida, são os pobres que acabarão por pagar.

Publicação, importante etapa da ciência.


ROGÉRIO MENEGHINI, professor titular aposentado da USP, é coordenador científico do programa SciELO de revistas científicas e membro da Academia Brasileira de Ciências, escreveu hoje na FOLHA DE S. PAULO sobre “Publicação, importante etapa da ciência”.

No Brasil, os periódicos são publicados por sociedades, e não por publishers; por isso, a maioria é gerenciada de modo amador e com poucos recursos A produção mundial de ciências tem crescido intensamente, principalmente em países emergentes.
Estima-se que haja mais de 100 mil periódicos científicos no mundo.

Tanto em taxa de crescimento quanto em total de artigos, os países emergentes do grupo Brics se destacam, com 18% das publicações mundiais. Tais números ressaltam a quantidade, mas e quanto à qualidade? A avaliação mais próxima desse atributo se faz pelo número médio de citações aos artigos, utilizando bases internacionais de indexação.

Na mais prestigiosa, a Thomson-Reuters-ISI, o Brasil se encontra na 13ª posição em número de artigos publicados e na 35ª posição em citações por artigo; em resumo, relativamente bem em produtividade, mas mal em qualidade.
Entre os fatores que pesam para isso está o baixo nível de colaboração internacional (27% dos artigos).

Países mais avançados apresentam taxas superiores a 50%. É evidente que, hoje, a interação com parceiros internacionais aumenta a troca de ideias e informações, beneficiando o trabalho resultante.

Outro fator é a baixa presença de cientistas brasileiros nos corpos editoriais das revistas internacionais. Não por menos, esses pesquisadores são chamados de guardiões do portão: como cientistas destacados, têm o poder de estabelecer os contornos da ciência contemporânea, definindo o que é relevante e vanguardeiro.

Nossos periódicos também têm seus guardiões. Poderiam eles compensar a pouca presença internacional? Dificilmente.

Os países emergentes buscam indexar seus periódicos nas bases internacionais, e alcançaram sucesso nos últimos anos. Contudo, tais periódicos não se tornam necessariamente internacionais por isso. Eles operam primordialmente para fluir a produção científica nacional.

No Brasil, são publicados por instituições ou sociedades, e não por publishers, como na grande maioria dos países.

Por isso, são em sua maioria administrados de forma amadora e com recursos modestos.

O programa SciELO, apoiado primordialmente pela Fapesp, tem operado para selecionar os melhores periódicos brasileiros, dispondo-os em acesso aberto na internet e alavancando-os para indexação nas bases internacionais. O programa, porém, não intervém em suas administrações, não exercendo, portanto, o papel de publisher.

Como avançar na internacionalização desses periódicos? A meta é atingir maior visibilidade (citações) com uso intensivo da língua inglesa e da colaboração internacional.

Para isso, é necessário: (1) profissionalizar a administração, por meio de publishers e de atuação na composição do corpo editorial com pesquisadores conceituados e ativos (não perfunctórios), remunerados e experientes internacionalmente; (2) adotar um modelo econômico em que os autores pagam para publicar seus artigos, com recursos provindos de seus projetos.

A escolha de onde publicar já seria um procedimento de avaliação dos melhores periódicos pelos pesquisadores.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

A atualidade de John Maynard Keynes.


No site da VEJA uma excelente entrevista com o principal biógrafo do genial JOHN MAYNARD KEYNES.

A solução para a crise que se iniciou em 2008 e ainda faz a economia dos países desenvolvidos patinar está na obra do economista John Maynard Keynes (1883-1946), afirma seu principal biógrafo, o inglês Robert Skidelsky, 72 anos. O historiador - que escreveu 1.790 páginas de história e ensinamentos do economista que aconselhou poderosos na época da Grande Depressão de 1929 - explica o que Keynes diria hoje a Barack Obama, Angela Merkel e Nicolas Sarkozy.

Em sua opinião, a política americana de afrouxamento quantitativo - em que o governo antecipa o pagamento de títulos de longo prazo, despejando dólares na economia - peca ao não estimular corretamente a atividade. "Esse afrouxamento quantitativo não é, totalmente, uma proposta keynesiana", avalia Skidelsky. Ele explica que, para Keynes, a simples impressão de moeda não traz impulso ao consumo e ao investimento.

Em visita ao Brasil para o 5º Congresso Internacional de Mercados Financeiro e de Capitais, realizado em Campos do Jordão (SP) pela BM&FBovespa, Robert Skidelsky falou ao site de VEJA e defendeu por que Keynes é mais atual do que nunca.

O senhor escreveu, na esteira da crise de 2008, um livro chamado "O retorno do mestre" (Ed. PublicAffairs, 256 páginas, sem tradução para o português) em que relembra a relevância de Keynes para o pensamento econômico, mesmo mais de 60 anos após sua morte. Por que as teorias desse economista são hoje mais relevantes que nunca?
Keynes é particularmente relevante porque entendeu como as crises acontecem e, sobretudo, porque se debruçou sobre uma verdadeira calamidade econômica: a Grande Depressão de 1929. Ele dizia que, quando uma crise começa, os governos devem responder a ela, impedindo-a, e não simplesmente deixar o sistema ruir. Esse é o ponto fundamental. Graças a Keynes, não tivemos outra Grande Depressão. Em 2008, quando os bancos, os preços das commodities e as bolsas começaram a entrar em colapso, nos deparamos com todos os contornos de outra depressão profunda, mas os governos conseguiram impedi-la em função das ideias de Keynes. Em todo o mundo, os governos adotaram estímulos para permitir a retomada da atividade.



Durante a Grande Depressão, Keynes propôs o estímulo contínuo ao investimento. Nos Estados Unidos, nos últimos anos, as políticas do banco central americano (Fed) não turbinaram exatamente o investimento. Na Europa, segue-se o caminho contrário ao do impulso à economia, com planos severos de austeridade. Os resultados claramente não têm sido satisfatórios. À luz da teoria keynesiana, o que está errado com as políticas atuais?

O erro do afrouxamento quantitativo [intervenção governamental para injetar dinheiro na economia -- como, por exemplo, a compra de títulos bancários], adotado nos últimos anos pelo governo americano, é que essa política significa imprimir moeda. Se você aumenta a quantidade de divisas em circulação, as pessoas vão gastar mais. Os juros caem, as bolsas sobem, há um pouco de inflação e o valor da moeda talvez caia um pouco. Tudo supostamente desenhado para estimular a atividade econômica. O problema é que, como ensina Keynes, o importante é saber como gastar esses dólares. Todo esse dinheiro não tem aportado na economia real, mas sim nos mercados de ações e nos títulos do Tesouro. Se a intenção é realmente estimular a economia, o jeito de fazer o afrouxamento monetário é dar um cheque para todo mundo e definir que o dinheiro só pode ser sacado em dois meses. Só então haverá algum efeito estimulante no consumo. Do contrário, há um buraco entre a impressão de moeda e o gasto. Esse afrouxamento quantitativo não é, totalmente, uma proposta keynesiana.

Agora, na Europa, o ponto central é que as políticas não produzem nenhum crescimento. Uma grande parte do déficit da Grécia vem de suas instituições financeiras. Esses bancos emprestaram muito de seus pares alemães e franceses. Assim, quando Atenas resgatou seus bancos, assumiu as dívidas. Então, toda essa movimentação para impedir um calote grego é, na verdade, uma tentativa de evitar enormes perdas para os bancos alemães e franceses. Esse esforço é totalmente compreensível. Mas eu pergunto: de onde virá o crescimento? Se o setor privado não está gastando e o governo está cortando despesas, a atividade vai cair. Nós temos uma possibilidade real de um duplo mergulho na Europa.



Keynes foi um conselheiro dos poderosos de seu tempo, sobretudo durante a Grande Depressão; muito embora nem sempre o que pregasse fosse seguido. O que ele provavelmente diria hoje, considerando o contexto, a Barack Obama, Angela Merkel e Nicolas Sarkozy?

Para o presidente americano, ele diria que é preciso expandir a demanda agregada. Dada sua difícil situação política, uma saída seria criar um banco voltado à infraestrutura, como o próprio Obama propôs inúmeras vezes. Esta seria uma maneira de fazer as pessoas investirem nas partes da economia mais necessitadas. Mas isso se teria de ser feito fora do orçamento. O dinheiro seria concedido pelo banco central, mas seria captado no setor privado. Dessa forma, não aumentaria o déficit público.

Outra saída é tentar algum acordo com a China. É urgente. Os Estados Unidos precisam reduzir o volume de importações chinesas e aumentar suas próprias exportações. Essa correção ajudaria a indústria americana. Se esse acordo não funcionar, os americanos terão de se proteger com barreiras comerciais.

Para Merkel e Sarkozy, Keynes recomendaria estabelecer títulos de dívida europeus, garantidos coletivamente pelos membros da União Europeia, os eurobonds. Esses papeis iriam encampar grande parte da dívida grega, reduzindo os custos de financiamento da Grécia e de outros países em risco, como Portugal.

A UE precisa também de uma autoridade fiscal comum. Não é exatamente o que eles propuseram recentemente. Por último, os líderes do bloco deveriam criar uma ampla política europeia de investimento. Eles precisam usar o Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento ou os fundos disponíveis. Só precisam colocar mais dinheiro nesses fundos. Do contrário, não crescerão.

Por fim, confiar na China para tirar o mundo da recessão não é o caminho certo.



Keynes defendia que a recuperação da economia deve preceder as reformas. Ele dizia: "Não assuste os investidores no momento em que você quer que eles invistam". O que estamos vendo agora é exatamente o contrário, não?

Exatamente. É até uma contradição elevar o compulsório dos bancos, por exemplo, ao mesmo tempo em que pede que emprestem mais. Para fazer com que concedam mais crédito, é preciso capitalizá-los. Você não deve impor tamanho sacrifício ao sistema financeiro até que a economia esteja crescendo novamente. O que está acontecendo agora é oposto. Os estados estão atacando os bancos. Não que eles não tenham culpa da crise. Contudo, ao mesmo tempo, os governos querem que eles emprestem mais e mais. Keynes estava certo quando disse, em carta, ao presidente Franklin Roosevelt: "Consiga primeiro a recuperação, depois implemente reformas". Ou então, nacionalize os bancos.



Keynes foi nomeado diretor do Fundo Monetário Internacional pouco depois de sua fundação, mas não chegou a assumir porque morreu vítima de um ataque do coração. Caso fosse nomeado hoje, quais seriam suas primeiras medidas?

Ele batalharia para transformar o FMI num banco central mundial, que ele propôs, mas não foi bem-sucedido. Esse BC global transformaria os superávits comerciais chineses, por exemplo, em contas e os déficits de outros países virariam dívidas. O plano de Keynes era taxar esses saldos excessivamente positivos para que nenhum país ficasse por muito tempo com superávits maiores que certo nível preestabelecido. Haveria, igualmente, penalidades para aquelas nações deficitárias. Haveria equilíbrio, enfim. Claro que, na época de Keynes, as moedas não flutuavam. Hoje, temos um sistema caótico em que algumas moedas flutuam, outras são fixas e outras são manipuladas. É uma bagunça. Os resultados da falta de um sistema monetário internacional apropriado é que alguns países, como o Brasil e o Chile, ao receberem enormes fluxos de capital, veem suas moedas valorizarem e precisam tentar, desesperadamente, parar esse movimento.



No pós-Guerra, Keynes propôs a criação de uma ordem monetária e financeira alternativa, com uma moeda única, de valor formulado em ouro. Hoje, num mundo que sofre com a dependência do dólar, viu-se o risco desta alternativa. Todos querem migrar para um sistema misto. Keynes teria errado neste ponto?

Não. Ele propôs, na verdade, uma âncora para ganhar estabilidade; e isso pode ser feito também com uma cesta de divisas.

O mal-estar dos nossos dias

LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA, hoje na FOLHA DE S. PAULO, escreve sobre "O mal-estar dos nossos dias".

Vivemos um tempo de crise, um tempo de mal-estar. A selvagem revolta no Reino Unido mostrou com clareza; foi uma reedição agravada das revoltas da França de 2005.


Essas, como as manifestações mais moderadas e mais objetivas na Grécia, na Espanha, e na própria Inglaterra contra as políticas de austeridade impostas pelos credores ou então autoimpostas pelo próprio governo conservador, demonstram que não vivemos dias felizes.


A miséria material continua a identificar países pobres e explorados da periferia, mas a miséria humana, a sensação de insegurança e falta de perspectivas e a frustração generalizada estão em toda parte. Especialmente no mundo rico.


Os EUA, que no pós-guerra eram uma sociedade coesa e vigorosa, hoje são uma sociedade dividida e desorientada. Na Europa a crise provocada pelo euro sugere para todos a estagnação senão a decadência econômica.


Como explicar o que está acontecendo? É o capitalismo que fracassou, é o Estado social que foi destruído, como afirma um crítico tão radical como brilhante como é Slavoj Zizek? Não aceito esse tipo de diagnóstico.


Os 30 anos neoliberais do capitalismo foram um tempo de retrocesso social e político, de aumento brutal das desigualdades e da instabilidade financeira e de diminuição das taxas de crescimento econômico. Mas o Estado social europeu sobreviveu porque foi defendido em eleições democráticas.


Foi então porque o mundo moderno perdeu seus parâmetros morais, como pretendem os conservadores? Não vale a pena perder tempo com esse tipo de não-explicação. As revoltas nem sempre são racionais, e muitas vezes não são sequer razoáveis, mas são sempre morais.


Mostram sempre indignação moral contra a injustiça, o privilégio e a corrupção dos ricos. Os revoltosos de Londres agiram em alguns momentos como criminosos, mas não subestimemos sua indignação.


Houve, sim, decadência moral no nosso tempo. Mas a perda de parâmetros morais decorreu da aliança contraditória e malsã do conservadorismo com o neoliberalismo - com uma ideologia ferozmente individualista, que nega de forma militante solidariedade e interesse público.


Os progressistas não têm o monopólio da moral, já que os conservadores foram sempre guardiões da moralidade, embora a confundindo com a ordem estabelecida. O conservador apenas não estava disposto, como estão o progressista e o revolucionário, a arriscar a ordem em nome da justiça social.


Quando, entretanto, nos 30 anos neoliberais, o conservadorismo foi capturado pelo neoliberalismo, tornou-se uma fonte de desorganização social e de retrocesso moral.


O mal-estar do nosso tempo só será superado quando o mundo rico redescobrir o futuro. Mas essa redescoberta só pode ser feita quando fizer a crítica ao neoliberalismo.



Os anos neoliberais do capitalismo terminaram com a crise financeira de 2008, que os desmoralizou, como desmoralizou a teoria econômica neoclássica que os justificava.



Mas nem as elites conservadoras nem os intelectuais progressistas foram capazes de fazer a crítica necessária do que aconteceu. Nem de reafirmar sua confiança na ideia do progresso ou do desenvolvimento.

sábado, 27 de agosto de 2011

Livraria Saraiva - loja em Trípoli.


Solicitei no site da Livraria Saraiva o envio de três livros. Para minha surpresa, o livro acima somente é possível a entrega no prazo de DEZENOVE dias úteis. Que logística louca é essa? Trata-se de um lançamento, por editora nacional, a concorrente Livraria Cultura entrega em dois dias úteis e a forte Saraiva não consegue... Será que mandaram buscar na Líbia?

O problema de Ben Bernanke


PAUL KRUGMAN, hoje na FOLHA DE S. PAULO, escreve que com o FED intimidado pela oposição para que fique inativo, eh difícil ver um fim para o desastre econômico.   

Investidores aguardavam ansiosamente o discurso de Ben Bernanke na reunião anual do Fed em Jackson Hole.
Eles queriam saber se Bernanke iria anunciar novas políticas capazes de tirar a economia dos Estados Unidos de algo que está parecendo um estado quase permanente de demanda deprimida e desemprego alto.
Eu ficaria muito surpreso se Bernanke propusesse qualquer coisa significativa.
Por que eu não espero muito de Bernanke? Em duas palavras: Rick Perry.
Não quero dizer que Perry, o governador do Texas, esteja pessoalmente funcionando como obstáculo a uma política monetária eficaz. Ainda não, pelo menos.
Estou usando Perry -que ameaçou Bernanke de consequências pessoais graves se implementar uma política expansionista antes da eleição de 2012 - como símbolo da intimidação política que está matando nossa esperança de recuperação.
Sob condições normais, esperaríamos que o Fed injetasse ânimo na economia, reduzindo as taxas de juros.
Mas os juros que o Fed normalmente visa já estão em quase zero. Então o que o Fed pode fazer?
Em 2000 um economista chamado Ben Bernanke apresentou uma série de propostas para uma política no "limite inferior zero". É verdade que o artigo focou o Japão, não os Estados Unidos. Mas os EUA se encontram agora em uma armadilha econômica muito semelhante à japonesa, apenas mais aguda. Por que Bernanke 2011 não está ouvindo os conselhos de Bernanke 2000?
Em 2000, ele sugeriu estimular a economia japonesa com uma série de políticas não convencionais e estava no caminho certo.
Então por que o Fed não segue a agenda que seu próprio presidente recomendou?
No ano passado o Fed chegou a instituir uma política de comprar dívida de longo prazo. Mas enfrentou uma reação política totalmente fora de proporção ao efeito modesto que isso exerceu sobre a economia, reação essa que culminou com a declaração de Rick Perry de que qualquer afrouxamento monetário antes da eleição de 2012 seria "quase uma traição" e que, se Bernanke fosse adiante e o fizesse, "nós aqui no Texas lhe daríamos tratamento brutal".
Imagine a reação que haveria se o Federal Reserve implementasse as outras e possivelmente mais importantes partes da agenda de Bernanke 2000, visando um índice de inflação mais alto e saudando o enfraquecimento do dólar. É certo que haveria uma tempestade política.
Agora você entende por que não previa anúncios de políticas de peso em Jackson Hole. Em 2000, Bernanke acusou o Banco do Japão de sofrer de "paralisia autoinduzida"; bem, agora o Fed está sofrendo de paralisia externamente induzida.
Na prática, ele foi intimidado politicamente para que fique de lado, como mero observador, enquanto a economia estagna.
A oposição política paralisou a política fiscal; ao invés de ajudar a criar empregos, o governo federal está recuando, com desincentivo à produção e ao emprego.
Com o Federal Reserve também intimidado para que fique inativo, é difícil divisar qualquer fim para o desastre econômico em curso

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Churchill e os governos do PT.


LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 68, engenheiro e economista, escreveu hoje na FOLHA DE S. PAULO.

A coluna de hoje lembrando uma imagem que Winston Churchill usava para caracterizar os americanos na primeira metade do século passado: "A sociedade americana sempre acaba fazendo as coisas certas, mas antes disso experimenta todos os caminhos errados que existem".
Lembrei-me dessa imagem ao ler na imprensa duas notícias relativas à privatização de empresas de serviços públicos no governo Dilma: a primeira descreve o bem-sucedido leilão de privatização de um aeroporto na cidade de Natal, no Rio Grande do Norte; a segunda especula sobre a possível venda, ao setor privado, das distribuidoras de energia elétrica em seis Estados do Norte e do Nordeste e que são controladas hoje pela Eletrobras.
Na solenidade de encerramento do leilão de privatização do aeroporto de São Gonçalo do Amarante, tivemos até a cena tradicional de "bater o martelo" na Bolsa de Valores de São Paulo. A foto desse ato simbólico nos jornais levava, há alguns anos, os membros do PT à revolta pública nas ruas.
Agora, passou despercebida mesmo entre seus mais radicais militantes. Mas o tempo passa e o Brasil, felizmente -como os Estados Unidos na imagem de Churchill-, também acaba trilhando o caminho correto depois dos erros cometidos.
Agora a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) promete levar adiante a concessão dos aeroportos de Cumbica e de Viracopos, ambos em São Paulo, e de Brasília. Espero sinceramente que prevaleça, daqui para a frente, a máxima caipira que diz que "em porteira que passa um boi passa também uma boiada" e que a privatização dos aeroportos permita que o cidadão tenha mais respeito quando for utilizar os serviços de um aeroporto no Brasil.
No caso das empresas estaduais de distribuição de energia elétrica, várias reportagens no jornal "Valor" trazem um resumo transparente do caos que domina a gestão dessas empresas, depois de dez anos sob o controle da Eletrobras.
Desde 2008, só em conversão de dívidas para com a estatal federal em capital social já foram gastos mais de R$ 5 bilhões. Mesmo com todo esse esforço de redução de dívidas para manter as empresas funcionando, elas já acumulam prejuízo consolidado de mais de R$ 750 milhões.
Esse estado caótico, aliás, levou os auditores dessas empresas a colocar em seus balanços uma nota em que chamam a atenção para um possível colapso operacional em futuro próximo.
Conheço bem esse quadro -principalmente as razões que levaram a essa situação caótica. Durante os anos em que fui presidente do BNDES, coordenei a privatização de várias empresas estaduais de distribuição de energia elétrica e, nesse processo, pude observar que nem sempre a boa gestão era praticada para o bem do povo e do Estado. Por isso, não me emocionam os números revelados finalmente pela Eletrobras.
Uma das empresas em pior situação quando o BNDES implantava esse processo de privatização nos Estados era a Cemar, a distribuidora de energia elétrica no Maranhão.
Nesse feudo da família Sarney, essa empresa estava sob o comando de um filho do ex-presidente da República. Por motivos políticos, a empresa continuou nas mãos do governo estadual e somente em 2004 foi vendida a um grupo privado.
Nesses últimos sete anos, tudo mudou e transcrevo, a seguir, parte do que foi publicado no jornal "Valor": "Dona de um terço do capital da Companhia Energética do Maranhão (Cemar), a Eletrobras pouco dá palpite em sua administração, pois está feliz com o que acontece por lá. Em sete anos, viu a distribuidora sair de um estado falimentar, com serviço que deixava o cidadão maranhense, na média, 60 horas por ano sem luz, para uma situação em que os dividendos pagos já se aproximam de R$ 1 bilhão e a média de horas sem luz caiu para menos de 20".
Espero sinceramente que a presidente Dilma vença a oposição que sindicatos e políticos ainda fazem às privatizações e siga os conselhos de técnicos da Eletrobras e do próprio Ministério de Minas e Energia e leve adiante a venda dessas empresas.

Seminário de Economia.


Economistas e ex-integrantes do governo FHC debateram no seminário “Transição Incompleta e Dilemas da (Macro)Economia Brasileira”. Hoje no ESTADÃO.


A crise internacional evidenciou o fato de que a política de bem estar social, adotada pelos países europeus e almejada pelo Brasil, chegou ao seu limite. O ônus de oferecer serviços de educação, saúde, transporte e segurança apostando em um Estado capaz de socializar perdas e acomodar conquistas é o elevado nível de endividamento público.

Esse é o consenso a que chegaram economistas e ex-integrantes do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que participaram nesta quinta-feira, 25, do seminário Transição Incompleta e Dilemas da (Macro)Economia Brasileira, realizado na capital paulista pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC) e BM&FBovespa.

Para o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, a crise do mundo desenvolvido levou a um processo de reavaliação dessa política, cuja implementação vem sendo desejada há décadas pelos países emergentes. "Hoje estamos em um processo de recente reavaliação. Os países estão ou fora das possibilidades dos gastos do setor público ou fora do limite que a população, pelo menos a que paga impostos, aceita como necessário ou razoável para prover os serviços esperados", afirmou.

Na avaliação de Malan, o Brasil, que tomou esse modelo como referência, precisa discutir os impactos dessa política sobre as contas públicas. Isso porque as tentativas de elevar impostos de forma continuada, conforme fizeram os países europeus, afetam negativamente o investimento e o crescimento econômico, destacou Malan. "O País hoje tem a mais alta proporção de gasto público em relação ao PIB comparada a qualquer país em desenvolvimento, mais alta que muitos países desenvolvidos. O Brasil também tem hoje a mais alta carga tributária entre todos os países em desenvolvimento, também mais alta que muitos países desenvolvidos. Essa discussão engatinha entre nós, mas precisa ser aprofundada", disse.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que o Brasil vive um momento em que precisa de ideias novas e deve retomar a agenda de reformas estruturais. Isso, na avaliação dele, é o que pode garantir o crescimento econômico a médio e longo prazo. Questionado se concorda com a avaliação de Malan, de que o modelo de bem estar social está se esgotando, o ex-presidente concordou, mas ponderou que ninguém pode pensar o Brasil sem uma política social ativa. "Malan está dizendo que temos que tomar cuidado porque lá na Europa chegou-se a um momento em que ‘desbalançou’. Veja o que aconteceu na Espanha, com déficit público elevadíssimo. Isso pode chegar aqui, se nós não tivermos cuidado", afirmou. "Se quisermos preservar a possibilidade de ter uma política social ativa, temos que olhar para isso."

FHC ressaltou que o Brasil não está imune à crise. "Tudo que está acontecendo de positivo agora pode se perder se não nos preparamos para o que vai acontecer pelo mundo", afirmou. "Todos aqui concordam que a crise global que nós estamos vivendo é grande. Ela começou em 2008 e continua, e a ideia de que o Brasil é uma ilha isolada que não pode ser alcançada está equivocada. Temos de ter já uma previsão do futuro, e isso implica em retomar uma agenda de reformas."

O economista Andre Lara Resende, ex-diretor do Banco Central e ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, criticou a adoção da política clássica keynesiana desde o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que permaneceu com a presidente Dilma Rousseff. Na avaliação dele, o Brasil perdeu a oportunidade de implementar políticas econômicas que pudessem levar à redução da taxa de juros e a um maior crescimento econômico. Segundo ele, isso é fruto de um processo de transição e estabilização econômica inacabados. "A inflação foi resolvida, mas ela é apenas um sintoma. A raiz do problema é a incompatibilidade de ações. E as pressões na economia brasileira são as mesmas de sempre", disse, em referência ao excesso de gasto público, que tem como consequência uma alta na inflação e, por conseguinte, a necessidade de uma taxa de juros elevada.

Sobre essa questão, Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central e sócio da Rio Bravo Investimentos, foi enfático. "A dívida de hoje são os impostos de amanhã", afirmou, citando que o custo anual da rolagem da dívida brasileira corresponde a 17% do PIB. Para Franco, os problemas que têm levado à crise nas economias centrais não estão muito distantes do País. Ele pôs em dúvida a capacidade de o governo federal entregar o prometido corte de gastos destinado a amenizar os impactos da crise na economia, e, ao mesmo tempo, manter a base de apoio unida no Congresso. "Estamos perdendo uma grande oportunidade de cumprir uma agenda que traria a taxa de juros para patamares normais", alertou.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

The World's 100 Most Powerful Women: DILMA 3ª


Dilma Rousseff made news when she was elected to lead Latin America's largest economy in October, but in many ways the election result was not a surprise. As the first female Chief of Staff under reformist President Lula da Silva, appointed in 2005, she was widely expected to be his successor. It is her rise to that post that is remarkable. Involved in Latin America's radical labor politics, Rousseff was jailed for two years. In 2001, when she was appointed Minister of Energy, Rousseff began to alter her views towards a more a pragmatic and capitalist approach. Today she is battling a rebellious National Congress threatening to halt her agenda and Brazil's economic boom. Outside politics, Rousseff is an avid theater fan, particularly classical Greek drama and opera.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Brasil precisa manter a solidez fiscal diante da crise.


Muito bom o editorial de hoje do VALOR ECONÔMICO. Uma leitura imperdível.

O agravamento da crise internacional, nas últimas semanas, encontra o Brasil em situação confortável na área fiscal. Enquanto vários países da zona do euro se debatem em meio a um elevado endividamento que ameaça a saúde do sistema bancário e pode jogar as economias centrais em recessão, a dívida líquida do setor público brasileiro segue em trajetória de queda, devendo ficar abaixo de 40% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano. Mesmo considerando o endividamento bruto total, que alcançou 56% do PIB em junho, de acordo com dados do Banco Central (BC), o Brasil ainda está em patamar bem inferior ao dos países europeus, Estados Unidos e Japão.

É importante ressaltar que a dívida bruta talvez não seja o melhor critério para avaliar a trajetória do endividamento brasileiro como indicador de solvência pois parte considerável dela é a contrapartida das reservas internacionais. Ao comprar moeda estrangeira para compor as reservas, o BC despeja reais na economia em grande quantidade e precisa, no momento seguinte, colocar títulos no mercado para enxugar o meio circulante, evitando, assim, os efeitos inflacionários de um excesso de liquidez. O BC realiza esse movimento por meio das chamadas operações compromissadas, em que ele oferece títulos com a garantia de recompra. Esses títulos são contabilizados na dívida bruta.

Não há, hoje, qualquer dúvida entre os analistas e os investidores sobre a solvência do setor público brasileiro. No quadro atual, a política fiscal do país deve ser entendida na dimensão em que ela é tratada em qualquer livro texto de economia, ou seja, como um instrumento de expansão ou de contração da demanda agregada. Os economistas já demonstraram que, para manter a dívida pública líquida na trajetória de queda, não é necessário o esforço fiscal que está sendo feito este ano pelo governo. Um superávit primário menor seria suficiente para manter a dívida em queda como proporção do produto.

A meta de superávit primário do setor público que será alcançada este ano, em torno de 3% do Produto Interno Bruto (PIB), é uma contribuição da política fiscal para o controle da demanda agregada e, por conseguinte, da inflação. Esta foi a mudança na política econômica feita pela presidente Dilma Rousseff.

Durante o governo Lula - principalmente no segundo mandato do ex-presidente - a política fiscal esteve em conflito com a política monetária. Enquanto o Banco Central elevava a taxa de juros para controlar a inflação, o Ministério da Fazenda aumentava as despesas públicas. Esta situação se agravou em 2010, quando o governo Lula chegou a usar uma parcela da receita do petróleo do pré-sal, que sequer foi extraído, para garantir os gastos públicos. Tal distorção - o conflito entre as políticas monetária e fiscal - marcou o governo anterior.

Dilma assumiu a presidência em meio a fortes pressões inflacionárias herdadas da gestão anterior. Para enfrentar esse quadro adverso, ela buscou um equilíbrio entre as políticas fiscal e monetária. Com essa estratégia, Dilma procurou reduzir o peso da taxa de juros no controle da inflação. Para obter esse equilíbrio, o governo programou um ajuste fiscal de R$ 50 bilhões, que está sendo executado com rigor. No primeiro semestre, o governo federal já havia cumpriu 68,7% de sua meta fiscal para todo o ano.

A dosagem de política fiscal e monetária adotada pelo governo Dilma tem se mostrado eficaz, pois há sinais consistentes de que a inflação convergirá para o centro da meta - de 4,5% - no próximo ano. Na semana passada, o presidente do BC, Alexandre Tombini, chegou a projetar uma queda de 2 pontos percentuais da inflação acumulada em doze meses, no período que vai de setembro a abril do próximo ano.

Se as previsões de Tombini se confirmarem, a inflação estará em torno de 4,8% ao fim do primeiro quadrimestre de 2012. Com isso, o equilíbrio entre as políticas fiscal e monetária poderá registrar o seu primeiro sucesso.

A crise internacional, cujos desdobramentos ainda são de difícil previsão, poderá levar o mundo a uma nova recessão. Se isso vier a ocorrer, o crescimento econômico do Brasil também será afetado. Nessa situação, a melhor alternativa do governo é manter uma política fiscal forte e fazer os estímulos necessários à atividade econômica por meio da política monetária, com o corte dos juros.

domingo, 21 de agosto de 2011

Marx estava certo (e errado).

Sérgio Malbergier escreveu este provocativo artigo na FOLHA, que não podemos deixar de ler. 

Crises podem ser supervalorizadas, ainda mais numa era de noticiário histérico e ubíquo e de mercados histéricos e ubíquos.


Há em curso uma história econômica maior (e melhor) do que a implosão da bolha de consumo e bem-estar dos países ricos, que é a emancipação econômica de bilhões de cidadãos do chamado mundo emergente.

Quanto mais o segundo ato da crise econômica global se desenvolve, mais claro fica que ela é uma crise econômica do Hemisfério Norte. Os países do Sul já saíram da crise há muito tempo. O processo de inclusão socioeconômica das massas desses países se mostrou resistente ao empobrecimento dos ricos.


Nos EUA e na Europa Ocidental, o estouro da grande bolha de prosperidade (via crédito, nos EUA; via benefícios socioeconômicos, na Europa), ainda causará muita agonia. Suas empresas, instituições e cidadãos se sentem inseguros e pessimistas quanto ao futuro, o que é mortal para os negócios, mesmo que se tenha o melhor ambiente de negócios do mundo.

Nos EUA, pátria do consumo, as vendas de carros neste ano devem ser quase 30% menores do que em 2001. O mercado imobiliário do país voltou a afundar, e nunca tantos americanos dependeram da ajuda do governo para comprar alimentos.


Corta para o Brasil, que tem um ambiente de negócios muito pior que o dos EUA, mas onde a confiança é a maior da história, as vendas de carros batem recordes, o mercado imobiliário atinge picos nunca vistos e a procura por programas como o Bolsa-família cai com o aumento do emprego e da renda.

São dinâmicas completamente diferentes. De um lado, EUA, Europa e Japão atordoados pelo estouro da bolha de prosperidade. Do outro, Brasil, China, Índia, Indonésia, Turquia, Angola, Colômbia, Peru, etc., países que depois de anos de liberalização e avanços macroeconômicos vivem processos sólidos de desenvolvimento.

É um tremendo rearranjo geoeconômico que terá conseqüências geopolíticas e culturais muito maiores do que conseguimos vislumbrar hoje.

Na edição 2011 das Maiores Ideias do Ano da prestigiosa revista americana "The Atlantic", a primeira da lista é a emergência da classe média dos emergentes.

Gillian Tett, a editora do "Financial Times" que tratou do tema, escreveu esperançosa que países como Brasil, China e Índia, que antes contribuíam com "choque de oferta" na economia mundial, ao produzir produtos mais baratos, agora, com suas massas consumidoras, podem fornecer um "choque de demanda" capaz de reativar as economias do Norte.

Diz muito de nossos tempos que consumidores como o brasileiro, o indiano ou o chinês possam ser vistos como a salvação das economias de Europa e EUA.

O otimismo aqui no Sul, estampado em quase todos os rostos brasileiros, é o oposto do pessimismo do Norte, cujo porta-voz melhor talvez seja o economista Nouriel Roubini, apelidado de Mister Apocalipse e que previu com antecedência de anos o estouro da bolha de crédito imobiliário e suas consequências.

Roubini anda tão pessimista que disse ao wsj.com que Karl Marx pode ao final estar certo sobre o capitalismo. Como?

Para Roubini, o brutal processo de desalavancagem, que reduz gastos públicos e privados, cria governos zumbis, consumidores zumbis, lares zumbis. Nos últimos anos, disse ele, houve enorme redistribuição de riqueza do trabalho para o capital, dos salários para os lucros. E como as empresas gastam proporcionalmente menos do que os lares, essa concentração reduz a demanda e ameaça a economia.

"Marx estava certo. Em algum ponto, o capitalismo pode se autodestruir. Não se pode continuar transferindo renda do trabalho para o capital sem gerar excesso de capacidade e falta de demanda agregada. Foi isso o que aconteceu. Pensávamos que os mercados funcionavam bem. Eles não estão funcionando. A empresa, para sobreviver e prosperar, pode reprimir gastos trabalhistas cada vez mais, mas os gastos trabalhistas são a renda e o consumo das pessoas. Por isso é um processo autodestrutivo", explicou (provocou) o professor Roubini.

Marx pode estar certo em algumas coisas e errado em outras. Mas é preciso notar que, se é a crise do capitalismo que traz estagnação ao Hemisfério Norte, é o sucesso do capitalismo que traz prosperidade para o Sul.

A importância de debater o PIB nas eleições 2022.

Desde o início deste 2022 percebemos um ano complicado tanto na área econômica como na política. Temos um ano com eleições para presidente, ...