DUAS NOVAS medidas do governo no sentido de enfraquecer o real não vão alterar a força de nossa moeda.
A razão dessa minha observação é muito simples: barreiras à entrada de capitais financeiros de curto prazo não compensam as forças estruturais, de longo prazo, que estão agindo no mercado de câmbio. O problema do real forte é uma questão que merece uma reflexão mais profunda e uma política mais abrangente por parte do governo. E isso não está acontecendo...
As medidas pontuais que vêm sendo tomadas são corretas, mas têm objetivos limitados e que precisam ser explicitados pelo ministro da Fazenda.
A cobrança de um imposto que incide sobre títulos de renda fixa e empréstimos externos de curto prazo tem como objetivo principal melhorar a qualidade dos capitais financeiros que estão entrando no país. Mas sua eficácia para forçar a desvalorização do real -ou pelo menos interromper seu fortalecimento- é muito baixa.
Quando se está em uma posição pública, como a do ministro da Fazenda, a forma de se comunicar com a sociedade passa a ser uma questão fundamental. Por isso deve-se trabalhar com conceitos bastante rígidos e claros, para não entrar em um processo de perda de credibilidade. Temo que o ministro da Fazenda esteja nessa situação, em razão da forma como vem tratando a questão da valorização do real.
Para não ficar apenas na crítica fácil, trago ao leitor da Folha algumas ideias para um novo discurso do governo em relação a essa questão. Eu começaria apresentando de maneira mais clara as razões pelas quais o dólar está sendo cotado abaixo de R$ 1,60. Considerando a valorização da moeda e o retorno dos juros locais, o ganho proporcionado pelo real é imbatível: desde o início de 2006, chegou a mais de 150%.
Para o leitor ter uma ideia da força desse movimento, basta compará-lo ao de outras moedas de países emergentes, nesse mesmo período e com o mesmo critério (incluindo os juros de cada país no período): peso argentino, 50%, dólar canadense, 40%, yuan chinês, 22%, e won sul-coreano, 6%. Somente o dólar australiano -país que tem nas exportações de produtos primários uma força comparável à nossa- teve uma valorização mais acentuada, porém ainda bem inferior à do real: 91%.
Por isso começaria por esse fato minhas explicações à opinião pública. A força do real -e do dólar australiano- tem muito a ver com a valorização dos produtos primários nos mercados internacionais depois de 2004. E o Brasil foi um dos grandes beneficiários desse movimento, que deve permanecer por muitos anos.
Em 2003, cada US$ 100 de exportações brasileiras podiam comprar o equivalente a US$ 90 dos principais itens de nossa pauta de importações; hoje, os mesmos US$ 100 de exportações podem comprar quase US$ 140 de produtos importados.
Essa dinâmica tem sido responsável por um aumento anual de mais de 1,6% no PIB brasileiro nos últimos anos. E isso não é explicitado pelos porta-vozes do governo.
Explicado ao distinto público o caráter estrutural e benéfico da força do real, seria preciso caminhar mais na direção de explicitar os problemas que são criados nessa situação. O governo tem sido mais claro na explicação desse lado negro do processo que vivemos. Mas, como não explicita o lado virtuoso, fica a impressão de que se deve buscar a qualquer preço uma moeda mais fraca. Isso aumenta a responsabilidade do governo com as ações do Ministério da Fazenda e o preço do inevitável fracasso que deve se seguir.
Creio que a questão mais difícil que vive o governo Dilma hoje é a de apresentar um balanço de perdas e ganhos nessa questão da taxa de câmbio e, em um segundo momento, definir uma proposta para enfrentá-la. O caminho da comunicação trilhado desde o governo Lula passa a uma distância lunar dessa minha proposta.
Atacar inimigos externos -como os especuladores e as taxas de juros muito baixas nos Estados Unidos- está de acordo com os manuais petistas. Mas criará muito mais problemas do que soluções para o governo da presidente Dilma, que, por ser a herdeira de Lula, terá que enfrentar a crise na indústria brasileira.
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