ROGERIO FURQUIM WERNECK é economista e
professor da PUC-Rio. Escreveu este artigo para O GLOBO de hoje.
Em artigo publicado há quase cinco anos, o
ex-ministro Antonio Palocci fez ponderações sobre entraves aos investimentos do
PAC que, a cada dia, soam mais oportunas (O GLOBO, 16/9/2007). Arguiu que, no
governo, o investimento costuma ser "a mais difícil das tarefas".
E que, em vista das dificuldades envolvidas, não só na escolha dos projetos,
como nas fases de planejamento, financiamento e execução, "os gastos
correntes tendem a ganhar de goleada dos gastos com investimentos".
O que Palocci queria dizer era que, ao
escolher que uso dar aos recursos fiscais adicionais propiciados, ano após ano,
pelo crescimento da arrecadação, o governo vinha mostrando preferência
inequívoca por aumento de dispêndio corrente. E que, mesmo quando a escolha
recaía sobre o investimento, à medida que a execução dos projetos se atrasava,
na esteira de incontáveis dificuldades, a sobra de recursos fiscais acabava por
viabilizar expansão adicional de gastos correntes.
São ponderações que continuam a merecer
atenção. Nos últimos anos, o governo não encontrou dificuldade para expandir
em muito seus gastos correntes. Aumentar o investimento público, no
entanto, continua sendo muito difícil. E não se trata apenas de evitar que a
expansão tão fácil dos gastos correntes acabe por inviabilizar o aumento dos
investimentos. Trata-se também, e principalmente, de conseguir fazer o
investimento acontecer, quando o financiamento está plenamente garantido.
No ano passado, o governo não tinha qualquer
intenção de conter seus gastos de investimento. Muito pelo
contrário. Ainda assim, o que se constatou, afinal, foi que tais gastos
permaneceram estagnados, em nível equivalente ao de 2010. Não por ter havido
contingenciamento de verbas ou qualquer outra forma de restrição ao
financiamento. Mas, simplesmente, porque, em ministérios infestados por
esquemas de corrupção, o governo se viu obrigado a desmantelar as cadeias de
comando que acionavam o investimento. E ainda não conseguiu remontá-las.
A remontagem promete ser bem mais complexa do
que o governo antevia, como bem ilustram as dificuldades de reconstrução do
Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, o emblemático Dnit. De
acordo com seu novo diretor, o órgão teria de contar com o dobro dos
funcionários com que agora conta, para que pudesse ter chance de desempenhar a
contento o papel que dele se espera, na gestão dos programas de investimento
público sob sua responsabilidade. Em vista dessas dificuldades, já há quem
argua que talvez faça mais sentido reconstruir o Dnit em outras bases.
Além de corrupção escancarada, o atrofiado
esforço de investimento que ainda subsiste no orçamento federal vem enfrentando
os custos do problemático loteamento de cargos que vem sendo feito pelo
governo, em nome de um presidencialismo de coalizão que parece já ter
ido bem mais longe do que seria razoável. A mídia tem dado destaque à licença
com que políticos agraciados com a gestão de determinados órgãos da
administração pública interpretam os poderes de que foram investidos.
Proliferam casos de gestores que se permitem concentrar a maior parte dos
investimentos dos órgãos que administram em projetos de interesse exclusivo dos
Estados de onde são oriundos.
A grande vantagem da presidente é que dela
não se pode dizer que lhe falte reflexão prévia sobre esses problemas. Desde
o primeiro mandato do presidente Lula, Dilma Rousseff está mobilizada com o
desafio de assegurar que os programas de investimento público avancem conforme
previsto. E foi exatamente isso que, na transição do governo anterior para
o atual, assegurou tão alto grau de continuidade na gerência dos programas de
investimento público. Prestes a completar sete anos de envolvimento diário com
tais problemas, a presidente já não tem como alegar surpresa diante de qualquer
dos desafios envolvidos na complexa gestão dos investimentos do governo. Não
pode se dar ao luxo de apresentar mais um ano de desempenho medíocre nessa
área.
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