Editorial do Valor Valor Econômico de hoje vai de juros a política fiscal.
Em uma de suas decisões mais
antecipadas, o Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou quarta-feira o
corte de meio ponto na taxa básica de juros (Selic) para 10,50% ao ano. A como
sempre sintética nota emitida pelo Copom após a reunião indica novos cortes
pela frente. Até aí, nenhuma novidade. A dúvida é até onde chegará a tesoura do
Copom.
Foi o quarto corte consecutivo de meio
ponto da taxa Selic, acumulando dois pontos de redução desde a histórica
reunião do fim de julho, quando o Copom inverteu a trajetória dos juros.
Naquele momento, o Copom surpreendeu o mercado com a avaliação de que haveria
uma significativa piora na crise da zona do euro, com impacto forte na economia
brasileira.
A realidade mostrou que, infelizmente, o
Copom tinha razão e o mundo viveu um dos piores semestres da história. A
avaliação de que o cenário externo ainda é hostil permanece, como indica a nota
divulgada na noite da quarta-feira: "O Copom entende que, ao
tempestivamente mitigar os efeitos vindos de um ambiente global mais
restritivo, um ajuste moderado no nível da taxa básica é consistente com o
cenário de convergência da inflação para a meta em 2012".
Mas já há tênues sinais de mudança no
cenário doméstico e internacional, que vão influenciar as decisões futuras do
Copom. No exterior, a economia americana parece começar a reagir, embora à
custa das volumosas injeções de dinheiro do Federal Reserve (Fed, o banco
central americano), a ponto de causar a melhora no nível de emprego pela
primeira vez em muito tempo. Os dados mais recentes da economia chinesa afastam
o risco da temida desaceleração brusca, embora ainda sejam frágeis; e a Europa
parece ter conseguido represar os riscos com as operações do Banco Central
Europeu (BCE), dando tempo para os países mais problemáticos executarem seus
programas de ajuste fiscal.
No front doméstico, outubro parece ter
sido o fundo do poço da economia. O Índice de Atividade Econômica do Banco
Central (IBC-Br), que antecipa os resultados do Produto Interno Bruto (PIB),
surpreendeu com o crescimento de 1,15% em novembro, na série com ajuste
sazonal. Foi o primeiro resultado positivo após três meses de quedas
consecutivas e o maior em 19 meses. A sinalização do IBC-Br é que a economia
brasileira começou a reagir em novembro, mesmo que moderadamente, processo que
deve ter continuado em dezembro, a julgar pelos dados de produção industrial e
do varejo. Neste ano, o nível de atividade contará com o impulso do aumento de
14,1% do salário mínimo e da redução do IPI para os produtos da linha branca,
além da provável redução do IOF do crédito. Já a inflação mostra sinais de que
vai se acomodar entre 5% a 5,5% neste ano.
O quadro todo coloca o prumo da balança
na política fiscal. Cumprir a meta fiscal é política defendida pelo Banco
Central e pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e considerada fundamental
para que os juros mantenham a trajetória de queda. O superávit primário cheio
previsto pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para este ano é de R$ 139,8
bilhões, ou 3% do PIB.
Até fevereiro o governo deve definir os
cortes orçamentários necessários para atingir essa meta, tarefa que será
dificultada pela perspectiva de redução da arrecadação neste ano. Fala-se em
diminuir as despesas em R$ 60 bilhões a R$ 70 bilhões, esforço maior do que o
feito em 2011, quando foram cortados R$ 24 bilhões, principalmente em
investimentos.
É isso que alguns setores do governo não
querem repetir neste ano. A questão que se discute nos círculos mais íntimos do
governo é como equilibrar o cumprimento do superávit primário fiscal com o
desejável crescimento da economia. A presidente Dilma gostaria que a economia
crescesse 4% a 5% neste ano, acima dos 3% a 3,5% previstos pelo mercado,
considerando as condições atuais. Para estimular o nível de atividades, o
Planalto quer enfatizar os investimentos especialmente em infraestrutura, como
em portos, aeroportos e rodovias, que inclusive estimulam a iniciativa privada.
O governo poderia ainda usar a prerrogativa prevista em lei de descontar da
meta os investimentos previstos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC),
de cerca de R$ 42 bilhões, o que não é visto com bons olhos por todos. Mais do
que nunca, a trajetória dos juros está atrelada à política fiscal.
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