Nivalde J. de Castro é professor da UFRJ e coordenador do Gesel - Grupo de Estudos do Setor Elétrico do Instituto de Economia da UFRJ. Guilherme de A. Dantas é doutorando do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ e pesquisador-sênior do Gesel-UFRJ.André Luis da Silva Leite é professor da UFFS (Campus Chapecó) e pesquisador-sênior do Gesel-UFRJ. Escreveram este artigo especialmente para o VALOR ECONÔMICO de hoje.
As questões ambientais vêm preocupando a
sociedade brasileira. Quando o Ministério das Minas e Energia (MME) toma a
decisão de construir a 3ª maior usina hidrelétrica do mundo, Belo Monte, é
natural o surgimento de críticas sobre sua viabilidade ambiental e econômica.
Por se tratar de uma obra estratégica, que afetará o bem estar futuro de
milhões de brasileiros, a discussão deve se pautar em análises técnicas,
econômicas e jurídicas, evitando uma avaliação sem a necessária racionalidade.
A análise deve partir de três premissas básicas: 1) o Brasil precisa de energia
elétrica em volumes crescentes para sustentar seu crescimento; 2) qualquer nova
usina elétrica impacta o meio ambiente; e 3) os recursos energéticos são
escassos e nem todos são renováveis.
O Brasil é a 6ª maior economia do mundo
e apresenta perspectivas macroeconômicas muito positivas. Nessa trajetória de
crescimento, a sociedade quer melhorar os padrões sociais e econômicos e
superar as graves desigualdades existentes. Para tanto, será preciso aumentar a
produção industrial e a oferta de serviços, exigindo, obrigatoriamente, maior
consumo e geração de energia elétrica.
O Brasil tem uma matriz elétrica com 87%
de energias renováveis, enquanto que a média mundial é de 19%. Essa posição do
Brasil está assentada em 956 usinas hidrelétricas construídas ao longo do
século XX que geram energia limpa e sustentável. Manter a matriz elétrica
renovável será, cada vez mais, um diferencial internacional competitivo,
econômico e ambiental. É com esse objetivo que a política energética do MME vem
priorizando o aproveitamento do 3º maior potencial hídrico do mundo, de 160 mil
MW, abaixo somente da Rússia e da China. A construção de Belo Monte faz parte
dessa estratégia de manter a matriz elétrica brasileira entre as mais
sustentáveis e competitivas do planeta.
A crítica central à Belo Monte é quanto
aos impactos ambientais e sociais, e que seria possível atender a demanda
elétrica de 6 mil MW/ano somente com energia eólica, biomassa e solar, deixando
de usar o imenso potencial hídrico.
Todas as grandes hidrelétricas em
construção, como Santo Antônio, Jirau, Teles Pires e mesmo Belo Monte, estão
respeitando a Constituição de 1988 e a legislação ambiental. Nem poderia ser
diferente, porque o Brasil é hoje uma democracia consolidada: quem se sente
prejudicado ou entende que algo fora da Lei está sendo construído, recorre à
Justiça, que, nesses casos, tem julgado e dado o nihil obstat para essas obras.
A legislação obriga que esses empreendimentos apliquem mais de 10% do custo
total das obras em ações que mitiguem os impactos na flora, fauna e invistam
nos sistemas de saúde, educação, saneamento etc., buscando melhorar a qualidade
de vida das populações de índios, ribeirinhos e citadinos afetados pelas
usinas. Com essas ações, a legislação busca manter o equilíbrio ecológico,
melhorar a qualidade de vida das populações afetadas usando recursos das
receitas da venda de energia elétrica e, ao mesmo tempo, garante o aumento da
oferta de eletricidade que o Brasil precisa para o seu desenvolvimento.
Trata-se de uma legislação inteligente e eficiente que não foi usada no passado
por falta de consciência social ambiental.
Particularmente em um aspecto a
legislação ambiental brasileira é muito rigorosa. Trata-se da área inundada
pela represa da usina, por representar uma perda irreversível no uso do solo. A
solução tem sido a construção das usinas de fio d"água, com reservatórios
mínimos, onde a eletricidade é gerada pela força do fluxo e volume das águas.
Como resultante, estão sendo construídas usinas no Brasil com a menor relação
entre capacidade instalada e área alagada.
Sobre o uso de outras fontes de energia
renovável, uma primeira questão é que a hidreletricidade é a fonte mais barata
do mundo. As novas usinas em construção irão vender energia a R$ 80 por MW em
contratos de 30 anos, garantindo às gerações futuras eletricidade barata, limpa
e sustentável. Os países desenvolvidos usaram ao máximo seu potencial hídrico,
como é o caso da França, tendo que recorrer à energia nuclear, fonte que responde
por 80% da eletricidade total produzida naquele país, mas com custo bem
superior à hidreletricidade e risco ambiental não desprezível como o acidente
de Fukushima mostrou.
O MME adota política de exploração de
fontes renováveis, buscando criar sinergia operacional, mas priorizando a fonte
em que temos mais experiência, maior abundância e menor custo: a
hidreletricidade. São realizados leilões de energia eólica, estimulando a
competição, fazendo os preços caírem de R$ 270 para R$ 100 por MW. A biomassa do
bagaço da cana de açúcar tem um potencial estimado de 17 mil MW para 2020,
equivalente à Binacional Itaipu. Leilões têm sido realizados sendo contratadas
a R$ 150 por MW. A energia solar é ainda muito cara por não ter uma rota
tecnológica consolidada e escala produtiva para ser competitiva. Em breve, o
custo da energia solar deve cair, como ocorreu com a energia eólica, quando
então serão realizados leilões de energia solar no Brasil.
Para garantir a segurança do suprimento
de eletricidade frente a períodos de hidrologia crítica, como já ocorrido no
passado, é necessário investir, marginalmente, em usinas termelétricas. O
Brasil conta com grandes reservas de gás natural do pré-sal. Além disso, o gás
natural é o menos poluidor entre todas as fontes derivadas do petróleo. Dessa
forma, não se trata de excluir fontes de energia da matriz elétrica, mas somar
as fontes e buscar uma complementaridade mais eficiente do ponto de vista
elétrico, ambiental e econômico.
Diferentemente do resto do mundo, o
Brasil é totalmente autossuficiente em recursos energéticos. Toda a energia
elétrica que consumimos hoje e precisaremos para as próximas décadas está
dentro de nossas fronteiras. Temos completa e absoluta segurança energética.
Nesse sentido, o setor elétrico brasileiro apresenta um cenário de
desenvolvimento muito promissor, onde cada fonte, em especial a
hidreletricidade, contribuirá de forma direta para o almejado desenvolvimento
econômico e social brasileiro.
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